Watch Dogs

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Em alguns aspectos, Watch Dogs está no mesmo time de outro jogo sobre cachorros em um mundo aberto: Sleeping Dogs.

O jogo da Square Enix tem uma mecânica única e muito divertida no seu sistema de porrada. Porém, a falta de confiança nesta mecânica é evidente pela simples existência de armas de fogo, aproximando o jogo perigosamente de um Grand Theft Auto.

Substitua, no parágrafo acima, “sistema de porrada” por “sistema de hacking”, e a frase se encaixa perfeitamente em Watch Dogs. Assim como Sleeping Dogs, em seus melhores momentos, temos aqui um jogo único e empolgante, que poderia ser grande, mas ele aparenta carecer de confiança na própria mecânica que o torna especial.

ASSISTINDO OS CACHORROS

O jogador controla Aiden Pearce, um cara com um smartphone que realmente faz jus ao “smart”. Simplesmente olhando para o celular, o protagonista consegue saber a renda dos transeuntes ou fazer um cano de vapor abaixo de uma rua explodir.

Aiden quer se vingar da morte de sua sobrinha, e não vai poupar esforços para saber quem foi o mandante do assassinato dela e qual o motivo. Para isso, ele vai dirigir, hackear e se envolver em muitos tiroteios. A história é daquele tipo mais aglomerado do que interessante. Tem viradinha demais, com todo mundo traindo todo mundo, o que acaba deixando até engraçado.

Além disso, Aiden não é um personagem muito bem desenvolvido. Boa parte do seu tempo com o jogo, você vai passar impedindo crimes de acontecerem. Daí você consegue, aumenta sua reputação de vigilante e logo em seguida rouba um carro para ir para sua próxima missão.

E aqui eu devo admitir: minhas primeiras horas com Watch Dogs não foram divertidas. Eu sentia que absolutamente tudo que eu fazia colocava a polícia na minha cola, e escapar levava tempo e dava trabalho. Roubou um carro? A vítima chama a polícia. Fez uma sidemission ou uma missão principal? Pode ter certeza que vai terminar a dita-cuja escapando da polícia.

Particularmente, eu nunca achei divertido fugir dos tiras em videogames (nem na vida real). Essa é a parte mais chata dos Need for Speeds ou dos GTAs para mim. Pelo menos Sleeping Dogs tem um combate entre carros, que acaba dando um twist interessante. Em GTA, você pode atirar enquanto dirige. Watch Dogs não tem nada disso, tornando bastante difícil escapar da polícia no início do jogo, pois não conseguia quebrar seus carros e muito menos sair de sua linha de visão.

A frustração chegou a um ponto que eu tive que admitir a derrota e mudei a dificuldade para o famigerado easy, o que nunca faço. Acontece que no início de Watch Dogs, boa parte da mecânica do jogo está travada para o jogador, e deve ser liberada através de upgrades.

Com o tempo, você não vai mais se sentir tão overpowered pela polícia, pois vai poder usar o celular para levantar pontes, mexer com semáforos ou, meu preferido, explodir um pedaço da rua. Mas tudo isso, que torna as perseguições de carro tolerantes, precisa ser comprado. E, curiosamente, são nas primeiras missões que a polícia parece aparecer mais.

Durante essas primeiras horas, também estava achando o jogo muito complicado, com muitos apps (os “poderes” do protagonista) e muita coisa a ser aprendida. Os tutoriais pareciam ser inexistentes. Por exemplo, no mapa eu via umas torres que deveriam ser liberadas para me dar hideouts, mas eu ia até elas e não conseguia encontrá-las. Só depois de muito procurar, eu descobri que eu tinha que encontrar um caminho secreto que me possibilitava chegar até elas. Mas o tutorial que me mostrava isso parecia ser inexistente. Parecia, pois eventualmente ele apareceu, lá pela metade da campanha principal, quando eu já tinha descoberto sozinho como o negócio funcionava.

O mesmo vale para as sidemissions. Quando finalmente o jogo me mostrou na campanha como eu lidava com os criminal convoys, eu já tinha o troféu por ter feito todos eles.

Assim, Watch Dogs é um jogo que se abre muito cedo, mas que para ser melhor usufruído, o jogador deve investir primeiro na história e deixar a exploração e as sidemissions para depois. Um pouco mais de timing e de condução seria bem-vindo, com o jogo se abrindo aos poucos, mostrando de forma homeopática como lidar com tudo que ele oferece.

E O QUE ELE OFERECE?

Muita coisa, delfonauta curioso. Tem um monte de mini-games que vão de xadrez a poker (por que diabos sempre tem poker em jogos de mundo aberto? E alguém faz questão disso?), assim como alguns mais interessantes que são chamados de Digital Trips.

Nas Digital Trips, você pode fazer coisas como pular de uma flor para outra (é…) ou sair atropelando pedestres e ganhando pontos por isso, numa versão modernizada do clássico Carmageddon. Estes minigames são mais divertidos, mas você provavelmente não vai passar muito tempo neles.

Depois que você tiver explorado todos os apps do seu celular (onde se encontram boa parte das atividades), a parte que tem sustância mesmo é a campanha e as sidemissions. E foi quando eu comecei a me focar nisso que eu comecei a me divertir com Watch Dogs. Demorou, especialmente porque eu demorei para sentir que tinha aprendido a jogar, mas assim como Grand Theft Auto, ele acabou me conquistando.

MELHORES MOMENTOS

Os melhores momentos de Watch Dogs são exatamente os que o tornam único. Em determinada missão, você tem que vigiar o último andar de um edifício sem entrar nele e, para chegar lá, vai hackeando de câmera em câmera. Você se sente o próprio big brother.

Outra fase muito boa acontece em uma prisão. Você está sem armas, tem apenas o seu telefone para abrir caminho e se defender. Este é um dos momentos que demonstram quão pintudo Watch Dogs poderia ser se tivesse desencanado de usar armas.

Em geral, as fases envolvem planejamento e stealth. Você precisa atravessar uma área restrita, e a melhor forma de fazer isso é sendo furtivo. Hackeando as câmeras, você pode marcar a posição de todos os inimigos, desabilitar a possibilidade de eles chamarem por reforços, explodir suas granadas, ativar alarmes de carros ou explodir coisas, tudo isso sem sequer ter entrado na área restrita. É muito legal.

Poderia ser melhor ainda se tivessem pegado uma dica da franquia Arkham City. Nestes jogos do Batman, quanto mais você assusta os inimigos, mais fácil fica para você vencê-los. Em Watch Dogs, caso você exploda a granada de um sujeito, seus comparsas ficam alertas e começam a procurar pelo jogador, tornando mais difícil se manter escondido.

Assim, ao invés de brincar de hacker e tentar eliminar a maior parte dos inimigos antes de colocar a mão na massa, você acaba usando as câmeras para marcar a posição deles e desabilitar os reforços. A partir daí, vale mais a pena se infiltrar na área restrita e eliminá-los manualmente, um a um. E é claro, isso dificilmente dá certo, fazendo com que o que começou como stealth termine em tiroteio. Entende o que eu digo quando falo que Watch Dogs poderia ser ainda mais legal se tivesse mais confiança no próprio taco?

Seria muito mais divertido limpar a área utilizando-se apenas dos seus poderes de hacker. Se tirassem todas as armas do Aiden, Watch Dogs poderia ser ainda melhor do que é.

Outro tipo de missão muito boa é quando você tem que usar as câmeras para levar um NPC em segurança até determinado local do cenário. Lembra aquela cena do Matrix, em que o Morpheus fala o caminho e a hora de se mover para o Neo escapar dos agentes? É tipo isso, com o jogador assumindo o papel do Morpheus. É bastante emocionante, especialmente porque a sua visão fica limitada às câmeras que estão no ambiente.

AS SIDEMISSIONS

Existe um número limitado de tipos de sidemissions. A melhor delas se chama gang hideout, e é basicamente uma área restrita na qual você deve nocautear (e não matar) um inimigo específico. Os outros você pode assassinar a gosto. Para isso, você pode utilizar seus apps ou ir direto para as armas de fogo.

Outras missões envolvem corrida contra o relógio ou o download de arquivos confidenciais, o que significa manter seu carro próximo ao da sua vítima enquanto o download é feito.

O tipo mais chato são os criminal convoys, que envolvem dirigir até um grupo de carros inimigos e matar todos eles. Porém, em alguns casos você deve apenas nocautear um dos caras, o que torna bem difícil. Poderia até ser legal, se o jogo fizesse um checkpoint no momento que você alcança os bandidos, mas cada vez que você morre, tem que voltar do início, inclusive tendo que dirigir de novo até o local onde a porradaria vai comer solta.

ONLINE

Se tem uma coisa que a Ubisoft faz bem é uma modalidade online única e divertida. Eu não sou muito fã de multiplayer competitivo, mas passei muitas horas brincando de assassino no Deathmatch de Assassin’s Creed Revelations.

Essa tradição retorna em Watch Dogs. Aqui, a qualquer momento seu jogo pode ser invadido por outro jogador. Caso você seja o invadido, tem que encontrar e matar o hacker. Caso você seja o invasor, deve ficar escondido e incógnito até o hacking terminar. É bem divertido.

Outra forma 1 contra 1 presente aqui é mais simples, e envolve simplesmente observar o jogador inimigo durante algum tempo. Neste caso, o jogador não é avisado que está sendo observado, o que deixa relativamente fácil de cumprir a missão. É um bom lugar para se começar, antes de ir para o hacking em si.

Curiosamente, mesmo eu não sendo mais um assinante da Playstation Plus, o que significa que eu não posso jogar online, estas duas formas de jogo funcionaram normalmente e eu me diverti bastante com elas.

Tem outras modalidades online que eu não pude testar por não ser um Plus, como corridas (o que não deve ser grande novidade) e uma chamada Online Decryption.

TRILHA SONORA E GRÁFICOS

A trilha sonora de Watch Dogs tem um monte de músicas licenciadas bem legais, que vão de Stooges a Alice Cooper, passando por alguns blues e jazz deveras interessantes. Tem também uns raps e algumas músicas eletrônicas, caso você seja fã desses gêneros.

A diferença é que aqui não há rádios. As músicas parecem tocar em ordem alfabética e você pode pular as que não gostar. Isso significa que não existem os divertidos programas de rádio na linha do GTA, a não ser algumas rápidas notícias entre as músicas falando do tal “vigilante”.

Os gráficos são bem legais, mas não me passaram uma sensação de next-gen. É um jogo bonito, sem dúvida nenhuma, mas acredito que a diferença entre as versões de PS3 e de PS4 se limite a detalhes. Coisas como o chão ficar molhado quando chove ou as faíscas de uma explosão dão um charme especial e recompensam o jogador atento. Assim, acredito que Watch Dogs seja quase tão bonito na geração antiga quanto na nova.

POTENCIAL ENORME

Watch Dogs tem um potencial enorme. Se sua inevitável continuação investir mais no que ele tem de único e tiver coragem de deixar o lado GTA de lado, podemos estar presenciando aqui o nascimento de uma franquia muito especial. Afinal, para jogar GTA, já temos o próprio GTA.

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Nota
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
watch-dogsAno: 2014<br> Gênero: Mundo aberto<br> Plataforma: PS4, PS3, Xbox One e Xbox 360<br> Fabricante: Ubisoft<br> Versao: PS4<br> Distribuidor: Ubisoft<br>