Exclusiva: Andre Matos

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Entrevistar um músico pode ser uma experiência e tanto. Já havia entrevistado outros dois músicos antes – um deles foi Hugo Mariutti, pouco tempo atrás, aqui no DELFOS, mas até então nunca tinha tido a oportunidade de entrevistar alguém como se fosse um bate-papo. Mesmo preparando perguntas, como de praxe, o que de fato aconteceu foi que, na conversa que tive com Andre Matos, elas quase não faziam diferença.

O Andre é uma pessoa muito eloquente, e o único papel das perguntas foi dar o direcionamento desejado à conversa. O engraçado, contudo, é que a conversa fluiu tão bem que eu nem precisaria das perguntas, bastaria estar lá ouvindo e anotando o que o maestro dizia. Para você ter uma ideia, o início da entrevista se deu por acidente: eu, em off, perguntei se o Andre toparia fazer uma interação durante a entrevista, mas a resposta que ele deu foi tão longa e tão interessante que iniciou a entrevista espontaneamente. E se você quiser ver o resultado disso tudo, está no lugar certo. Divirta-se.

Perguntas por Luiz Felipe Lima e Carlos Eduardo Corrales.

DELFOS: Andre, primeiramente muito obrigado pela entrevista. Eu tinha preparado uma interação com você, mas não sei se você vai topar, então eu gostaria de perguntar primeiro.

Andre: Interação significaria…?

DELFOS: Assim, a gente sabe que teve aquela declaração que você deu sobre o Angra, em que o pessoal interpretou muito mal e todo mundo te criticava sem ler a entrevista, e eu achei isso muito ruim, porque tirava a sua frase do contexto. E o ponto é se você toparia dar uma declaração completamente absurda só para poder ser manchete e as pessoas que lessem passassem a usar como se fosse verdade.

Andre: (risos) Eu até toparia, o problema é que não me vem nada à cabeça…

DELFOS: Algo tipo “eu gosto da revista Capricho”, ou qualquer coisa bem absurda.

Andre: Caramba, cara… É que eu acho difícil eu dar uma declaração…

DELFOS: Nosso medo é você dar uma declaração que seja realmente mal interpretada e vire um problema.

Andre: Então, aquela declaração… Você tá falando daquela declaração do Heavy Nation (n.e.: na supracitada declaração, Andre disse que achava que “o Angra devia acabar”)?

DELFOS: Sim.

Andre: Aquilo ali eu tive até a oportunidade de elucidar mais tarde. Depois de cinco ou seis perguntas acerca do Angra, banda da qual não faço parte há mais de quinze anos, chegou em um momento de saturação, porque eu não sou responsável pela carreira do Angra depois que eu saí da banda. Eu acho que foi uma resposta até mesmo ríspida – na hora mesmo eu disse “acho que estou falando uma coisa um pouco forte” -, mas a intenção não foi ser polêmico nem nada. Na verdade, quando eu falei aquilo eu fui bem sincero comigo mesmo.

DELFOS: Quem conhece a sua carreira até entende aquilo que você falou.

Andre: Não é? Porque chegou em um momento em que eu esperava ser mais perguntado sobre o meu trabalho do que sobre quais são os destinos do Angra, o que você acha do vocalista X ou Y, se a banda vai fazer sucesso ou não… Já não me interessa mais, é uma página virada, na realidade. Eu talvez até tenha agido de uma forma meio intempestiva, mas isso condiz com aquilo que eu penso, de qualquer maneira. É o que eu disse na segunda entrevista, na realidade: eu não retiro o que eu disse. Eu talvez tenha falado de um jeito um pouco exagerado – carregado, digamos. Carreguei na tinta, mas eu acho que a história está aí para provar as coisas.

Eu nem sei quanto tempo faz essa entrevista, provavelmente mais de um ano, e talvez hoje muita gente me dê razão acerca daquilo que eu falei. Outras pessoas não, e eu tenho todo o respeito por aqueles que não concordam comigo – eu não estou aqui para ser unanimidade para ninguém -, mas eu acho que a gente tem que parar um pouco com essa história do “politicamente correto”, sabe? Sempre respondendo o óbvio, aquilo que se espera, para não se comprometer… Acho que chega uma hora em que a gente tem que começar a falar um pouco mais o que pensa, e a gente conquista esse direito a partir do momento em que a gente apresenta uma carreira e um trabalho consistentes. A gente conquista esse direito, esse status, de você poder realmente expressar a sua opinião de forma mais clara. Então, daquilo que foi falado naquele momento, há mais de um ano – e você vê que até hoje reverbera -, é como eu disse: se eu ofendi alguém com aquilo, peço desculpas, mas não deixa de representar o meu pensamento, a minha opinião.

Uma vez, durante um workshop, um participante perguntou uma coisa muito pertinente. Ele falou: “você não acha meio contraditório você ter dito que o Angra vive do passado e ao mesmo tempo você estar fazendo uma turnê calcada no passado?”. E a minha resposta foi que sim, foi contraditório de fato, mas quando eu disse que (o Angra) vivia do passado, no momento em que eu respondi àquela pergunta, eu estava me referindo a outra coisa – não em relação ao repertório em si, não em relação às músicas, mas em relação à imagem.

Eu acho que você tem que saber se adequar aos tempos, saber evoluir ao longo dos anos. E nesse aspecto eu acho que – para não citar os outros profissionais, que têm todo o direito de fazer o que eles bem entenderem sobre as suas carreiras, mas para citar o meu caso específico -, eu acho que nós evoluímos ano após ano. Quer dizer, houve um primeiro disco solo, depois um segundo, um terceiro… Eu vejo uma evolução muito clara nisso aí.

E ao vivo é uma grande conquista, porque a gente está cada vez mais entrosado, mais coeso, mesmo se tratando dessas turnês “comemorativas” – como foi o caso da reunião do Viper, que foi o que gerou a ideia da turnê do Angels Cry – que foi tão bem sucedida que a gente não conseguiu terminar em um ano apenas, teve demanda para mais de um ano de turnê… E agora existe uma demanda enorme para uma turnê eventual do Holy Land, que eu ainda não prometo que vou fazer, mas ao mesmo tempo não nego porque, honestamente, de todos os discos que eu realizei com o Angra, o Holy Land, sem dúvida nenhuma é o meu disco favorito. Então poder realizar isso ao vivo pode vir a ser uma grande realização também, do ponto de vista artístico, pessoalmente falando. Mas isso nós ainda não definimos, ainda não discutimos, e se for para acontecer é uma coisa só para o ano que vem.

Então, eu acho que tá respondida a tua pergunta. E a intenção naquele momento, se é que não ficou claro até agora – e na realidade eu não me preocupo muito com as críticas, porque a partir do momento em que eu estou sendo coerente com a minha própria verdade eu estou em paz com isso -, é o que eu digo: se chegou a ofender alguém, eu peço sinceras desculpas, porque a intenção não foi ofender. Mas, não deixa de representar o meu jeito de pensar, porque todas as vezes em que eu me vi em uma encruzilhada em que a parte criativa se viu prejudicada em função da parte interpessoal, eu nunca tive medo de arriscar tudo de novo e começar do zero. E não foi uma vez só, foi mais de uma vez. Então, eu acho que eu sou um exemplo vivo de que isso é possível.

DELFOS: Você inclusive falou como a turnê de comemoração do Angels Cry tem sido bem-sucedida, mas uma coisa muito engraçada é que não se vê uma mobilização em torno de um DVD nem de um CD ao vivo. Por quê?

Andre: Eu não acho que seria o caso. Acho que se for para fazer um CD ou DVD ao vivo seria com o meu próprio repertório, e não com o repertório já consagrado, já mais antigo e já explorado anteriormente. A intenção disso agora é proporcionar àquelas pessoas que não viram e não puderam presenciar na época um show como por exemplo o Angels Cry na íntegra, como foi o Viper na íntegra ou como pode vir a ser eventualmente o Holy Land na íntegra, na voz original e também com uma banda que executa isso, modéstia à parte, à perfeição – e eu acho que executa de uma forma até provavelmente melhor do que a gente conseguia fazer na época, sem nenhum desmerecimento, é claro, mas são outros tempos, outros músicos, outras qualidades, enfim… É uma oportunidade reviver isso de uma certa forma ou viver isso pela primeira vez, mas não chega ao ponto de querer explorar isso ao extremo, de querer imortalizar ou plasmar isso na forma de uma gravação de vídeo ou de áudio, eu acho que aí não faria muito sentido.

No caso do Viper fez sentido, porque realmente foi uma reunião única, a gente esperou muito tempo para fazer isso e só fez quando foi possível… E o DVD do Viper está para sair, ele está praticamente terminado.

DELFOS: Quais foram os problemas que aconteceram para ele não ter saído?

Andre: Não houve nenhum problema, só foi realmente uma questão de tempo para edição. Foi muita captação de imagem, foi um tempo de decupação de imagens que demorou mais de um ano, quase dois anos, e toda a sincronização de som e imagem, enfim… Agora ele está 95% pronto, só falta a gente dar o “ok” final para ele ir para a fábrica.

DELFOS: E você provavelmente já viu o resultado do DVD…

Andre: Já.

DELFOS: E ele está bom mesmo?

Andre: Está maravilhoso.

DELFOS: Está como o Ritualive, que também foi um DVD excelente?

Andre: Ele é diferente do Ritualive. O Ritualive é um DVD que eu acho, honestamente, provavelmente o melhor já feito no Brasil por uma banda brasileira desse estilo. Eu me dediquei muito a isso na época, eu lembro que dormi no estúdio de edição uma semana inteira para terminar a tempo, e foi realmente dado muito sangue para ele ficar daquele jeito. E nós demos uma sorte muito grande de, em um dia só de captação, um dia só de show, a gente conseguir aquelas imagens e aquele som sem ter uma segunda chance… Foi um momento único, eu acho que o Ritualive ainda é um DVD insuperável em se tratando de um DVD de uma banda brasileira produzido aqui no Brasil.

A diferença para o Viper é a seguinte: o Ritualive é muito perfeito. Ele é todo grandioso, vamos dizer assim. No caso do Viper, você se sente mais dentro do show. Ele já é um DVD com um clima mais orgânico, mas igualmente interessante. Igualmente muito bem editado, muito bem gravado. Mas é muito diferente do Ritualive, não dá para comparar um com o outro – mas ele também vai vir para marcar uma época definitiva, pelo menos no que diz respeito a este retorno do Viper enquanto ele durou.

DELFOS: A banda Andre Matos já está se mobilizando em torno de um novo disco pós-The Turn of the Lights?

Andre: Não, não está. Eu até conversei bastante isso com eles, e eu acredito no seguinte: o mercado fonográfico mudou muito. Antigamente, até em função muito mais do exterior do que do Brasil, a gente tinha uma obrigação quase que anual de lançar um disco novo, e se não era anual era bienal. Era uma exigência da Europa, do Japão, enfim… E como mudou um pouco essa questão da venda física da música, e a venda passou a ser mais virtual, as gravadoras também estão adquirindo uma outra dinâmica, o que, para mim, pessoalmente falando, foi ótimo.

Não há mais aquela pressão externa de que você tem que produzir um disco e lançar daqui a um ano, dois anos, três. Eu acho que agora a gente lança um disco quando ele estiver pronto – o que não quer dizer que a gente não comece a trabalhar desde já. Ideias nós temos, eu acho que é muito provável que a gente comece a trabalhar alguns singles, algumas músicas isoladas, de repente lançar um ou outro mais pra frente, e depois de tudo isso lançar um disco completo – mas não tem mais aquela obrigatoriedade de lançar um disco a cada dois anos ou um ano.

E adicionalmente, eu diria o seguinte: eu acho o The Turn of the Lights um disco, modéstia à parte, muito bom: muito bem produzido, muito bem composto, muito profundo – tem um material muito rico ali – e a gente ainda não o explorou ao extremo, a gente ainda não explorou profundamente tudo o que ele tem a oferecer. Então eu acho que provavelmente ele ainda possa render uma segunda turnê com músicas que nós ainda não apresentamos ao vivo.

Era uma pena isso antigamente, porque a gente sempre lançava disco após disco e tocava apenas uma parte dos discos que eram lançados e uma parte ficava no limbo, no esquecimento, e nunca se tocava – a não ser que anos depois você faça aquela homenagem, né, dez anos depois, com um tributo. Eu acho que agora a gente tem uma grande chance na mão de explorar um material a fundo e ao mesmo tempo ter a calma necessária para trabalhar um material novo, e é isso que eu pretendo fazer com um próximo disco.

DELFOS: Você falou de como surge a oportunidade de fazer um tributo e depois de tantos anos resgatar os CDs, e um CD que tem sido de certa forma esquecido por você tem sido o…

Andre: O Virgo.

DELFOS: O Reason

Andre: Ah, o Reason? (risos)

DELFOS: Isso, que vai fazer aniversário antes do Holy Land. Vai ter uma comemoração do Reason?

Andre: Eu vou falar uma coisa para vocês, é senso comum de que o Reason, provavelmente, de todos os CDs que a gente já gravou, é o que tem a melhor produção. O som desse disco é incomparável! Aliás, é comparável só ao Theatre of Fate (risos). Mas nós caprichamos tanto na produção desse disco que ele é motivo de orgulho para a gente até hoje. E ele tem músicas excelentes, fantásticas… A própria faixa-título e tantas outras…

Foi uma experiência muito legal gravar o Reason, e nós realmente nos realizamos dentro do estúdio. Eu me lembro de ter fechado um teatro inteiro com um piano de calda dos melhores que existem só para gravar as partes de piano para o disco. Nós tivemos orquestra também – uma parte dos arranjos foi gravada pelos músicos da Sinfônica do Estado de São Paulo, a OSESP – em um estúdio fantástico, que era para gravação de orquestra de fato, e tudo em analógico… Assim, foi uma experiência. É um disco que vocês podem ter certeza de que está no nosso coração, a gente não desmerece esse disco não, mas talvez a gente espere ele fazer um aniversário… (risos)

DELFOS: … Maior.

Andre: Alcançar sua maioridade, digamos. (risos)

É muito curioso isso, porque de uma pergunta a gente passa para muitas outras… Mas uma coisa que eu venho notando é assim: eu me lembro quando foi lançado o Holy Land, por exemplo. Nós fomos massacrados aqui no Brasil. O disco não foi bem recebido.

Fazer Heavy Metal com ritmo brasileiro naquela época, o que inclusive o Sepultura coincidentemente fez ao mesmo tempo – de uma forma diferente, obviamente – mas eu me lembro que a gente soube que o Sepultura estava fazendo o Roots quando a gente estava no estúdio, e nós ficamos desesperados na época (“Caramba, mas essa era a nossa ideia, os caras estão fazendo também?”), mas foi uma coisa de sintonia.

DELFOS: Do momento.

Andre: Do momento, não é? E era um momento seminal da música brasileira, com aqueles ritmos mais tribais, não era essa banalização que é hoje – hoje a gente não faria um disco daquele jeito, eu não faria, pelo menos – mas na época era muito interessante porque isso estava surgindo, era uma coisa que estava germinando. Agora, quando saiu lá fora, no exterior, foi um sucesso: foi bem recebido na França, no Japão, Itália, Alemanha… Mas aqui no Brasil nós fomos massacrados pela crítica. Ainda não era uma época de internet, em que os recalcados de plantão podiam se esconder atrás da tela dos seus computadores e profetizar os seus bullyings virtuais, mas mesmo a imprensa oficial, escrita, não foi muito favorável àquele lançamento.

Hoje, passados quase quinze anos – quase quinze anos não, vinte, né – ele é considerado por muitos como o melhor disco da carreira do Angra – e, modéstia à parte, eu pessoalmente acho, do meu período pelo menos, foi o disco mais intenso, mais inspirado, mais profundo. Então você vê que é uma coisa de momento. Você lança um disco, e dá a impressão de que é necessário que se passe pelo menos cinco anos, de cinco a dez anos para que isso seja incorporado, assimilado pelas pessoas de uma forma mais orgânica – e que, entre aspas, essas composições passem a ser consideradas como “clássicos”.

Então, por isso hoje em dia eu não tenho tanta pressa assim. Vai chegar o momento em que, por exemplo, o Mentalize, o The Turn of the Lights, vão ser considerados clássicos – é só esperar o momento deles, que nunca é imediato. Isso eu venho reparando que não é só com a gente que acontece, é com qualquer artista, com qualquer banda – exceção feita a, por exemplo, quando o Guns N’ Roses lançou o primeiro disco, que já foi um sucesso imediato, mas tudo aquilo foi uma estratégia XYZ que funcionou.

DELFOS: Agora mudando um pouco de assunto, teve aí uma história na internet sobre uma tal “Família Angra”. Você sabe o que era, chegou a ser contatado?

Andre: (risos) Não, eu não sei. Como era o negócio?

DELFOS: O Aquiles postou no Facebook que ele tinha sido convidado para um projeto chamado “Família Angra”.

Andre: Mas é tipo Família Lima? (risos)

DELFOS: Ninguém sabe ao certo, ele falou por alto e não aprofundou.

Andre: Quando vocês falam isso eu penso em Família Lima, porque até tem uma relação, não?

DELFOS: Sim, sim.

Andre: Não sei, nunca ouvi falar.

DELFOS: Andre, tem sido comum para muitos músicos lançar autobiografias. O Ozzy lançou, o Tony Iommi lançou, Alice Cooper lançou, e aqui no Brasil o Max Cavalera lançou, o Aquiles Priester lançou…

Andre: O Aquiles lançou uma biografia? Ele lançou um livro, que eu me lembre.

DELFOS: Era esse, “De Fã a Ídolo”. E o Andre Matos, também vai lançar uma autobiografia?

Andre: Seria muito complicado (risos). Em primeiro lugar, porque se eu fosse lançar uma biografia eu ia querer escrever eu mesmo.

DELFOS: Sim, uma autobiografia.

Andre: É, uma autobiografia. Mas como eu sou muito enrolado em termos de perfeccionismo – no mau sentido, porque eu acho que perfeccionismo não é uma virtude, é um defeito -, não ia sair nunca essa autobiografia (risos). Ia ser revista e revista e revisada e revisada e nunca ia ficar pronta. Enfim, eu tenho uma história precoce, na realidade, dentro da música – se a gente for se ater só à questão musical dentro da carreira, eu comecei com 12, 13 anos de idade com banda, e meus estudos musicais começaram lá pelos 10 anos de idade – e hoje eu estou com 43. Ah, gente, acho que dá para esperar até uns 50 para começar a pensar em uma biografia. 50 é uma boa idade… É uma boa idade, um meio século.

DELFOS: Nós podemos esperar, então.

Andre: Não é? Acho que vale a pena. Acho que com 50 valha a pena – começando já, eu consigo terminar aos 50 (risos).

DELFOS: Perfeito, Andre, nós já estamos terminando aqui, eu só queria saber se você topa dar uma declaração completamente absurda… (Nesse momento o Andre vira os olhos à minha prancheta e pergunta:)

Andre: O quê que tá escrito aqui, “agudo”, que porra é essa? (risos)

DELFOS: Era uma brincadeira, mas a ideia era se fosse filmado.

Andre: Ah, tá. Você quer uma declaração? Bom, eu declaro que fui autuado em flagrante cometendo uma infração de trânsito… Estou brincando (risos). Declaração parece uma coisa jurídica, né… Declaração?

DELFOS: É, uma coisa bem absurda.

Andre: Ai, meu Deus. Bem absurda? Absurdo não é difícil, difícil é fazer uma declaração, como eu disse antes, politicamente correta. Isso é o que a gente tem que pensar, porque absurdo não precisa pensar… Não quer dizer que eu seja o Timo Tolkki (risos). Bem diferente.

Eu gosto dos absurdos que fazem sentido, na realidade. Eu sou muito fã de artistas, escritores, cineastas, pintores, e eu acho que tudo o que é arte se ajuda, se interage, e você acaba usando influências distintas para construir o seu universo artístico. Agora, é curioso pelo seguinte: até alguns anos atrás, isso que a gente faz, que é o Heavy Metal, falando a grosso modo, estava longe de ser considerado uma manifestação artística. Talvez hoje em dia já seja – até acho que o fato de vocês estarem aqui, agora, fazendo essa entrevista da forma como estão fazendo, até em função das perguntas em si, dos temas que vocês estão abordando, já prenuncia que a coisa é encarada de um ponto de vista mais profundo, com mais respeito, com mais dignidade. Mas quando eu comecei, nos anos 80, isso aqui era uma coisa completamente marginal.

Eu acho que, ao longo da minha trajetória, eu consegui, bem ou mal, de uma forma ou de outra, ir juntando alguns aspectos do que era essa cultura mais mundana do rock, da vivência de rua – que de fato era a fonte onde a gente bebia, no final dos anos 80 – com uma vivência mais acadêmica, formal, da música clássica, e acabou dando o que deu.

Na verdade, é curioso porque naquela época eu meio que não pertencia nem a um mundo nem a outro. Eu era visto como um alienígena tanto no meio do rock quando no meio da música clássica, porque pros clássicos eu era um roqueiro, pros roqueiros eu era um clássico, então… Talvez hoje eu consiga me definir melhor, me afirmar melhor com essa mistura – até porque eu não sou o único e não fui nem o primeiro que fez isso, mas foi aí que eu encontrei a minha identidade.

Então, se isso de alguma maneira veio a influenciar outras pessoas, eu fico muito contente. Eu vejo que de fato muitas pessoas me procuram e se dizem influenciadas por esse caminho, por essa escolha, e eu continuo acreditando nela, eu acredito que é por aí – sem desmerecer as demais, afinal eu acho que cada um encontra a sua, se identifica e segue a sua, e, tomara, desenvolva ao máximo o seu potencial. No meu caso foi assim, por uma ironia do destino – e se isso servir de exemplo para mais alguém, eu fico muito contente de poder ter colaborado para essa evolução. Eu acho que essa é a minha declaração final.

DELFOS: Deixe uma mensagem para o público do DELFOS.

Andre: (pensativo, respondendo após uma longa pausa) É muito complicado essa história de mensagem.

DELFOS: Ou então você pode dar um agudo, muita gente te pede isso…

Andre: Não, não, pelo contrário, agudo é no show. Vão ao show que vocês provavelmente, se estiver em um dia bom, ouvirão um agudo. (risos)

Mas pensa que acabou? Ainda não. O Andre respondeu uma última pergunta, por curiosidade, que muita gente se faz: afinal de contas, por que no DVD Ritualive não há a performance final de “Breaking the Law”, com todos os músicos reunidos no palco?

Andre: Quando o Sascha entrou com a guitarra dele, ela estava meio tom acima ou abaixo do resto, não me lembro agora. Impossível corrigir. E não dava para corrigir em estúdio, porque vazava nos outros microfones, e por isso essas músicas não foram. As músicas do final do show eram meio tom abaixo por causa das músicas do Angra, então teria que todo mundo ser afinado meio tom abaixo.