Começo esta análise The Talos Principle 2 com um causo. Um tempo atrás, estava conversando sobre cinema, e a outra pessoa comentou que achava curioso que o mesmo diretor – no caso, Sam Raimi – dirigiu Evil Dead, Oz – Mágico e Poderoso e Homem-Aranha. Minha resposta: “você não imaginaria alguém como eu criando coisas nos mesmos gêneros?”. Afinal, pessoas não são apenas uma coisa. Nossos gostos e nossas criatividades vão muito além de um único estilo. Eu mesmo já escrevi histórias de terror e de criança.
Razão deste causo? The Talos Principle 2 foi desenvolvido pela Croteam, mesma equipe que ganhou fama especialmente pela série Serious Sam. Sabe do que se trata, né? São jogos de ação deliciosamente estúpidos estrelados por um machão troglodita que provavelmente é incapaz de abrir uma porta sem quebrá-la. E daí temos The Talos Principle 2, um game de quebra-cabeça cuja história questiona e analisa o que é ser humano e ter consciência.
ANÁLISE THE TALOS PRINCIPLE 2
Segundo o exemplo do Sam Raimi, eu amo meus joguinhos e filmes de ação, e quanto mais estúpidos forem, melhor. Mas eu também gosto de história, filosofia, pensar, analisar e questionar valores. Então sim, pode parecer estranho que a mesma empresa seja responsável por dois jogos tão diferentes quanto Serious Sam e The Talos Principle, mas eu sou alguém que transitaria entre estes dois tipos de roteiro. E muita gente é assim – claro que as combinações de gêneros nunca são as mesmas para todo mundo.
Você começa The Talos Principle 2 nascendo como um humano. Mas você não é um humano orgânico, de acordo com o significado que esta palavra tem para nós no século XXI. The Talos Principle 2 acontece num futuro distante e a humanidade como a conhecemos hoje já foi extinta. Em seu lugar, surgiu uma civilização de robôs que se denominam “humanos”. O Objetivo deles, com letra maiúscula, era aumentar sua população até chegar a mil. Você é o milésimo, e portanto a última pessoa a nascer, gentilmente apelidado pelos colegas de 1k.
AMBIÇÃO CAUSOU A DECADÊNCIA DOS ANTIGOS
Então ao contrário da maioria dos games, The Talos Principle começa quando o Objetivo é atingido. É o ápice da civilização, as pessoas, como se chamam, cumpriram seu propósito. É o começo do final feliz. E só isso já causa muitos questionamentos interessantes. Quem já conheceu todas as pessoas e ainda não se apaixonou, está destinado a ficar sozinho, já que não nascerão novos humanos? E mais coletivamente: será que eles devem de fato parar de expandir? Ou devem fazer isso com um cuidado que os antigos não tiveram?
Mas as coisas ficam ainda mais complicadas na celebração do Objetivo. Uma enorme figura holográfica de Prometeu aparece e é interrompida antes de entregar sua mensagem. Isso convence geral a enviar uma expedição para o lugar em que acreditam que ela saiu. Você pode escolher participar dela. Se falar não, o jogo “termina”, antes mesmo de começar. Mas a opção está lá – e dá troféu.
EXPLORAÇÃO E QUEBRA-CABEÇAS
É na expedição que o gameplay de The Talos Principle 2 realmente começa. Cada mapa/fase tem 10 quebra-cabeças. Você precisa resolver pelo menos oito deles para juntar pecinhas de Tetris (sério mesmo), e então usá-las para montar uma ponte que permite chegar à torre e “encerrar” a fase. Nas torres, um holograma representando uma figura mitológica vai questionar sua ambição e moralidade, além do seu propósito.
Esta é a rotina de The Talos Principle 2. E como você pode perceber pelo quanto falei de sua narrativa e quão pouco dos quebra-cabeças em si, dá para sacar o que realmente curti no jogo. Cada área de puzzle é totalmente independente e autocontida. Isso faz com que o gameplay se divida em dois pilares bastante separados.
EXPLORAR É UMA DELÍCIA
The Talos Principle 2 é estupidamente lindo e agradável. Toda a criação audiovisual é de babar, tornando simplesmente andar pelo mundo uma delícia. Mesmo coisas banais, como buscar colecionáveis ou ouvir audiologs se tornam fantásticos quando a atmosfera que o jogo passa é tão gostosa e ele tem tanto a dizer.
Em outras palavras, eu gostaria ainda mais de The Talos Principle 2 se ele fosse um walking simulator narrativo. Isso porque…
QUEBRAR A CABEÇA É DOLORIDO
The Talos Principle 2 tem uma quantidade grande de ferramentas e mecânicas para os quebra-cabeças. Em geral, você precisa saber o que cada uma faz, ver o que está disponível e arranjá-las de forma que abra o acesso à recompensa. Nenhuma das ferramentas é realmente inovadora. São lasers coloridos, cubos, etc. The Talos Principle 2 lembra bastante Portal, mas não tem nenhuma mecânica tão inovadora quanto a arma de portal do game em questão.
A questão é que os puzzles são criados para serem extremamente trabalhosos. Em determinada altura, os itens só podem ser usados se você levar outro para “ficar preso” no lugar. Isso significa que não só você precisa matar como arranjá-los de acordo, mas saber a ordem que deve tirar os itens de sua casinha.
THE TALOS PRINCIPLE 2 É DIFÍCIL PORQUE TEM QUE PENSAR
Tem um consumível que você pode usar para pegar a recompensa de um quebra-cabeça sem resolvê-lo, mas este consumível é bastante raro. Sem exagero, eu encontrei apenas seis em 40 horas de jogo. É mais viável fazer uma busca nas internets para ver a solução. E isso é relativamente fácil porque cada quebra-cabeça tem um nome.
Eu senti que The Talos Principle 2 é MUITO mais difícil do que Portal ou outros games de puzzle. Em Portal, eu consigo resolver pelo menos uns 80% sem apelar para guias. Aqui acho que preciso de ajuda em 80% das salinhas, especialmente no início, quando quase todos envolvem lasers. Além dos puzzles serem repetitivos, envolvendo sempre entrar em uma salinha, resolver e ir para a próxima, a coisa fica sinceramente chatinha se você trava logo que entra em uma e tem que ficar copiando um vídeo para poder avançar.
Seria bem desejável se The Talos Principle 2 tivesse um sistema de dicas embutido, e acredito que o jogo ganharia muito simplesmente com vídeos próprios de solução, naquele esquema “dicas de PS Plus”, sabe? Mas ele não usa esta funcionalidade no PS5 e a única colher de chá é o consumível extremamente limitado mesmo. E poder pular seis quebra-cabeças em um game com mais de 120 não ajuda muito.
QUEBRA-CABEÇAS E FILOSOFIA COMBINAM
Ou não? Por um lado sim, faz sentido um jogo que te faz pensar narrativamente combine isso com um gameplay que igualmente ajuda a criar um tanquinho no cérebro. Por outro, eu gostei tanto da exploração e da narrativa que passar 20 minutos ou mais preso em cada salinha, independente da história e do mundo, não é apenas chato: é irritante.
The Talos Principle 2 está numa condição técnica muito superior ao último Serious Sam. Mas tem umas coisas esquisitas aqui. As barreiras roxas e azuis, que mostrei acima, parecem ser problemas da minha TV, pois nas imagens que capturei saíram como deveriam ser.
Agora olha a imagem acima, e veja a silhueta do robô que aparece quando giro a câmera rapidamente. Achei que era reflexo de uma daquelas tecnologias artificiais que as TVs modernas têm, mas se fosse o caso não saíria na imagem. Curiosamente, ativar o modo performance elimina totalmente estes fantasmas, mas muita coisa bacana do visual some junto. Além disso, a julgar pelos vídeos a que assisti, The Talos Principle 2 é um game com muito maior potencial gráfico para quem jogar no PC. E olha que já é lindão no PS5.
ESTOU DIVIDIDO, MAS AMEI THE TALOS PRINCIPLE 2
Durante muito tempo aqui no DELFOS, minha falta de apreço por resolver puzzles em videogame foi piada. Hoje em dia não sou exatamente pirado neles, mas consigo curtir e ver o valor em jogos como Portal, mesmo gostando muito mais do roteiro do que dos quebra-cabeças. The Talos Principle 2 é muito mais difícil. Acredito que talvez seja tão difícil por partir do pressuposto que você jogou o anterior – o que pretendo fazer assim que possível – e assim não ter um período de onboarding, já ficando difícil desde a abertura.
Mas até aí, o jogo é idealmente feito para quem quer curtir tanto seu lado narrativo quanto seu lado videogame. E de forma alguma quero passar a impressão que o lado quebra-cabeças é ruim ou malfeito. O que senti é que é um tanto trabalhoso e repetitivo demais, mas é importante dizer que isso vem de alguém que não tem tanto prazer em solucionar essas coisas.
Se você gosta de movimentar cubos, apertar botões, direcionar laser e todas essas coisas tradicionais de puzzles de videogames, acredito que The Talos Principle 2 é imperdível. Aliás, devido à sua narrativa, diria que ele é imperdível mesmo para pessoas como eu. Certamente quero jogar o primeiro também. Quem sabe consigo resolver ele olhando menos no celular?