Ontem, assim que liguei o computador, recebi um e-mail do Lucas avisando para revisar a notícia do Nightwish que ele tinha colocado no sistema, sobre o show que rolou sem a vocalista Anette Olzon. Assim que li sobre as declarações da Anette reclamando sobre a postura da banda em substitui-la sem consultá-la, pensei: isso vai dar repercussões. Aposto que a Anette vai sair da banda assim que terminar esta turnê.
Com este pensamento, fui à sessão de imprensa assistir a Selvagens, excelente novo filme do Oliver Stone (a resenha sai ainda esta semana) e, assim que retornei ao Oráculo, tinha um e-mail do Homero passando um link para o site da Nuclear Blast avisando que a Anette e o Nightwish tinham se separado. Gostaria de dizer que fiquei mais surpreso, mas analisando a história da banda e sua absurda falta de consideração com os colegas, isso era mais do que esperado.
NIGHTWISH E EU
Houve uma época em que eu realmente era um grande fã de Nightwish. Quando o Oceanborn foi lançado no Brasil, foi uma sensação entre os fãs de metal, e quase todo mundo comprou o disco. Eu não só comprei, mas gostei tanto que ele provavelmente se tornou um dos álbuns que mais ouvi na vida. Aí veio o Wishmaster que, em minha opinião, manteve a qualidade, e logo em seguida a notícia do primeiro show da banda no Brasil, o que me deixou deveras ansioso e empolgado.
Bem na época do show, eu estaria na Argentina visitando meus parentes, mas resolvi voltar uma semana antes só para poder assistir ao show. Pois é, olha o quanto eu curtia essa banda. Hoje eles acabaram ficando com uma fama de “banda para meninas”, mas eu nunca achei isso correto. Caramba, o Nightwish era pesado pra caramba! Ok, tinha teclado e várias orquestrações, mas guitarra e bateria eram bem mais pesados do que o Stratovarius ou mesmo o Iron Maiden, e algumas músicas como Passion and the Opera tinham riffs que poderiam estar em um álbum como Painkiller, do Judas Priest.
No tão esperado dia do show, no entanto, veio uma grande decepção, e a partir daí nunca mais encarei a banda da mesma forma. Era uma época em que a oferta de shows de metal estava começando a aumentar muito, mas os shows ainda aconteciam em casas relativamente pequenas (o show de São Paulo do Nightwish foi no Tom Brasil). Quem acompanhou a cena metal daqueles tempos deve se lembrar que era comum alguns fãs chegarem à casa de show à tarde. Eles faziam isso pois assim poderiam pegar a banda chegando para a passagem de som e conseguir fotos e autógrafos com seus ídolos. E isso rolava de forma natural e amigável, totalmente sem stress com praticamente todas as bandas. Inclusive, eu consegui autógrafos até de bandas que na época eram maiores do que o Nightwish, como o Gamma Ray e o Primal Fear, simplesmente chegando mais cedo à casa de show e esperando.
Mas com o Nightwish não foi assim. Em determinado momento, uma van de janelas escuras parou do outro lado da rua e, pouco depois, seguranças começaram a empurrar os fãs para abrir um espaço. A van embicou, subindo na calçada, e a banda passou correndo, cobrindo as cabeças. Foi uma das coisas mais ridículas que já vi.
Pouco depois, saiu a cobertura da Rock Brigade sobre a turnê brasileira da banda, e lembro que a matéria falava da multidão de fãs que estava lá e que a banda não conseguia acreditar que realmente existia algum perigo real. Amigo delfonauta, tinha no máximo 15 fãs ali que nada mais queriam do que autógrafos e fotos. Eu sei porque era um deles. E mais da metade dessas pessoas eram garotas. E depois a banda ainda coloca no seu site oficial como gostou do contato que fez com os fãs no Brasil e dos shows que fez por aqui. Sim, me engana que eu gosto.
Este episódio me mostrou o tipo de atitude que o Nightwish tinha com seus fãs, e também me mostrou a real cara do jornalismo musical brasileiro. Eu fiquei realmente decepcionado e, depois disso, nunca mais ouvi a banda nem li a Rock Brigade da mesma forma. Acredito que foi um momento vital da minha vida, quando minha mentalidade mudou de “fã fanático” para “adulto apaixonado por música”. Era algo que aconteceria mais cedo ou mais tarde, e foi bom ter acontecido mais cedo. Pena que foi com tamanha decepção simultânea com duas coisas das quais gostava muito.
MAIS AMOSTRAS DA COVARDIA
O tempo passou, e eu acabei me afastando do Nightwish. Não apenas por causa da historinha contada acima, mas principalmente porque não gostei dos discos seguintes, o Century Child e o Once. Aliás, minha resenha do Once fez com que eu recebesse ameaças de morte no meu e-mail. Foi a primeira vez que isso aconteceu, e só contribuiu para a minha decepção com a atitude dos headbangers, como já abordei tantas outras vezes.
Nesses anos, a banda também lançou o documentário End of Innocence, e aí vi mais uma amostra da forma terrível que esses caras lidam com conflitos: a demissão do baixista Sami Vänskä. Para quem não sabe, a banda estava com problemas de relacionamento com ele. Ok, a demissão do cara poderia ser inevitável, mas como eles resolvem lidar com isso? Simplesmente pedindo para o empresário ligar e dizer que ele estava fora. Caramba, é assim que se lida com um sujeito que foi seu colega por pelo menos três anos? Aliás, não só três anos, mas os três anos nos quais a banda cresceu absurdamente e atingiu fama internacional. Será que Vänskä não merecia no mínimo ter sido chutado pessoalmente?
Quando chegou a hora de despedir a vocalista Tarja Turunen, então, é que o negócio ia pegar. Afinal, ela era a cara e a voz da banda, principal responsável pelo diferencial que levaria a banda ao estrelato e começaria a moda do “metal com vocal feminino”. Ela tinha fãs. E muitos. Por isso, a polêmica com a demissão dela foi bem maior e provavelmente você até já sabe como foi.
END OF AN ERA
O Nightwish gravou um DVD, que posteriormente seria o End of an Era e, logo após a apresentação, demitiu a vocalista via carta. E fica pior, por algum motivo a banda decidiu que seria uma boa jogada tornar esta uma carta aberta, em um dos maiores desrespeitos públicos da história da indústria musical. Dá para imaginar o baque que isso teve na pobre vocalista, e eu considero impossível assistir a qualquer música do End of an Era sem ficar com pena dela pelo que a esperava e com raiva dos outros membros por estarem gravando um DVD já tendo em mente a cachorrada que fariam com sua colega.
Isso simplesmente não se faz. E se isso parece ser claramente uma jogada do tecladista Tuomas Holopainen, os outros membros da banda são igualmente culpados por permitirem que uma colega seja tratada de forma tão humilhante. Não é assim que se trata um ser humano, muito menos alguém que foi tão instrumental para o sucesso da banda.
E historinha de imaturidade tem de monte no Nightwish. Quando o site Global Domination publicou uma resenha negativa de um de seus álbuns, a banda chegou a escrever para o site solicitando a exclusão do texto. Isso não se faz. Uma banda tem que saber lidar com críticas e só os muito amadores e covardes pedem para tirar uma matéria negativa do ar.
ANETTE OLZON
A sueca Anette Olzon foi a substituta de Tarja Turunen e nessa época eu já não acompanhava mais a banda simplesmente porque o som já não falava mais comigo. Mas como trabalho com jornalismo cultural, acabava sabendo das notícias da banda, isso quando eu mesmo não as escrevia.
Anette entrou e gravou dois álbuns com o Nightwish, o Dark Passion Play e o Imaginaerum. Se eu já ouvi alguma coisa com a Anette, admito que não me lembro, já que quando ela entrou eu não tinha mais interesse em novas músicas dos finlandeses. Além disso, com todos esses fatos narrados aqui, eu não poderia ter uma impressão pior de Tuomas Holopainen e seus súditos. Aliás, minto, pois essa impressão foi piorada com a notícia de ontem: “Anette foi chutada do Nightwish”.
Ok, o comunicado oficial dessa vez pelo menos não foi tão desrespeitoso quanto no passado, se limitando a dizer que a banda “está se separando por decisão mútua e para o bem de todos os envolvidos”. Mas o timing deixa muito claro que Anette foi chutada porque demonstrou sua insatisfação com ter sido substituída no dia em que ficou doente. Provavelmente os problemas de relacionamento já vinham de antes, e essa foi apenas a gota d’água, mas o timing foi péssimo e demonstrou que os caras tomam decisões importantíssimas no calor do momento e sem levar em consideração as outras partes.
Nossa vocalista ficou doente? Chama outras duas para cantar no lugar dela. Nossa vocalista reclamou publicamente? Então está fora. Ninguém é insubstituível. Caramba, dá para entender esse tipo de attitude num moleque no início dos seus 20 anos, mas segundo a Wikipédia, Tuomas Holopainen tem 35 anos. Não é mais um moleque, é um homem. E um homem tem que conversar e resolver seus problemas cara a cara, não dessa forma covarde ou imatura.
Neste ponto o ardiloso leitor pode dizer “Mas o Nightwish é escandinavo. Lá eles não são tão emotivos e nem conversam tanto quanto nós, brasileiros”. Pois é, amigo delfonauta, mas essa atitude do Tuomas e sua trupe é totalmente emotiva e irracional. Ela é muito mais brasileira do que finlandesa, diga-se de passagem.
Normalmente quando alguém pensa no supra-sumo do babaca musical, fala do também escandinavo Yngwie Malmsteen. E ele pode ter seus problemas, mas quando seu tecladista Derek Sherinian resolveu xingar todos os brasileiros no seu site oficial, Malmsteen ficou do lado do seu colega. Na época eu odiei a atitude de ambos, e ainda acho que eles agiram muito mal diante dos problemas, mas os dois estavam do mesmo lado desde o início e continuaram depois que a bomba explodiu.
Aqui no DELFOS, nos idos de 2006, tivemos acesso antes de todo mundo à informação de que Gene Simmons viria ao Brasil para o lançamento de um livro. A empresa responsável fez um tremendo escarcéu pra cima da gente, dizendo que estávamos mentindo e tirando informações de entrevistas antigas. Respondemos com uma matéria dizendo de onde veio a informação e publicando uma imagem de prova, mas sem dizer a fonte, e a empresa entrou em contato ameaçando nos processar se não revelássemos a fonte.
Já passou bastante tempo, e hoje eu posso revelar que a fonte foi o delfiano Bruno Sanchez, que na época trabalhava na editora Globo e a produtora em questão enviou um Fax para a Globo pedindo patrocínio e dizendo que Gene Simmons viria. Só estou revelando isso agora porque uns anos atrás, o próprio Bruno me liberou para falar disso quando achasse necessário. O ponto é que a bomba explodiu e eu fiquei morrendo de medo, mas em nenhum momento joguei o problema para o Bruno encarar sozinho. Estávamos juntos nessa. Ele me passou a informação e eu resolvi publicar.
O Tuomas não teria agido da mesma forma. Ele é um cara que responde a problemas empurrando o colega para a linha de fogo. Não é assim que um adulto deve agir. Problemas de relacionamento em bandas acontecem e são inevitáveis, mas você não deve fazer disso um circo ou humilhar publicamente as pessoas que saíram (nem em privado, que fique claro).
Muita gente já passou pelo DELFOS nesses quase nove anos que o site está no ar, e é claro que já rolaram brigas e discussões mais esquentadas. Isso é normal. Mas um adulto lida com isso, senta e conversa, com olhos nos olhos e respeito mútuo. E se as diferenças forem irreconciliáveis, o respeito não precisa acabar aí. O Tuomas precisa se preocupar menos com a perda de sua inocência e mais com aquisição de maturidade. Com quase 40 anos nas costas, o Tuomas é uma vergonha para outros músicos, para os finlandeses e para a raça humana. Está na hora de deixar de ser criança e aprender a tratar seus funcionários com o respeito que eles merecem.
CURIOSIDADE:
– Se o delfonauta estava com saudades de matérias como esta no site, grite “Yabadabadoo” nos comentários e aguarde, pois muitas surpresas virão por aí! E você vai gostar delas. =]