O Discurso do Rei

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Quando o tremendão Frank Drebin recebeu a missão de proteger a rainha da Inglaterra, ele disse algo como “prometo protegê-la da melhor forma possível, não importa quão imbecil seja a ideia de ter uma rainha”.

É fato, essas histórias de reis podem funcionar muito bem em filmes de fantasia ou letras de Heavy Metal, mas convenhamos que monarquia não faz absolutamente nenhum sentido na realidade. E isso deixa vários momentos deste filme completamente nonsense, especialmente a arrogância do protagonista, quando diz coisas como “eu sou seu rei”. Eu responderia “e o quico?”, pouco antes de abaixar as calças e começar a cantar Hammer Smashed Face, mas isso é porque sou um sujeito especialmente maduro. =)

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Felizmente, por mais atrasados que sejamos aqui no Brasil, já paramos com essa baboseira de família real há mais de 100 anos. A Inglaterra, por outro lado, continua até hoje nesse sistema arcaico. Mas o monarca deste filme não é a Elizabeth, mas sim seu papai, chamado Bertie.

Acontece que Bertie (ainda um príncipe no início da projeção) é gago. E esse não só é o maior problema da vida dele, como é também o único. Tirando isso, a vida dele é perfeita. Assim, durante os próximos 120 minutos, veremos o pobre sujeito milionário e arrogante tentando vencer o único problema da sua vida.

O Discurso do Rei, um dos preferidos ao Oscar desse ano (só de indicações teve 12), mostra quão banalizado ficou esse tipo prêmio. Admito, nunca me importei com a academia, mas por mais que os oscarizáveis só falassem de judaísmo X nazismo, pelo menos eram coisas importantes. Aqui temos uma fuckin’ história de um sujeito tentando superar a gagueira. GAGUEIRA, caro delfonauta!

Se a gente fizer aqui uma lista das inconveniências da vida do ser humano, gagueira estaria lá embaixo, logo após ter uma coceirinha na parte das costas que você não consegue alcançar. Então aguarde, pois não duvido nada que o preferido do Oscar no ano que vem trate exatamente disso.

E nem é uma daquelas gagueiras graves, que o cara não consegue nem conversar. Não, é uma gagueira bem levinha. Dá para entender porque isso seria inconveniente para um rei, mas não é nada além disso. Esse filme é sobre um sujeito tentando vencer o único fuckin’ inconveniente da sua vida. E é um inconveniente minúsculo, que eles tentam levar a proporções hercúleas! Fala sério, isso lá é história que se conte?

Parece até aquele tipo de paródia que filmes como Trovão Tropical costumam fazer com o Oscar. Dá até para imaginar a narração inspiradora falando algo tipo “a comovente história de um homem contra a gagueira”.

Tudo isso culmina no clímax mais emocionante da história, quando Bertie, já rei, tem que fazer um discurso anunciando o início da Segunda Guerra Mundial. Pois é, enquanto alguns filmes têm helicópteros explodindo ou cenas de superação ou romance reais, este tem simplesmente um sujeito tentando falar no rádio sem gaguejar.

E veja só, ele consegue. E, embora ele não gagueje, faz um péssimo trabalho e o discurso fica sem timing nenhum. Mesmo assim, quando termina, todo mundo o aplaude, como se ele tivesse feito realmente algo digno de nota, tipo quebrar o pescoço do Leão de Nemeia ou matar a Hidra de Lerna. E o que ele fez foi simplesmente falar, de forma porca, diga-se de passagem.

Muita gente gosta de histórias de superação, e normalmente essas histórias mostram alguém vencendo dificuldades reais. O Discurso do Rei mostra um cara (que não é mudo, apenas gago) tentando falar. E, enquanto um troço desses é indicado a 12 carecas, tem um monte de gente realmente criativa no mundo do cinema que não consegue sair do mundo indie. Em outras palavras, este filme é um belo exemplo de tudo que está errado com o nosso mundo.

E, ao terminar esta resenha, não consigo parar de pensar no Guia do Mochileiro das Galáxias, quando os seres humanos chegam à Terra e as primeiras coisas que fazem são declarar guerra contra as árvores e fazer documentários sobre si mesmos. A única diferença é que hoje fazemos cinebiografias, não documentários. A parte da guerra continua igual.