Festival Hellfest 2014 em Clisson, França (20, 21 e 22 de junho)

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Desde 2006, na pacata cidade de Clisson, na França, os deuses franceses do metal celebram o Hellfest. Este ano eu tive o prazer de estar lá e gostaria de compartilhar minhas experiências com os amigos delfonautas. Antes dos shows em si, vou relatar um pouco da organização do festival.

Clisson é uma bucólica e minúscula cidade. Nos dias do festival, ela é literalmente invadida por uma horda de headbangers. Percebe-se que todos os moradores que permanecem nesse período na cidade se esforçam para ajudar o público do festival. E digo aqueles que permanecem, pois muitos moradores saem da cidade para evitar a confusão.

Chegando lá, já percebemos que não seria fácil encontrar um lugar para estacionar, pois não existia um estacionamento oficial do evento! Como todos ali, deixamos nosso carro em alguma rua nos arredores. Dizer arredores é uma bondade, pois andamos uns 40 minutos até chegar na entrada do Hellfest.

A estrutura do festival é quase perfeita. Quatro palcos, várias lojas, mini parque de diversões, bares, ponto de atendimento médico, etc. Um ponto interessante é a quantidade de pessoas que acampam numa grande área reservada perto do local do show. Isso é bem legal, pois há uma grande interação entre indivíduos de diferentes nacionalidades.

Também observei alguns pontos a melhorar. O primeiro é a pequena quantidade de sanitários. Todos sabemos que as mulheres gostam de uma fila para ir ao banheiro e respeito isso. Mas filas gigantescas para o sanitário masculino não dá! Muita gente deixou de lado a finesse francesa e optou por regar a vegetação local para não perder muito tempo. Outra coisa que percebi foram as enormes filas para comprar comida. Muitos também poderiam reclamar da falta de um estacionamento. Eu sinceramente não me incomodei muito com essas pequenas falhas, mas que pode melhorar, pode. Agora vamos aos shows!

20 DE JUNHO – ROB ZOMBIE, SEPULTURA E IRON MAIDEN

Antes de qualquer coisa, quero deixar claro que não fiz uma cobertura completa do festival por dois motivos: fadiga da idade e incompatibilidade com algumas bandas. Separei os shows que achei de maior importância e dei minha opinião. Sendo assim, tem muitas chances de você não ler a resenha do show da sua banda preferida. Foi mal!

Logo depois que eu cheguei começou o show do Rob Zombie. Não sou lá muito fã do Robinho Zumbi e não sei até que ponto isso influenciou minha opinião. O fato é que achei o show deles morno. E acredito que, pela reação do público, não fui o único que teve essa impressão. A voz dele não estava lá essas coisas e as músicas simplesmente não empolgaram. Bem, vamos esperar o próximo filme dele.

Mal o menino zumbi foi embora, já começou no palco ao lado o show do Sepultura. Sempre fui muito fã da banda mineira. Para mim, eles têm uma porção de discos clássicos e essenciais ao estilo. Porém, não considero o Sepultura liderado pelo Andreas Kisser comparável ao de outrora. Acredito que os irmãos Cavalera eram parte essencial daquela banda que eu sempre gostei. Mas fui ao show despido de preconceitos, pois acima de tudo eram músicos brasileiros e teriam sempre o meu apoio.

Contra fatos não há argumentos e o fato é que o público só se animou de verdade com as músicas da era Max Cavalera. Propaganda, Arise e Roots Bloody Roots foram responsáveis pelos pontos mais altos do show. Para mim, Polícia teve um gosto especial. Muito bom escutar uma música cantada em português estando longe de seu país. O que eu não gostei do show? Eu simplesmente não consigo engolir que atualmente o Sepultura tenha apenas um guitarrista. As músicas mais antigas ficam vazias com essa formação, sobretudo nos solos. O Paulo não é o baixista mais habilidoso do mundo para segurar sozinho a base nos momentos em que o Andreas sola. Não fica bom. Tirando isso foi um bom show. O Brasil foi bem representado.

Você pode até não gostar de Iron Maiden, mas em uma coisa tem que concordar comigo: os caras são extremamente competentes no que fazem. E foi isso que pude ver em mais um show deles. Bruce Dickinson estava impecável. Presença de palco, voz perfeita e interagindo muito com o público. Ele inclusive comunicou-se durante a apresentação em francês, mostrando que, além de cantor, compositor, historiador, esgrimista, radialista, autor, roteirista, piloto de avião, diretor de marketing (segundo a wikipedia) também é poliglota. O resto da banda também mandou muito bem, como já era esperado. Para mim, os destaques foram as minhas músicas preferidas dos caras: Revelations, Wasted Years, Seventh Son of a Seventh Son, Aces high e The Evil That Men Do. Sinceramente não consigo ver pontos negativos nesse show. Eles entregaram aquilo que os fãs queriam.

Muitos irão achar um absurdo, mas não assisti inteiro ao show do Slayer. Mas o fiz por vários motivos. Não sou fã da banda, o show começou depois da meia noite e eu vinha de uma viagem de mil quilômetros de carro. Mesmo assim, assisti a quase metade do show. Como estava exausto, não pude avaliar como foi a apresentação. Mas pelos mosh pits que se formaram, acredito que eles não decepcionaram seus fãs.

21 DE JUNHO – EXTREME, SOULFLY, DEEP PURPLE E AEROSMITH

Mal cheguei no festival e começou o show do Extreme e fui surpreendido positivamente. Hard rock de qualidade e energia. Gary Cherone é um senhor frontman! Carismático e com a voz em dia, ele mandou muito bem! Nuno Bettencourt foi outro destaque. Apesar da postura cheia de marra dele, temos que reconhecer: ele toca guitarra como poucos! E também canta muito bem. Destaque para Decadence Dance e Get The Funk Out.

Max Cavalera e o seu Soulfly começaram o set com a boa Cannibal Holocaust, e já emendou com Refuse/Resist. Já foi o bastante. Ele já tinha ganho o público logo de cara! Difícil não comparar o show do Soulfy com o do Sepultura. E o que posso dizer é que a banda de Max está na vantagem. Além dele controlar o público com mais habilidade do que o Derrick Green, percebi que a galera agitou e curtiu todo o show do Soulfly. Já na apresentação do Sepultura, a resposta positiva veio somente nas músicas da era Max. E divido minha opinião com a do público. Gostei muito do Marc Rizzo. Ele consegue ser virtuoso sem perder o peso. Grande guitarrista!

Depois que Jon Lord faleceu perdi um pouco a vontade de assistir a um show do Depp Purple. Sem ele e o Blackmore já não era a mesma coisa. Mesmo assim, estava feliz em saber que eles seriam os próximos a se apresentar. Um carreira fantástica como a deles só poderia nos proporcionar um show sensacional, certo? Errado! Eles pareciam muito cansados, cara! A voz do Ian Gillan estava um fiapo. Claro que clássicos como Hard Lovin’ Woman, Lazy, Space Truckin e Black Night são mais do que bem vindos, mas não conseguiram empolgar. Fiquei chateado em ver uma banda que admiro tanto acabar desse jeito. Triste isso.

E veio o Aerosmith! Minha idade somada ao meu amor pelo Rock me proporcionou o testemunho muitos shows. E mesmo assim posso dizer com segurança que o Aerosmith apresentou um dos melhores shows da minha vida. Steven Tyler parece ter 20 anos de idade pela maneira que se movimenta no palco. É um absurdo. O carisma dele é contagiante. No set, tinha várias músicas da primeira fase da banda, o que para mim foi sensacional. Back in the Saddle), Train Kept A Rollin, Last Child, Same Old Song and Dance, Rats in the Cellar, etc. Clássicos! Claro que eles também tocaram as mais recentes (nem tão recentes assim). O que não prejudicou em nada, pois também são grandes músicas. Vide Livin’ On the Edge com a participação nos backing vocals de Gary Cherone e Nuno Bettencourt, que estavam assistindo ao show do palco.

O que poucos imaginam é o quanto Brad Whitford é bom! Claro que o destaque é Joe Perry. O show é montado com esse objetivo. Mas Brad toca vários solos durante a apresentação, e o cara manda muito bem! Tom Hamilton e Joey Kramer podem não ser destaques, mas também são perfeitos para a proposta da banda. O auge do show é Dream On. Momento épico. Um piano é levado ao palco, onde Steven Tyler começa a tocar a introdução. Termina em meio a inúmeros efeitos pirotécnicos e com Joe Perry solando em cima do piano. Show inesquecível! O segundo dia para mim tinha terminado, pois o show seguinte foi do Avenged Sevenfold. Não, obrigado. Deixa para outro dia ou para outra vida.

22 DE JUNHO – ANGRA, ALTER BRIDGE E BLACK SABBATH

Não esperava muito pelo show do Angra, talvez pelas noticias que correm na internet, eu tinha a impressão de que a banda seria uma grande decepção ao vivo. Não foi o que aconteceu. Foi um grande show. Acho que o Fabio Lione trouxe um fôlego à banda. Não vou entrar no mérito de comparações com os antigos vocalistas, mas o cara é bom e acredito que pode trazer bons frutos. Show tecnicamente impecável.

Alterbridge era uma das bandas que eu mais aguardava, pois nunca tinha visto os caras ao vivo. E considero eles uma das melhores coisas que aconteceram na música nos últimos anos. E não me decepcionei. Longe disso. Myles Kennedy é um dos melhores vocalistas da atualidade. Além de estar cantando muito, é muito carismático. E como talento não parece ser distribuído com justiça, ele toca muito bem guitarra. Muito mesmo!

Costumo dizer que Mark Tremonti é uma das maiores surpresas que já tive. Na época do Creed, ele passava quase desapercebido. No Alterbridge, ele demonstra que é um guitarrista bem acima da média. Os solos que ele e o Myles dividem em Blackbird são o exemplo do que é um trabalho em equipe. Enquanto o vocalista manda um solo cheio de melodia, Tremonti faz um solo cheio de velocidade e agressividade. Foi um show curto. Apenas dez músicas. Gostaria de um dia poder assisti-los em seu set inteiro. Destaque para Addicted to Pain, Blackbird, Rise Today e a épica Cry of Achilles.

Eu já imaginava o que esperar do Black Sabbath. Fui nos dois shows realizados no Brasil. Para mim, foi um sonho realizado ver o quase original Sabbath em ação. Com todos os anos de carreira e discos lançados, é moleza fazer um set list recheado de clássicos. Isso ajuda muito, principalmente na interação com o público, que só esfriou um pouco quando o quarteto tocou músicas do ultimo disco, 13.

O Ozzy todo mundo já conhece. Tem um carisma espontâneo e uma habilidade nata em lidar com o público. Claro que tecnicamente nunca foi um grande vocalista, mas neste show especifico ele foi bem. Geezer Butler é um monstro no baixo. Poucos conseguem ter um som tão pesado quanto ele. É prazeroso ver um baixista com linhas de baixo tão criativas e não apenas uma “cópia” dos riffs de guitarra. E como falar em riffs e não lembrar de Tony Iommi? O guitarrista do Black Sabbath é considerado por muitos a alma da banda. Nada mais justo. A atuação dele foi impecável. Timbre de guitarra fantástico e perfeita execução da músicas. “Intruso” na formação original, o baterista Tommy Clufetos não deixou nenhum fã decepcionado. Além de ser excelente tecnicamente, ele tem uma pegada setentista que encaixou perfeitamente à banda. Excelente escolha para substituir Bill Ward. Em resumo, show inesquecível. Presenciar ao vivo clássicos como Snowblind, Black Sabbath, Fairies Wear Boots e Children of the Grave não tem preço.

No final da maratona de três dias, estava exausto mas satisfeito. Por um preço justo (cerca de R$ 600,00), pude assistir inúmeras bandas consideradas top. O festival é muito bem organizado, mas acredito que nesse quesito aqui no Brasil também evoluímos bastante. Fui no último Monsters of Rock em São Paulo e gostei muito da organização. Acho que a maior diferença com os festivais europeus ainda é o preço. Aqui os preços são abusivos e desumanos. Que venha o próximo festival!

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