Pode parecer incrível para você, e eu sei que é para mim, mas para a maioria das pessoas, a diferença entre Marvel e DC não é tão marcante. Pergunte para alguém sem envolvimento com a cultura nerd quem não pertence no grupo Batman, Homem-Aranha e Superman. Para você e eu, a resposta é óbvia. Para um “normal”, são todos super-heróis. E o mundo do cinema está seguindo o mesmo caminho. Nesta crítica Besouro Azul, você vai conhecer este que é mais um filme seguindo a cartilha da Marvel. Nós sabemos que é um filme da DC, mas não me surpreende que alguém estranhe o Miguel de Cobra Kai não aparecer no próximo Vingadores.
CRÍTICA BESOURO AZUL
Besouro Azul – continuação espiritual do extremamente autoral Michel Gondry’s Besouro Verde – é muito parecido com um filme da Marvel. Muito disso se deve à enorme quantidade de semelhanças que o herói tem com o Homem-Aranha (um pé-rapado que ganha super poderes e precisa lidar com como isso afeta sua vida e relações sociais). Mas a real é que não há um pingo de originalidade no herói, pelo menos não na época atual, em que uma a cada três produções audiovisuais envolve superpoderes.
Falando dos poderes, o Besouro Azul é praticamente um Homem de Ferro. Basicamente, ele é um moleque numa armadura superpoderosa. A pegada é que a armadura é consciente, e é capaz de lutar sem sua interferência. E a gente já viu isso na Marvel também, na série do Cavaleiro da Lua.
Daí vem a cartilha que a Marvel popularizou no cinema, e que a DC tentou evitar por bastante tempo. O filme é uma comédia, que solta piadinhas a todo momento. Tem duas cenas pós-créditos, uma que adianta o tema da continuação, e outra que é apenas uma piada. Você já viu isso antes. Muitas vezes. De típico da DC mesmo, só o fato de o herói ser tão poderoso que é praticamente indestrutível, e a pegada de o roteiro ir literalmente criando poderes novos conforme eles se fazem necessários para a trama. E essas características, as únicas coisas da DC que ele realmente traz, são justamente as que sempre me fizeram ser um leitor da Marvel. A boa notícia é que, apesar da falta de criatividade, Besouro Azul é um filme divertido.
EL CHAPULÍN
Jaime Reyes (Xolo Maridueña, de Cobra Kai) é um pé-rapado em busca de emprego. Nessa busca, ele cruza o caminho da milionária Jenny Kord (Bruna Marquezine), que pede pra ele proteger uma caixinha de hambúrguer com a sua vida, e para não olhar o que tem dentro. Adivinha se ele olha! Bum, Besouro Azul!
Tem a milionária malvada (Susan Sarandon) e o Homem de Ferro malvado (Raoul Max Trujillo), que vão servir de antagonistas. Obviamente, eles querem usar os poderes do Besouro Verde para a guerra, enquanto a milionária do bem quer que sua empresa pare de fazer armas. Nosso herói vai aprender a usar os poderes, se apaixonar, salvar pessoas em perigo… confirma para mim, você já viu isso tudo, certo?
O problema de Besouro Azul é quão comum um filme como este, uma história de origem de super-herói, é em 2023. Teve uma época em que eu pirava o cabeção nesses filmes. Poxa, passei minha infância lendo gibis de heróis, e quando começaram a fazer longas decentes com bons atores e diretores, contando as mesmas histórias, era um orgasmo nerd. Mas muito tempo se passou. Eu ainda consigo gostar de filmes de super-heróis, mas talvez seja hora de pararmos de contar histórias de origens com pequeníssimas variações.
PEQUENÍSSIMAS VARIAÇÕES
A variação aqui é o Mexican Pride da coisa toda. A família de Jaime, em especial, é sensacional. Eles roubam a cena sempre que aparecem, e no começo, você acha que eles serão apenas alívios cômicos. Porém, quando o filme termina, você sem dúvida terá se afeiçoado a eles, não como personagens que visam fazer rir (o que eles fazem, com frequência), mas sim totalmente desenvolvidos. O próprio Jaime é um personagem legal. É fácil se identificar com ele e o Xolo Maridueña simplesmente parece gente boa – o que já foi bem capitalizado em Cobra Kai também.
Chamou minha atenção o tom anti-imperialista da história. Sim, temos aqui um herói e uma família de origem mexicana, mas este é um filme estadunidense que visa vender brinquedos. Sempre que vejo este tipo de contradição no cinema, lembro daquele diálogo com o arquiteto em Matrix Reloaded, que falava que o sistema precisa permitir que a anomalia o questione. E quem me fez pensar isso também foi um filme de produtor estadunidense. Então sei lá, eu devo ser também só mais uma engrenagem no sistema.
De qualquer forma, acredito que é bacana para um jovem estadunidense de ascendência mexicana se ver representado em um filme deste porte. Tem uma pequena cena em que a Bruna Marquezine fala português, e ela foi aplaudida na cabine, o que mostra que a síndrome de vira-lata afeta até países muito mais ao sul. Ou simplesmente não estejamos acostumados a ver o Brasil em obras internacionais. Se isso é bom ou não – até porque provavelmente é os dois ao mesmo tempo – é uma discussão para um outro texto, e admito que não tenho uma opinião formada sobre o assunto. Estou apenas apontando fatos pertinentes a esta crítica.
CRÍTICA BESOURO VERDE: ABAIXO OS IMPERIALISTAS
A verdade é que eu até falei bastante aqui para um filme do qual simplesmente não há muito a se falar. Só o Homem-Aranha já contou esta mesmíssima história no cinema três ou quatro vezes desde que eu criei o DELFOS, e eu resenhei a maioria deles. E ainda tivemos dezenas de outros filmes na mesma linha. Agora temos até séries de TV como Miss Marvel contando a mesma história.
É engraçado quando relembro da minha juventude nos anos 90, quando os boatos diziam que o Homem-Aranha ganharia um filme dirigido pelo James Cameron e estrelado pelo Tom Cruise como Peter Parker e Arnold Schwarzenegger como Doutor Octopus. Este plano realmente existiu, mas como todos sabemos nunca saiu do papel. Na época, parecia um sonho impossível. Um blockbuster hollywoodiano de qualidade trazendo personagens do gibi.
Hoje, quase trinta anos depois, cá estou eu dizendo com todas as letras que estou cansado de ver filmes contando essas mesmas histórias que tanto sonhei em ver na pimpolhice. Isso não é um problema especificamente de Besouro Azul, que faz seu trabalho de “história de origem de super-herói” direitinho. É mais uma coisa de timing. É fácil se empolgar com algo que você gosta, mas quando você passa a só receber aquilo que gosta, começamos a ansiar por outras coisas. E este é o ponto no qual me encontro hoje. E você?