Esta é nossa crítica A Luz do Demônio, e já começo reclamando de algo que me incomoda muito em traduções para português: a confusão entre demônio (demon) e diabo (devil). Isso é como confundir Hitler com nazista. Um padre até explica neste filme que demônios são os soldados do diabo, mas mesmo assim em todas as cenas em que alguém usa a palavra devil, as legendas mostram “demônio”. Chato, né?

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Dito isso, A Luz do Demônio tem uma temática que muito me interessa, remanescente daquele ótimo O Ritual. O filme se passa quase completamente em uma escola de exorcismo, onde sacerdotes aprendem como combater esta condição e tratam daqueles afligidos por ela. Lá, eles trabalham ao lado de uma psiquiatra, combinando ciência e misticismo para ajudar as pessoas.

Eu amo esse tipo de história, até porque ela reflete meus próprios ideais. Lembro de uma aula de teologia na faculdade em que o professor foi perguntando para cada aluno individualmente se acreditava que o universo foi criado por Deus ou pelo Big Bang. Todo mundo respondeu um dos dois. Quando chegou na minha vez, respondi: “Por que Deus não pode ter criado através do Big Bang?”.

Afinal, para quem não tem conhecimento, até coisas como o nascer do Sol podem parecer mágica e precisarem de explicações místicas. Porém, acredito que em algum momento, provavelmente além do nosso tempo de vida, ciência e misticismo vão se encontrar. Assim como hoje sabemos o que causa o ciclo do Sol – e isso não nega necessariamente a existência do divino – coisas como possessões demoníacas podem um dia ser tratados como hoje tratamos depressão ou esquizofrenia. E não necessariamente excluir uma ajudinha divina. Ei, whatever works, certo?

VOLTANDO AO FILME

Falando do filme, possessões são algo tratado exclusivamente por sacerdotes homens. As freiras mulheres são limitadas a ajudar as vítimas de outras formas. Algo como freiras = enfermeiras / sacerdotes = cirurgiões. Ambos têm seu valor no tratamento, mas é claro que na história acompanhamos uma freira (Jacqueline Byers) que questiona esses costumes e quer aprender sobre exorcismo.

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Parte da escola a apóia, enquanto outra a bloqueia. Obviamente, a moça vai provar seu valor, inclusive questionando ideias da igreja que seus antagonistas justificam que são “conhecimento de milhares de anos”. Argumento burro, eu sei. Se fôssemos nos limitar a conhecimentos que tínhamos milhares de anos atrás, viveríamos em uma monarquia acreditando que a Terra é plana. Ahn… então…

CRÍTICA A LUZ DO DEMÔNIO E O MAL DO AUTOR

A Luz do Demônio são quase dois filmes em um. Por um lado, temos as partes que falam sobre possessões, e como combatê-las com exorcismos. E essas partes são ótimas. Em outras, temos os encontros com os possuídos propriamente ditos, que vão mais para aquela linha “terror sobrenatural adolescente”, com um monte de sustos do tipo bu, com aumento de trilha sonora e tudo.

Assim, se os dois primeiros atos são ótimos, a coisa degringola de vez no terceiro, que apela mais para esse lado sobrenatural. Tudo começa a desabar quando acontece aquilo que meu colega Carlos Cyrino chamava por aqui de “mal do autor”, aquela necessidade de estar tudo conectado. Você sabe, é quando o protagonista percebe que um personagem totalmente sem conexão prévia na verdade é filho do amigo de seu vizinho de infância, e por isso eles estavam intrinsecamente ligados a vida inteira. Assim como o Cyrilove, eu ODEIO isso.

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O ato final é todo assim.

Depois dessa parte, o filme foca na tradicional batalha entre o bem e o mal, cheio de cenas escuras, aumento de trilha sonora e imagens que causam aflição. É uma queda considerável das partes mais intelectuais que permearam os dois primeiros atos. E é uma pena.

Isso porque A Luz do Demônio é bom justamente quando sai do óbvio. Quando trata o sobrenatural de forma racional, ainda que com resquícios de magia. Afinal, magia nada mais é do que ciência que ainda não foi explicada. E fazer um filme sobrenatural de terror que seja bom por inteiro, para Hollywood, sem dúvida é uma magia. Às vezes dá certo. Mas outras… virge.