Ernest Cline parece ter encontrado seu filão. Após o sucesso de seu primeiro romance, Jogador Nº 1, ele volta com mais um livro colocando os games em primeiro plano, com altas doses de referências nerds para deixar qualquer leitor satisfeito. Em suma, se deu certo da primeira vez, para que mudar?
Na nova história, somos apresentados ao adolescente Zack Lightman, que passa todo o seu tempo livre jogando Armada, um simulador de combate espacial, ou o popular “jogo de navinha” para a galera da minha geração. Eis que uma raça alienígena declara guerra à Terra, usando aeronaves, armas e mechas de combate totalmente similares aos do jogo e Zach descobre então que Armada não é um mero game de entretenimento, e sim também uma ferramenta para treinar civis para operarem drones contra os ETs nos confrontos vindouros.
Sendo Zack um dos melhores jogadores de Armada do mundo, é claro que ele terá um papel de destaque no desenrolar dos acontecimentos. Quem levantou a mão e gritou que isso é praticamente a mesma trama do filme O Último Guerreiro das Estrelas (1984), um verdadeiro clássico perdido da Sessão da Tarde, acertou. Junte ainda umas pitadas de O Jogo do Exterminador e temos Armada, o livro.
Ernest Cline é tão cara-de-pau que nem se dá ao trabalho de esconder a “inspiração”. Pelo contrário, cita tanto O Último Guerreiro das Estrelas quanto o livro O Jogo do Exterminador, bem como mais uma porrada de obras nerds que envolvam alienígenas, incorporando-os em sua história, tirando de cada um deles alguma coisinha para montar sua narrativa.
Narrativa que mais uma vez comete os mesmos erros do trabalho anterior, como ser uma história extremamente previsível (neste caso, descaradamente chupada de um filme cult dos anos 80), cheia de clichês do gênero, claramente pensada para ser adaptada para o cinema.
Aqui, o autor também parece gostar tanto de seu protagonista que claramente torna sua vida cotidiana um paraíso nerd. Zack é um gamer hardcore e talentoso, trabalha numa loja de games onde o chefe o encoraja a jogar durante o expediente, sua mãe fala com ele usando citações de filmes e muito embora seu pai tenha morrido quando era apenas um bebê, lhe deixa de herança várias caixas com jogos, séries e filmes antigos.
Ah, ele também é badass a ponto de surrar o bully da escola e mesmo durante o caos do conflito com uma raça alienígena, consegue encontrar a garota dos sonhos, com as roupas ideais, o cabelo ideal e até a tatuagem-referência ideal. É tudo idealizado demais, exagerado demais, deixando o protagonista e sua vida nada crível. E mesmo com tudo isso, não é que novamente funciona?
Cline tem um talento próprio para requentar esses velhos chavões e deixá-los atraentes para uma leitura descompromissada, rápida e cool. Este aqui tem uma pegada até mais infantojuvenil que o anterior, mas ainda funciona muito bem para nerds de todas as idades.
Imagine então como seria ainda mais legal se ele conseguisse ser menos derivativo, melhorasse seus vícios de escrita e fosse menos utópico com seus personagens. Claro, grande parte da diversão também é pescar todas as citações e referências e identificar de onde saiu cada uma delas e aqui você vai se entreter bastante com esse passatempo.
Em comparação a Jogador Nº 1, o novo romance tem uma história mais simples e direta. Narrativamente, no entanto, ambos apresentam exatamente os mesmos prós e contras, embora Armada também conte com um protagonista irreal demais para o meu gosto.
Contudo, é inegável a paixão do autor por games e cultura pop em geral, e essa paixão consegue passar por cima dos defeitos, tornando Armada, a exemplo de seu antecessor, mais uma vez uma leitura extremamente divertida e recomendada para quem já pegou num joystick e em algum momento chegou a desejar que o que estava acontecendo na tela da TV virasse realidade.