Escrever uma análise de Life Is Strange 2 nesta semana é uma experiência um tanto triste. Afinal, poucos dias atrás ficamos sabendo do surpreendente fechamento da Telltale, a empresa responsável por popularizar os adventures modernos, e da qual eu sou bastante fã. A relação dela com Life Is Strange é clara, não apenas pelo gênero, mas mesmo pelo fato de este ser uma história dividida em cinco episódios, prática pela qual a Telltale ficou conhecida (e que eu sinceramente odeio). Mas a vida continua, agora sem Telltale nela, então vamos falar de…
LIFE IS STRANGE 2
Apesar do número dois no título, Life Is Strange 2 conta uma história totalmente nova e independente de seu excelente antecessor. É feita apenas uma referência ao final do jogo anterior, e é do tipo piscou, perdeu. Eu também não percebi nenhuma relação da prequência grátis, The Awesome Adventure of Captain Spirit, com este, então não é necessário nenhum conhecimento prévio para curti-lo.
Esta “continuação espiritual” (melhor definição que encontrei para ele) conta a história de dois irmãos chamados Sean e Daniel.
Sean é um adolescente bem tradicional. Pratica esportes na escola, curte uma festa regada a cerveja, tem uma crush e uma melhor amiga. Daniel é seu irmãozinho, um moleque que adora chocolate e está empolgadão com o Halloween que se aproxima.
Por uma confusão que não convém falar aqui, eles se tornam fugitivos da polícia. Sean, então, resolve levar o irmão a uma fugitiva road trip, mas ele não planejou isso muito bem e sequer sabe para onde ir. Este é o mote do primeiro episódio de Life Is Strange 2.
ADVENTURE COM GAMEPLAY
Apesar de a comparação imediata e mais óbvia ser mesmo com os jogos da Telltale, Life Is Strange 2, bem como seu antecessor, tem muito mais exploração. Na maior parte do tempo, você, no papel de Sean, fica explorando uma área, analisando coisas e conversando com Daniel. Pelo fato de este episódio se passar majoritariamente em áreas inabitadas, sabe o que ele me lembrou? The Last of Us. E não por acaso, o Daniel até faz uma referência a ele.
Sem um plano, sem casa e sem supervisão adulta, os dois basicamente focam em sobreviver. Onde arranjar comida? Onde dormir? Embora seus objetivos sejam sempre algo como encontrar comida, este não é um jogo de sobrevivência. O foco é mesmo na narrativa.
Justamente por isso, há algumas arestas neste aspecto que poderiam ser aparadas. A cena da confusão que dá início a tudo, por exemplo, é bastante forçada. Isso é um problema grande considerando quão vital ela é para toda a história.
Menos importantes, mas que também incomodam, são problemas técnicos. Assim como em The Last of Us, os dois protagonistas estão sempre conversando, e é comum suas ações interromperem os diálogos, que não são continuados depois.
Se você não precisa se preocupar com comida, a não ser para avançar a história, algo que é necessário administrar é o dinheiro. O dindin é bem limitado, então é comum você ter que escolher entre comprar comida ou aproveitar uma oportunidade para roubar e economizar. Daniel, como a criança que é, não tem noção disso e está sempre pedindo chocolates e brinquedos. Cabe a você escolher se vai atender aos desejos dele ou não.
NARRATIVAMENTE FALANDO…
Apesar da mancada na cena crucial que dá o pontapé para a história, o resto do roteiro é muito bom. A Dontnod continua craque em escrever personagens adolescentes que sejam carismáticos e que ajam como jovens de verdade. Cá entre nós, eu me identifiquei mais com a protagonista do jogo anterior (que, afinal, era uma nerd fotógrafa como eu) do que com Sean, mas este também é muito bem escrito e suas relações com Daniel, seu pai e sua amiga Lyla são magistralmente construídas.
Tem vários pontos em que você pode simplesmente sentar em algum lugar para conversar, e isso serve para deixar os personagens ainda mais desenvolvidos e reais.
E isso é bom, porque este primeiro episódio se foca bastante em construir estas relações. Há bem poucos momentos tensos por aqui e, curiosamente, quando algo de ruim acontece, me lembrou bastante Red State, aquele filme semi-desconhecido do Kevin Smith.
Uma coisa que me incomodou é quão distantes são os checkpoints. Não, você não morre em Life Is Strange 2, mas algumas ações têm limite de tempo e quando eu perdia algo que parecia interessante, queria voltar. Porém, sempre que mandei reiniciar o checkpoint voltei bem mais do que esperava.
Como se trata de um jogo narrativo, isso é um problema. Imagine que você quer voltar 30 segundos em um filme, mas quando faz isso, acaba voltando cinco minutos e tem que assistir tudo de novo até voltar para onde parou. Não é legal.
SOBREVIVÊNCIA SEM RISCO DE MORTE
Esteticamente, Life Is Strange 2 segue a mesma linha estilosa do anterior, com traços pouco definidos e belíssimas cores vivas. Não é um jogo tecnicamente exigente (e me surpreende que ele não rode a 60 fps no Xbox One X), mas tem lindos cenários, o que torna explorar seus ambientes um prazer.
Eu já falei muitas vezes por aqui que não gosto quando dividem um jogo em episódios, ainda que adore estes games narrativos. Curiosamente, este primeiro episódio de Life Is Strange 2 conta uma história mais ou menos completa. Sim, é claro que há espaço para continuar e nada é definitivamente encerrado por aqui, mas ele apresenta um final bastante satisfatório. Pense, por exemplo, no final do Episódio IV de Star Wars, para ter uma ideia do que quero dizer aqui.
Se você já jogou qualquer um destes adventures episódicos, já percebeu que eles sempre terminam em um cliffhanger. Fiquei positivamente surpreso com a Dontnod não ter apelado para esta tática narrativa e o jogo ganhou muitos pontos comigo por ter seguido o caminho mais difícil.
No final das contas, muita coisa ainda vai acontecer por aqui, mas o final e a relação dos personagens me deixaram bem satisfeito e animado para o que vem por aí.
CURIOSIDADE:
- A série 13 Reasons Why é constantemente comparada ao primeiro Life Is Strange, e a relação narrativa e estética é realmente marcante. Claramente o pessoal da Netflix foi influenciado pelo jogo da Dontnod.