Darksiders III é um retorno às origens em muitos aspectos. É um jogo de ação que lembra os jogos de ação de outrora. É também um game com irritantes características modernas, o que torna a sensação de jogá-lo bastante diferente dos anteriores. Esta é nossa análise Darksiders 3.
ANÁLISE DARKSIDERS 3
Olha, eu sei que, neste caso, quando eu começar a descrever o jogo, vai parecer que eu não gostei dele. Então permita-me começar dizendo: eu gostei muito de Darksiders III. Apesar de minha campanha ter durado satisfatórias 21 horas, este seria um daqueles raros casos em que, se eu tivesse tempo para isso, começaria uma nova história quase imediatamente.
A primeira surpresa veio na própria carta que os desenvolvedores enviaram junto com nossa cópia de review. Lá, eles davam explicações narrativas para Darksiders III ter abandonado a mecânica de loot do segundo jogo. Segundo eles, o Morte era um cavaleiro que tirava sua força dos equipamentos. Fúria, a protagonista da vez, não precisa disso.
Na prática, Darksiders II foi um RPG que saiu em uma época em que tudo era jogo de ação. Darksiders III, por outro lado, é um jogo de ação na era dos RPGs. E isso foi uma surpresa bem surpreendente para mim. Era algo que eu queria que acontecesse, mas não acreditava que ia rolar. Porém, regozije-se comigo diante deste fato: você não vai perder nem um segundo do seu tempo comparando estatísticas de quatro armas virtualmente idênticas para escolher qual vai usar.
A história rola ao mesmo tempo que a dos dois primeiros jogos. Fúria é ordenada pelo Charred Council a ir para a Terra caçar os sete pecados capitais. Sim, cada pecado é um personagem propriamente dito, e um chefe. Mas isso não significa que o jogo tem apenas sete chefes, pois há outros além destes principais.
MUNDO FECHADO FTW!
Além de abrir mão do lado RPG, Darksiders Três também manda para as cucuias todo aquele esquema de mundo aberto e sidequests do segundo jogo. Esta é uma aventura quase totalmente linear, e a protagonista Fúria é focada em sua missão. Nada de fazer uma pausa na salvação do mundo para ficar pegando plantinhas ou algo assim.
Isso não significa que a exploração não seja recompensada. Há itens e chefes opcionais em caminhos escondidos. Ainda assim, o caminho que avança a história é sempre bem claro, identificado em uma bússola no topo da tela por uma caveirinha que aponta a direção do próximo chefe. Teve um único ponto da campanha em que eu podia escolher, entre dois chefes, qual seria o próximo que iria caçar. De resto, toda a história funcionava com um objetivo por vez.
Não há mais um mapa, e isso diminui consideravelmente o clima de metroidvania do primeiro jogo. Afinal, se eu não tenho um mapa me mostrando os itens que eu não peguei, eu fico bem menos tentado a voltar para áreas já visitadas. E isso é ótimo, pois evita que o clima esfrie e fique repetitivo.
Basicamente, o aspecto de metroidvania mais evidente aqui é a área chamada “Encruzilhada”. É um ponto central do mundo do jogo de onde saem vários caminhos com obstáculos pelos quais você só pode passar depois de adquirir certas habilidades. Basicamente, depois de matar alguns chefes, basta você se teleportar para lá e seguir o caminho que acaba de se abrir para você.
Esta linearidade permite que o foco de Darksiders III seja no combate.
COMBATE EXCELENTE
Jogos de hack and slash exigem um equilíbrio. Coloque combos demais, e o jogador vai apertar botões aleatoriamente. Coloque de menos, e as lutas ficam entediantes. Darksiders III, assim como seus antecessores, se encontra no ponto certo.
Você tem dois botões de ataque principais. O quadrado sempre usa o chicote (arma que deveria ser muito mais usada nos games, não acha? Cadê a influência de Castlevania, pô?). Já o triângulo usa uma das quatro armas elementais que você vai ganhar ao longo da aventura. Além da arma em si, ter cada uma delas equipada afeta suas habilidades de movimentação e ataques especiais. Por exemplo, a do trovão permite planar e criar furacões que vão na direção dos seus inimigos.
É um sistema simples e eficiente. Você sempre sabe o que acontece apertando cada botão, sem a necessidade de decorar dezenas de combinações diferentes.
E é bom que o combate seja tão caprichado, pois a movimentação foi consideravelmente simplificada em relação aos anteriores. Fúria é muito menos ágil do que seus irmãos Guerra e Morte. Ela pula baixo, não escala paredes nem nada do tipo.
A comparação com Morte, em especial, é surpreendente, já que Darksiders II era quase um Prince of Persia dos infernos. Isso também vai contra o clichê dos games de que as personagens mulheres são sempre as mais ágeis.
Esta foi a primeira decepção de Darksiders III. Mas infelizmente não foi a única. Nem a mais importante. Isso porque ele se tornou…
MAIS UMA CÓPIA DE DARK SOULS
Os Darksiders eram jogos muito agradáveis. Além de uma exploração bacanuda, eles tinham um dos melhores sistemas de checkpoints que eu já vi. Basicamente, sempre que você morria, reaparecia na frente daquilo que te matou. Pois esqueça isso. Darksiders III nem é mais difícil do que os anteriores. Na verdade, eu diria que é até mais fácil. Só que ele é infinitamente mais punitivo.
Jogando na dificuldade normal, eu não morri muito em Darksiders III. Porém, quando morria, perdia mais de dez minutos de progresso, além de todas as almas (AKA o XP) que eu estava carregando. Isso porque o funcionamento do jogo é exatamente igual ao de Dark Souls.
O vendedor Vulgrim, velho conhecido da série, funciona como as fogueiras (checkpoints). Ao morrer, você ressurge no último Vulgrim ativado, e sua XP fica te esperando na área da sua morte.
Isso faz com que o jogo funcione naquele esquema dos jogos da From. Você passa por um Vulgrim, dá uma volta enorme, e daí abre uma porta que dá acesso a um Vulgrim anterior, servindo portanto como um atalho.
Obviamente, há muito menos Vulgrims do que havia checkpoints nos jogos anteriores. E Darksiders III ainda usa aquele humor doentio típico dos soulslike de colocar um Vulgrim inacessível atrás de portas fechadas.
Felizmente, Darksiders III não tem a dificuldade de sua fonte de inspiração. Fora dos chefes, era bem raro morrer. Porém, quando morria, perdia um bom tempo, o que considero inaceitável e um tremendo retrocesso para a série. Além disso, vários chefes, em especial os primeiros, não têm nenhum Vulgrim próximo, exigindo que você jogue boa parte da fase para poder tentar de novo.
SOULSLITE
Uma vantagem de Darksiders III sobre Dark Souls é que este se apropriou de uma melhora implantada por Lords of the Fallen. Ou seja, ao encontrar o Vulgrim, você pode depositar toda a XP que estiver carregando, mesmo que não seja o suficiente para subir de nível.
Subir de nível, aliás, é feito de forma bastante incremental em três estatísticas: vida, força e arcano (que determina o poder dos seus ataques especiais). E é realmente incremental. Tipo, colocar um ponto em vida sobe a barra de 200 para 205, por exemplo. Na prática, você continua morrendo na mesma quantidade de golpes. E já que falamos nisso…
COMBATE TAMBÉM É TIPO DARK SOULS
O Guerra e o Morte eram parrudos, difíceis de matar. Fúria é extremamente frágil, normalmente morrendo com três ou quatro golpes bem dados, mesmo de inimigos fracos. É que neste ponto ele tem uma pegada diferente. Assim como em Dark Souls, Darksiders III quer que você brigue um pouco, se afaste e use um item de cura antes de voltar à porradaria. E assim como em Darks Souls, usar um item imobiliza o personagem por cerca de um segundo, o que pode ser fatal caso o momento não seja propício.
Embora você tenha uma infinidade de itens, que aumentam força, ira, vida, etc; sua cura principal virá do chamado Nephilim’s Respite, que é o equivalente aos Estus de Dark Souls. Porém, aqui eles não são recuperados no checkpoint, mas no combate. Então, se você está sem itens de cura, não adianta voltar para o checkpoint, o jeito é continuar lutando e torcer para algum inimigo dropar uma dose da poção.
Outra alternativa que vira e mexe você vai usar é se matar quando passar por um checkpoint, o que é a forma mais garantida de completar suas doses de cura de uma vez para o próximo desafio.
O triste é que nada, absolutamente NADA, destas “influências” de Dark Souls, vem para o bem da série Darksiders. Tudo parece no mínimo gratuito, e diria até, verdadeiras traições ao movimento dos games de ação.
AUDIOVISUAL
Darksiders nunca foi uma série com cenários especialmente inspirados, e esta tradição continua aqui. Apesar de ter suporte a HDR, Darksiders III é monocromático, com cenários quase completamente cinzas e cavernosos.
Felizmente, o que falta de inspiração nos cenários sobra no design dos personagens. Gosto muito da estética de quadrinhos que a série usa, distanciando do visual realista dos AAA atuais. É aquele tipo de design estilizado em que os caras têm bíceps do tamanho de troncos de árvores, o que deixa tudo bem interessante. Os pecados, em especial, são bem elaborados e ficam bem longe do clichê.
Basicamente, o visual é o que você espera da série. Apesar de estar em uma nova geração, é inegável que Darksiders III não é visualmente mais impressionante do que os anteriores.
A música também deu uma boa fraquejada. Aliás, quase não tem músicas aqui. Ao contrário dos anteriores, que tocavam temas épicos a todo momento, este segue aquele design mais minimalista de (adivinha só) Dark Souls.
Sabe aquele esquema tradicional nos anteriores, de você estar explorando um dungeon, daí as portas se fecham, um bicho enorme aparece na sua frente e um tema orquestrado começa a bombar nas suas caixas de som? Isso não rola aqui. De vez em quando toca uma musiquinha de exploração, mas não há temas sincronizados com combates.
PROBLEMAS TÉCNICOS
Apesar de eu ter jogado Darksiders III antes do lançamento, ele rolou para mim com alguns problemas técnicos consideráveis. Coisas que iam de sair do jogo sozinho (o que, combinado aos saves esporádicos, me fazia perder um bom tempo sempre que acontecia) a falhar em carregar partes do cenário (o chão, inclusive), tornando impossível progredir.
Houve também coisas mais leves, como tutoriais de novas habilidades que apareciam depois da área onde eu precisaria usá-las.
O excesso de loadings também é digno de nota. Ao morrer no último chefe, por exemplo, você precisa esperar não uma, mas DUAS telas de load. Além disso, tem horas que o jogo para no meio do gameplay para carregar e isso aconteceu duas vezes para mim no meio de combates.
UM JOGO ESTRANHO
Darksiders III é um jogo estranho. Em vários aspectos, ele remete aos deliciosos jogos de ação da geração passada. Em outros, ele vira um moderno soulslike genérico. Embora eu não tenha morrido muito ao longo da campanha, o medo de morrer e perder um tempo que eu simplesmente não tenho hoje em dia afetou consideravelmente meu aproveitamento do jogo.
Ainda assim, como um fã de jogos de ação hack and slash que basicamente não existem mais hoje em dia, Darksiders III serviu para coçar uma coceira que não recebia atenção há tempos. Afinal, este ano saiu apenas um outro hack and slash, e ele era um RPG baseado em loot. Se você, como eu, quer apenas distribuir uns sopapos sem ter que perder tempo comparando estatísticas de roupinhas, Darksiders III é simplesmente sua única opção em 2018. E esta raridade o torna mais do que recomendável.
CURIOSIDADES:
- Os quatro Cavaleiros do Apocalipse bíblicos são Guerra, Morte, Fome e Peste. Na versão de Darksiders, Fome virou Fúria, a protagonista deste jogo. E Peste virou Strife (Conflito), protagonista do próximo?
- Pela primeira vez na série, aqui podemos ver os quatro Cavaleiros do Apocalipse, inclusive o até então inédito Strife.
- A Gunfire Games, desenvolvedora de Darksiders III, tem em seu staff boa parte das pessoas que trabalharam na Vigil Games quando esta fez os dois primeiros Darksiders.