Permita-me começar essa análise Judgment com uma explicação para aqueles que não estão inteirados na série Yakuza.

É um ótimo momento para conhecer a série Yakuza!

Depois do excelentíssimo Yakuza 6, a série encerrou a história do tremendão herói Kazuma Kiryu. Para onde ir a partir daí? Pois a série se dividiu em duas, diferentes, mas iguais. Se você é um delfonauta dedicado, deve se lembrar da nossa análise Yakuza: Like a Dragon. Esse é o futuro dos jogos chamados Yakuza: JRPGs com combates em turno. Por outro lado, quem é fã de distribuir uns soquinhos em tempo real pode migrar para Judgment que, apesar da mudança de nome, mantém o gameplay tradicionalmente associado a Yakuza. Recentemente, inclusive, foi anunciado que Judgment de fato é uma série, e vai ganhar uma sequência chamada Lost Judgment. Pois some isso ao recente lançamento do primeiro jogo para PS5, Xbox Series e Stadia, e é um ótimo momento para falarmos sobre ele.

ANÁLISE JUDGMENT NO PS5

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Essa versão next-gen de Judgment não é um simples port, e quem comprou o jogo no PS4 não ganha upgrade para a versão de PS5. O Judgment next-gen é o que a gente costuma chamar de “edição definitiva”, que junta o jogo original a todos seus DLCs.

Pelo que consegui observar, os DLCs em questão são itens superpoderosos que já começam no seu inventário, e permitem curar, recuperar EX (mana), dar golpes especiais e até invocar uma fúria divina que destrói todos os inimigos. Esses itens têm uso ilimitado, e apenas um cooldown de três minutos. Então, na prática eles servem para “quebrar” o jogo. Eu não recomendo que você os use adoidadamente, mas admito que eu apelava para eles em lutas mais difíceis ou, especialmente, para poder me curar sem precisar comprar comida.

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Isso que eu chamo de Hadoken!

Tirando esses itens extras, Judgment no PS5 roda, pelo que posso perceber, a 4K/60fps, e tem carregamentos negligíveis, de menos de cinco segundos. Dito isso, ele não parece exatamente um AAA next-gen, mas se você acompanha Yakuza, sabe que a série nunca foi exatamente um primor técnico. E Judgment é suficientemente bonito e detalhado.

ANÁLISE JUDGMENT: ME CONTA UMA HISTÓRIA

Apesar de ter um gameplay legal, Yakuza também nunca foi marcado por isso. Esta é uma série narrativa, com longas cutscenes e histórias complexas que combinam momentos muito sérios com outros deliciosamente bobos. É isso que possibilitou, por exemplo, que Like a Dragon virasse um RPG, mas que continuasse parecendo um típico Yakuza.

Judgment tem todas essas características, e ainda mantém o combate bem semelhante ao dos jogos de Kazuma Kiryu. Yagami, o protagonista, é um ex-advogado que agora trabalha como detetive no tradicional bairro de Kamurocho (a interpretação da série Yakuza para Kabukicho).

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A história começa quando Yagami é contatado pela firma de advocacia para a qual trabalhava, com um trabalho: ajudar a investigar e provar a inocência de Hamura, um capitão da Yakuza acusado de matar membros de famílias rivais de uma forma horrível.

THE MOLE

Esse caso é apenas o início, mas após provar a inocência de Hamura, Yagami fica obcecado pelo serial killer, que passa a chamar de “The Mole“, e abre uma investigação por conta própria. Obviamente, ele logo descobre que a coisa é muito mais profunda do que uma briguinha entre famílias criminosas e, como não poderia deixar de ser, acaba sendo acusado de ser o próprio The Mole.

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Yagami distribui sopapos como o governo da Romênia distribui vacinas contra a COVID.

Embora a história fique eventualmente interessante, devo dizer que Judgment demora muito mais para engrenar. Muito disso se deve ao seu protagonista. Eu sinceramente gosto muito do Kazuma, e gostei muito também do Ichiban de Like a Dragon. Kazuma é um cara sério e marrento, porém é um verdadeiro gentleman, um herói com um tremendo senso de justiça e respeito. Ichiban é mais nerd, mais brincalhão e mais divertido, mas é igualmente um sujeito decente. Já Yagami… bom, ele é um cara decente também, mas tirando isso ele é quase vazio. Ele não se destaca positivamente como seus colegas de série.

Particularmente, eu gosto muito mais da jogabilidade beat’em up de Judgment e dos Yakuza tradicionais do que do combate por turnos. Porém, esses jogos são antes de mais nada histórias interativas. E, em histórias tão longas e elaboradas, jogos em que você passa tanto tempo assistindo a cutscenes quanto jogando, é importante gostar e se importar com o protagonista. Eu não diria que eu “não gostei” do Yagami, mas ele é muito tradicional, um herói de videogame padrão, e isso torna Judgment, para mim, uma história mais fraca do que aquelas que levam o nome Yakuza.

ANÁLISE JUDGMENT: YAKUZA SIMPLIFICADO

Em muitos aspectos, aliás, Judgment me parece um Yakuza simplificado. Comecemos pelo óbvio: a série Yakuza costuma ter sempre pelo menos dois mapas. Kamurocho está sempre lá, mas sempre há outro. Em Like a Dragon, por exemplo, o jogo começa em Kamurocho, mas acontece quase inteiro em outro lugar. Judgment é totalmente focado em Kamurocho.

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Eu sou o campeão dos drones.

Também achei que há menos coisas aleatórias para se fazer na cidade. Tem uns joguinhos antigos da Sega, corrida de drones e algumas atividades tipo Mahjong. Mas não tem, por exemplo, o tradicional Karaoke, ou os chats com moças bonitas de Yakuza 6. Também não tem os jogos mais elaborados, como a administração de empresas de Like a Dragon ou os clubes de hostess de Kiwami 2.

Agora, cá entre nós, essas coisas não fazem tanta falta assim para mim. Todos os jogos de Yakuza são tão longos que eu eventualmente acabo desistindo de brincar no mundo aberto e começo a focar na história. Dito isso, é inegável que todas essas características juntas dão a Judgment um ar mais modesto. Ele parece de fato mais um spin-off do que um Yakuza completo, como o Like a Dragon. Além disso, nenhum personagem da série Yakuza aparece aqui, tornando-o mais independente do resto até mesmo do que Like a Dragon.

ANÁLISE JUDGMENT: AINDA ASSIM É LONGO

Porém, isso não significa que o jogo é curto. Pelo contrário. Devo dizer que, quando eu vi que estava com cerca de dez horas de jogo, e ainda no capítulo 2 (de um total de 13), fiquei um tanto desesperado. Sei que tem gente que gosta dos Yakuza pela possibilidade de “viver no Japão” e passar dezenas de horas lá, mas para ser sincero, eu gostaria que esses jogos fossem mais editados, e tivessem ainda menos conteúdo.

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As perseguições pelas ruas de Kamurocho são maior legais.

Infelizmente, o que acabaram cortando aqui, além das atividades e games secundários, é algo que eu considero o mais especial da série: os dungeons. Todo Yakuza tem áreas em que você entra em um lugar fechado e segue um caminho linear cheio de inimigos. É o mais próximo que esses jogos chegam de um Streets of Rage em 3D, e eu adoro isso!

Porém, Judgment tem muito, muito pouco disso. A maior parte do jogo envolve ir para um ponto do mapa, assistir a uma cutscene, e daí ir para outro ponto, onde rola outro filminho. Eventualmente tem uma perseguição, ou um “siga sem ser visto”, mas dungeons mesmo são raríssimos, o que é uma pena.

O LEGAL DE SER CONTIDO

Uma coisa que eu achei legal é que, por ter apenas um mapa, e o mapa em questão não ser muito grande, você vai várias vezes para os mesmos lugares. Por exemplo, o Bar Tender é um lugar importantíssimo na história, e isso, a meu ver, deixa o jogo mais realista.

Por exemplo, eu moro em São Paulo, que é um mapa de mundo aberto enorme. Porém, ao longo da minha vida, eu sempre frequento as mesmas casas, restaurantes, lojas. Judgment vai por aí. Além disso, mesmo inimigos mais padrão, que não são chefes nem nada, são encontrados várias vezes. Por exemplo, a família Matsugane tem sempre os mesmos capangas contratados, e você os encontra muitas vezes ao longo da campanha, tanto em conversas quanto em lutas.

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A família Matsugane. Você vai lidar muito com essa galera.

Isso é especialmente legal porque na série Yakuza você não mata ninguém. Assim, um capanga, apesar de ter perdido a briga com você, continua trabalhando para as mesmas pessoas, e volta a aparecer depois. Isso é bem mais realista do que, por exemplo, em Uncharted, onde os vilões têm exércitos infindáveis, e você vai matando todo mundo. As mortes que de fato rolam na série Yakuza têm peso, e isso é muito legal.

ANÁLISE JUDGMENT: JULGANDO JUDGMENT

Eu gostei de Judgment, mas devo dizer que, especialmente pela falta de um protagonista mais carismático, gostei menos do que esperava. Por pura preferência de gênero, tinha a mais absoluta certeza que gostaria mais de Judgment do que de Like a Dragon, o que não aconteceu.

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Acho que o Yagami não concordou comigo.

Eu não joguei todos os Yakuza ainda, mas dentre os que joguei, Judgment é o mais fraquinho. Isso, claro, se você considerar Judgment um Yakuza – ele certamente é parecido o suficiente, embora não leve o nome. Ainda é legal, mas certamente não alcança o ápice das aventuras de Kazuma e Ichiban.