Velozes e Furiosos: Encruzilhada, ou Fast & Furious: Crossroads é um raro caso de um código de review que não chegou antes do lançamento, e nem mesmo na data, mas uns bons dias depois. Nesse meio tempo, eu já tinha lido a repercussão gringa e visto que ele tinha sido universalmente odiado (sua nota no Metacritic, no momento em que escrevo isso, é de 36). Cheguei a pensar até que códigos não seriam distribuídos para a imprensa nacional, o que é relativamente comum em casos de potenciais bombas. Assim, até me surpreendi quando o código chegou. Eu sinceramente já tinha desistido de fazer uma análise Velozes e Furiosos: Encruzilhada.
Acontece que eu sou teimoso. Se você lê o DELFOS há algum tempo, sabe que minhas opiniões ocasionalmente divergem radicalmente da grande mídia. E eu acreditava que este seria um desses casos. Não, eu não esperava que Fast & Furious: Crossroads fosse o grande jogo do ano. Não esperava um visual impressionante, e nem mesmo uma boa história. Eu esperava apenas que fosse um jogo enxuto, que me divertisse por algumas horas. E foi isso o que aconteceu. Tem dias que a gente só quer um pouco de diversão explosiva e descompromissada. Os filmes Velozes e Furiosos contemplam isso. E eu diria que este jogo também.
ANÁLISE VELOZES E FURIOSOS: ENCRUZILHADA
Velozes e Furiosos: Encruzilhada não é um jogo especialmente criativo. Basicamente, é uma sequência de minigames cheios de adrenalina com temática veicular, emoldurados por uma história que se passa entre Velozes e Furiosos 8 e o vindouro nono filme.
A verdade é que não tem nada aqui que você não tenha visto antes e melhor em jogos como GTA, Need for Speed Uncharted, ou Burnout. Porém, ao combinar elementos de todas essas séries em uma sequência de fases cheias de adrenalina, algo muito especial nasceu.
As fases mais entediantes envolvem seguir um carro sem ser notado. A maioria envolve combate entre carros, lembrando bastante Burnout. Tem algumas (duas, na verdade) corridas tradicionais, e um monte de perseguições emocionantes. Basicamente, Velozes e Furiosos: Encruzilhada é uma coletânea do que os gringos chamam de set piece. Ou seja, cenas de ação absurdas e roteirizadas, que normalmente respondem pelo clímax de um filme ou de um jogo. Você vai, por exemplo, dirigir montanha abaixo enquanto rola uma avalanche atrás. Vai perseguir trens. Destruir hovercrafts com um canhão montado no teto do carro. Esse tipo de baboseira te apetece? Porque eu sinceramente adoro essas coisas!
Vou descrever uma cena, e você me fala qual é sua reação a ela. Essa reação vai te dar uma boa ideia se você vai gostar ou não deste jogo. O que você pensa de dirigir ao lado de um foguete, enquanto um caboclo surfa em cima dele, com o objetivo de pular no seu carro e escapar sem nenhum arranhão? Se você sorriu, meu amigo, eu diria que você vai se divertir por aqui. Eu me diverti, e bastante.
ATORES HOLLYWOODIANOS
Digno de nota em Velozes e Furiosos: Encruzilhada é o elenco, que traz de volta uma galera dos filmes, e outras caras conhecidas. Dos filmes, temos Vin Diesel, Michelle Rodriguez e Tyrese Gibson. As duas novas personagens, que são as protagonistas do jogo, são interpretadas por Sonequa Martin-Green (de Walking Dead e Star Trek: Discovery) e Asia Kate Dillon (de Billions e Orange is the New Black). Ou seja, tem muita cara conhecida por aqui. Todos os atores entregam ótimas interpretações e o roteiro desenvolve todos muito bem. Nenhum desses citados é uma ponta que só está aqui para emprestar o nome, todos são importantes.
A história contada por esses atores, obviamente, não vai ganhar prêmios. Começa com um cara que tem uma dívida com o crime organizado e a coisa se complica a tal ponto que eventualmente você vai impedir a terceira guerra mundial. Eu já disse que é uma baboseira? Pois digo de novo. E sabe o que mais? É uma baboseira deliciosa.
Assim como os filmes, a história está lá só para dar um contexto para as cenas de ação pintudas. Sinceramente, eu não teria gastado tanto do orçamento em pegar tantos atores famosos. Preferia, por exemplo, investir essa grana em gráficos melhores, mas talvez o jogo não chamasse tanta atenção se fosse só mais um jogo licenciado sem envolvimento dos atores dos filmes. E também não corresponde à realidade achar que só por ter mais dinheiro para os gráficos, a Slightly Mad Studios conseguiria dar ao jogo a qualidade técnica de um The Last of Us Part II. Mas, poxa, seria legal se fosse o caso.
VALORES DE PRODUÇÃO
Em Uncharted e The Last of Us sempre há uma ou outra cena de perseguição emocionante, que empolga e impressiona. Fast & Furious: Crossroads é 80% composto por essas cenas. É um clímax atrás do outro. Mas é claro, não tem os mesmos valores de produção ou a qualidade artesanal de um jogo da Naughty Dog. Na verdade, não seria mentira dizer que este parece um jogo de PS3. E nem um tão bonito assim.
Por outro lado, a parte sonora é excelente. As músicas, gravadas por uma orquestra, são absurdamente cinemáticas e deixam as cenas com todo o teor épico que elas buscam alcançar – e que talvez pelos gráficos fraquinhos não cheguem exatamente lá.
A única reclamação que eu tenho da parte sonora é a mixagem: o som fica MUITO mais alto durante as cutscenes do que no gameplay, o que exige ajustes de volume constantes. Mas tirando isso, a composição e execução das músicas é excelente.
ONLINE
Tem também um modo online que é até interessante. Porém, como todo jogo “menor”, está fadado ao esquecimento. Eu testei ele na semana após o lançamento, e já tinha tão pouca gente jogando que eu demorei 20 minutos para conseguir iniciar uma partida. E depois que parei de jogar online, um dos desconhecidos com quem joguei ficou me mandando mais de uma dezena de convites, o que demonstra o desespero de quem está jogando em encontrar outras pessoas.
Caso você consiga jogar, o online divide os jogadores em três times: heróis, vilões e policiais. Em geral, os heróis competem contra os vilões, e a polícia está lá para prender todo mundo. Esses objetivos assimétricos, diferentes para cada time, são legais. Porém, a conexão é péssima. Some isso à falta de gente jogando, e este é mais um caso em que o dinheiro investido para criar o multiplayer seria melhor colocado em outros aspectos da produção.
A situação me lembrou até de jogos da geração passada, quando tudo precisava ter multiplayer, e jogos focados em campanha, como Dead Space e Bioshock, gastavam um dinheirão para criar esses modos, e daí ninguém jogava. É uma pena, e deve ser extremamente frustrante para os desenvolvedores.
SUSTÂNCIA
Talvez o principal problema em Velozes e Furiosos: Encruzilhada seja o fator sustância, combinado à sua precificação. Nós recebemos a versão Deluxe, que no Xbox One está sendo vendida a R$ 378. A padrão custa R$ 250. E este não é um jogo a ser vendido a preço cheio. Este não é um The Last of Us Part II. Este é um fast food, um jogo para curtir em uma tarde, se divertir bastante por algumas horas, e depois ir para a próxima. E eu não tenho problema algum com isso. Se tanto, acho que o mundo precisa de mais diversões descompromissadas. Mas elas precisam ser vendidas de acordo com esta proposta.
Fast & Furious: Crossroads é, por exemplo, um jogo que eu acredito que faria miséria entrando para o Game Pass. A licença de Velozes e Furiosos chamaria pessoas a experimentarem. Elas curtiriam o modo história sem a pressão de terem investido mais de duzentos contos para jogar. E, se pá, o multiplayer até ficaria mais animado.
Ele até poderia ter mais sustância se tivessem enfiado um mundo aberto e uma pá de atividades secundárias pentelhas. Isso poderia ter sido feito com um aumento mínimo de trabalho (certamente menor do que para criar o multiplayer). Talvez até tivesse sido melhor avaliado pela crítica gringa se fosse o caso (a crítica do Polygon, por exemplo, diz que poderia ser melhor se tivesse mundo aberto). Mas eu fico feliz que não fizeram isso. Da forma que está, Velozes e Furiosos: Encruzilhada é um jogo enxuto, que diverte durante toda sua curta duração, e não perde tempo com colecionáveis, sidequests e outras pentelhações sem sentido. E isso para mim tem um valor enorme. Mas não 250 contos.
Isso não significa que eu não ache que valha a pena comprá-lo. Vale sim. Em uma promoção futura, em que ele esteja saindo por volta de 100 reais, eu o recomendo fortemente. Como disse, é uma excelente diversão descompromissada, que deve agradar a qualquer um que curta um filme de ação descerebrado.