Admito que eu fiquei surpreso quando descobri que Jordan Peele, diretor deste Nós e do premiado Corra!, é um dos sujeitos da série de comédia Key & Peele. Sei lá, eu não esperava que o diretor de um elogiado filme de terror tivesse sido um ator de comédia.
Porém, minha surpresa não é justificada. Afinal, terror e comédia são gêneros que costumam atrair as mesmas pessoas. Eu mesmo uso bastante de humor nos meus textos aqui no DELFOS e paralelamente já escrevi um filme de terror e até gibis de super-heróis.
Além disso, tanto a série Key & Peele quanto Corra! são obras que têm em conflitos raciais suas principais inspirações, o que é algo mais a ligar as duas produções. Felizmente, Nós varia um pouco de tema, e consegue mesclar terror e comédia com sucesso, e ainda apresentar uma nova interpretação aos bons e velhos zumbis (só não espere ninguém comendo miolos por aqui).
NÓS FILME
Aqui conhecemos uma família que vai passar uns dias em sua casa de veraneio. A mãe (Lupita Nyong’o) tem um fato traumático no passado que traz sofrimento para o que deveria ser um agradável passeio.
Uma bela noite, porém, a casa de praia é invadida por outra família. O que eles querem? E mais importante, quem são eles? É aqui que eu paro de expôr a trama, pois a partir daí, quanto menos você souber, melhor.
A temática, que você provavelmente consegue descobrir em sinopses oficiais (mas não aqui no DELFOS) é um tanto bobinha, a exemplo de Corra!, ainda que desta vez não tenha nada a ver com raça. Porém, a narrativa se destaca. Jordan Peele definitivamente não é um roteirista de altos predicados, mas é um excelente diretor.
ESTILO
O mais bacana de Nós é a construção das cenas, o clima que elas conseguem criar. A cena da invasão da casa é um excelente exemplo. Ela usa o som e a escuridão para criar uma atmosfera de medo que há muito não via no cinema.
Tudo parece acontecer no momento certo para fazer a plateia se sentir exatamente como o diretor planeja. E são pouquíssimos os diretores que conseguem ter o expectador nas mãos como Jordan Peele conseguiu em Nós. Completando o climão, temos a assustadora voz da vilã, ainda que a viradinha do final torne isso um tremendo furo de roteiro.
Mais legal ainda é que, sim, Nós dá medo, mas também é legitimamente engraçado. E não digo isso como quando falei a mesma coisa de Maligno. Aqui o humor é totalmente intencional, e até frequente.
Filmes de terror flertarem com a comédia é algo comum, mas em geral acabam sendo comédias com temáticas envolvendo assassinatos, como Pânico e a série Sexta-feira 13. Nós é um dos poucos filmes que querem te assustar tanto quanto te fazer rir. E eu sinceramente não consigo lembrar de outros que tenham sequer tentado esta façanha, quanto mais conseguido realizá-la.
Apesar de ter gostado do trabalho de direção, eu não o consideraria perfeito. O filme é escuro além da conta, a ponto de que em boa parte de sua projeção você fica apenas observando silhuetas. Talvez seja preciosismo da minha parte, mas eu gosto de realmente ver o que está acontecendo nos meus filmes.
UM FILME DE M. NIGHT SHYAMALAN
Como falei há pouco, Nós tem uma viradinha no final e ela acaba contribuindo para deixar a sua história ainda mais bobinha. Além disso, há várias coisas não explicadas e um final que não resolve boa parte das sementes deixadas pelo filme. Talvez a ideia seja fazer continuação. Mas se não for, dá uma sensação de incompletude quando as luzes se acendem.
Ainda assim, Nós é um excelente filme de terror. Seu roteiro é fraco, mas sua direção é magistral e merece ser assistido na tela grande. É bem diferente de Corra! e, em minha opinião, muito superior a ele.