O delfonauta com certeza se lembra de Distrito 9. Filmão, né? Sendo o primeiro longa do diretor Neill Blomkamp, os fãs de ficção científica ficaram em polvorosa, ansiosos por novos trabalhos do caboclo.
Não demorou para seu próximo filme ser anunciado, e a expectativa dos nerds brasileiros ficou ainda maior quando foi anunciado que o elenco contaria com os brasileiros Wagner Moura e Alice Braga. E agora, quatro fuckin’ anos depois, o filme em questão, Elysium, chega aos nossos cinemas, e veja só, você está lendo a resenha delfiana dele. Tan-tan-taaan!
O SENHOR É UM FANFARRÃO
Num futuro distante, o Planeta Terra foi destruído, e os trilhardários criaram uma estação espacial onde poderiam viver uma utopia sem guerras, sem violência e sem doença. Essa estação se chama Elysium, e lá todas as doenças são instantaneamente curadas por umas camas mágicas inexistentes na Terra, onde agora vivem apenas os pobretões.
Max (Matt Damon), é um desses pobretões. Ex-criminoso, ele está tentando se redimir e assume um trabalho qualquer em um regime deveras opressor. Após um acidente, no entanto, ele é submetido a um alto nível de radiação e, ao contrário do que os gibis nos ensinaram, isso não dá a ele superpoderes, mas deve matá-lo em cinco dias. Os superpoderes são dados a ele por cortesia de Spider (Wagner Moura), um sujeito que ganha a vida levando os pobretões para Elysium ilegalmente.
Acontece que Spider quer aproveitar que um dos ricaços está visitando a Terra para roubar suas senhas, dados bancários e tudo mais que puder. Ele promete levar Max para Elysium, onde poderá usar uma das camas mágicas para se curar, em troca deste simples trabalhinho. E, para ajudá-lo a concluir o trabalho, dá ao Mateus Demônio um exoesqueleto que lhe proporciona superforça.
BOTA NA CONTA DO PAPA!
Como os antenados delfonautas já perceberam, o roteiro original de Neill Blomkamp bebe na fonte de muitas outras histórias de ficção científica, e não apenas no que foi feito no cinema. A história em geral, tem um quê bem forte de Philip K. Dick e, não por acaso, o começo tem a maior cara de filme do Schwarzenegger, em especial O Vingador do Futuro.
Mas não é só isso. A segregação social e a dificuldade/impossibilidade de ir para o outro lado já foi abordada de montão na cultura pop, e o tratamento dado ao tema aqui tem muito de O Preço do Amanhã e Terra dos Mortos.
E digo mais, a própria ideia de uma utopia que separa as pessoas por alguma característica arbitrária também já foi abordada em Bioshock e Bioshock Infinite. E estes, por sua vez, foram baseados na obra da escritora russa Ayn Rand.
Estas relações, no entanto, são temáticas e podem muito bem ter sido coincidência. Porém, uma coisa que não foi coincidência de jeito nenhum é o design da Elysium em si, que é exatamente igual ao mundo do excelente jogo Vanquish. Tão igual, aliás, que eu me sentiria melhor se soubesse que a Platinum Games recebeu algum dinheiro pela semelhança.
PEDE PRA SAIR!
O mais triste disso é que Distrito 9 era um filme tão único, abordando o tema “invasão alienígena” de uma forma totalmente inédita, e assim invertendo os papéis de heróis e vilões de um jeito inteligente. Ok, no final, ele acaba virando um filme de ação padrão, mas não dá para negar que a sua primeira hora é única e mostra um potencial enorme.
Para onde foi esse potencial em Elysium? Aqui a abordagem é totalmente padronizada, e a discussão social que ele se propõe a fazer não traz nada de novo para pessoas como nós, que já somos escolados nos filmes de zumbis. E se você tirar o ineditismo e a discussão social que fizeram o sucesso de Distrito 9, o que sobra? Sobra uma ficção científica pasteurizada. E é exatamente isso que temos em Elysium.
Não, o filme não é ruim. É apenas decepcionante, diante do potencial exibido no filme anterior do diretor. Temos aqui uma ficção científica bacana, divertida e que tem na discussão social que se propõe a fazer um ponto positivo, ainda que não inédito. Mas a verdade é que em muito pouco Elysium se diferencia de outros lançamentos recentes do gênero, como Oblivion ou Depois da Terra. E isso é uma pena.
O SISTEMA TRABALHA PARA MANTER O SISTEMA
Em uma entrevista coletiva que rolou depois da sessão de imprensa, com cobertura delfiana, Wagner Moura disse que a principal diferença que sentiu nesta sua primeira incursão hollywoodiana foi a quantidade de dinheiro. Citou, como exemplo, um momento que pediu uma bengala para seu personagem e em dez minutos trouxeram cinquenta bengalas para ele escolher.
E é justamente aí que acredito estar a explicação para a falta de criatividade de Elysium. Não é falta de talento do jovem diretor, mas intervenção da turma do dinheiro mesmo. Se tem muito dinheiro envolvido, a liberdade diminui e, com isso, a criatividade é podada. Neill Blomkamp conseguiu uma carreira no cinema graças ao seu inovador primeiro longa, mas as pessoas que acreditaram nele a ponto de contratá-lo não acreditaram a ponto de dar a ele liberdade criativa total. O resultado, no final das contas, reflete a Hollywood atual: até pode ser divertida, mas é totalmente pasteurizada e sem criatividade.
Embaso ainda mais minha opinião em outra declaração de Wagner Moura na coletiva. Quando perguntado se o roteiro mudou bastante ao longo da produção, ele disse que na versão final do filme, o personagem de Matt Damon e o seu próprio estão muito mais heroicos. Quando eles filmaram o longa, o protagonista queria saber apenas de se curar, enquanto o Spider só queria saber do dinheiro que levaria pra casa. No corte final não é assim. Essa tridimensionalidade vai embora. Heróis são heróis. Vilões são vilões. Tudo bem preto no branco. Tudo bem mastigado. Tudo bem como Hollywood gosta.
Já que estamos falando dos atores brasileiros, aliás, ambos aparecem bem pouco. A Alice Braga é o tradicional interesse romântico, mas a história não é focada nisso. Wagner Moura é um coadjuvante importante para mover a narrativa, mas não tem muito tempo de tela. Então não se deixe enganar pela divulgação tupiniquim, que coloca o nome dos dois logo abaixo de Matt Damon e Jodie Foster. Se alguém merece o terceiro e o quarto lugar no billing, estes seriam o mexicano Diego Luna e o protagonista de Distrito 9, Sharlto Copley, que está irreconhecível aqui como o vilão Kruger.
Agora veja bem, nada do que disse aqui deve ser o suficiente para impedi-lo de assistir a Elysium. Não tenho nenhuma dúvida de que este é um filme que há de divertir bastante qualquer delfonauta que se preze. A decepção é grande porque a expectativa era imensa. Se este filme fosse dirigido por qualquer outro sujeito, pode ter certeza que a resenha seria diferente. Porém, as coisas não existem no vácuo, e devem ser julgadas de acordo. Diminua suas expectativas, espere ver apenas uma boa ficção científica e divirta-se.
CURIOSIDADES:
– Na falta de frases de efeito em Elysium, usei algumas emprestadas de Tropa de Elite. Ei, pelo menos um dos atores está em ambos os filmes. =D
– O momento mais engraçado da coletiva foi quando Wagner Moura comentou que Matt Damon, ao ver sua tatuagem com a bandeira do Brasil, perguntou por qual motivo ele tatuou um hambúrguer no braço. Wagner explicou que era a bandeira do Brasil e Damon se desculpou e ficou compreensivelmente sem graça. Mas fica a dúvida: você consegue ver um hambúrguer na bandeira do Brasil? Difícil, não?