A semana passada caminhava para ser apenas mais uma no ano. Acordei cedo para ir ao trabalho, tomei meu café, sujei minha camisa com pasta de dente, troquei de camisa e fui trabalhar, como acontece em qualquer outro dia. Pego ônibus e metrô e tudo rola normalmente até eu encontrar com uma amiga que há muito não via. O metrô aqui em São Paulo tem dessas coisas. Milhões de pessoas e você sempre encontra alguém que não vê há tempos.
Novidades atualizadas e eis que ela me solta a seguinte frase: “Cê viu? O Chorão morreu”. Não acreditei até ela me mostrar no Twitter da Veja a notícia. Ela desceu uma estação depois e eu fiquei ali, sentado, pensando no que tinha acontecido. Chorão, vocalista de uma das bandas mais importantes dos últimos tempos e que, convenhamos, tinha se tornado a própria imagem da banda, morreu. O cara, que tinha feito o seu escritório na praia, deixou todo um legado para trás e agora vai descansar.
E morte é um assunto que rende bastante conversa. A semana passada foi marcada por muitas reportagens sobre o assunto, e o Facebook ficou abarrotado de gente comentando a morte, relembrando as músicas preferidas do Charlie Brown Jr. e colocando o Chorão na posição de ídolo musical. E quase que proporcionalmente as pessoas rebatiam, dizendo que ele não merecia estar nessa posição.
Essa discussão me levou a pensar bastante no assunto. Afinal, Chorão é um ídolo musical, que merece ser colocado na mesma categoria de Cazuza ou Renato Russo? Ou ele é só mais um artista que se foi?
CHORÃO MORREU E TODO MUNDO VIRA ROCKEIRO!
Até onde eu pude acompanhar, praticamente todos os meus amigos curtem Charlie Brown Jr.. Com exceção, é claro, do pessoal que curte se besuntar em óleo e ouvir bandas abençoadas pelo vento preto.
E como todo mundo, eu não tenho somente amigos que curtem rock. Tem os pagodeiros, a turma do sertanejo, do rap e por aí vai. E todos curtem Charlie Brown Jr.. Lógico que não são todas as músicas e que eles não iriam a um show da banda, mas curtem músicas mais famosas. Músicas que até marcaram momentos especiais em suas vidas. E convenhamos: poucos artistas conseguiram fazer isso.
Tais demonstrações de carinho me fizeram pensar que o Charlie Brown Jr. ultrapassou a barreira do rock e atingiu todo mundo que gosta de música, independente do estilo. Se você quiser chamar esse povo de eclético ou de sem identidade musical, fique à vontade, mas isso é assunto para outro texto.
O QUE TORNA O CHARLIE BROWN JR. ESPECIAL?
Simples. Desde que conheci a banda, e isso foi em 1997, Chorão sempre manteve um estilo meio molecão. E tal estilo passou para as suas letras, falando o que a molecada que acompanhou a banda sempre viveu. Decepções amorosas, sacanagem, amor proibido, fatos do dia a dia e tudo mais que acontece na vida de um adolescente. Mesmo sendo um adulto, Chorão nunca deixou essa parte da sua vida de lado. E isso sem contar a sua identificação com o skate e com o público que pratica esse esporte.
E você, que é adolescente ou que já passou por isso, sabe que os adolescentes precisam de pessoas para se espelhar, precisam de alguém com quem se identificar. E o Chorão fez esse papel para muita gente. Pode não ser pelas suas atitudes, mas com certeza as suas letras ajudaram e transmitiram muitas mensagens para um grupo de pessoas.
ÍDOLO OU NÃO?
Sim. Chorão pode ser elevado a este nível. Ele tem todas as características de um ídolo. Foi polêmico, simpático, conseguiu ultrapassar a barreira do rock, suas letras marcaram uma geração inteira e ele conseguiu deixar o rock nacional em um nível mais alto do que era antes do Charlie Brown Jr. aparecer. E até a sua morte está cercada de polêmicas, pois até o fechamento desse texto, não ficou claro se o triste ocorrido tem algo a ver com drogas, embora tudo indique que sim.
É difícil aceitar isso, eu sei. Com certeza você tem dificuldade em aceitar que uma pessoa possa a vir ser “classificada” como ídolo. E na música isso é mais comum ainda, pois ninguém aceita colocar alguém novo ao lado dos imortais.
Mas Chorão deve sim ser colocado ao lado dos grandes nomes da música brasileira. Se você não gosta dele, apenas aceite e tente entender isso. Afinal, muita gente não considera o Cazuza grande coisa. E para outros, Renato Russo era apenas um cara qualquer. Assim como o Chico Science, Cassia Eller e mais uma infinidade de músicos.
Ele pode não ser o meu ídolo, pode não ser o seu, mas com certeza é ídolo de muita gente. É ídolo de uma geração que talvez não seja a sua, mas é.