Helloween – Gambling With the Devil

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Oficialmente, o Helloween é uma das minhas bandas preferidas. Além de terem sido uma das primeiras representantes do Metal que conheci, os Keepers foram importantíssimos para que eu fosse racionalmente convencido de que não era necessário ser mau para ser Metal. Afinal, os discos supracitados são tão felizes, tão fofinhos, positivos e bem-humorados, que é simplesmente impossível não ser contagiado por sua alegria.

Infelizmente, a banda teve mais baixos do que altos em sua carreira, culminando naquele disco “mamãe, quero ser o Black Sabbath” chamado The Dark Ride. Só que o Helloween não tem que ser a ex-banda do Ozzy. Na verdade, eles têm é ser completamente o oposto, ficar bem longe disso. O problema é que, mesmo nesses casos, eles têm sérias dificuldades para lançar discos bons e, verdade seja dita, não gosto de nenhum álbum da banda como um todo desde o The Time of the Oath. E, cara, já faz mais de 10 anos desde que esse aí chegou às lojas. Se tem uma banda de Metal que pode se dar ao luxo de ser engraçada, bonitinha, alegre e comercial, essa banda é justamente o Helloween. Não entendo porque eles não seguem justamente esse caminho, visto que seus três melhores discos se encaixam completamente nessa descrição (me refiro aos Keepers e ao Master of the Rings).

Desde o Time, para mim, o Helloween tinha uma ou duas músicas geniais por álbum, outras que eu achava legalzinhas e um montão de composições deveras chatas, a maioria delas de autoria do Andi Deris. Não sou daqueles puristas que acha a voz de Andi horrível. Pelo contrário, acho que ele é um vocalista de mão cheia, preso na banda errada – afinal, sua voz é simplesmente perfeita para cantar Hard Rock, não Metal Melódico. Aliás, não por acaso, o álbum Master of the Rings, focado justamente no Hard, é um dos meus preferidos e o considero tão bom quanto os Keepers. Ou seja, o cara é um verdadeiro patinho feio da voz e muitas pessoas não percebem isso por serem incapazes de olhar além de um estilo.

Só que, como compositor, ele realmente deixa muito a dever e os últimos discos tinham, em seus tracklists, uma quantidade bem grande de músicas de sua autoria, enquanto Michael Weikath, o verdadeiro criador das composições tipicamente Helloween, aquelas que tinham melodias que lembravam até músicas infantis de tão fofinhas, normalmente se limita a escrever uma ou duas – não raro os grandes destaques do álbum.

Por tudo isso que digo acima, comprei o Gambling With The Devil versão dupla por pura obrigação de colecionador, crente que não o ouviria com mais freqüência do que o Rabbit Don’t Come Easy ou qualquer coisa do catálogo pós-96 da banda. Quando o pacote chegou, imediatamente coloquei o segundo disco no meu computador para ouvir as duas faixas bônus enquanto terminava o trabalho do dia. E, sinceramente, palavras não podem descrever a minha surpresa, então comecemos nosso faixa a faixa justamente por elas:

Find My Freedom: Um típico Heavy Metal germânico. Não tão alegre quanto o Helloween clássico, mas lembrando bastante bandas como o Gamma Ray. Pesada, vigorosa e empolgante.

See the Night: Essa já tem bem a cara do Helloween fase Andi Deris e lembra bastante as melhores faixas do The Time of the Oath ou do Better Than Raw. Gosto mais da Find My Freedom, mas se você é um dos fãs que gosta dos álbuns mais puramente Metal da banda, como os dois supracitados, vai pirar o cabeção aqui.

O disco bônus ainda traz, de acordo com a caixinha, o clipe de As Long as I Fall e um making of do álbum, mas nenhum dos dois rodou no meu computador, sabe-se lá o porquê. Essas duas faixas realmente criaram expectativas para o que estaria presente no álbum em si, mas o meu lado racional ainda estava meio desconfiado. Afinal, o Helloween tem tradição de jogar fora músicas maravilhosas como The Madness of the Crowds (bônus da versão japonesa do The Dark Ride) ou Livin’ Ain’t No Crime (da época dos Keepers). Assim, logo que tive um tempinho, coloquei o disco propriamente dito para ver se ele me surpreenderia. E agora, lhe apresento o faixa a faixa de verdade:

Crack the Riddle: desde o Better Than Raw que a banda não lança uma introdução realmente legal. Gambling With the Devil mantém essa tradição, pois nada mais é do que uma narração completamente desnecessária, feita pelo Biff Byford, do Saxon. Agora alguém me responde: se você vai chamar o vocalista de outra banda para participar do seu disco, por que não deixá-lo cantar?

Kill It: a primeira faixa de verdade me deu uma primeira impressão péssima. O nome é feio e o refrão é mais feio ainda. Depois de ouví-la algumas vezes, contudo, continuo não gostando do refrão, mas hoje a música me agrada. Seu jeitão pesadão e com Andi se esgoelando nos vocais lembra bastante Push. Não é o que eu espero da abóbora germânica, mas é uma boa faixa.

The Saints: aqui sim temos o típico Helloween. A música já começa com as belas guitarrinhas cantantes que a banda havia praticamente abandonado desde a saída de Roland Grapow. A estrofe lembra a divertida Laudate Dominum, enquanto o refrão é daqueles tipicamente Helloween, para todo mundo cantar junto e com um sorrisão no rosto. São sete minutos do mais puro Metal germânico, sem nenhum trechinho lento de enrolação. Uma das melhores do disco.

As Long as I Fall: essa é a escolhida para o primeiro videoclipe e eu já falei aqui o que achei dela quando publiquei a notícia do dito-cujo. Ela tem toda a cara de composição do Andi Deris (dessa vez o encarte não especifica quem compôs o quê, dando créditos para a banda inteira por todas as músicas). A estrofe é arrastada e chata e o refrão é tão absurdamente parecido com Scorpions que eu sinceramente imagino o Klaus Meine cantando sempre que a ouço. Mas verdade seja dita, apesar do plágio/homenagem, o refrão é tão legal que acaba até salvando a música e me fazendo gostar dela. Só eliminaria completamente a estrofe. 😉

Paint A New World: se você estava sentindo falta de velocidade, pedais duplos e técnica apurada, é nesta música que você encontrará isso. Essa é outra que poderia estar no The Time of the Oath.

Final Fortune: assim que ouvi as primeiras notas do tecladinho que abre essa música, uma palavra me veio à mente: “Farofa”. Essa idéia foi ainda mais reforçada quando, depois da introdução e antes da entrada do vocal, vem aquela tradicional paradinha só com o baixo. Finalmente, quando o vocal se uniu à guitarra ritmada, o pressentimento se tornou certeza. Final Fortune é a Metal Farofa do disco. Mas como já disse antes, se tem uma banda que realmente pode se dar ao luxo de fazer isso, é o Helloween e, não por acaso, essa é minha segunda preferida do álbum e representa exatamente o que eu espero de uma banda como eles.

The Bells of the 7 Hells: até aqui o disco estava bom demais para ser verdade. Como ele é verdade, aqui começa aquele tradicional “meio de álbum”, que reúne as piores faixas da bolacha. Esta, especificamente, tem o maior jeitão “olha como o Helloween também sabe ser mau” que a banda já usou no The Dark Ride e que, como todos nós sabemos, não dá certo.

Fallen To Pieces: essa é a balada. Mas não é uma balada tradicional, mas daquele jeitão que alterna trechos leves com outros bem pesados. Verdade seja dita, baladas nunca foram a especialidade do Helloween e, tirando In The Middle of a Heartbeat, We Got the Right e A Tale that Wasn’t Right, não me lembro de nenhuma outra que mereça ser citada. Esta, especificamente, é bem fraquinha, mas tem um trecho bem bonito depois do solo, lá pelos seus três minutos. É uma pena que esse trecho esteja escondido em uma música que eu dificilmente vou ouvir de novo depois de escrever essa resenha.

I.M.E.: o significado dessa sigla, I am me, lembra uma música do Twisted Sister (I am, I’m Me). Essa tem um jeitão Hard Rock do mau que definitivamente não me agrada e felizmente finaliza a trilogia de músicas chatas deste álbum. Se a banda tivesse deixado essas três para bônus e usado as duas do disco dois no tracklist oficial, esse poderia ser um disco quase perfeito e um grande candidato a ser agraciado com o Selo Delfiano Supremo.

Can Do It: depois do pior momento, vem a melhor do disco e uma das mais legais da história da banda, na minha opinião. É aquele tipo de composição alegre e deliciosamente comercial que os Keepers tinham de monte e que, depois disso, se tornou um sabor raro no mundo do Metal (e do Helloween), presente apenas em algumas poucas faixas, como Power. Can Do It é um Hard Rock com aquela tradicional bateria que pode ser acompanhada por palmas e um refrão deveras pegajoso, sobretudo a parte do “come on, come on, get on”. Sem falar na letra tão Happy, Happy Helloween que chega até a ser bobo, e digo isso da forma mais positiva possível, como Future World, manja? É uma pena que nenhuma banda de Metal hoje em dia tenha coragem para fazer um disco inteiro assim, simplesmente feliz e positivo.

Dreambound: seguir Can Do It definitivamente não é uma missão fácil. Ainda assim, Dreambound se dá bem. É um Metal divertido e bem feito, que também lembra bastante o Time of the Oath. Nada memorável, mas uma boa faixa.

Heaven Tells No Lies: eu adoro músicas que já começam com guitarrinhas cantando o refrão, e esse é o caso desta. Pegajosa e empolgante, fecha o disco em grande estilo, representando aquele mesmo estilo de Metal típico das abóboras germânicas, mais ou menos como The Saints.

Depois de ouvir Gambling With the Devil inteiro, a impressão que fica é que se trata quase de um reload do The Time of the Oath – e isso é positivo. Afinal, se a banda não vai mais fazer o Fofo Metal dos Keepers ou o Hard Rock fanfarrão do Master of the Rings, minha terceira opção seria o Metal com traços dos outros dois estilos que eles apresentaram no disco de 96 – e nunca mais desde então. Assim, me surpreendi bastante com este álbum e, se a banda realmente se mantiver por esse caminho, talvez eles voltem a merecer a posição no seleto rol das minhas bandas preferidas. Um álbum mais que recomendável, especialmente em sua versão dupla, que traz duas músicas extras que nunca deveriam ter sido excluídas.

E fica a pergunta: não é curioso que as duas músicas que mais gosto aqui sejam separadas pelas três que considero as piores? 😉

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