Três anos atrás, depois de muitos adiamentos, fomos brindados com The Stick of Truth, jogo baseado em South Park escrito e dublado pelos criadores do desenho, Matt Stone
Trey Parker
. O resultado foi um RPG simples, porém bastante autêntico, com visual, som e gameplay realmente dignos do programa de TV.

Na minha resenha da época, lembro de ter falado que o visual era perfeito e que não tinha como ser melhor nem em uma máquina mais avançada. Pois agora temos A Fenda que Abunda Força, de fato em uma nova geração de consoles. E quer saber? O visual continua perfeito.

South Park, Fenda, Delfos
É o visual do desenho, perfeitamente transportado para os games.

No Brasil, o jogo ainda vem dublado em português brasileiro com os mesmos atores que fazem as vozes no desenho. Nesta primeira campanha, eu optei por jogar com o som original, mas tenho toda a intenção de ver dublado também, e acredito que esteja tão bom quanto.

NÃO MEXA EM TIME QUE ESTÁ GANHANDO

A Ubisoft levou a sério a máxima acima. A Fenda que Abunda Força é basicamente uma nova história com as mesmas mecânicas de The Stick of Truth. Dá para contar nos dedos as diferenças, e até o próprio mapa é basicamente o mesmo.

Basicamente, temos duas novidades maiores. O sistema de combate permanece em turnos, mas agora envolve também movimentação em quadrantes. Assim, não basta escolher o ataque e em quem você deseja bater, também é necessário se movimentar e estar na distância correta para acertar o golpe. Isso significa que você pode gastar um turno apenas se movendo, sem conseguir atacar, e traz mais estratégia e interatividade ao combate.

South Park, Fenda, Delfos
Agora você precisa chegar perto antes de bater.

A outra mudança talvez seja a mais importante. Agora você tem uma flexibilidade absurda para escolher classes e poderes. Você começa escolhendo uma classe entre três opções, e pode trocar entre elas a hora que quiser, bastando conversar com o Cartman.

Porém, basta avançar um pouco na história que outras classes vão surgir e você poderá escolher mais delas, com a possibilidade de combinar os poderes que mais lhe apeteçam. Eventualmente, você será capaz de escolher qualquer poder entre todas as classes, sem limitação alguma, o que é bem diferente do primeiro, onde você escolhia a classe no início do jogo e não podia mais trocar.

Tirando essas pequenas diferenças, é basicamente o mesmo jogo com uma nova história. E isso é bom, porque…

A HISTÓRIA É BOA E MUITO ENGRAÇADA

Em The Stick of Truth, as crianças estavam brincando de um RPG mais tradicional, medieval. Agora elas estão brincando de super-heróis. Só que o interesse não é lutar pelos frascos e comprimidos, mas criar uma grande franquia e ganhar muito dinheiro.

South Park, Fenda, Delfos
O plano da franquia.

Mais importante do que o dinheiro, o real objetivo é impedir que a franquia rival ganhe mais fãs. Você começa o jogo se unindo ao grupo Coon and Friends, liderado pelo Cartman. Provavelmente você se lembra desse grupo e das identidades heroísticas dos garotos, uma vez que já apareceram muitas vezes no programa.

O time rival é o Freedom Pals, liderado pelo Doutor Timothy, que é o Timmy telepata e extremamente poderoso. Tão poderoso, aliás, que é o único dos meninos principais com quem você não vai poder jogar.

South Park, Fenda, Delfos
Eu estou lendo a sua mente agora. Você está pensando: TIMMY!

Gatos estão sumindo na cidade de South Park, e há um gato específico com uma recompensa de 100 dólares para quem o encontrar. Trata-se de dinheiro suficiente para levantar a franquia do chão, assim os dois grupos de heróis estão em uma guerra civil para ver quem consegue solucionar o mistério antes e faturar o prêmio.

BRINCADEIRA DE CRIANÇA

Uma coisa que dá muito charme e personalidade ao jogo é que tudo não passa de brincadeira de criança. Os personagens não são super-heróis de verdade, estão apenas brincando disso. Assim, rola várias coisas bonitinhas, como as brigas serem interrompidas para um carro passar ou mesmo horas em que você é brindado com ver as coisas da forma que elas veem.

South Park, Fenda, Delfos
Este é o Butters, em sua forma de Professor Chaos, por exemplo.

Isso deixa o jogo bem fofinho, colocando-o bem parecido com o programa, que sempre transitou entre o fofinho, o crítico e o escatológico. E, claro, há bastante coisa escatológica por aqui. O principal poder do seu herói, que é chamado de The Amazing Butthole, é peidar. Seus peidos são tão poderosos que conseguem rasgar a linha do espaço/tempo, além de federem pra caramba. Com certeza nosso heróis tem uma Fenda que Abunda Força.

South Park, Fenda, Delfos
À direita, como ele se vê. À esquerda, como é na vida real.

Este é o aspecto de South Park que nunca me agradou. Eu gosto do humor crítico e inteligente do desenho, mas eliminaria completamente as piadas com peidos, vômitos e coisas do tipo. Mas até aí, esta parece ser uma característica comum em humor nonsense. Até o todo-poderoso Monty Python costumava enveredar com frequência por este caminho.

South Park, Fenda, Delfos
O poderoso Capitão Diabetes.

O que acho curioso em South Park é que eles focam a divulgação totalmente neste aspecto (vide o nome do jogo), e acredito que tem muita gente que sequer sabe do lado mais inteligente e crítico que é a principal atração do desenho.

SOCIAL JUSTICE WARRIOR

No jogo, por exemplo, você pode definir totalmente a sexualidade do seu personagem. Quando você pôde criar um personagem transexual em um videogame? Pois é, aqui você pode. E não fica limitado a isso.

South Park, Fenda, Delfos
Que tal ter um personagem skoliosexual que não se conforma a gêneros?

O Diretor PC, que considero uma das melhores coisas das temporadas mais recentes, aparece no jogo para te ensinar as lições do Social Justice Warrior. Na prática, isso significa que você pode furar a fila e encher de porrada qualquer um que utilize de insultos que não sejam politicamente corretos. E depois você ainda recebe uma mensagem do Diretor explicando porque aquela microagressão não é aceitável.

Claro, nem todo o humor do jogo é político ou escatológico. Há muitas piadas que têm simplesmente o objetivo de fazer rir, e funcionam muito bem. Por exemplo, o jogo pega a estética da série de misturar algumas coisas com desenhos mais elaborados ou mesmo com coisas filmadas, e o estranhamento que isso causa arranca boas risadas.

South Park, Fenda, Delfos
Let’s fighting love!

REFERÊNCIAS A RODO

Há, claro, também muitas referências a piadas que já foram feitas na série. Algumas são legais, como os colecionáveis que são desenhos Yaoi fofinhos representando o amor entre Tweek e Craig.

South Park, Fenda, Delfos
Óun!

Outros já têm menos graça, pois são simplesmente piadas repetidas, que a gente já viu antes, como a participação do tal do Jared do Subway, que aqui vem como um chefe, mas repete a mesma piada de seu episódio.

Há também piadas que quase não são piadas, mas que são até meio tristes. Por exemplo, se você assiste ao programa, sabe que a família do Kenny é pobre. Pois em determinado momento você entra na casa dele e visita sua irmã, Karen, no quarto dela. O quarto não tem janelas, então a menina simplesmente desenhou uma janela com uma vista bonitinha em um pedaço de papel e colou na parede.

South Park, Fenda, Delfos
E é por este tipo de detalhe inteligente que South Park deveria ser conhecido.

Em geral, no entanto, o jogo tem um bom equilíbrio entre piadas novas e outras que são simplesmente fanservice, mas eu gostaria que em uma eventual segunda continuação, eles façam o roteiro como um novo episódio apenas, não tendo necessidade de ficar fazendo referências a todo momento.

BLACK LIVES MATTER

O jogo segue uma formulinha bem simples. Basicamente, durante o dia você explora a cidade, cumprindo algumas missões típicas de mundo aberto (vai ali, pega alguma coisa, traz de volta). É bem bacana, especialmente pelo visual extremamente autêntico. Você pode fazer compras na Raisins, ajudar a mãe do Cartman a dar “aulas particulares” para adultos e até mesmo assistir strippers artesanais na casa de cavalheiros local.

A parte mais chatinha disso já estava presente no jogo anterior, e só vai afetar você se for obsessivo como eu. Acontece que a cidade tem pequenas diferenças todo dia, e novas áreas que vão abrindo para serem exploradas. Isso significa que todo dia eu me via explorando o mapa inteiro novamente e isso não é tão legal depois da primeira vez.

South Park, Fenda, Delfos
#blacklivesmatter

O legal mesmo vem à noite, que é quando acontecem os dungeons. São missões mais roteirizadas e lineares e, rapaz, como elas são boas. Combinam exploração e ação em doses bastante equilibradas e são basicamente uma metralhadora de piadas.

Em um dos melhores momentos, você invade a fortaleza do Professor Chaos e rola um clima muito bacana de quadrinhos de super-heróis. Combine isso ao excelente personagem que é o Butters e seu alter-ego supervilão e terá a parte mais marcante de A Fenda que Abunda Força.

South Park, Fenda, Delfos
Completo com lutas contra os minions do Professor Chaos.

Entre outros momentos marcantes, você pode pedir a ajuda de Moisés, ajudar a mãe de um peixe gay a ir para o céu e até sair no pau com o Morgan Freeman. Vença e ganhe o troféu mais difícil do jogo.

South Park, Fenda, Delfos
Peidos sobre sardas.

SOUTH PARK: A FENDA QUE ABUNDA FORÇA

Basicamente, South Park: A Fenda que Abunda Força é um jogo perfeito no que se propõe. Eu sou fã do desenho, e me diverti horrores com ele. Admito que, por outro lado, quem não curte South Park encontrará pouco aqui que se destaca. Trata-se de um jogo para fãs, com tudo de bom que o desenho tem, acrescentado de interatividade a possibilidade de explorar South Park.

South Park, Fenda, Delfos
ET phone home!

Se você jogou The Stick of Truth, gostou e quer mais, pode comprar sem medo. Se você não jogou, mas curte o desenho, tenho uma excelente notícia. A cópia física de A Fenda que Abunda Força vem com um código para você baixar o The Stick of Truth remasterizado completo. O código vale só até 31 de janeiro de 2018, então se te interessa levar os dois jogos pelo preço de um, sugiro que você compre logo. Com certeza você não vai se arrepender.