Não se engane, apesar do título, de parte do elenco ser estrangeira e de ser quase todo falado em inglês, Soundtrack é um filme nacional. E um do qual nosso cinema necessita muito, saindo do lugar comum de produções mais comerciais e pobres tanto narrativa quanto tematicamente.

Ele é o primeiro longa de uma dupla que se utiliza da alcunha 300ml. Não consegui descobrir o nome verdadeiro dos caras, mas quem gosta de curtas-metragens certamente já viu o trabalho deles antes. Eles são responsáveis pelo curta Tarantino’s Mind (2006), que fez sucesso no circuito e virou cult. Ele também era estrelado pelo Selton Mello e pelo Seu Jorge, que aqui repetem a parceria.

No longa temos a história de Cris, um artista que vai para uma estação de pesquisas no Polo Sul com o intuito de, na desolada paisagem cercada de gelo por todos os lados, tirar autorretratos influenciados pelas músicas que estiver ouvindo no momento e depois montar uma exposição com as fotografias.

Seu companheiro de alojamento é Mark, um cientista inglês conduzindo pesquisas meteorológicas. Completam a equipe do lugar um chinês, um escandinavo e outro brasileiro, o Your George. Cris, obviamente, começa como o estranho no ninho, pois é o único lá que não é pesquisador e também é o único que não irá passar um grande período de tempo isolado do resto do mundo, visto que só irá ficar uma dúzia de dias.

Logo, a princípio ele não se integra tão bem com os novos companheiros, mas logo o isolamento do lugar, a solidão e a convivência farão com que eles passem a se entender melhor, ao mesmo tempo em que vamos tendo pistas do estado mental de cada um deles.

Eu realmente não me lembro de assistir a um filme nacional, ao menos não em anos recentes, com uma história tão introspectiva, onde aquilo que não é dito é muito mais importante do que o que é falado. Com uma história envolvendo relações humanas e estados psicológicos, mas sem diálogos e situações expositivas. Em suma, não é um filme com uma pegada popular, mas sem dúvida é algo que faz falta no cinema brasileiro.

Para falar a verdade, ele é tão diferente do que costuma ser produzido por aqui que me lembrou bem mais uma produção de nossos hermanos argentinos, que costumam ter bastante variedade estilística e temática. A gélida e bela ambientação no meio da neve também ajuda a passar essa sensação de que não parece um filme tupiniquim, embora o seja.

Também não deixa de ser irônico que, para um filme com este nome, a trilha sonora nem seja tão importante assim, tendo na realidade pouquíssimas músicas, e nenhuma digna de nota, durante toda sua duração.

Soundtrack não é um filme fácil e certamente não é para todos os públicos. Mas com certeza é algo que não se vê muito em nossa filmografia. É uma história que não segue caminhos óbvios, preferindo trilhas menos exploradas. Algo do qual precisamos bem mais em nosso cinema, e que, por isso mesmo, o torna um trabalho a ser visto.

REVER GERAL
Nota
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Carlos Cyrino
Formado em cinema (FAAP) e jornalismo (PUC-SP), também é escritor com um romance publicado (Espaços Desabitados, 2010) e muitos outros na gaveta esperando pela luz do dia. Além disso, trabalha com audiovisual. Adora filmes, HQs, livros e rock da vertente mais alternativa. Fez parte do DELFOS de 2005 a 2019.
soundtrack-e-o-tipo-de-filme-do-qual-o-cinema-nacional-precisa-desesperadamenteTítulo original: Soundtrack<br> País: Brasil<br> Ano: 2017<br> Gênero: Drama<br> Duração: 112 minutos<br> Distribuidora: Imagem<br> Direção: 300ml<br> Roteiro: 300ml<br> Elenco: Selton Mello, Seu Jorge e Ralph Ineson.