Saint Seiya Ômega

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Aviso: Esta resenha contém pequenos spoilers da primeira saga do animê. Continue a leitura por sua conta e risco.

Saint Seiya Ômega, a nova saga dos Cavaleiros do Zodíaco, chegou ao Japão com a proposta de contar a lenda dos defensores de Atena a uma nova geração de fãs de animê e, ao mesmo tempo, matar as saudades dos velhos e sempre fiéis fãs que acompanharam toda a trajetória dos cavaleiros de bronze.

Não há dúvidas que Seiya e seus amigos possuem um carisma enorme e uma história atemporal, mas, desta vez, o antigo cavaleiro de Pégaso sai de cena e dá lugar a Kouga e seus amigos. Eles têm a missão de proteger a deusa Atena da terrível ameaça de Marte, que se infiltrou no comando do Santuário e pretende destruir a Terra para dar lugar a um novo mundo, enquanto Seiya e os outros estão impossibilitados de lutar graças às suas feridas das trevas.

Será que os novos cavaleiros de bronze, Souma de Leão Menor, Ryuho de Dragão, Yuna de Águia, Haruto de Lobo, Éden de Órion e Kouga de Pégaso estarão à altura dos antigos defensores da deusa? Atendendo aos pedidos, aí vai a nossa resenha de Saint Seiya Ômega!

UMA NOVA SAGA COM CARA DE REMAKE

A primeira impressão que Ômega passou para mim foi que a ideia inicial era de um remake. Afinal, diversas situações do mangá/animê original estavam presentes nesta saga: um torneio entre cavaleiros de bronze que é interrompido pelas forças do mal, a perseguição pelos cavaleiros de prata, a manipulação do santuário, e até mesmo a subida das doze casas. Todos os elementos clássicos da famosa Saga do Santuário do animê estavam lá. Até mesmo o vilão, Marte, parecia querer fazer referência ao vilão da primeira Saga do Santuário, que era chamado de Mestre Ares (Ares, para quem não sabe, é a contrapartida grega do deus Marte da mitologia romana).

Talvez a ideia original fosse realmente um remake, porém os fãs saudosistas dos antigos cavaleiros provavelmente torceriam o nariz para qualquer mudança que fosse feita, o que pode ter feito os produtores optarem por apresentar uma nova leva de cavaleiros de bronze ao grande público (e de quebra abrir a possibilidade de faturar com novos bonequinhos). Com a desculpa de que “a história sempre se repete através dos tempos”, que sempre foi colocada no animê, eles tiveram então carta branca para refazer os passos dos heróis da série clássica ao seu jeito.

É claro que, além das diferenças claras dos protagonistas, a saga segue seus próprios rumos em alguns momentos. O torneio disputado entre os cavaleiros de bronze desta vez, por exemplo, não vale uma armadura de ouro, mas sim uma de prata, afinal, não está fácil para ninguém, não é mesmo? Você sabe que a Grécia anda em crise. Os cavaleiros de prata parecem ainda mais incompetentes e outras pequenas diferenças vão surgindo no decorrer da história mas, no geral, a sensação é de um grande deja vu.

Isto poderia, na verdade, ser um grande elogio, se tivessem aproveitado o potencial da antiga saga e corrigido alguns tropeços, mas com as várias mancadas dadas pelos roteiristas, a saga deixou ainda mais furos do que a antecessora.

IDEIAS DE OURO, RESULTADOS DE BRONZE

Como já dito, Ômega chegou ao Japão com uma proposta de apresentar os guardiões de Atena a um novo público. Por isso, muitos elementos comuns a animês que estão fazendo sucesso atualmente na terra do sol nascente foram incorporados ao universo de CDZ. Um bom exemplo é o cenário escolar em que se inicia a saga. Com a desculpa de que Atena criou uma escola para treinar os cavaleiros, o início da série mostra os cavaleiros interagindo com um ambiente escolar, aguentando professores, colegas malas e outras coisas da vida corriqueira da época que a gente batia tazo no recreio. Claramente a intenção foi aproximar os personagens da realidade das crianças. Outro elemento inserido foi uma protagonista feminina, também claramente com a intenção de atrair o público feminino.

Estes elementos não chegam a incomodar, mas o calo aperta quando a coisa começa a se tornar forçada demais. Por exemplo, o personagem Haruto de Lobo, o “cavaleiro ninja”. Não é preciso ser nenhum gênio para descobrir em quem este personagem foi inspirado. Apesar de não ter nenhuma semelhança em termos de personalidade com o garotinho da raposa de nove caudas, dá para perceber que a inserção do personagem e seus poderes claramente querem pegar carona no sucesso do ninja laranja. E se você não percebeu ainda, a imitação é tão descarada que eles não tiveram nem o trabalho de inventar um nome original para o ninja, e só trocaram o “N” pelo “H”!

Outro elemento descaradamente plagiado é a do “herói que convive com o mal dentro de si”. Copiado de protagonistas como Naruto e Ichigo (de Bleach), entre outros, Kouga de Pégaso tem que conviver com seu cosmo da escuridão e controlá-lo. E, assim como nos exemplos anteriores, este poder maligno é extremamente sedutor por dar a ele um poder enorme.

E por falar em cosmo da escuridão, outra inserção foi a dos elementos no cosmo. Assim como os Pokémons, agora cada cavaleiro tem um elemento que o representa. A ideia até tinha algum potencial, se não tivesse sido simplesmente abandonada no meio do animê, sem motivo algum, e parecer totalmente sem sentido na fase final da saga. Nenhuma luta é decidida por conta do elemento de um cavaleiro, o que torna a ideia jogada e totalmente desnecessária. Tanto é que na fase final, das doze casas, nem é falado quais são os elementos de cada cavaleiro de ouro, e fica difícil distinguir pelos seus golpes.

A impressão por trás disso é que os produtores forçaram a barra, e quiseram fazer da série uma salada de todos os clichês que vêm dando certo nos animês da concorrência, atribuindo-os universo CDZ. O resultado final não foi o esperado, e eles foram abandonando as coisas pelo caminho sem nenhuma explicação.

Outras ideias interessantes, como os templos de cada elemento, acabam se tornando também meras passagens sem relevância, protegidas por cavaleiros sem qualquer carisma. Para se ter uma ideia, em um dos templos, os cavaleiros chegam para lutar contra um cavaleiro de prata que controla golems de pedra. O poder é interessante e o adversário parece ter um bom apelo. Eis que, quando os cavaleiros chegam até ele, ele simplesmente diz que não se interessa em lutar com eles, e que quer apenas fazer suas “obras de arte”. Então o personagem vira as costas e vai embora. Você pensa: “ok, ele vai voltar mais tarde na maior pintudice para se vingar”. Não, delfonauta, ele não volta, ele simplesmente vai embora. Esta sensação de decepção ilustra bem muitos momentos do animê, onde você até tenta se empolgar, mas no final acaba apenas se iludindo.

OS NOVOS DEFENSORES DE ATENA

Mas se Os Cavaleiros do Zodíaco nunca foi marcado por histórias geniais, o grande barato da trama ficava por conta dos protagonistas. Todos os fãs têm seu preferido e seu odiado, e quem nunca brincou com os amiguinhos de cavaleiro e brigou para ser o Shiryu/Hyoga/Ikki e se negou veementemente a ser o Seiya ou o Shun? Os novos cavaleiros tinham, portanto, uma tarefa difícil e, infelizmente, não conseguiram superar seus antecessores. E não foi por falta de tentativa.

Os personagens são desenvolvidos, todos têm uma trama própria e flashbacks. Mas eis a prova que flashbacks e histórias de infância triste não tornam nenhum personagem amado. Os cavaleiros simplesmente não têm carisma, salvo talvez Yuna, que tem uma personalidade mais forte. Souma, Haruto e Ryuho são tão dispensáveis que são totalmente esquecidos na parte final da saga, servindo apenas de saco de pancadas.

Dá para dizer que o Leão Menor e o Lobo tiveram participações tão relevantes na luta final quanto seus antecessores Ban e Nachi. Já Ryuho é uma decepção para o papai Shiryu, até porque não tira a camisa em nenhum momento nem fura os olhos. Você acredita que ele enfrentou o cavaleiro de Perseu e usou a inteligência para vencer o combate? É isso mesmo, nem um olho furado. Absurdo!

Alguns vilões até parecem mais interessantes, a ponto de você pensar friamente “quem são os mocinhos mesmo?”. Os mais pessimistas então, desses que têm ódio pela humanidade, certamente vão torcer para Marte “limpar” a Terra e construir uma novinha em folha.

É engraçado pensar o quanto, apesar de extremamente caricatos, os antigos cavaleiros conseguiam, mesmo assim, ser mais humanos. Nós simplesmente nos apaixonávamos por aqueles arquétipos e torcíamos por cada um ou por pelo menos um deles. Já aqui, a identificação não acontece, e você simplesmente pouco se importa com cada um. Talvez a que mais inspire simpatia seja a pequena Aria, com sua pureza e simplicidade.E nem irei entrar no mérito dos péssimos cavaleiros de ouro. Só digo que senti saudades até mesmo do Afrodite.

TEM SEMPRE ALGUÉM NO COSMO AJUDANDO UM CAVALEIRO A VENCER

Se os novatos não brilham, grande parte da empolgação fica por conta das aparições dos cavaleiros antigos. Shun, Hyoga, Shiryu, Jabu e, é claro, Seiya, aparecem esporadicamente mas, para os fãs antigos da série, certamente são os momentos em que os sorrisos saem mais facilmente. E Ikki não aparece em toda a primeira saga. Ele provavelmente leu o roteiro, queimou-o de ódio com seu cosmo e preferiu ficar na Ilha da Rainha da Morte a ter que encarar essa.

Todos eles estão marcados pelas feridas das trevas (com exceção de Jabu), e não podem lutar. Mesmo assim, quando os veteranos aparecem na tela, não tem como não ser tomado pela nostalgia e vibrar.

Ao mesmo tempo em que os antigos cavaleiros dão uma forcinha aos novatos, os roteiristas parecem ter esquecido muitas coisas que foram estabelecidas nas antigas sagas, e muitas perguntas são deixadas sem resposta, além de muitas contradições com a cronologia original, que acabam incomodando os fãs de longa data.

Tudo acaba ficando confuso, a começar pelas nomeações dos cavaleiros. Afinal, o cavaleiro não vinha destinado por sua estrela a se tornar portador de sua armadura desdeo seu nascimento? Porque Seiya foi promovido a cavaleiro de ouro? Porque seus companheiros não? Até no Santuário dormir com o chefe continua sendo a melhor maneira de ganhar uma promoção? Como podem existir dois cavaleiros de Pégaso na mesma geração? E por que diabos a armadura de Águia agora é de bronze?

Em outros pontos, logo no início da saga, os roteiristas arriscam algumas explicações, como a da mudança das armaduras, e dão a entender que tudo vai ser melhor explicado e fará sentido no final. Porém, a promessa não se cumpre, e parece que eles entraram num clima de “deixe por isso mesmo”. A origem de Aria e Kouga, citando outro exemplo, é totalmente vago.

Já outras perguntas são respondidas com um pouco de fé e boa vontade. Por exemplo, como os cavaleiros terem sido transportados da casa de touro para as casas seguintes. Podemos dizer que era um novo Santuário, sem a proteção de Atena, mas por que então Kiki não teleportou logo os cavaleiros de bronze para frente de Marte ou não foi ele mesmo enfrentá-lo? Por que Yuna pode deixar de usar a máscara, além do motivo óbvio de tê-la como um apelo sexual? A explicação do motivo para ela poder quebrar as regras tenta soar poética e até como um grito feminista, mas ainda assim fere as regras estabelecidas na história como um todo.

Tudo bem, você pode dizer que a série clássica também tinha muitos furos e muitos erros, e você tem toda a razão. Mas nós não esperamos que uma nova saga cometa os mesmos erros e contradiga pontos estabelecidos pela antiga. Nossa vontade era de ver vários furos resolvidos, e não o contrário. Além do mais, diferentemente da anterior, os furos não acontecem para dar dinâmica à história. Os furos parecem acontecer por puro descuido dos roteiristas, que sofrem da famosa síndrome de Lost: jogam várias perguntas no ar e dão poucas respostas, com o agravante de que a maioria das respostas parecer ter motivações externas à história, como a necessidade de agradar um público feminino ou vender brinquedos.

ME DÊ SUA FORÇA, PÉGASO! (PRA AGUENTAR ATÉ O FIM)

Furos, personagens desinteressantes, ideias boas mal aproveitadas, cópias descaradas e lutas previsíveis e monótonas. Saint Seiya Ômega, infelizmente, não faz jus ao que representam os defensores de Atena para seus antigos fãs. No entanto, aparentemente a série tem agradado aos novatos, pois já iniciou sua segunda grande saga que, diga-se de passagem, já começou me dando calafrios, com a volta dos cavaleiros de aço. Para piorar, a armadura de Pégaso se regenera sozinha, sem nem um pingo se sangue ou pó de estrela, só com o elevar do cosmo, em um passe de mágica.

É uma pena ver que séries muito mais bem escritas e relevantes para a história de CDZ, como o Episódio G ou Lost Canvas, nunca ganharam uma versão animada ou foram canceladas.

Se você é um antigo fã procurando por novas aventuras, recomendo que recorra aos mangás de Lost Canvas e Episódio G, e assista Ômega somente se estiver curioso e queira rever alguns velhos cavaleiros que dão as caras. Afinal de contas, esta saga não foi feita pensando em você. Agora, se você estiver curioso para ter um primeiro contato com a saga dos defensores de Atena e tem mais de 12 anos, comece por outro lugar.

Saint Seiya Ômega está para a série clássica assim como Dragon Ball GT está para Dragon Ball Z: é melhor fingir que não existe.