Minha relação com Call of Duty, série da qual Black Ops 6 faz parte, sempre foi politicamente complicada. Mas recentemente ela também se tornou complicada em seu lado lúdico. Isso porque apesar de politicamente nojentos, o passado recente das campanhas foi fantástico. Todo ano, a série era responsável por apresentar jogos de ação altamente roteirizados e cheios de adrenalina, culminando nesta frase tirada do meu review de Vanguard: “Eu terminava uma fase pensando comigo mesmo ‘certamente a próxima não será melhor que essa’. Mas era!”.
E daí tudo isso foi jogado fora com o terrível Modern Warfare III lançado ano passado. A série Modern Warfare sempre apresentou Call of Duty em seu lado político mais nojento. Mas as duas campanhas anteriores eram fantásticas. Modern Warfare 3, no entanto, tinha de longe a pior campanha da série, e conseguiu a façanha de ser um dos piores jogos de 2023. Assim, Black Ops 6 tinha muito a provar. Será que restauraria a glória de outrora? Ou será que, após a compra da Microsoft, a campanha se perderia em meio a mundo aberto e microtransações? Antes de falar sobre o jogo em si, no entanto, quero falar sobre um sinal desta consolidação.
REVIEW: CALL OF DUTY LAUNCHER
Assim como ano passado, Black Ops 6 está dentro de um app chamado Call of Duty, que é basicamente um launcher. Este launcher inclui como jogo principal Modern Warfare II e como DLC Modern Warfare, Modern Warfare III, Black Ops 6, Vanguard e Black Ops Cold War. Isso significa que, como Modern Warfare 3, Black Ops 6 sai como DLC, sem uma platina e sem ser considerado um jogo completo, embora custe preço cheio. Também significa que você é obrigado a baixar um monte de porcaria que não vai usar.
A experiência de usar o launcher é péssima. Toda vez que você o inicia, ele pede para ser reiniciado por causa de um update. Pois é, cada vez que você abrir o app, apesar de ele ter acabado de iniciar, pede um reinício. É preciso abrir Call of Duty Launcher duas vezes antes de poder fazer qualquer coisa com ele. E daí você precisa escolher o jogo. E absolutamente nada faz sentido.
ABSOLUTAMENTE NADA FAZ SENTIDO
Por exemplo, se eu clico em jogar Vanguard ou Cold War, ele me leva para uma tela da loja me cobrando dez dólares por cada jogo. Isso apesar de eu estar logado na mesma conta que tem os dois jogos, e poder instalá-los e jogá-los sem problemas fora do launcher. Basicamente, estes 10 dólares parecem ser uma “taxa de conveniência” para eu poder jogá-los dentro do outro jogo.
Da mesma forma, ao iniciar Black Ops 6 de dentro do launcher (o que é a única opção para jogá-lo), ele me mostra três opções. Multiplayer, zumbis e campanha. Escolher zumbis me manda para uma tela de compra da PS Plus. Quando me recuso a pagar extra, ele fala “se não pagar, vai ter que jogar off-line”. Aceito, mas a parte de zumbis simplesmente não funciona. Ao escolher jogar off-line, ele abre a campanha de Modern Warfare II (???). Eu joguei zumbis em single player no passado e até fiz resenhas deste modo aqui no DELFOS, mas em Black Ops 6 parece que só funciona se você assinar a Plus, o que eu não tenho intenções de fazer de novo no futuro.
O launcher de Call of Duty não acrescenta absolutamente nada à experiência. Apenas deixa mais confuso escolher seu jogo, faz com que não exista mais platina e muitas vezes fica simplesmente quebrado e não funcional. É a definição de um tiro no próprio pé, e espero que a Activision/Microsoft repense isso no futuro. Agora vamos falar do jogo.
REVIEW CALL OF DUTY BLACK OPS 6
Depois daquela campanha péssima e apressada de Modern Warfare III, eu sinceramente esperava um retorno glorioso. Mas não é o caso. A campanha de Black Ops 6 é certamente boa. Mas é também a mais fraca que a série já fez, com a única exceção de Modern Warfare III. Por um lado isso é um elogio. Afinal, ainda vale a pena jogar, e ela só parece fraca pela absurda qualidade que as campanhas costumam ter. Por outro, ela é muito mais fraca do que esperava.
Quando é tipicamente Call of Duty é sensacional. Você se infiltra em festas da alta sociedade, usa de furtividade, se alterna entre vários personagens. Eventualmente, tudo vira uma ação desenfreada, com tanques, perseguições de veículos e explosões a rodo. Várias das fases de Black Ops 6 me colocaram um largo sorriso no rosto quando terminaram.
MAS VÁRIAS FORAM EXATAMENTE O CONTRÁRIO
Especialmente lá no meio da campanha, tem um trio de fases absurdamente sofrido. A primeira delas é um total mundo aberto. Você tem um jipe e três objetivos para avançar. Mas há também 18 objetivos opcionais. Estes são coisas totalmente sem graça, do tipo dirigir até o waypoint e abrir uma caixa, ou limpar um acampamento inimigo. Se quiser limpar tudo, você vai perder umas boas duas ou três horas nessa fase, e nenhum, absolutamente nenhum, desses objetivos me fez sorrir.
A quantidade de sidemissions que você cumpre determina seus super ataques na fase linear seguinte, que é um ataque ao palácio de Saddam Hussein. Sim, o jogo usa personagens históricos reais, como Saddam ou o ex-presidente dos EUA Bill Clinton, que inclusive aparece aqui. Estes ataques são bacanas e funcionam com cooldown. São coisas como usar um bombardeio de avião ou chamar um helicóptero para metralhar geral. Ajuda pacas, mas convenhamos, investir duas horas para destravar um super ataque que você vai usar duas ou três vezes em uma única fase e depois desaparece totalmente não é respeitar meu tempo.
DESRESPEITO AO TEMPO
Logo em seguida, você entra em uma outra fase com um mapa. Mas esta é mais próxima de um Bioshock do que de um Far Cry 6. Basicamente, é um prédio com várias salas e você precisa entrar em todas elas e matar um chefe “esponja de balas” em cada uma. É bem chato, mas fica ainda mais chato pela fase ser uma alucinação e os inimigos serem zumbis e monstros.
A que mais me incomodou foi a seguinte. Uma missão de stealth com instafail em que você não pode matar, distrair ou fazer qualquer coisa com os guardas além de evitá-los. Eu fiquei travado em um checkpoint por muito tempo. Meu objetivo era esperar o guarda passar, entrar na porta da imagem acima, esperar ele voltar, e resolver um quebra-cabeças no computador antes de ser visto. Aí deveria ter um novo checkpoint. Não tinha.
O que acontecia é que depois de resolver o quebra-cabeça, os guardas ficavam alertas e passavam a me caçar. Eu precisava evitá-los para sair da sala. E eu sempre era visto. Bum! Instafail! Ficar esperando o guarda se mover duas vezes e resolver o quebra-cabeças de novo a cada nova tentativa me custou um tempo que não tenho e uma paciência que o jogo já tinha queimado com as duas fases anteriores. Sabe aquela sensação do Vanguard em que uma fase é melhor que a outra? Depois disso, eu nunca mais sabia se a próxima fase de Black Ops 6 seria legal ou agravante. Os três capítulos em questão devem responder sozinhos pela metade do tempo da campanha, então apesar de serem os piores de fato, eles exigem muito do seu tempo para poder ver o resto.
A CAMPANHA DE BLACK OPS 6
A campanha de Modern Warfare 3 começava muito bem, mas depois que começava a feder, nunca mais se recuperava. A de Black Ops 6 é melhor tunada. O meio dela é absurdamente chato e arrastado, mas o que vem antes e depois é realmente bom, e traz várias boas ideias, embora às vezes volte a feder (como na segunda fase “alucinógena”, perto do final do jogo). Até mesmo o hub é bacana. Nele, os personagens conversam e seguem um roteiro e você fica livre para se mover pela casa e assistir à cena que quiser. Lembrou-me de uma peça imersiva que vi em São Paulo há alguns meses, em que várias cenas acontecem ao mesmo tempo e você escolhe a qual assistir. Achei bem bacana ver isso num videogame.
O visual também é simplesmente fantástico. Apesar de curta, toda a campanha tem valores de produção altíssimos, com personagens humanos fora do uncanny valley e com animações realmente realistas e marcantes. Todo o jogo parece caro demais, com um nível de polimento, cuidado e talento que quase não se vê mais nos games de hoje em dia.
A HISTÓRIA DE BLACK OPS 6
Black Ops 6 é uma história independente, mas traz de volta personagens, situações e lugares que estavam em Black Ops Cold War. Diante das campanhas recentes de Call of Duty, diria que esta é uma das menos nojentas. Os protagonistas são personagens que descobriram que os EUA não estavam sendo éticos (surpresa, surpresa, Gaza que o diga) e resolvem desafiar o governo para revelar a conspiração. É bem Black Ops, já que os soldados realmente não são bancados pelo governo.
Durante muitos anos, a campanha de Call of Duty esteve entre meus jogos de ação de alto orçamento preferidos. Black Ops 6 não se reergue gloriosamente do tropeço pateta do ano passado. Mas também não volta a cair. Está de pé, mas cambaleando, e ninguém sabe o que esperar do futuro. Só o Pai Tempo vai dizer o que vai acontecer nessa história. Será que Call of Duty 2025 vai ter uma campanha fedegosa, uma excelente ou se pá nem campanha vai ter? A resposta, neste momento, está envolta em uma neblina de guerra. Ao contrário do nosso financiamento coletivo, que está no Apoia.se a todo vapor.