Saudações, leitores deste site nefasto. Considerando vossas tentativas desesperadas e infrutíferas de descobrir minha verdadeira identidade, conceder-lhes-ei, com a benevolência que me é característica, algumas partes de minha imaculada biografia. Como sois habituados a ler historinhas, far-lhes-ei uma narração nos moldes daquilo que tanto lhes agrada.
Durante os obscuros anos 60, a América Latina vivia tomada por tenebrosos regimes ditatoriais, muito parecidos com aquilo que defende este jovem Senhor Corrales. Meu pai, então um audacioso universitário colombiano, engajou-se gloriosamente na luta pelos ideais libertários esquerdistas defendidos pelos verdadeiros heróis da liberdade da América Latina (não, senhores, não estou falando dos seus ídolos de cuequinhas vermelhas por fora da calça). Homens que pegaram em armas em nome da liberdade. Que liam Karl Marx, não Stan Lee. Que não temiam adentrar as selvas tropicais e nelas combater as obscuras forças imperialistas norte-americanas que assolavam nosso continente com suas latinhas de refrigerantes e música Rock’n’Roll.
Pois bem. Esse jovem guerrilheiro colombiano conheceu nos altiplanos bolivianos uma jovem camponesa plantadora de coca. E, ao contrário dos romances pornográficos dos filminhos hollywoodianos que vocês tanto adoram, aqueles jovens apaixonados firmaram um pacto eterno de lealdade, fidelidade e, acima de tudo, de lutar pelos miseráveis indefesos da América Latina.
No entanto, senhores, as obscuras forças do mal prevaleceram. Se hoje sois bombardeados e seduzidos pela cultura consumista de revistinhas em quadrinhos, cinemas multiplex, games violentos e todo o linguajar “norte-americanês”, saibam que meus pais e seus companheiros lutaram arduamente contra tudo isso. Lamentavelmente, foram derrotados. Perseguidos, fugiram para o interior da Argentina. E foi lá, meus caros, em meados da década de 60, que nasci num pequeno vilarejo chamado Los Embusteros. E, em homenagem aos verdadeiros heróis latino-americanos da liberdade, moral e retidão, fui batizado Emiliano Ernesto la Marca. Regozijem-se, senhores. Agora sabeis meu verdadeiro nome, minha idade e minha nacionalidade. Certamente já estão imaginando como retaliar-me fisicamente.
Pois bem. Desde muito pequeno, em minha comunidade, revelei seguir os passos dos verdadeiros ideais libertários da moral e bons costumes. Recusei-me desde sempre a aderir àquelas brincadeiras que exacerbam a sexualidade infantil. Jamais aderi aos jogos pervertidos de esconde-esconde, de “brincar de médico”, pega-pega ou gato mia. Por isso, inadvertidos leitores desse DELFOS, recebi ainda muito jovem a alcunha de el martelito de Dios. Passei toda a minha infância e adolescência no interior do mais belo país da América Latina: a Argentina. Li todos os manuais libertários de meus pais, segui todos seus conselhos e aprendi a tocar zampoña.
Foi então que, como acontece somente aos verdadeiros heróis e àqueles que lutam pela decência, o acaso beneficiou-me. Recebi de meu avô materno um bem sucedido comerciante do ramo da coca boliviano, a herança e a confiança para administrar seus bem-sucedidos e idôneos negócios. Obtive, assim, a tranqüilidade financeira para disseminar a moral e a decência pelas Américas. Para viajar pelos bolsões de miséria criados pelo massacrante capital internacional das mega-corporações. Para conhecer Cuba (Viva Fidel)! Para conhecer o México (Viva os espetaculares Mariachis!). Para conhecer o Brasil e o incrível carnaval de Salvador! Para conhecer meus inimigos. Para ir ao cinema e presenciar as horríveis mensagens pregadas pela defenestrável sétima arte. Para adquirir os discos dos conjuntos musicais de Rock Pauleira compostos por falsos profetas que, contraditoriamente cantam a liberdade e a paz enquanto estimulam a violência.
Sim, senhores. Tenho uma vida normal. Leio suas revistinhas, vou aos cinemas, ouço sua música caótica, conheço os seus games infernais. Conheça seus inimigos, é o primeiro passo de qualquer guerrilha. E eu conheço aqueles que combato, meus inimigos: os nerds, os metaleiros e demais fãs de música pauleira.
No entanto, também tenho meus prazeres. Gosto de futebol. Ocasionalmente, vou aos jogos do invencível Boca Juniors e integro a mais fabulosa torcida existente no mundo: os espetaculares barrabravas. Tenho meus ídolos que, ao contrário daqueles que vocês tanto idolatram, são exemplos de integridade e inspiradores de bons comportamentos. Exemplos como o maior atleta de todos os tempos, aquele que se tornou, com suas estupendas jogadas, o mestre por excelência: Diego Armando Maradona. Prova disso é que esse senhor iluminado recebeu ajuda da própria “mão-de-Deus” no mais espetacular lance da história dos esportes. Se isso não é prova de sua divindade, não sei o que é.
Pois bem, cá estou, senhores. Não temo ser ridicularizado. Sei que inúmeros cidadãos de bem compartilham de meus ideais. Não sou um comediante, ou uma farsa desse sítio de infames idólatras. Sim, conheço a letra da musiquinha Future World. Sei o que combato. Ficarão surpresos com meus conhecimentos acerca de suas preferências pecaminosas. E se esse ousado jovem jornalista Senhor Corrales permitir-me, uma vez mais farei uso de seu espaço para conduzir internautas ao bom caminho. O caminho sem diferenças de opiniões, moças sensuais ou Rock Pauleira. O caminho guiado pela mão de Deus, a tortuosa escada para o céu, bem longe da estrada para o inferno onde vocês se encontram.