Como eu já havia dito antes, eu não botava muita fé no projeto Graphic MSP, que convidava vários artistas, dos mais distintos estilos, para criar histórias estreladas pelos personagens do Maurício de Sousa com uma nova roupagem.
Porém, quando eu botei minhas mãos em uma das edições do projeto, minha opinião mudou completamente e hoje eu sinceramente acho que esta foi uma das melhores ideias do mercado editorial brasileiro dos últimos tempos e, desde então, venho acompanhando o projeto com uma grande ansiedade e expectativa.
Piteco: Ingá é a quarta edição sob o selo Graphic MSP, escrita e ilustrada pelas mãos de Shiko, um artista paraibano que já ganhou até mesmo um troféu HQ Mix por sua obra independente, Blue Note. Este também é o capítulo que fecha, magistralmente, a primeira fase do projeto Graphic MSP.
FROM THE DAWN OF TIME, A HERO SHALL RISE
Uma das coisas mais interessantes sobre a obra é que ela é realmente uma releitura do personagem, em todos os sentidos da palavra. Diferente de Laços e Pavor Espaciar , em que os personagens ganhavam uma nova aparência mas mantinham suas personalidades, em Ingá vemos protagonistas muito diferentes e mais heroicos do que estamos acostumados a ver nos gibis.
Outra coisa que vale destacar é que a fonte de inspiração da trama foi a Pedra do Ingá, um monumento arqueológico brasileiro cheio de desenhos rupestres, localizado na Paraíba, a terra natal do autor.
A história começa com Thuga, a xamã e líder espiritual do povo de Lem, uma tribo que vive no Brasil pré-histórico, explicando a seus conterrâneos que o rio que sustenta a tribo e sua agricultura está secando e eles devem partir em busca de um novo lar, próximo a um outro rio. Acontece que na noite anterior à migração, alguns membros da tribo dos Homens-Tigre raptam a xamã.
Preocupado com a moçoila, Piteco, um mero caçador da tribo, parte no encalço dos sequestradores, auxiliado por seus amigos Beleléu, um atrapalhado e criativo inventor, e Ogra, a única mulher guerreira de Lem. Porém, a jornada não será tão fácil, pois entre o grupo de aventureiros e sua amiga, encontram-se animais ferozes e famintos, os cavaleiros de Thulsa Doom membros da Tribo de Ur, feiticeiros malignos e deuses vingativos. Em outras palavras, Ingá é um conto épico no melhor estilo sword and sorcery (ou “fantasia heroica, se você preferir), com direito a muita pancadaria e misticismo, no melhor estilo Conan, o Bárbaro, mas sem os peitos de fora.
RIQUEZA SELVAGEM
A arte da obra é um show à parte, com destaque para a coloração feita em aquarela, que por si só já dá uma beleza única a obra. Os personagens são bastante expressivos e os cenários pelos quais eles passam, incluindo campos, florestas, praias e pântanos, são vívidos e detalhados, dando uma sensação de imensidão e selvageria.
As cenas de luta são desenhadas de uma forma tão natural e flexível que dá a impressão de que os lutadores estão realmente se movendo entre os quadros. As batalhas não são tão violentas ao ponto de ocorrerem desmembramentos, mas é possível ver vários ossos sendo quebrados e até uma pequena quantidade de sangue. Apesar disso, há alguns elementos bastante macabros espalhados pela história, incluindo caveiras, esqueletos e tronos de ossos. Os seres mitológicos, que fazem uma participação especial, são realmente de gelar a espinha.
A trama não possui muitas surpresas e, imagino eu, deve ser bastante previsível para quem já leu uma aventura do Conan ou mesmo jogou alguma campanha clássica de Dungeons & Dragons e demais RPGs de mesa. Mas isto não chega a ser um grande problema, pois o gênero sword and sorcery em si preza mais pela ação e pela pancadaria do que por uma trama bem elaborada, diferente de outras vertentes da fantasia.
Como já deve ter ficado claro, Piteco: Ingá é uma aventura belissimamente desenhada, cheia de testosterona e até mesmo um pouco de sentimento. É altamente recomendável para os fãs da boa pancadaria, aventuras pré-históricas, filmes e quadrinhos de fantasia dos anos 80 e, claro, do Manowar.
CURIOSIDADES:
– Você ficou triste quando eu mencionei que Ingá encerra a primeira fase do projeto MSP Graphic? Pois então alegre-se, delfonauta. No Fórum Internacional de Quadrinhos deste ano, o FIQ 2013, foi anunciada a segunda fase do projeto Graphic MSP, com histórias estreladas pelo Bidu, Papa-Capim, Turma da Mata, Penadinho e novas aventuras do Astronauta e da Turma da Mônica.
– Entre os diversos trabalhos anteriores do autor Shiko, está a adaptação em quadrinhos do romance O Quinze, de Rachel de Queiroz. A obra foi selecionada para o Programa Nacional Biblioteca da Escola, do Governo Federal, e pode ser encontrada em praticamente todas as escolas do país. Pelo menos na teoria.
– Na contracapa do álbum, há um pequeno texto escrito por Mike Deodato Jr., o desenhista paraibano que já se tornou uma lenda dos quadrinhos de super-herói, atualmente trabalhando para a Marvel Comics.
– O nome completo do Piteco é Pithecanthropus Erectus da Silva.
– Ao terminar de ler a história, eu fiquei com uma baita sensação de ter terminado de assistir a um episódio da clássica série Hércules. E como um fanático pela série, eu achei isso muito legal.
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