Sinceramente, amigo delfonauta, eu não tinha ideia do que esperar desse filme. Podia ser brega, clichê, moralista e religioso demais ou ir completamente pelo lado oposto e ser belo, filosófico e interessante. E sabe de uma coisa? Ele tem um pouco de todas essas características.
A sinopse, por si só, é deveras interessante. Se liga: baseado no livro homônimo de Chico Xavier, Nosso Lar conta a história do médico André Luiz (Renato Prieto) após a sua morte. Ele acorda no mundo espiritual e logo percebe que não está mais vivo. Agora ele vai aprender o caminho que todos devemos seguir após a transição, incluindo a cidade espiritual que dá nome ao longa e ao livro.
Embora eu não seja espírita e, até o momento dessa sessão, achava que André Luiz era o fundador de uma ONG, não dá para negar que o potencial filosófico dessa história é praticamente ilimitado.
Após um começo terrível e entediante, que deu vontade de levantar e fazer pipi na tela do cinema (mas eu não estava apertado o suficiente para fazer isso de forma gloriosa), o negócio finalmente engrena quando André Luiz é levado à cidade Nosso Lar e começa a aprender sobre a vida após a morte. E essa parte é bastante interessante, lembrando uma versão mais moralista e menos realista de Almas à Venda.
A parte boa culmina no reencontro do médico com sua mãe que, sem exagero, deve ser um dos melhores e mais emocionantes momentos da cinematografia tupiniquim.
Ajudando a deixar tudo ainda mais emocionante e os passeios pela cidade ainda mais empolgantes, temos uma belíssima trilha sonora, que não deixa nada a dever ao cinema estadunidense. O mesmo pode ser dito da cidade em si, que só não é mais linda por falta de espaço.
Infelizmente, o filme não se sustenta no topo por toda sua duração, pois logo aparece uma garota chamada Eloisa (Rosanne Mulholland Drive), que faz com que o longa se esqueça da filosofia e vire uma historinha genérica e clichê, típica do Steve Screenwriter.
Porém, o ponto mais grave mesmo, que tirou praticamente todos os Alfredos da nota final, é aquele que comumente ferra todos os filmes brasileiros: as atuações. Pelo amor do Grande Arquiteto do Universo, não existe uma única fala, em toda a projeção, que soe natural.
Será possível que esse povo não converse entre si? Será que eles não percebem que pessoas de verdade não falam dessa forma? Será que eles não são pessoas de verdade? Ou será que simplesmente não se importam com o texto falso e robótico? Será que não existem roteiristas que saibam escrever diálogos reais nesse país ou o problema é que não existem atores capazes de ler suas falas como pessoas reais, não como robôs altistas? Tantas perguntas, nenhuma resposta, e duvido que teremos alguma num futuro próximo.
O fato é que não dá para levar a sério um filme onde cada ator tem o mesmo sentimento e naturalidade nas suas falas que o Stephen Hawking, por mais que ele tenha vários predicados e um grande potencial.
Além disso, também fica difícil levar a sério um filme onde alguns personagens importantes têm nomes como Narcisa, Clarêncio, Anacleto ou Genésio. Caramba, com todo respeito aos Anacletos que estão me lendo neste momento, mas esses nomes parecem coisa de zoeira e com certeza fazem qualquer adulto maduro rir mais do que se alguém pronunciar Homo Erectus. Para completar, podiam ter também um Bráulio e um Astolfo.
Nosso Lar não é um filme ruim. Aliás, está acima da média do cinema nacional. Mas enquanto o assistia, não conseguia parar de pensar como seria legal se os estadunidenses resolvessem fazer um remake dele, como fazem de tantas obras européias e asiáticas. Afinal, com certeza se isso acontecesse, resolveriam o problema dos nomes engraçados e chamariam atores de verdade. Daí, sobraria apenas o arco clichê da Eloísa, mas a influência do Steve Screenwriter é um problema que o cinema nunca vai conseguir resolver.