Apreciadores dos mais finos survival horrors, regozijem-se comigo, pois temos aqui mais um ótimo jogo a engrossar os pilares do gênero. Narcosis é o jogo de estreia da Honor Code, e mostra muito potencial.
Aqui controlamos um cientista que trabalhava em uma estação no fundo do mar. Um terremoto faz com que água comece a invadir a estação, e a partir daí é hora de lutar para sobreviver. Não há monstros, não há misticismo. Com exceção de alucinações compreensíveis para a situação, esta é uma aventura bem realista.
Você está no fundo do mar, então é claro que nem todos os peixinhos lá são fofos. Há algumas criaturas que fogem de você, enquanto outras te atacam. Para se defender, você tem apenas uma faquinha bem tosca, então em geral é melhor não sair por ali procurando brigas, embora tenha momentos em que elas te encontrem.
O maior perigo, no entanto, não são as criaturas, mas o simples ambiente hostil. Com um passo em falso, você pode cair num abismo, e seu oxigênio é sempre limitado, em uma mecânica que lembra Adr1ft. A jogada é que você não precisa apenas pegar tanques de oxigênio para ficar vivo, mas ver algumas coisas terríveis ou correr perigo deixam seu personagem nervoso, e com isso o consumo de O2 sobe. Assim, cabe a você, como jogador, evitar olhar para essas coisas ou lidar com as consequências.
RESPIRE FUNDO
Você é um ser humano no fundo do mar, um ambiente altamente hostil, então é óbvio que está usando uma daquelas roupas de mergulhador que lembram até trajes de astronautas. Isso torna você um trambolhão lento e desajeitado, e talvez a primeira opinião que você tenha sobre o jogo seja relacionada às suas estranhas decisões de controle.
O jogo usa as duas alavancas, mas não faz isso da forma que outros que lançam mão da visão em primeira pessoa fazem. A alavanca direita, ao invés de controlar seu personagem, gira a sua cabeça dentro do capacete. Já a esquerda controla seus movimentos propriamente ditos, dando ao jogo uma desnecessária sensação de Resident Evil 4.
Talvez isso tenha sido uma má adaptação dos controles em VR. Afinal, em VR faz todo o sentido que mover a cabeça mova também a cabeça do personagem. No Xbox One, no entanto, isso é bastante estranho e incomoda. A única explicação para isso ter sido mantido é que você precisa olhar para baixo no seu capacete para ver quanto tem de oxigênio e de sinalizadores, mas teria sido muito mais inteligente ter mantido a cabeça num ponto fixo e essas coisas simplesmente fazerem parte do hud. Outra inconveniência é que isso torna impossível olhar para baixo (sua visão de baixo é bloqueada por essas informações), o que é um perigo em um jogo com tantos buracos mortais).
Sinalizadores? Pois é, esta é sua principal opção estratégica. Com os sinalizadores, você pode iluminar caminhos mais distantes, onde sua lanterna não chega (isso ajuda muito para encontrar precipícios) e mesmo distrair animais enquanto você passa correndo pelo outro lado.
Já que falamos em correr, seu traje tem também um jatinho, que te empurra para frente, e isso abre várias possibilidades. A mais óbvia, e mais usada, é uma espécie de dash que ajuda a se mover mais rápido. No entanto, com este jatinho você pode ultrapassar alguns obstáculos e, veja só, usá-lo como pulo. Pois é, tem alguns desafios em Narcosis que são bem semelhantes aos jogos de plataforma, onde você deve pular de um lugar para o outro.
HISTÓRIA INTERESSANTE
Pode não parecer pela sinopse, mas a história, que é contada pelo sobrevivente da tragédia em uma conversa que se passa após os eventos do jogo, é bem legal. Trechos da conversa relacionados aos que você está vivendo são tocados na hora certa, mas depois de terminar, você pode ouvir toda a conversa, completa e em ordem cronólogica. É tudo muito bem escrito e, somado à atmosfera caprichada e ao clima de perigo e isolamento que o jogo constrói tão cuidadosamente, acrescenta muito à experiência.
Parece que eu só tenho coisas boas a dizer, mas infelizmente não é o caso. Boa parte do jogo é bastante linear, bem focado no desenvolvimento de sua história e de sua experiência de terror aquático, mas as coisas degringolam no início da segunda metade, mais especificamente nos capítulos oito e nove.
Nestes capítulos, o cenário se torna muito aberto, deixando bem difícil saber para onde ir. Eu fiquei um bom tempo explorando até finalmente conseguir passar da oitava fase, e admito que não sei repetir a proeza, pois não há sinais de que você está progredindo. Você pode passar um bom tempo andando para o lado errado apenas para descobrir que, se continuar nesta direção, vai morrer de calor (sério).
No capítulo nove, então, a coisa fica ainda pior. Com uma clara influência de P.T., você precisa navegar pelos mesmos cenários que vão mudando lentamente, mas o caminho não é claro. Você pode seguir por um corredor e morrer ou então ir pelo corredor do lado e progredir, sem nada que indique qual é o certo. O que realmente é um problema grave, no entanto, é que a sua visão vai diminuindo, como se seus olhos estivessem fechando. Demore muito para encontrar o caminho e você se verá preso podendo enxergar apenas uma pequena faixa no centro da tela, o que torna o jogo injogável, e fica ainda pior por ele não permitir reiniciar o checkpoint pelo menu caso isso aconteça.
Até a sétima fase, eu estava bem empolgado com o jogo, sem querer parar de jogar, mas depois destes dois capítulos, eu estava com dor de cabeça e enjoado e tive que parar de jogar. E olha que nem estava jogando em VR. Depois disso ele até volta a ficar melhor, mas eu devo ter passado pelo menos 30% do tempo da minha campanha tentando passar por estes dois capítulos pentelhos.
NARCOSIS
Narcosis é um excelente jogo, mas não mantém sua excelência durante toda sua duração. Para aqueles que resistirem às suas duas fases mais fracas e perseverarem, ele termina de uma forma muito legal, que chega quase a apagar a má impressão. Quase. De qualquer forma, se você gosta de survival horrors e de jogos que te colocam em um cenário hostil e isolado, Narcosis foi feito para você.