O Sequestro do Papa é uma dramatização de um caso real que ocorreu na Itália no século XIX. O caso de Edgardo Mortara, para ser mais específico. É uma história que, vista pelos nossos olhos do século XXI, parece absurda e assustadora. Mas é um bom sinal dos problemas que podem surgir quando o Estado não é laico.

CRÍTICA O SEQUESTRO DO PAPA

Com seis anos, o menino Edgardo Mortara é tirado da sua família e levado para Roma, onde seria criado como católico. Seus pais eram judeus e uma pessoa que trabalhava na casa diz que o batizou secretamente. Segundo a igreja, batismo é irreversível, e o menino era, portanto, cristão. De acordo com as leis dos Estados Pontifícios, uma criança católica não poderia ser criada por uma família de outra religião.

Sim, é tudo muito absurdo. Entre assistir ao filme e escrever esta crítica, me obriguei a fazer uma pesquisa sobre o assunto para garantir que não falaria besteira. Afinal, já pensou seu filho ser tirado de você pela alegação de um batismo que ninguém mais viu acontecer?

Rapito, O Sequestro do Papa, Pandora Filmes, Delfos
Esta é uma das cenas mais assustadoras que eu já vi no cinema.

O desespero da família Mortara é palpável. E O Sequestro do Papa é um filme realmente pesado. Daqueles sem nada de violência física, mas que deixa com um nó na garganta o tempo todo. Desde o menino Edgardo pedindo para voltar aos pais até o adulto Edgardo completamente convertido a uma vida missionária. É tudo assustador.

ESTADO LAICO

O Brasil é oficialmente um Estado laico. Porém, eu me sinto muito incomodado quando numa campanha ou votação política, os políticos falam coisas como “em nome de Deus” ou “Deus abençoe”. Claro, os políticos não precisam ser ateus. A religião é uma decisão do espaço privado de cada pessoa. Porém, ela não deve guiar as leis, e quando vejo essas coisas tenho realmente minhas dúvidas se podemos considerar que nosso Estado é laico.

Quando recebi a cabine de O Sequestro do Papa, fiquei realmente curioso sobre como este caso, do qual não tinha até então ouvido falar, se desenrolou. Mas o filme não explica muita coisa. Ele espera que você já saiba os pormenores que levaram tudo a ocorrer. Ainda bem que você tem o DELFOS para esclarecer.

PAPA PIO IX

Dito isso, gostei muito mais do filme do que esperava. Verdade, ele é um tanto mais longo do que gostaria, mas a tensão é forte, e é um longa que incomoda muito. Vendo hoje – e o próprio título nacional entrega isso – pensamos no papa Pio IX como o vilão da história. Mas o filme não o vilaniza. Para ele, o que está fazendo é o moralmente certo. E se ele é a lei… Já viu, né? Mais impressionante é que nem o próprio Edgardo o vilaniza.

Rapito, O Sequestro do Papa, Pandora Filmes, Delfos
Edgardo adulto.

Todo o resto do mundo, por outro lado, faz protestos. A imprensa cai em cima. Em um momento cinematograficamente muito legal, o papa está olhando charges que ironizam a situação e as vê como desenhos animados. Aliás, cinematograficamente O Sequestro do Papa é inteiro muito legal. Cenários, figurinos e o filme como um todo é muito bonito.

É um caso de um filme que provavelmente não verei outra vez, mas que gostei de ter visto pelo menos esta. No mínimo, ele enfatizou na minha cabeça que o Estado tem que ser laico sem exceções. Espero um dia viver para ver os políticos brasileiros pararem de citar suas religiões em momentos políticos.