Ao começar a escrever esta crítica Helloween, minha cabecinha de fã ainda não acredita no que houve em 2016. A banda anunciou que os membros clássicos Kai HansenMichael Kiske voltariam à banda. E não só isso, Andi Deris Sascha Gerstner continuariam, fazendo com que a banda tivesse três guitarristas e três vocalistas. E pela primeira vez na história dos caras, os vocalistas cantariam juntos, já que, mesmo quando Hansen e Kiske estavam juntos na banda, apenas o segundo cantava.

A reunião deu muito certo, com shows em lugares enormes (em São Paulo foi no Espaço das Américas) e aparentemente o relacionamento entre os músicos também vingou. Se você acompanhou entrevistas com os caras ao longo dos anos, isso é especialmente surpreendente, já que o guitarrista Michael Weikath e seu xará Kiske pareciam ter problemas pessoas bem sérios. Bom para eles – e para nós – que eles conseguiram colocar isso para trás. E agora, em 2021, a banda lança seu primeiro álbum como septeto. E seguindo a tradição do Weezer, é a segunda vez que os caras lançam um disco apenas com o nome da banda (o primeiro foi o EP de estreia, de 1985).

CRÍTICA HELLOWEEN: A REVELAÇÃO

Quando as faixas e compositores foram revelados, admito que fiquei um tanto decepcionado. Como fã dos Keepers of the Seven Keys, obviamente eu queria que o grosso das faixas fosse composto por Hansen e Weikath. Este último, aliás, é um dos meus compositores de metal preferidos, e acho uma pena que ele componha tão pouco. Porém, o disco traria três faixas de Weikath e apenas uma de Hansen, contrastando com cinco composições de Andi Deris.

Isso é algo que se repete nas últimas décadas do Helloween. Deris é um compositor muito prolífico. Infelizmente, apesar de ele compor bastante, não sou muito fã de suas músicas. Gosto dele como vocalista, mas como compositor, acredito que o Helloween teria um catálogo melhor se lançasse menos faixas escritas por ele.

A impressão que eu tenho é que, quando a banda se junta para escolher as faixas que serão gravadas, Weikath aparece com duas ou três, enquanto Deris vem com trinta. Daí fica difícil que a maior parte de cada álbum não seja composta por ele. E isso se repetiu aqui, já que Deris compôs praticamente metade das 11 canções principais do álbum.

CRÍTICA HELLOWEEN: O ÁLBUM DA VOLTA

Apesar da decepção com a pouca contribuição de Weiki e Hansen nas composições, quando ouvi o disco me surpreendi. Eu sinceramente não esperava gostar tanto do que ia ouvir. Helloween é um álbum divertido e empolgante, com um excelente trabalho vocal e de guitarras. Não diria que é um retorno ao estilo do Keeper of the Seven Keys, mas certamente é um excelente álbum do Helloween. E é o primeiro disco dos caras que eu tenho vontade de ouvir com frequência literalmente desde The Time of the Oath (de 1996).

Uma coisa que eu nunca entendi em bandas de rock e metal é que, nos poucos casos em que há mais de um vocalista, eles preferem gravar cada um sua música. Duetos são raríssimos no rock. Pegue o Kiss, por exemplo. Gene SimmonsPaul Stanley se alternam nos vocais, cada um cantando sozinho as faixas que compôs. Você ouve os dois juntos quase exclusivamente em covers.

Outros dois exemplos envolvem o próprio Kai Hansen. O Iron Savior tinha ele e o Piet Sielck, mas cada um cantava sozinho as que escreviam. Até mesmo no Gamma Ray, na época em que o Ralf Scheepers estava na banda, eles só gravaram dois duetos (Heal MeMoney).

Assim, é com prazer que digo que Kiske e Deris cantam juntos a maioria das faixas. Infelizmente, Kai Hansen é limitado a cantar frases pontuais, fazendo parte do vocal principal mesmo apenas em Skyfall.

CRÍTICA HELLOWEEN E A PERFORMANCE

Sobre a performance de cada vocalista, eu diria que Andi Deris é o maior destaque. É como se ele tivesse encarado o álbum como uma saudável competição contra Kiske. Assim, ele entrega aqui uma de suas melhores performances, chegando a cantar extremamente alto em faixas como Mass Pollution.

Já Michael Kiske parece ter seguido outro caminho. Sim, a voz do cara é linda, mas boa parte da graça que eu via no estilo dele nos Keepers é como alternava entre voz bem grave e bem aguda. Não me lembro de outro vocalista que alternasse tanto a voz no heavy metal a não ser o King Diamond. E convenhamos, Diamond não tem uma cor de voz tão bela quanto Kiske. Aqui Kiske parece cantar sempre no seu tom médio e mais confortável, sem nunca atingir os agudos e graves de outrora.

Também gostei muito do trabalho de guitarras. Kai HansenMichael Weikath são, para mim, uma das duplas de guitarristas mais mágicas do heavy metal. Apesar de tantos anos separados, a química continua excelente. Sascha Gerstner, como um terceiro guitarrista, acaba sendo tão útil quanto Janick Gers no Iron Maiden. Tipo, ele está lá. Mas é difícil dizer quão diferente seria o álbum sem ele.

É uma pena que, ao contrário dos Keepers, o encarte de Helloween não especifique quais guitarristas fazem cada solo. Isso é mais importante com três caboclos solando do que com dois. E também seria útil para vermos o quanto a presença de Gerstner contribuiu.

CRÍTICA HELLOWEEN E O ENCARTE

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Eu sempre achei os encartes do Helloween os mais legais. Eles costumavam colocar simpáticos desenhos com as abóboras mascotes estilizadas de acordo com a letra que estivesse naquela página. Admito que fazia um bom tempo que eu não olhava um encarte da banda, então não sei dizer quando eles pararam de fazer isso. Mas fiquei decepcionado que Helloween siga bem a fórmula padrão que qualquer banda usa, de alternar apenas as letras com fotos dos músicos.

Além disso, o diretor de arte cometeu um erro básico de design: escolheu fontes absurdamente ilegíveis. É muito mais difícil do que deveria ser acompanhar as letras enquanto ouve as músicas. E, se você for dessas pessoas estranhas que, como eu, gostam de ler os agradecimentos e créditos técnicos, se prepare para sofrer.

Falei do álbum até agora em termos gerais. Porém, um álbum tão importante para mim merece uma segunda parte. E no restante dessa humilde resenha vou comentar faixa a faixa. Bora?

CRÍTICA HELLOWEEN: COMEÇANDO O FAIXA A FAIXA

Helloween começa com Out For the Glory, composição de Weikath. Ela demora um pouco para engrenar, mas quando finalmente começa, se mostra digna do trabalho desse cara. Eu já comentei que adoro o estilo de composição do Weiki, né?

Uma coisa que dificilmente vejo comentarem por aí é o lado gospel do Helloween. Pois é, entendo sua surpresa considerando quão raramente a imprensa fala disso. Quase todos os discos dos caras têm pelo menos uma faixa literalmente louvando Deus (exemplos de faixas com essa temática incluem, mas não se restringem, a We Damn the NightSave Us Laudate Dominum). Em Helloween, Out For the Glory cumpre esse papel. E o faz muito bem.

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A música é cantada apenas por Michael Kiske, com uma pequena participação do Kai Hansen gritando depois dos refrões. As melodias são lindas, as guitarras cantam tanto quanto os vocalistas e eu gostei até da letra. É uma excelente abertura para um excelente álbum. Minha única picuinha com ela é uma narração que rola perto do final e que se estende mais do que eu gostaria.

YESTERDAY IS HISTORY, TOMORROW IS A MYSTERY

Fear of the Fallen é a seguinte. Esta é uma composição de Andi Deris e os vocais principais são divididos entre ele e Kiske sendo, portanto, o primeiro dueto do álbum. Ela é a típica composição de Deris, alternando partes lentas com extremamente pesadas. Fear of the Fallen tem um riff inicial muito empolgante, mas suas partes lentas são chatinhas, tornando-a uma das que menos gostei.

Felizmente, a que vem a seguir restaura a qualidade do trabalho para seu ponto máximo. Best Time é uma das minhas preferidas! Ela é uma composição conjunta de Deris e Gerstner, mas se isso não estivesse no disco, podia jurar que quem a escreveu foi Hansen. Ela lembra muito aquelas faixas antigas em que o Helloween canta a alegria de viver, como Future World.

Kiske e Deris se alternam lindamente cantando sua positiva e empolgante letra. Tem até um espacinho para Hansen cantar a que é provavelmente a frase mais legal do disco, “yesterday is history, tomorrow is a mystery“. Com apenas três minutos e seu clima alegre, Best Time para mim seria a escolha natural para um videoclipe (a banda escolheu Skyfall para isso) e uma verdadeira candidata para hit de palco. Aquelas que a banda para de tocar para o público cantar junto, sabe? É certamente a faixa do álbum que eu mais gostaria de ouvir ao vivo.

I LOVE THE SOUND OF HEAVY THUNDER

Mass Polution vem a seguir, e também é uma das minhas preferidas. Composta e cantada por Andi Deris, esta mostra o sujeito dando seu melhor, tanto como compositor quanto como cantor.

O vocal principal dessa música é bem naquele estilo hard rock com o qual Deris se dá tão bem. Você sabe, aquele jeitão gritado, que lembra uma arara histérica. Sua letra falando do amor pela música pesada e seu clima divertido lembram o clássico recente da banda Are You Metal?. Mas o que mais gostei mesmo foi o riff de abertura, pesadão e empolgante. Quando Deris começa a cantar, eu já tinha decidido que gostava da faixa.

Angels é a próxima e… bem… para mim ela é simplesmente a pior do disco. Não apenas isso, é uma das faixas do Helloween que menos gostei. Composta por Gerstner e cantada por Kiske, é simplesmente entediante. É lenta sem ser balada, e seus poucos momentos legais (como um excelente riff) são arrastados para baixo por um refrão bem… arrastado.

ONLY ILLUSION, A BAD DREAM CONFUSION

Rise Without Chains é uma faixa diferente. Composta por Deris, ela é bem semelhante ao estilo que o Helloween tem seguido nos últimos 20 anos. Porém, o que a torna diferente é que ela é quase completamente cantada ao mesmo tempo por Kiske e Deris. A mixagem faz com que a voz de um ou de outro se destaque mais em pontos específicos, mas eles cantam a letra quase inteira juntos. É uma música legal, mas eu dificilmente pegaria Helloween especificamente para ouvi-la.

Já Indestructible é outra história. Embora componha pouco, eu gosto das faixas criadas pelo baixista Markus Grosskopf e esta é uma delas. Ela mostra de cara suas influências de um heavy metal clássico como Judas Priest, embora com uma energia mais alegre e positiva, típica do Helloween. Os vocais trazem também belas alternâncias entre Kiske e Deris, com algumas sementinhas pontuais de Hansen.

A VOLTA DO QUE NÃO FOI

Robot King finalmente nos apresenta mais uma nova música de Michael Weikath. E que música, meu camaradinha! Robot King segue um estilo bem dele, com melodias que lembram músicas infantis, guitarras cantantes e uma letra contando uma historinha de ficção científica bem humorada, estilo Dr. SteinMission Motherland.

Os vocais trazem Kiske e Deris em um belo dueto, e mostram bem o que eu falei no início do texto, sobre como Deris parece estar se esforçando muito mais do que seu colega. Veja, por exemplo, o refrão, com Deris se esgoelando de forma impressionante.

Cyanide é mais uma composição de Andi Deris, e dessa vez ele não divide o vocal. É uma canção empolgante e bem tradicional do Helloween dos últimos 20 anos. Isso, e o fato de ser cantada apenas por Deris, dá a sensação de que ela poderia estar em qualquer disco recente da banda. Não é ruim, longe disso, mas é um tipo de som que o Helloween já fez bastante e que não ressoa tanto comigo.

WEIKATH 3

Down in the Dumps é a terceira e última composição do Weikath e a única das três que tem menos de sete minutos (tem seis). Para mim, é a mais fraca das três que ele contribuiu ao disco. Porém, para meu gosto pessoal, a composição mais fraca do Weikath ainda me agrada bem mais do que faixas como Cyanide ou Rise Without Chains.

Como sempre, é uma música bem melódica, com ótimos riffs, solos e a tradicional interpretação esforçada de Deris que faz com que sua voz se destaque mais do que a de Kiske – que também canta na música.

CRÍTICA HELLOWEEN: CADÊ KAI?

E chegamos à única composição do outrora prolífico Kai Hansen. Sua canção foi dividida em duas faixas no disco, mas na verdade é uma única música. A introdução Orbit é uma instrumental de um minuto com barulhinhos progressivos que não soariam estranhos em um ábum do Rush ou até do David Bowie.

Orbit desemboca sem você nem perceber em Skyfall. Com mais de doze minutos, é a mais longa do disco e literalmente a única em que os três cantores se revezam na voz principal. Apesar de ser a mais longa, Skyfall foi também escolhida como o primeiro videoclipe, que você pode assistir no Youtube.

Sua letra também flerta com a ficção científica, contando a história do ET de Varginha. Ok, não direta e oficialmente, mas a história envolve um alienígena que caiu na Terra e foi preso pelos humanos na Área 52 (embora a letra só cite o famoso Hangar 18, ou seja, a parte pelo todo).

Ela é a típica música longa que costuma fechar os álbuns de heavy metal melódico. Ou seja, é ótima. Acho incrível como as bandas de metal melódico conseguem fazer músicas longas, repletas de variações, sem nunca ficarem chatas. Pelo contrário, Skyfall tem um refrão altamente cantarolável e assobiável, que sem dúvida vai fazer miséria nos shows. Também a considero uma das melhores do disco e uma excelente forma de encerrar uma bolacha bem bacana.

Encerrar? Mas peraí, ainda não acabou!

CRÍTICA HELLOWEEN: FAIXAS BÔNUS

A versão física brasileira traz apenas as 12 faixas acima. Porém, algumas edições trazem duas faixas a mais.

A primeira delas é Golden Times. Assim como Angels, foi composta por Gerstner e é cantada apenas por Kiske. Ao contrário de Angels, ela é bem legalzinha. Não se destacaria no disco, mas poderia ser colocada no lugar de Angels, fazendo com que Helloween não tivesse nenhuma faixa ruim.

Save My Hide é a outra bônus. Composta e cantada por Deris, esta faz todo o sentido ser bônus, porque simplesmente não se encaixa na obra. Ela parece o tipo de canção que o Andi Deris costumava lançar com sua banda solo. É muito mais uma faixa do Deris do que uma do Helloween, ou pelo menos é o que o estilo dela passa para o ouvinte.

CRÍTICA HELLOWEEN COM OLHINHOS PUXADOS

Agora se você tiver acesso ao CD japonês, Helloween não acaba aí. A versão japonesa vem em CD duplo, e traz no segundo CD quatro faixas extras. As duas primeiras são as que comentei acima. A terceira é Pumpkins United, a faixa que o Helloween lançou gratuitamente em 2017 para divulgar sua turnê de reunião, e que você provavelmente já ouviu.

O destaque é a quarta: We Are Real.

É muito triste que We Are Real tenha sido escolhida para ser a faixa mais rara do disco. Ela é simplesmente fantástica. Composição do baixista Grosskopf, traz a alegria e a positividade que normalmente são ligadas ao happy, happy Helloween! Além disso, é a única que traz um dueto entre Hansen e Deris. Estivesse no álbum padrão, We Are Real certamente seria um dos destaques. Por ter sido lançada apenas no CD japonês, ela provavelmente nem será tocada ao vivo.

CRÍTICA HELLOWEEN – HELLOWEEN

E assim encerramos esta que provavelmente foi a mais longa resenha de CD que escrevi. Helloween é um disco muito legal. É a primeira coisa que o Helloween lança em décadas que eu realmente estou ouvindo com frequência, e que quero até ouvir ao vivo.

O retorno dos membros antigos fez bem à banda. Se não afetou tanto quem compõe as músicas, impedindo um retorno aos Keepers of the Seven Keys, eles trouxeram uma nova energia e empolgação que permitiram que a banda mostrasse a alegria de viver que fez com que tantos de nós se apaixonassem pelo seu estilo happy metal.

REVER GERAL
Nota:
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
critica-helloween-o-album-da-reuniaoBanda: Helloween<br> Álbum: Helloween<br> Gênero: Power Metal / Metal Melódico<br> Gravadora: Nuclear Blast / Shinigami Records<br> Número de faixas: 12 + 2 bônus da edição especial / + 4 bônus no Japão<br> Produtor: Charlie Bauerfeind e Dennis Ward<br>