Este povo precisa ler mais o DELFOS. Já falei tantas vezes aqui: confundir diabo (devil) com demônio (demon) é como confundir Hitler com nazista. E este erro é sempre na tradução em português. Afinal, o original Late Night With the Devil usa a alcunha correta. Entrevista com o Demônio não. Neste caso específico, ainda, talvez fosse melhor usar “Entrevista com UM Demônio”, já que o demônio em questão não é o cramulhão. Mas vamos ao que importa.
CRÍTICA ENTREVISTA COM O DEMÔNIO
Entrevista com o Demônio é um filme bem diferente. Suas escolhas artísticas e visuais fazem com que, talvez mais do que todos os outros, seja algo para se ver na telinha de casa. Isso porque o que temos aqui é um talk show como eram nos anos 70. Isso é refletido na qualidade de imagem “manchada”, mas especialmente na proporção 4:3 da tela. Você sabe, como as TVs eram lá naquela época longínqua de outrora. É até estranho ver um filme no cinema que não usa, sei lá, 50% da tela, mas a opção artística é clara. Isso se reflete muito bem na narrativa.
O filme inteiro é a gravação do talk show. Você vê tudo conforme foi ao ar, mas também vê o que está acontecendo nos intervalos comerciais. Eu já assisti ao Late Night With Jimmy Fallon quando fui a Nova Iorque e é bem parecido ao que vemos aqui. A pegada é que o tema do programa é o sobrenatural. É um especial de Halloween, afinal de contas. Isso é refletido nos convidados. E não, demônios não fazem parte do programa. Para uma Entrevista com um Demônio, é melhor assistir a Nefarious.
CONVIDADO ESPECIAL DE HOJE: ABRAXAS!
Obviamente, embora o apresentador e toda sua equipe façam o possível para continuar com o talk show conforme roteirizado, coisas estranhas vão acontecer. O primeiro entrevistado é um daqueles charlatões que diz que fala com os mortos e usa a vulnerabilidade da plateia contra eles. O segundo é um daqueles chatonildos que acham que tudo pode ser explicado cientificamente e promete pagar qualquer um que prove a existência do sobrenatural. Finalmente, as terceiras convidadas são uma parapsicóloga e uma menina que está em tratamento por uma suposta possessão demoníaca.
Eu achei tudo, até os intervalos comerciais, extremamente interessantes. Este é o tipo de terror mais racional que é bem sucedido em me assustar. Sinceramente, não sei se me assustava mais com as coisas sobrenaturais, como um sujeito vomitando longe – ou com a banda tocando uma musiquinha cafona de elevador ao voltar dos comerciais. É tudo ao mesmo tempo estranho e familiar. E aí está a força de Entrevista Com o Demônio. É um talk show como todos nós já vimos um monte de vezes, mas com coisas acontecendo que definitivamente não vimos em talk shows.
ENTREVISTA COM O DEMÔNIO SERVO DE ABRAXAS
Fazia bastante tempo que não via um filme tão consistente e que despertasse tanto meu interesse. Achei que estava diante do mais novo premiado pelo Selo Delfiano Supremo. Mas não foi dessa vez. Ele tem um ponto natural de parada, quando a coisa fica realmente absurda e aparece uma tela de “dificuldades técnicas”. Perfeito, pensei. Mas ele continua.
O que vem depois é uma tentativa de explicar uma ponta solta da sociedade mística envolvida com o apresentador, que nem deveria estar no filme. E ao tentar explicar o inexplicável, o filme inteiro fica menos interessante e, veja só, mais confuso.
Assim, Entrevista com o Demônio não é filme de Selo Delfiano Supremo. Mas é excelentíssimo mesmo assim. Por sua estética de programa de TV antigo, talvez não seja exatamente um longa para se ver no cinema. Mas sem dúvida vale ser assistido, seja na telona ou na telinha.