Contra Todos

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Quando li a sinopse desse filme, imediatamente pensei que deveria tratar-se de um remake de Beleza Americana adaptando-o à realidade brasileira. Eu não podia estar mais certo, pois as semelhanças são tantas que é até estranho Contra Todos não ter sido batizado de Beleza Brasileira. Na verdade, o troço é tão parecido que chega a ser até desonesto não citarem que este filme foi baseado em sua contraparte estadunidense, mais ou menos como a deprimente atitude da Disney ao não divulgar que um de seus filmes de maior sucesso (O Rei Leão) nada mais é do que uma versão fofa de Hamlet.

Tudo gira em torno de uma aparentemente feliz família de classe média baixa de São Paulo (segundo a sinopse, mas pelas condições em que vivem parecem ser de classe ainda mais baixa). A primeira cena que vemos é da família rodeada de amigos comendo lasanha (hum… lasanha…) e batata frita (hum… batata frita…). E o pior é que a cabine começou exatamente ao meio-dia (estava marcada para 11:30 e teve meia-hora de atraso) ou seja, horário de almoço total e eu só iria ter chance de almoçar dali a duas horas. Sinceramente, isso lá é hora para marcar uma cabine?

Depois dessa cena, as coisas começam a desabar em uma cadeia de acontecimentos relacionados a sexo e assassinatos. Lembrou de Beleza Americana? Puxa, eu também. O filme inteiro. Até o final é idêntico, tanto nos acontecimentos quanto na forma em que ele é contado, através de diversos pontos de vista. Um grande diferencial e algo muito interessante é que, como o filme se passa em São Paulo, algumas cenas foram filmadas em locais que conhecemos e às vezes até freqüentamos, como a Galeria do Rock de São Paulo, por exemplo.

Outro problema do filme é a direção do estreante (percebe-se) Roberto Moreira. As câmeras não param de tremer e a qualidade da imagem lembra um filme caseiro dos anos 70 que já foi copiado de fita para fita tantas vezes que já está até se desfazendo. Curiosamente, o filme começa mostrando logotipos de dezenas de patrocinadores. É sério, deve chegar a durar um minuto só de logotipos de indústrias de petróleo (como sempre), produtoras e etc. E onde foi o dinheiro do patrocínio? Porque o filme não tem atores famosos e percebe-se que não teve nem sequer um equipamento profissional. A qualidade audiovisual nos faz imaginar que o filme foi rodado em uma handycam caseira. Além disso, por diversas vezes, barulhos sem importância, como o do motor dos carros, por exemplo, é mais audível do que a voz dos atores, tornando muitas cenas incompreensíveis. Puxa, será que é exigir muito que o som de um filme seja mixado antes de chegar aos cinemas? E pior que parece que esse filme já está sendo exibido em festivais desde fevereiro. Considerando que essa resenha foi escrita em outubro e você a está lendo em novembro quando o filme estréia em circuito comercial (a não ser que você a tenha encontrado nos arquivos antigos), eles tiveram um bom tempo pra arrumar o som. Para você ter uma idéia, a qualidade técnica do filme é tão amadora que nos faz pensar que se trata de um projeto de faculdade. Um bom projeto, é verdade, mas nada além disso. E para chegar ao cinema de forma honesta ainda deveria ser muito trabalhado em todos os aspectos (roteiro e qualidade audiovisual, principalmente).

Curiosamente, Contra Todos (novamente na cola de Beleza Americana) vem faturando muitos prêmios e chegou a ser o filme mais premiado do Festival do Rio 2004. Como sempre, prêmios não significam nada para mim pois não preciso que pessoas que eu não conheço me digam o que é bom. Mas pergunto: Premiar o quê? O que justifica a premiação deste filme? Ele não é original, não tem qualidade técnica, não tem absolutamente nada que o faça melhor do que qualquer outro filme a não ser uma história pesada. Isso me faz lembrar de algo que alguém me falou há algum tempo atrás. Rico adora estudar pobre. Isso me parece a mais pura verdade e o único motivo racional para Contra Todos ser tão premiado, ou seja, os ricos (as pessoas que distribuem os prêmios) devem ter adorado o fato de ele mostrar as condições precárias de uma vida tão próxima e ao mesmo tempo tão distante. E eu duvido que os pobres gostem desse filme tanto quanto os ricos, afinal, ninguém gosta de ter seus defeitos jogados na cara. Essa teoria pode justificar também a premiação de Cidade de Deus, mas como não assisti esse ainda, não vou meter meu bedelho.

Assim como o tal filme da terra do Tio Sam, Contra Todos nos faz olhar para dentro de nós mesmos e pensar em como a nossa vida é patética. Mas verdade seja dita, a violência e a “beleza” do que é mostrada aqui é muito superior ao do seu antecessor estadunidense. Se a Beleza Americana já chocou os brasileiros, dado o tom de veracidade e a cara de pau de mostrar a vida como ela é, possibilitando que muitas pessoas se identifiquem com a história, a Beleza Brasileira vai deixar muita gente de cabelo em pé com seu show de realismo e uma possibilidade de identificação muito maior. Afinal, acontece aqui no nosso país. E isso me leva à pergunta: a Beleza Americana é menos pior do que a brasileira ou é apenas mais hipócrita? Eu fico com a segunda. E você?

Conta Todos estréia esta sexta, dia 19 de novembro.