Evolução e amadurecimento. Essas duas características podem ser perfeitamente aplicadas às carreiras de diversas bandas de Heavy Metal, tanto no quesito lírico quanto no instrumental. E é justamente por essa constante inquietação que esse estilo consegue sobreviver e se reciclar, mesmo estando à margem da mídia massificada e da opressão cultural do jabá.
O Metallica, maior símbolo do Thrash Metal oitentista norte-americano, é um claro exemplo da evolução sedimentada na inquietação (com perdão da rima) que permeia o estilo. Desde o Kill em’ All, de 1983, até o St. Anger, de 2003, é notória a capacidade da banda de se manter relevante, ainda que sua carreira esteja repleta de polêmicas e controvérsias. É notório também como as músicas refletem fielmente os diferentes momentos vividos pela banda.
O momento do grupo, em 1988, era depressivo. Impactados com o falecimento do exímio baixista Cliff Burton (morto na Suécia, em 1986, num acidente de ônibus durante a turnê do Master of Puppets), o Metallica entra em estúdio para externar toda a sua angústia e sofrimento. O resultado é …And Justice For All, o álbum mais complexo, sorumbático e anti-comercial de toda a carreira do grupo. Com músicas longas e recheadas de variações rítmicas, é um disco de difícil assimilação e, portanto, impraticável para os padrões radiofônicos.
A começar pelas performances individuais que beiram a utópica perfeição. Kirk Hammet desfila um conjunto de riffs e solos embasbacantes e cria uma atmosfera sonora extremamente versátil ao fundir passagens pesadas (riffs) a outras melódicas (solos).
Lars Ulrich, por sua vez, tem nesse disco sua melhor performance em toda a carreira. Com linhas de bateria assaz criativas (vide a faixa-título), com viradas rápidas, eficazes e cheias de musicalidade (sem exibicionismo) e, finalmente, com o uso do pedal duplo que confere maior densidade às músicas, Ulrich é, sem dúvida, o protagonista desse registro.
Jason Newsted, substituto de Cliff Burton, é um baixista bem menos arrojado que seu antecessor, preocupando-se apenas em seguir os riffs principais de guitarra, como se fosse um guitarrista base. É verdade que essa postura deixa as músicas mais pesadas, mas as composições de Burton eram muito mais ousadas e originais. Quem não se espanta com o riff principal de baixo de For Whom The Bell Tolls ou com o baixo gritante de Seek and Destroy? Já James Hetfield, evoluiu bastante e tem aqui seu apogeu de técnica vocal, ainda que tenha perdido a espontaneidade de outrora.
Seria injusto destacar uma ou outra música para análise mais profunda, pois a uniformidade das composições é tão grande, que todo o álbum merece ser ouvido com igual atenção. Certamente, One é a faixa mais popular desse CD, já que foi ela que projetou o grupo ao estrelato com a gravação do primeiro clipe. Aliás, ainda está para nascer uma banda que componha power baladas tão bem quanto o Metallica. E isso é um tremendo elogio, diga-se de passagem.
Pessoalmente falando, acho esse disco tão bom quanto o Master Of Puppets e, muitas vezes, fico em dúvida quanto a qual quero ouvir. Primeiro porque adoro CDs e bandas envoltas num clima depressivo e sombrio, o que deixa as músicas mais honestas e com letras menos entorpecidas. Segundo porque o …And Justice é muito menos venerado que o álbum mencionado. É uma questão de fazer justiça com as próprias mãos.
Não sei se já te disseram, caro leitor, que é a tristeza, muito mais que a alegria, que traz reflexões à tona. É na tristeza que as mais belas obras-primas são compostas. …And Justice For All não foge à regra. Então se você ainda não tiver, clique aqui e compre.