O Brasil ganhou recentemente sua primeira sala de cinema Imax, localizada em São Paulo, no Shopping Bourbon Pompéia. E agora esta ganha sua primeira estréia tremendona. Nada de documentários sobre bichinhos fofinhos do fundo do mar. Temos o retorno do Homem-Morcego aos cinemas, aquecendo as turbinas para o Oscar.
Com o interesse nas estatuetas do careca dourado, somado ao fato de que praticamente todas as cenas de ação de Batman – O Cavaleiro das Trevas foram filmadas em câmeras Imax, este se torna o exemplar ideal para conferir no cinema da tela gigante. Mas antes, como é de praxe, uma historinha.
O IMAX E EU
Alguns anos atrás, durante uma viagem à África do Sul (se não me falha a memória), tive a oportunidade de ir a um cinema Imax, onde assisti Matrix Revolutions. Fiquei impressionado. A tela era realmente gigantesca, e sim, pegava a parede inteira. A sala em formato stadium e em disposição circular, tinha uma inclinação absurda e de onde quer que você se sentasse, via apenas a tela.
Com isso, a imersão era total. Assistir ao filme era como estar sentado na primeira fileira de um cinema convencional, ou como ver uma partida de tênis, você tinha que mexer a cabeça para ver tudo o que rolava. Confesso que fiquei até meio tonto com tanto movimento, em tamanho gigantesco, bem na minha fuça.
A sala tupiniquim não é bem assim. Se minha memória não me prega nenhuma peça, a tela nacional é bem menor, o que não dá aquela sensação de estar dentro do filme. Mas ainda assim é consideravelmente grande. Sentei na última fileira e conseguia ver as paredes dos lados da sala. E as poltronas da frente batiam nos meus joelhos! E olha que eu não sou de forma alguma um gigante. Tenho módicos 1,73m e fiquei desconfortável. Mesmo assim, o tamanho da imagem impressiona e na sessão em questão, o som estava no talo, fazendo o peito tremer. Eu não sou fã de sair surdo do cinema, mas se você gosta, esta sala é o que há. Mas o que de fato importa é a versão Imax do Cavaleiro das Trevas. Bem, um pouco de calma porque antes vou aproveitar o espaço para dar minhas impressões sobre o filme, e quem quiser apenas saber como é vê-lo no ultra-hiper-mega telão (que no final das contas é apenas ultra-hiper), é só pular para o último tópico.
O CAVALEIRO DAS TREVAS E EU
Este era o filme que eu mais queria ver ano passado e mal me aguentava de expectativa. O meu problema com expectativas é que, quanto maiores elas são, maior a decepção. Batman – O Cavaleiro das Trevas não somente cumpriu tudo o que prometia, como ainda supera em muito todas essas já referidas expectativas. Não apenas é a melhor adaptação de HQs para o cinema já feita, como também é um senhor filme policial, como não se via desde a década de 70.
Em O Cavaleiro das Trevas, se junta à aliança entre o morcegão (Christian Bale) e o tenente James Gordon (Gary Oldman), o novo promotor público de Gotham, Harvey Dent (Aaron Eckhart). Chamado de Cavaleiro Branco de Gotham, Dent é um herói que Batman não pode ser: uma pessoa comum, com um rosto sem máscara, incorruptível e que faz o certo porque acredita que pode fazer a diferença. E capaz de influenciar as pessoas de um modo saudável, algo que o cruzado de capa não consegue. Desta forma, Batman caça os criminosos, Gordon os prende e Harvey os processa. Juntos, os três armam um plano para derrubar a máfia da cidade, atingindo-os onde dói mais, no bolso.
Mas o surgimento do Coringa (Heath Ledger) vai agitar as coisas e deixar toda a cidade em clima de terror, além de forçar o Homem-Morcego a ir aos seus limites, questionando sua própria influência na cidade e o nível de violência exigida para se chegar à justiça. Basicamente, essa é a trama básica, e bem básica mesmo, do filme. Mas a essa altura você já deve saber disso!
O grande mérito da película é não fazer concessões. Sim, é um filme de quadrinhos com censura baixa para atrair a molecada. No entanto, é violentíssimo sem mostrar uma gota de sangue. Respeita a fonte original (o roteiro foi influenciado pelas HQs A Piada Mortal e O Longo Dia das Bruxas), mas com coragem para modificar certos elementos e fazê-los funcionarem melhor dessa forma. Tem muita ação e o nível de adrenalina fica constantemente lá em cima. No entanto, como o próprio nome já entrega, é o mais sombrio dos filmes do morcegão, com um clima dark e carregado e a sensação constante de que nem todos os personagens chegarão ao fim da jornada inteiros.
E, sobretudo, é um daqueles exemplares cada vez mais raros em Hollywood. Um filme de entretenimento onde o lado psicológico de seus personagens é mais importante que o número de explosões. E que diverte ao mesmo tempo em que faz pensar. E não somente aos fãs do personagem e de quadrinhos em geral, mas a qualquer um. Como disse, não é apenas uma adaptação de HQ, mas um policial de qualidade, como há muito não se via.
É um estudo sobre a maldade e os limites de uma crença. Tudo isso centralizado na figura do Coringa, o caos encarnado, produto de uma sociedade cada vez mais amoral e corrupta. O que é mais assustador do que alguém sem motivação aparente para os atos mais bárbaros? É a pura representação do anarquismo. E o mais assustador ainda é notar que apesar de seus métodos terroristas, capazes de deixar Gotham City de joelhos, ele tem certa razão em fazer o que faz. Sim, eu acho que também sou anarquista…
O último trabalho de Heath Ledger, morto no início do ano passado, não somente é a encarnação definitiva do personagem (assustador, sádico e sim, cruelmente engraçado), bem como uma interpretação inesquecível (coitado de quem for substituí-lo em projetos futuros. Essa pessoa terá de suar muito a camisa). Debaixo de uma maquiagem de pesadelos, Ledger desaparece na pele do Palhaço do Crime e se torna a grande força motora da película, ao lado da sensível interpretação de Aaron Eckhart como Harvey Dent, o último bastião de bondade em um mundo cada vez mais corrupto e violento.
Aliás, talvez essa seja a grande qualidade do filme. Além de um elenco de nomes invejáveis, todos entregam performances não menos que ótimas. Christian Bale, como Bruce Wayne/Batman, está mais perturbado do que nunca, levado ao limite pela presença de seu maior vilão, seu exato oposto e talvez resultado de sua própria existência. Afinal, o conceito de escalada (policias usam armas semi-automáticas, os bandidos passam a usar automáticas. Um sujeito combate o crime vestido de morcego e começam a surgir criminosos insanos e fantasiados, como o Coringa) é um dos temas da história.
O ritmo da narrativa e a montagem são excelentes. A história não para nunca. Há tramas e mais subtramas que se desenrolam de forma natural e precisa, fazendo com que as duas horas e meia de duração passem num piscar de olhos.
E, ao final, a sensação de levar um soco no estômago é inevitável. Aqui não há finais felizes, vitórias completas e nem maniqueísmo. O mundo de O Cavaleiro das Trevas é composto apenas por áreas cinzas. Cabe aos personagens se equilibrarem nelas sem cair.
E por falar em queda, eis minha visão sobre o que talvez seja a parte mais polêmica do filme, o destino do Duas-Caras (OLHA O SPOILER): se ele de fato morreu, Christopher Nolan comeu bola e cometeu o mesmo erro que Sam Raimi em Homem-Aranha 3. Eu gosto de pensar que ele está vivo, e o funeral foi preparado para preservar a boa memória de Harvey perante o povo e não estragar seu trabalho, enquanto ele estaria descansando numa cela acolchoada do Arkham, pronto para voltar no próximo filme. Sim, eu sei que o roteiro deixa claro que ele está morto, mas o que conta é o que foi filmado. E o que está na tela deixa margens para essa interpretação. E você, o que acha?
Mas já me alonguei demais. Vamos ao que todo mundo quer saber, como é ver o Batimão em Imax?
O BATIMAX E EU
Esta foi a sétima vez que assisti ao filme, e a experiência continua poderosa. Ainda mais ampliada pela tela gigante (mas nem tanto) do Imax brasilis. É impactante sim, especialmente no começo, mas depois que você se acostuma, acaba ficando meio normal, como se estivesse numa sala de projeção comum.
Sim, dá para ver praticamente todos os poros dos atores e você tem que escolher a qual quadrante quer assistir, já que é impossível focalizar toda a tela de uma vez só. E eu desencanei de ler a legenda, não apenas porque já decorei as falas, mas porque se ficasse só nelas, olhando para a parte de baixo da tela, perderia praticamente todo o filme. Ou seja, você terá de selecionar o que irá querer ver.
As cenas filmadas com as câmeras Imax são basicamente as maravilhosas sequências de ação. A diferença entre a película Imax e a tradicional pode ser melhor notada nos planos abertos, nas tomadas panorâmicas. São nessas cenas que você nota claramente a riqueza de detalhes captada por uma câmera dessa tecnologia. Nessas tomadas, dá para ver Gotham City inteira, e com todos os prédios em foco!
E as cenas de ação como um todo ficam ainda mais tremendonas neste formato, aliado ao já comentado som “estoura tímpano” como, por exemplo, a sequência na China, que deixa qualquer Missão: Impossível no chinelo. Engula essa, Ethan Hunt.
Já nas cenas comuns, de diálogos e tal, não achei grandes diferenças para o formato tradicional, fora ter que ficar virando a cabeça para a esquerda para ver um personagem falar e depois para a direita para ver o outro sujeito responder.
Então, para concluir, a experiência de ver Batman – O Cavaleiro das Trevas em Imax é bacana, mas nada tão fora do comum e diferente de vê-lo em um cinema tradicional. Ainda assim, que é uma excelente pedida como primeiro blockbuster a estrear na sala Imax brasileira, ah isso é.