Fallout 76: Bethesda, multiplayer e campanhas narrativas

O multiplayer mais solitário que você vai encontrar por aí.

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Fallout 76 é Fallout apenas no título e na estética. Esta série, caracterizada por histórias elaboradas, com várias facções e longas campanhas single player, não poderia estar mais distante do que este novo exemplar proporciona. Fallout 76 é um jogo de sobrevivência com um fiapo de história, que lembra mais Conan Exiles do que Fallout 4.

Mais do que isso, é um distanciamento considerável do posicionamento de marketing no qual a Bethesda se colocou ano passado. Você deve se lembrar que, em 2017, ela lançou vários excelentes jogos narrativos, como The Evil Within 2Wolfenstein II.

The Evil Within 2, Delfos
The Evil Within 2 é um jogaço.

Ela aproveitou a boa fase de 2017 para se mostrar como uma defensora de jogos single player com foco na história, algo cada vez mais raro na indústria atual. E agora, seu único jogo em 2018 vai na linha totalmente oposta, aderindo à moda da sobrevivência e ao MMO.

Ao mesmo tempo, Prey, outro jogo narrativo do ano passado, ganhou em 2018 o DLC Mooncrash, que o transforma basicamente em um roguelike. Se a Bethesda de 2017 representava a contracultura das campanhas excelentes e trabalhadas, a de 2018 é o status quo dos roguelikes e da sobrevivência.

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Me acorda quando novos single players forem lançados.

Claro, isso pode ser apenas uma coincidência. Ao defender as campanhas tradicionais em 2017, a empresa não disse que lançaria apenas jogos assim (o que, no clima atual, seria um suicídio comercial). Ao mesmo tempo, com o lançamento de Fallout 76, ela não diz que está abandonando a arte de contadora de histórias pela qual ficou conhecida. As coisas não são excludentes, mas vai ser difícil combater a mudança de percepção do público, uma vez que a Bethesda não tem nada mais tradicional no seu calendário de 2018.

FALLOUT 76

E sabe o que é mais curioso? Eu, que sou tão defensor das campanhas tradicionais quanto a Bethesda ’17, até gosto de Fallout 76 no campo das ideias. O jogo tem a proposta de mostrar as primeiras pessoas que saíram dos bunkers após os ataques nucleares. O objetivo delas é reconstruir a América (o país, como os estadunidenses o chamam, não o continente que realmente tem este nome).

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O bunker 76.

Em outras palavras, faz sentido que fora do bunker 76, onde o jogo se inicia, seja só mato, sem facções ou outros personagens, a não ser um ou outro jogador que aparece de vez em quando. Isso também justifica que a simples sobrevivência seja um desafio. Onde arranjar água e comida em um mundo destruído, sem traços de civilização?

Infelizmente, é só no campo das ideias que eu gosto disso mesmo. Jogar um jogo em que eu tenho que administrar fome, sede e descanso definitivamente não faz parte da minha ideia de diversão. Aliás, se a vida real tivesse a opção de desligar estas features, eu faria isso. Já pensou quanto tempo da sua vida você gasta comendo, e quanto você poderia realizar se usasse este tempo para algo mais produtivo? Tipo assistir pornografia, ou ler o DELFOS?

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Carlonius, meu personagem em Fallout 76.

De qualquer forma, a proposta do jogo poderia render uma história bacana e bem elaborada. Afinal, não é como se faltassem boas histórias pós-apocalípticas na cultura pop.

#FOREVERALONE

A questão é que, embora Fallout 76 tenha missões de história, elas se resumem a ouvir audiologs ou ler longos textos em computadores. Isso, como sempre falo por aqui, não aproveita o forte dos games como mídia narrativa, que é algo que os jogos da Bethesda anteriormente faziam muito bem.

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É assim que a história de Fallout 76 é contada.

Além disso, o jogo também peca como jogo online. O mapa é grande, e há sempre poucos jogadores dividindo o mundo com você. Seus encontros com outras pessoas costumam ser breves e efêmeros. Basicamente, você está seguindo seu waypoint, e outro sujeito passa na sua frente, rumo ao waypoint dele.

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Eventualmente, vocês vão parar e se olhar.

Claro, o jogo incentiva vocês a jogarem juntos, mas o gameplay de Fallout 76 é bastante individual. Não dá para pedir para o jogo te juntar com outras pessoas que estão na mesma missão, e assim fazê-las em grupo, por exemplo. Você pode chamar qualquer caboclo que passar na sua frente para o seu grupo, mas cada um vai ter seus próprios objetivos. Não é algo amigável para alguém estritamente antissocial, como eu.

E, aparentemente, os outros jogadores são tão antissociais quanto. Afinal, nas raras vezes em que eu via alguém, nunca havia algum tipo de interação. A impressão é que todos estão jogando Fallout 76 como se fosse um dos outros Fallouts, e isso acaba matando a própria proposta do jogo, que é, como a série Lost vivia dizendo: “ou vocês sobrevivem juntos ou morrem sozinhos”. Acho que eu vou morrer sozinho então, muito obrigado.

HEADING FOR TOMORROW

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Provavelmente Fallout 76 vai mudar bastante no futuro. Não duvido que, se a Bethesda investir bastante no jogo, ele pode até vir a se tornar um jogo digno do nome Fallout. Afinal, narrativamente, dá para dizer que, neste primeiro momento, a sociedade está sendo criada do zero, mas ao longo dos próximos meses, as pessoas vão se organizar e criar grupos e facções.

gameplay atual não permite que os jogadores façam isso. O mundo é zerado cada vez que você sai do jogo, e você nunca encontra as mesmas pessoas novamente, a não ser que as adicione como amigos. Porém, NPCs podem aparecer com a desculpa acima, aumentando a quantidade de história e de missões.

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Você vai se sentir tão sozinho que vai querer abraçar os presuntos que encontrar. Como na vida real.

A questão é: quem comprou Fallout 76 no lançamento ainda vai jogá-lo quando, e se, isso acontecer? E o jogo vai continuar trazendo novos jogadores por tanto tempo para possibilitar isso? Especialmente considerando que as críticas estão sendo bem duras, e o jogo já não é exatamente cheio de jogadores neste momento?

Difícil dizer. Talvez a vida de Fallout 76 seja curta como a de alguém que passou o fim do mundo em um bunker, sem treinamento para sobreviver sem a civilização. Ou, talvez, como os personagens de sua história, ele consiga criar uma sociedade viva e ativa a partir deste começo difícil. O tempo dirá. Enquanto isso, prefiro criar uma hashtag que me parece apropriada para este momento desta grande editora: #voltabethesda