E eis que, num período de menos de um ano, a editora Suma de Letras publica toda a “trilogia Bill Hodges”, que na terra do tio Sam saiu no espaço de três anos. Ponto para a editora tupiniquim. Último Turno, a conclusão da saga, chegou recentemente às livrarias.
Se na resenha de Achados e Perdidos eu disse que aquele romance não parecia parte de uma trilogia, mas sim uma espécie de interlúdio com os mesmos personagens, este aqui sim realmente é um desfecho para a saga, retomando conexão direta com Mr. Mercedes, o primeiro livro, e encerrando mesmo a história principal iniciada lá.
E como ele tem ligação direta com o primeiro tomo, é impossível falar deste aqui sem dar spoiler do livro em questão. Assim, se você ainda não o leu e pretende fazê-lo, melhor deixar esta resenha guardada para ler apenas depois que você concluir Mr. Mercedes. Vai lá, eu dou cinco segundos de lambuja para você se mandar daqui.
Bem, aos que sobraram, vocês foram avisados, então vamos em frente. Brady Hartsfield, o assassino do Mercedes do primeiro livro está de volta. Ele despertou no hospital e agora conta com poderes paranormais de telecinesia moderada e a capacidade de invadir mentes alheias.
Não vai demorar para que ele volte a atormentar a vida do detetive Bill Hodges e retomar seu objetivo de matar um monte de gente, desta vez influenciando-as a cometer suicídio. Claro que Bill e seus amigos farão de tudo para deter o recém-desperto psicopata.
Bem, se de fato sua ligação direta com o primeiro livro realmente o transforma numa trilogia (há até algumas menções a fatos e personagens do segundo volume, mas ele continua sendo totalmente não essencial para a saga), por outro lado ele toma um caminho mais fantástico que destoa bastante do tom dos anteriores, que eram mais pés-no-chão e realistas.
Na verdade, eu diria que ele toma um caminho até ridículo. A história é bastante forçada e estamos falando de um escritor que se especializou em inserir elementos sobrenaturais e fantásticos em suas tramas e torná-los críveis e orgânicos. Isso não acontece aqui.
Talvez por, como já mencionei, este ser muito diferente da pegada das outras duas partes. Ou então porque Stephen King simplesmente errou a mão mesmo. Mas toda a trama do joguinho eletrônico que hipnotiza as pessoas, deixando-as suscetíveis à influência e ao controle do assassino é bem ridícula, parecendo ter sido escrita por um adolescente e não pelo experiente mestre do terror.
Contudo, quando se foca em sua galeria de personagens e a exploração do lado psicológico de cada um deles, ganha em qualidade e deixa a coisa mais interessante. Já o desfecho da história também é bem padrão e pouco inspirada, o que me passou a sensação de que King forçou a barra para ter uma trilogia, quando poderia ter apenas uma boa história e guardado Bill Hodges, o detetive que faltava à sua galeria de personagens, para quando batesse a inspiração.
Da forma como ficou, temos um bom primeiro livro, um segundo que funciona por si só, mas não como parte da trilogia, e um terceiro que até diverte, mas claramente é pouco inspirado. Último Turno é obra menor (bem menor mesmo) dentro da bibliografia de King. Não é ruim, mas força muito a barra. Encerra a “trilogia Bill Hodges” razoavelmente, mas está bem longe de ser um desfecho memorável.