Tom Clancy’s The Division

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A Ubisoft tem planos deveras ambiciosos para The Division, e eles não são nem um pouco secretos. Basicamente, a gigante dos games quer fazer com que esta nova franquia seja o seu próprio Destiny. Ou seja, um RPG de ação focado em loot no qual os jogadores continuam jogando mesmo meses depois de terem concluído o modo história.

Como alguém que teve uma história de amor bem complicada com o novo clássico da Bungie (história que você pode conhecer lendo o texto que escrevi para o Kotaku), admito que eu tinha medo que The Division tomasse conta da minha vida como aconteceu com Destiny. Eu estava a fim de um jogo divertido, e uma boa experiência, mas algo que terminasse e que eventualmente eu tivesse vontade de jogar de novo desde o início, como a maioria dos jogos.

O que aconteceu após ter passado mais de 50 horas na Nova Iorque pós-apocalíptica de The Division? Isso é o que vou elaborar por aqui.

A SEGUNDA ONDA

A Divisão é um grupo secreto de agentes que ficam inseridos na sociedade e são chamados apenas em situações nas quais tudo está degringolando fortemente. Pois um vírus evoluído da catapora é liberado em plena Black Friday, causando a degringolação supracitada.

Uma pá de agentes é chamada para manter a ordem, mas o governo perde o contato com eles, fazendo com que seja necessário chamar um segundo grupo, desta vez bem menor e bem menos equipado do que o primeiro, que acabou consumindo quase todos os recursos. Adivinha só: você é um desses agentes da segunda onda, e deve descobrir o que aconteceu com seus colegas e botar ordem na casa.

Eu joguei o beta de The Division e lembro de ter comentado com um amigo como os gráficos do jogo estavam fracos. Se você também sentiu isso, é hora de respirar aliviado. O visual da versão final é belíssimo, com cenários realistas e detalhados, e uma excelente recriação visual de Nova Iorque.

Tem até alguns pequenos detalhes como um bandido que levou alguns tiros começar a andar mancando ou cambaleando, demonstrando o capricho que a turminha da Ubisoft Massive teve na criação do jogo.

Uma coisa que eu costumo sentir dos jogos que levam o nome de Tom Clancy é que eles são sérios demais, e isso costuma diminuir consideravelmente a diversão. Para minha surpresa, The Division não é tão sisudo e conta com uma dose bem saudável de humor.

Por exemplo, cada safehouse tem um agente responsável e cada um desses agentes tem um traço de personalidade bem definido e usado para fins humorísticos. Tem o sujeito que realmente gosta de cachorros, um outro que está resfriado e até aquele que é todo místico e cheio dos namastês e do equilíbrio de energia do universo. Chega a dar vontade de fazer as sidemissions só para ver o que eles vão falar, que sempre arranca alguns sorrisos.

PIPOCOS COM AMIGOS

Este é um shooter/RPG que está sempre online. No entanto, ao contrário de Destiny e outros jogos que seguem esta linha, você vê outros jogadores apenas nas safehouses. Quando está passeando pelo mundo aberto, é apenas você e os NPCs, como a maioria dos jogos de mundo aberto.

Ou seja, não espere estar explorando Nova Iorque, encontrar outros jogadores fazendo uma sidemission, se juntar a eles e depois ir cada um para o seu lado. É uma pena, e The Division sofre por causa disso.

Felizmente, você só joga sozinho se quiser. Você pode escolher deixar seu grupo aberto para todos, para amigos ou totalmente fechado. Eu mantive meu grupo aberto durante boa parte da minha jogatina e não demorava muito para outros jogadores se juntarem a mim enquanto estava explorando ou fazendo sidequests.

Quando iniciava uma fase de história, então, podia entrar correndo nela e começar a jogar e dentro de poucos minutos já estava com um grupo completo de quatro jogadores matando desafetos juntos em nome da civilização.

E é exatamente assim que The Division brilha. Ele não comete o erro de jogos como Borderlands, onde o loot é público e deve ser dividido entre os jogadores. Tal qual Destiny, cada um tem suas próprias recompensas, evitando brigas caso um fominha resolva pegar tudo.

Existem alguns níveis de dificuldade para cada uma das missões de história. Na dificuldade padrão, os inimigos morrem com uma quantidade modesta de balas, fazendo com que a ação seja bem parecida com outros shooters do mercado. Estes inimigos têm energias vermelhas, que são as normais.

Ocasionalmente, pode aparecer uma galerinha com energias roxas, que são muito mais resistentes e precisam levar alguns pentes inteiros para morrer, bem como aqueles com energias amarelas, que são ainda mais resistentes.

É bastante diferente jogar no hard, pois as energias vermelhas somem e todos os inimigos têm energias roxas ou amarelas. Além disso, eles são sempre do nível do jogador mais forte do time. Ou seja, se você é nível 15 e está jogando com um cara nível 18, prepare-se para encarar inimigos nível 18. Isso faz com que o jogo seja mais lento e seus aspectos de RPG se tornem mais importantes. Agora é necessário usar as habilidades adicionais dos personagens e trabalhar em equipe com seu time para que vocês estejam sempre saudáveis e com buffs.

Depois que você atinge o nível 30, o cap do jogo, libera uma nova dificuldade, chamada challenging. Agora todos os inimigos têm energias amarelas e além disso são nível 32, dois níveis mais fortes do que o que você consegue atingir. Para piorar, você só volta à vida se for ressuscitado por outro jogador, então fique sempre junto com seus amiguinhos. É realmente muito difícil e um time azeitado é essencial para conseguir sobreviver, pois um único inimigo precisa levar tanta bala para cair que é capaz de destruir seu time inteiro sozinho.

PIPOCOS EXTRAS

Além das missões de história, há coisas secundárias para fazer. Divididas em sidemissions e encounters, trazem objetivos sortidos com recompensas fixas. As sidemissions dão uma boa quantidade de XP, enquanto os encounters dão a moeda que você usa para fazer upgrades na sua base.

Alguns desses objetivos, como caçar inimigos mais poderosos, são divertidos, mas em geral são bem repetitivos. Tem ali uma meia-dúzia de tipos de missões que simplesmente se repetem e boa parte delas envolve encontrar itens em uma área grande e com limite de tempo.

Eu costumo ser obsessivo com sidemissions e fazer todas elas, mas essas realmente não me apeteceram. Depois que cheguei no nível 30, e XP não servia para mais nada, parei de fazê-las, e fiz os encounters apenas para conseguir comprar todos os upgrades da base.

Há algumas centenas de colecionáveis também, que envolvem majoritariamente audiologs desenvolvendo o mundo do jogo e sua história, mas o legal mesmo em The Division é a sua ação, que é muito divertida. Você simplesmente não vai se importar muito com a história.

PIPOCO E INVENTÁRIO

A jogatina, como na maior parte dos RPGs de ação, se divide em duas partes. Uma delas é o tiroteio em si, que é excelente. Trata-se de um cover based shooter, na linha Gears of War, mas obviamente com itens e habilidades. Na dificuldade normal, você pode jogar como o Gears mesmo, focando no tiroteio. Nas dificuldades mais altas, os itens e habilidades são essenciais, dando um sabor bem diferente ao jogo.

A outra parte da jogabilidade é a manutenção do inventário. Tal como Borderlands e o próprio Destiny, você fica o tempo todo coletando armaduras e armas. E quando o tiroteio acalma ou uma missão é concluída, você vai querer entrar no seu inventário e comparar estatísticas dos itens que você tem equipados com os novos e tomar algumas decisões bem difíceis. Você abre mão daquela sua joelheira que dá 10 mil de pontos de saúde por uma outra que dá dois mil de dano de tiro, mas que tem um grau de proteção maior?

Os equipamentos são codificados por cores daquela forma tradicional de RPGs. Eles podem ser, em ordem de qualidade, cinzas, verdes, azuis, roxos e amarelos. Porém, você não pode achar uma arma que goste e ficar eternamente com ela.

Por exemplo, eu arranjei uma light machinegun que tinha um pente de mais de 100 balas. Como os inimigos precisam levar muita bala para cair, era bem satisfatório esvaziar um pente inteiro dela num desgraçado. Porém, conforme eu subia de nível, a arma mantinha o nível antigo, se tornando cada vez mais inútil. E é muito triste quando você se vê obrigado a trocar sua arma roxa e pintuda por uma outra verde cocozona que tem um nível mais alto.

Tudo isso, claro, é típico de RPGs e você provavelmente já teve que tomar esse tipo de decisão em tantos outros jogos do gênero. Isso também faz com que seu personagem esteja em constante evolução. As habilidades e equipamentos que você está usando agora podem ficar completamente diferentes duas horas depois.

PIPOCO BANG BANG!

Eu achei a ação de The Division realmente muito divertida, mas isso não significa que ela não tem alguns problemas. O que mais me incomodou é que você larga o botão de mira para se esconder na cobertura, mas se você não largar antes o botão de tiro, seu personagem vai ficar com o braço para fora, levando tiros. Perdi a conta de quantas vezes morri por essa decisão estranha de design, que nunca tinha visto em nenhum outro jogo de tiro.

A jogatina em geral rola sem lag, mesmo em quatro jogadores, mas rola um certo atraso no registro de tiros, mesmo quando você está jogando sozinho. Na prática, o que você vê é que a energia do inimigo começa a diminuir um tempinho depois de você começar a atirar e às vezes ele morre sozinho depois que você já parou de atirar. Sei que o “envio de tiros” é algo que depende do upload da sua conexão, mas aqui esse problema foi permanente.

Uma coisa que parece muito datada é que quando você morre e tem que esperar um outro jogador te salvar, não pode mudar a câmera para assistir a ação de outros lugares e ver o que seus colegas estão fazendo. Ela fica sempre lá, mostrando seu presunto, o que deixa bem chato, especialmente quando você não tem a opção de renascer sozinho e seus colegas não estão por perto.

Claramente, The Division é um jogo para ser curtido em grupos, mas tem algumas decisões que tornam jogá-lo sozinho um suplício. Por exemplo, em sidemissions e encounters, se você morre, não vai reiniciar de um checkpoint, mas tem que escolher uma safehouse para renascer, andar até a missão e recomeçá-la do zero. É algo que já era ruim naqueles primeiros jogos de mundo aberto lançados nos idos de 2003, e é inaceitável que seja assim em um jogo de 2016.

As missões principais têm checkpoints, mas eles são bem distantes. Eu não fiz nenhuma delas sozinho, mas é fácil de perceber quão frustrantes elas podem ficar, considerando quão fácil é de morrer no jogo, tornando sempre essencial ter um grupo para te ressuscitar. No momento, tem gente adoidado jogando The Division e seu matchmaking é bem eficiente, então isso não é um problema, mas pode se tornar daqui a um ano quando as pessoas migrarem para outros jogos mas você queira refazer a história (ou caso simplesmente tenha comprado o jogo mais para frente).

DARK ZONE

A Dark Zone é um conceito bem interessante e único a The Division. Trata-se de uma área específica do mapa na qual você só entra se quiser. Nenhuma missão da história leva você até lá (o que parece uma oportunidade perdida) e a única sidequest relacionada é uma que simplesmente te manda entrar na região.

Lá dentro é o único lugar de ação em que você vai encontrar outros jogadores. É também o único lugar em que você pode matar outras pessoas. Basicamente, você entra na Dark Zone em busca de loot, pois os inimigos dali (todos com energias roxas e amarelas) têm um drop bem mais alto de equipamento. Você basicamente sai explorando a região e matando NPCs esperando por drops interessantes.

Quando sua mochila estiver cheia, você deve ir a uma zona de extração e chamar um helicóptero, que demora 90 segundos para chegar. Neste tempo, você é atacado por NPCs e todos os jogadores na região serão avisados, podendo aproveitar o helicóptero para extrair os seus próprios itens ou atacar os jogadores e roubar seus loots.

Aí está o twist. Um jogador que ataque outros se torna um traidor e, como tal, será caçado por todos os outros. Ao se tornar um traidor, um timer aparece. Seu objetivo é sobreviver até o tempo esgotar, e assim você é recompensado. Obviamente, isso é muito difícil, uma vez que estará todo mundo tentando te matar. O lado ruim é que você pode se tornar traidor sem querer, caso algum outro jogador entre no seu campo de visão.

Morrer como traidor tem uma penalidade enorme de experiência e dinheiro, além de você derrubar todos seus itens, e a recompensa para sobreviver não ficou clara para mim, então não parece exatamente um bom negócio. Dessa forma, a maioria das pessoas na Dark Zone está mais interessada em arranjar bons loots do que em matar outros.

Até o fechamento deste texto, eu visitei a Dark Zone três vezes. Vou contar como elas foram.

A DARK ZONE E EU

Na minha primeira visita, eu estava jogando com um amigo. Entramos lá e começamos a coletar itens. Logo, dois outros jogadores começaram a seguir a gente e pouco depois eles entraram no nosso grupo, e saímos explorando juntos por um tempo. Como estava explorando, cheguei a matar outros jogadores para ver como era, sendo imediatamente assassinado logo em seguida.

Na segunda vez, meus equipamentos estavam seriamente underleveled e eu precisava de uns upgrades rápidos. Fui lá sozinho, mas não durei muito. Ou os NPCs me matavam ou grupos de jogadores traidores o faziam. Dessa vez foi bem frustrante. Morri tanto que perdi muita experiência e dinheiro. Além disso, uma das coisas que você pode comprar com pontos na lojinha do Ubisoft Club são três chaves para a Dark Zone. Eu comprei e as perdi antes mesmo de descobrir para que usá-las. Taí um péssimo investimento.

Minha terceira visita foi a mais legal. Nas safehouses, você pode pedir pro jogo te juntar com outras pessoas que estejam se preparando para entrar na Dark Zone. Eu fiz isso e fui juntado com três caboclos e lá fomos nós, pimpões e saltitantes, rumo ao nosso loot.

Mesmo sem nenhum de nós estar usando microfone, a coisa rolou de forma muita legal. Nós exploramos o cenário juntos, pegamos equipamentos e de tempos em tempos fazíamos extrações. Eu saí dali com 30 novos equipamentos, muitos deles roxos.

Em determinado ponto, acho que o grupo se cansou de ser bonzinho e se tornou traidor. A partir daí, começamos a ser caçados. Eu saquei que o ideal era ficar em uma posição e atirar em quem chegasse perto, mas como sou muito impaciente, acabava perseguindo os caras que tentavam fugir de mim. Isso, obviamente, fez com que o grupo dele me matasse. Tomei isso como deixa para voltar ao jogo normal, mas essa última visita foi uma experiência divertida e tensa.

A DIVISÃO

Quando terminei Destiny, eu senti que o jogo tinha sido curto demais e até por isso continuei jogando. Não senti isso em The Division. Joguei este por mais de 50 horas até chegar no fim da história, embora o final seja um pouco brochante, apenas com uma mensagem de áudio, sem cutscenes, créditos nem nada do tipo.

Ainda assim, me considerei satisfeito com o jogo. Ao chegar no nível 30, você libera a nova dificuldade challenging, a possibilidade de encontrar itens amarelos e missões diárias com recompensas saborosas. Eu devo fazer essas missões por alguns dias só porque ainda estou me divertindo com The Division, mas admito que não quero que jogá-lo diariamente se torne uma obrigação como aconteceu com Destiny.

Além disso, tem uma incursão planejada para um update futuro gratuito, e no mapa você vê que ela precisa de um nível X de equipamento. Não consegui descobrir como ver meu nível de equipamento, mas espero que a Ubisoft não repita o mesmo erro da Bungie ao obrigar os jogadores a achar loots específicas para subir de nível.

De qualquer forma, mesmo sem o end game, The Division já é um jogo satisfatório e muito divertido. É fácil recomendar para qualquer fã de RPGs de ação. Agora vamos ver se eu consigo lutar contra o vício de jogá-lo diariamente.

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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
tom-clancys-the-divisionAno: 2016<br> Gênero: RPG / TPS / MundoAberto<br> Plataforma: PS4, Xbox One e PC<br> Fabricante: Ubisoft Massive<br> Versao: PS4<br> Distribuidor: Ubisoft<br>