Todo ano temos uma nova E3 e todo ano, após a apresentação das grandes produtoras, todos se perguntam: “quem ganhou?”. Apesar de ser uma exposição, é nítido que há uma competição para ver quem consegue empolgar mais o público. Com a conclusão das coletivas da Sony, Nintendo e Microsoft, podemos analisar com mais calma os fatos apresentados e ver para onde irá o mercado daqui para frente. Vamos seguir em ordem cronológica.
Microsoft – A inovação tecnológica definitiva
A apresentação da Pequenomole foi perfeita. Ela entrou no espírito da nova E3, que pretendia voltar às origens, e fez uma apresentação para a imprensa especializada e para os gamers. Nada de gráficos, discussão de lucros e coisa do tipo. Finalmente pudemos pirar o cabeção se preocupando apenas com o que importa para nós, os jogos.
Foi apresentado um line-up muito bom, que conta com Splinter Cell: Conviction, Assassin’s Creed 2, Left 4 Dead 2, dois novos Halo e jogos exclusivos para XBLA. Além disso, ficamos impressionados com a nova estratégia da companhia, a integração multimídia com serviços de distribuição digital de música, vídeo, televisão e até mesmo com o Facebook. Eu já estava convencido de que seria difícil alguma das outras duas companhias baterem a sua apresentação. É então que ela apresenta a quebra da maior exclusividade da Sony: Metal Gear Solid.
Eu já estava satisfeito quando a companhia começa a falar sobre novas maneiras de interagir com o console. Era a deixa para entender que a Microsoft tinha uma resposta ao controle com sensibilidade a movimentos da Nintendo. Eu, particularmente, estava bem curioso com relação ao novo sistema. Os rumores haviam surgido há algumas semanas na internet, e ele possivelmente utilizaria apenas uma câmera, captando os movimentos do corpo. Estava preparado para isso, mas não para o anunciado Project Natal.
O Project Natal é um sistema de captura de movimentos, não o controle. Sua proposta é justamente eliminar o controle, proporcionando total imersão no mundo virtual: ele capta os movimentos do seu corpo em três dimensões usando uma câmera e os reproduz fielmente na tela utilizando o seu avatar. É a mesma tecnologia por trás de Expresso Polar e Beowulf, a última palavra em animação por computação gráfica.
Você não aperta mais um botão para socar um adversário, você faz o movimento do soco. Naturalmente, o console reproduz isso na tela e então determina se você foi capaz ou não de atingir o adversário, analisando o seu “mundo virtual”.
Mas o sistema da Microsoft não é só isso, ele também reconhece comandos por voz e rostos das pessoas além de permitir controlar a dashboard utilizando movimentos com as mãos (impossível não se lembrar de Minority Report nesta hora). Nos vídeos também pudemos ver os jogos reagindo em tempo real ao que os jogadores falavam. Parece que havia algo que ainda não havíamos compreendido.
Entra em cena Steven Spielberg, que se diz extremamente empolgado com a nova tecnologia apresentada pela Microsoft. Tudo bem, mas por que convidar Spielberg? Ele não faz jogos (ok, participa de alguns, mas mesmo assim…), por que o interesse?
O CEO da Microsoft informa que o sistema acabou de ser disponibilizado para as desenvolvedoras parceiras, mas havia uma em especial que já estava brincando com ele há alguns meses. Peter Molyneaux, criador de Fable, entra no palco e temos a maior surpresa no mundo dos games desde o surgimento do Atari.
Molyneaux criou, com sua equipe, Milo. Ele é um garoto que mora num mundo virtual, mas é capaz de interagir com o mundo real. Uma moça conversa com ele, que então analisa suas expressões faciais, seu tom de voz, e responde de acordo. Você vê a preocupação na face de Milo quando ela lhe pergunta se ele já fez seu dever de casa, como as crianças fazem ao perceber que não fizeram o que tinham de fazer. Ela se propõe a ajudar, e desenha em um papel. Ela então passa o papel por cima da televisão, na frente da câmera do console, e ele é instantaneamente reproduzido na tela, indo direto para as mãos de Milo. E ele analisa o desenho. Nesse momento eu já estava em êxtase e não conseguia pronunciar mais nada. Devia ter levado um babador.
Falar sobre o reflexo da garota quando ela olha em um lago, ou a resposta instantânea dos gráficos conforme ela movimenta as mãos “tocando” no espelho d’água, é chover no molhado. É para calar a boca de quem duvida do potencial do Xbox.
E voltamos à questão da presença de Spielberg. Com a capacidade do console de reconhecer emoções e comandos, bem como a capacidade de reprodução multimídia, não é muito difícil que o mesmo sistema possa estar disponível em mídias menos interativas. E se a mocinha pudesse ouvir o espectador avisando-a do perigo? E se as cenas mais intensas e violentas fossem poupadas assim que o console notasse a presença de uma criança? As possibilidades são imensas!
É então que a apresentação termina e ficamos com o queixo caído ao ver o futuro. Não há dúvidas de que há um potencial imenso para uma nova geração inteira ali. E, no entanto, ela estará disponível em todos os consoles vendidos até hoje, comprando-se apenas a câmera. A Sony e a Nintendo teriam de se esforçar muito para se destacar depois do Project Natal. Aliás, o sistema tem esse nome porque foi criado por um brasileiro, natural da capital do Rio Grande do Norte, uma homenagem à cidade.
Nintendo – Fechada em seu mundinho particular
A Nintendo havia sido responsável pela revolução nos jogos casuais, criando um console onde qualquer pessoa, mesmo aquelas sem prática, pudessem jogar. Desde o lançamento do Nintendo Wii, no final de 2005, o seu público alvo se diversificou muito. O cenário inimaginável se tornou real: até mesmo pessoas idosas estavam animadas e brincando com o Wii.
No entanto, havia uma parcela insatisfeita. A grande quantidade de jogadores e fãs da Nintendo sofriam com a falta de jogos mais “maduros” e elaborados. Os únicos títulos que conseguiram trazer esta experiência aos jogadores velhos de guerra foram aqueles criados pela própria Nintendo. Há um tremendo vazio no que se refere a third parties programando para o Wii. Sem falar que todos estavam decepcionados com a “simplicidade” do wiimote, capaz de reconhecer movimentos praticamente apenas em duas dimensões, e mesmo assim apenas movimentos limitados, pré-programados.
Era a grande chance da Nintendo dar uma resposta aos críticos. E ela simplesmente ignorou esta oportunidade.
Diferente da Microsoft, a coletiva da Nintendo parecia um comercial com uma hora e quinze de duração. Repetiram à exaustão sobre a forma que revolucionaram o mercado e como ampliaram seu público alvo com o Nintendo Wii e o Nintendo DSi. Parecia um apelo aos acionistas: “invistam em nós, somos uma máquina de fabricar dinheiro”!
Anunciaram uma continuação do Wii Fit, o que não é nenhuma surpresa e que não traz nenhuma grande novidade. Anunciaram vários jogos “casuais” para Nintendo DS, alguns de qualidade altamente questionável. Por exemplo, um dos jogos anunciados foi Style Savvy, onde você compra roupinhas para o seu avatar no DS. Caramba, não é pensar pequeno demais? E ainda por cima anunciam o jogo como se ele fosse direcionado a tweens e 20-somethings. Como é que é? Eles realmente esperam que uma gamer com mais de 20 anos jogue isso? Desanimador.
A Nintendo teimou em apresentar o Wii Motion Plus como se fosse uma novidade revolucionária, mesmo tendo sido anunciado meses atrás. E isso mesmo depois da apresentação do Project Natal, que é claramente uma tecnologia superior. A memória do que vi no dia anterior só ressaltava as limitações do Motion Plus: o cursor era tremido, parecia sensível demais.
Ok, então a Nintendo não apresentou nenhuma novidade tecnológica. Mas tudo bem, ela pode se sobressair na questão de lançamentos, pensei. Minhas esperanças serviram apenas para tornar a decepção maior.
A Nintendo começou bem, mostrando o New Super Mario Bros. Wii, versão para console de mesa do melhor jogo do Nintendo DS. Quatro jogadores na mesma tela, simultaneamente, com um cenário com excelentes animações e gráficos, no bom e velho estilo plataforma 2D. Realmente, era muito bom. Mas, ainda assim, não era algo surpreendente.
Então ela apresenta Super Mario Galaxy 2. E ele é exatamente igual ao primeiro jogo, com a mesma mecânica, talvez apenas com um mundo mais diversificado. Se você é fã da franquia, deve ter ficado feliz coma possibilidade de montar no Yoshi no jogo. Mas não, isso não é suficiente para aplacar a ira dos jogadores hardcore, abandonados pela companhia. Será que ela não vai apresentar nenhuma novidade?
Fils-Aime então aparece dizendo que lê o que dizem sobre sua companhia na internet. E que estão trazendo third parties para o Wii. Ótimo, tudo que queríamos ouvir. Agora mostre os jogos! E então ele mostra dois rail shooters (Resident Evil Darkside Chronicles e Dead Space Extraction) e o já divulgado The Conduit. Não importa o quanto tentem inventar, rail shooters sempre são chatos e repetitivos! Vamos lá, Nintendo, eu acredito em você!
Outra novidade foi a volta da franquia Final Fantasy para a Nintendo, com Final Fantasy Crystal Bearers, título exclusivo para o Wii. No entanto, nada foi mostrado, deixando todo o público decepcionado. Essa, pelo jeito, tem se tornado uma especialidade da companhia desde a E3 de 2008, quando apresentaram o Wii Music. Um ano depois e quase ninguém fala mais desse jogo. Que sucesso, não?
É aí que eles mostram o game que quase salvou a coletiva, Metroid Other M. O jogo está sendo desenvolvido em parceria com o Team Ninja, responsável pela franquia Ninja Gaiden. E vemos Samus dando cambalhotas, arrebentando as fuças de monstros alienígenas. Finalmente temos a confirmação: o Wii terá pelo menos um jogo de ação decente este ano! Infelizmente, parece que só terá esse.
A coletiva termina e ficamos olhando um para o outro, com um tremendo WTF?! na cabeça. A Nintendo parece simplesmente ignorar o que ocorre à sua volta. E não percebe que os seus concorrentes estão lhe alcançando.
Sony – Correndo atrás do tempo perdido
Com a apresentação totalmente decepcionante da Nintendo, só nos restava rezar para que a Sony não cometesse os mesmos erros da Big N. Felizmente nossas preces foram ouvidas e fui poupado de mais uma apresentação chata com duas horas de duração.
Ela começou falando sobre o PS2, o console da geração passada e que continua firme e forte. Reafirmou seu compromisso de dar suporte ao videogame, prometendo 100 novos títulos para ele ainda esse ano. Também divulgou que irá investir na América Latina, incluindo o Brasil nos seus gráficos. Sim, finalmente o PS2 terá suporte oficial aqui! A Sony reconheceu que existimos! É uma pena que não tenha sido falado nada sobre trazer o PS3 para cá…
A Sony focou bastante em seus próximos jogos para Playstation 3. Apresentou um trailer de gameplay de Uncharted 2, que mostra que ele se tornou maior, melhor e mais intenso. Quando você tem que pular entre prédios que desmoronam, enquanto escapa de um helicóptero atirando em você e ao mesmo tempo tem de matar capangas, sabe que está na frente de algo extremamente hell, yeah!
Também apresentaram uma demonstração ao vivo de MAG, um FPS cujo principal diferencial é permitir “apenas” 256 jogadores online ao mesmo tempo. É praticamente uma guerra ao vivo e um prato cheio para quem gosta desse tipo de jogo.
Depois disso, apresentaram os lançamentos para o PSP, cujo principal diferencial é Metal Gear Solid: Peace Walker, continuando a saga. Entretanto, este aqui se situa dez anos depois de Metal Gear Solid 3. Como você pode ver, Hideo Kojima não foi assim tão infiel à Sony.
A seguir é apresentado o PSP Go, a nova versão do portátil da Sony. Também vem o anúncio de que, a partir de então, todos os jogos do PSP serão disponibilizados na loja online e em mídia física, dando um tiro de misericórdia no UMD. E não são apenas jogos que estarão disponíveis. Músicas e até programas de TV poderão ser carregados direto no seu “neguinho”. Pena que o design do portátil, quando aberto, seja tão feio.
Pouco tempo depois temos o “momento vexatório” da Sony. Ela apresenta o seu controle de reconhecimento de movimentos, uma mistura do Wiimote com o Project Natal. O Playstation Eye capta os movimentos de um controle especial, no caso um bastão com uma bolinha colorida na ponta, e reproduz os movimentos num cenário 3D. Pela apresentação, vê-se que era um produto ainda em desenvolvimento e aquilo era apenas um protótipo bem rudimentar. Até mesmo a equipe técnica parecia incomodada em mostrar algo incompleto. Fica claro que a companhia quis dar uma resposta ao Wii Motion Plus e ao Project Natal, mas aparentemente se precipitou. É claro que isso ainda levará pelo menos mais um ano para ficar pronto, então por que mostrar agora? Pelo menos ele pareceu mais preciso que o Project Natal e menos “tremido” que o Motion Plus. Só resta esperar para que ele fique pronto antes do Playstation 3 ser declarado obsoleto.
A apresentação seguiu, com a apresentação de Modnation Racers, um jogo de corrida que permite a criação de pistas com armadilhas, armas, diversos terrenos e iluminação. Parece uma mistura do espírito de Stunts com o gameplay de Mario Kart, adicionando a disponibilidade de pistas na internet. Sem dúvida, um excelente jogo.
É então revelado o novo game do Team Ico, responsável por Shadow of the Colossus. O Project Trico foi renomeado para The Last Guardian, e vemos basicamente o mesmo trailer que vazou na internet há algumas semanas, mas estendido e com gráficos melhorados. A história do menininho com seu grifo gigante, é emocionante. Creio que vou chorar se o bichano morrer no final do jogo.
Finalmente, é exibido o incrível demo de God of War III, o jogo mais esperado pelos donos do PS3. Os gráficos estão sensacionais e uma grande atenção foi dada aos efeitos sonoros. É muito legal ver sangue se espalhando enquanto você ouve o som de carne cortada e sangue jorrando. É algo tão fofo que somente um verdadeiro true pode gostar. 🙂
O demo cumpriu bem o seu papel, mostrando gráficos fantásticos e novas criaturas. E sim, o Kratos continua tão pintudo quanto antes, fazendo até mesmo uma mantícora fugir de medo depois de levar uma surra. Pena que a Sony resolveu nos torturar e anunciou o lançamento do jogo apenas para março de 2010, contrariando as expectativas de que sairia esse ano.
Com isso, a apresentação foi encerrada e, mesmo sem grandes inovações tecnológicas, ficamos com a sensação de que a Sony cumpriu bem o seu papel. 2009 pode mesmo ser o ano do Playstation 3.
Saldo Final
Teve de tudo um pouco na E3 deste ano, com apresentações variando de medíocres a excelentes.
A verdadeira decepção ficou por conta da Nintendo. Parecia que ela estava apenas fazendo volume ali, sem mostrar nada de interessante. Ela se comporta como se estivesse alienada do resto do mundo dos games, como se a hegemonia do Wii fosse eterna. Mas os concorrentes estão se movimentando, e não deve demorar muito para que cheguem nela.
Aliás, a Microsoft, tecnologicamente, acabou de ultrapassar a Nintendo. O Project Natal foi o verdadeiro trunfo da empresa. Isso fez com que ela ganhasse a disputa logo no primeiro dia, dando poucas chances às outras duas grandes.
Obviamente, o Project Natal não deve ser incluído em todos os jogos. Pelo menos não o sistema de captura de movimentos. Mas a capacidade de reconhecer comandos vocais e de “entender” o que o jogador quer dizer, pode realmente revolucionar os jogos. Já imagino essa feature em um Gears of War 3, onde você dá ordens para o seu esquadrão se agrupar ou avançar sem ter de apertar botões.
Já a Sony continua correndo atrás do prejuízo, mas parece que vai chegar lá. Há muitos jogos bons sendo lançados para o seu console, que continua tendo lançamentos exclusivos. Ela só precisa parar com a mania de copiar as concorrentes e começar a inovar.