O Oceano no Fim do Caminho (resenha da Joanna)

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Depois de Os Filhos de Anansi, que saiu em 2005, o tremendão Neil Gaiman esteve dedicado a escrever livros infantis, como os ótimos O Livro do Cemitério e Odd e os Gigantes de Gelo. Só agora, oito anos depois, chegou outro livro dele dedicado aos crescidos, O Oceano no Fim do Caminho. Mas as experiências da infância e o poder que elas têm sobre nós ainda são o grande tema.

Tudo começa quando o protagonista, cujo nome não nos é revelado, chega a Sussex, sua cidade natal, para um funeral, e guiado por um impulso, escapa para visitar sua antiga casa, que fica numa estradinha rural. Ao chegar lá, ele resolve ir em frente até o fim do caminho e acaba encontrando a fazenda das Hempstock. Ao retornar a este fatídico lugar, ele começa a recordar os sombrios momentos que viveu ali na companhia de uma estranha menina que chamava um pequeno lago de Oceano.

Assim nós passamos a acompanhá-lo como um inteligente e sensível garoto de sete anos. Coisas ruins começam a acontecer, e a única pessoa a quem ele pode recorrer é Lettie, sua nova e misteriosa amiga que mora com a mãe e a avó na fazenda no fim do caminho. Como ele imaginava, Lettie e sua família são muito mais do que parecem, e através delas ele descobre partes da realidade que nem sonhava que existiam. Mas ao voltar de lá, ele acaba abrindo caminho para uma criatura que nunca deveria ficar à solta no nosso mundo. E então, ele e Lettie terão de detê-la.

Em geral, a escrita do Neil Gaiman é sempre muito cativante. As descrições que ele faz realmente conseguem te fazer visualizar, entender e sentir o que ele propõe. Mas quando ele escreve para crianças – ou sobre crianças – é especialmente legal. A sensibilidade que ele tem para pensar e ver as coisas de uma perspectiva infantil, sem menosprezar nem romantizar demais, é realmente impressionante.

Ele descreve todos os pequenos prazeres, medos e impressões infantis com umas frases tão pungentes, e ao mesmo tempo tão óbvias, que dá vontade de ir sublinhando conforme se lê. É incrível a simplicidade com que ele descreve sensações que parecem meio abstratas, instintivas. Ele deixa o protagonista muito convincente e relacionável, e enquanto vai contando a memória do personagem, e misturando elementos da sua própria infância (Gaiman já viveu em Sussex, por exemplo), também vai despertando as lembranças de quem lê.

A parte fantasiosa é levada com a mesma seriedade e com o mesmo tom grave, e assim fica fácil se deixar envolver. O livro é bem pequeno, e o cenário se limita àquele caminho de terra, sem desperdiçar tempo com o mundo exterior. O resultado é uma história curta, mas muito rica e extremamente imersiva. É um daqueles livros que você não quer largar e ao mesmo tempo quer ler aos poucos para não acabar rápido demais.

Se você já conhece o Neil Gaiman, vai achar bem familiar. Os gatos sem nome, a costura mágica e o mundo paralelo parecem com Coraline. A sensação de isolamento lembra O Livro do Cemitério. E este clima de fantasia que vai aos poucos pendendo para o terror, sempre presente na obra dele, aqui também está muito bem representado.

Enfim, o Neil Gaiman tem exatamente o tipo de escrita que me agrada, e O Oceano no Fim do Caminho é bem característico dele. Portanto, para mim seria fácil dar o Selo Delfiano Supremo. Mas fazê-lo poderia dar expectativas altas demais e estragar a experiência do delfonauta. Sendo assim, se você quiser uma leitura breve, mas emocionante, eu recomendo. Especialmente se por dentro você ainda se parece com o que era quando tinha sete anos.

Não deixe de ler também a resenha do Cyrino para este mesmo livro.