Será que alguém ainda acredita na ideia de mãe perfeitinha, aquelas de comercial de margarina? Eu acho que não. É muito mais comum se referir às mães como essas entidades que se desdobram para cuidar de tudo e todos, que nos conhecem melhor que nós mesmos e que sempre colocam nossas necessidades antes das suas próprias. E concordemos que com tantas preocupações, responsabilidades e expectativas, ampliadas por um amor tão incondicional, não dá para ser exatamente “normal” e equilibrada. E é melhor assim, afinal, todo mundo tem uma história engraçada para contar sobre as manias e traços da mãe.
Inspirado por muitas dessas histórias e pela sua própria mãe, o comediante Paulo Gustavo criou a Dona Hermínia, que personifica esse conceito de “mãe da vida real”. Ela está no espetáculo Minha Mãe é uma Peça, que estreou em 2005 e continua em cartaz até hoje. Depois de ir para a TV, no programa 220 Volts, que Paulo estrela no Multishow, agora ela está também nos cinemas, dessa vez acompanhada de seus filhos, seu ex-marido, sua tia e todos os personagens que até agora eram apenas citados.
Eu confesso que não conheço muito do trabalho dele, mas aqui ele está muito bem. Depois de tantas porcarias estreladas pelos irmãos Wayans, pelo Eddie Murphy e afins, quando um filme tem como protagonista um homem caracterizado de mulher, já se espera aquele resultado bizarro que te deixa desconfortável ao assistir. Pelo menos era o que eu esperava. Mas Paulo Gustavo ficou uma mulher bastante convincente. A maquiagem e o figurino, apesar de caricatos, não estão exagerados. E a linguagem corporal também mostra que, depois de tantos anos, ele já está bem confortável na personagem.
Mas o mais legal é quão bem construída a Dona Hermínia é. O jeito de falar, os vícios de linguagem, os trejeitos, as atitudes (como não conseguir dormir nem comer quando longe dos filhos, mesmo estando brigada com eles), é tudo muito realista. Aposto que ela vai te lembrar realmente de alguém que você conhece. Talvez não sua mãe, mas uma tia, sogra, empregada, vizinha, whatever. Com certeza você conhece uma dessas senhoras meio loucas e neuróticas, mas que também têm um coração enorme e a melhor das intenções.
As partes tristes que tentaram inserir não foram desenvolvidas o suficiente, e também tem umas piadas de peido, o que fez dois dos Alfredos da nota voarem desesperados. Por sorte, nenhum desses pontos teve grande ênfase ou importância, então não chegaram a prejudicar realmente. O filme em si é bastante simpático, e bem sucedido na proposta principal: a de criar uma figura materna familiar e identificável para todo mundo, com quem é ridiculamente fácil simpatizar.
Mas voltando àquele assunto do início: na vida real eu dificilmente vejo adolescentes que têm vergonha dos pais a ponto de falar deles como os filhos do filme falam. Se fossem duas criancinhas (muito mimadas) ainda seria compreensível preferir morar com o pai rico, mas na adolescência, normalmente as pessoas já compreendem que as mães pegam no pé porque se importam com você. Na escola, por exemplo, até o pessoal mais desagradável com quem eu convivia ainda era apegado ao pai ou à mãe. Problemas e conflitos todo mundo tem, obviamente, mas na grande maioria, ao menos o respeito continua lá. Será que foi só sorte minha nunca cruzar com o outro tipo? Ou será que esse estereótipo é que já ficou ultrapassado?