Já faz um bom tempo que a gente acompanha aqui no DELFOS o desenvolvimento de Lost Kids: Buscando Samarkand, a cria de Felipe Cagno. Agora ela finalmente ficou pronta.
Caso você não se lembre, Lost Kids é uma minissérie em HQ que acompanha JJ, uma menina que acabou de perder os pais e agora está na casa de seu amigo Tommy, um rapaz com um talento para o desenho. De repente, JJ recebe uma estranha esfera pelo correio, que a teletransporta magicamente junto com Tommy e mais três colegas de escola, Sarah, Peter e Kate. Os cinco vão parar em Akkades, uma misteriosa cidade medieval onde os navios voam e as florestas escondem monstros devoradores de almas. Um lugar que Tommy já tinha desenhado.
Lá eles terão de superar seus próprios conflitos e se unir a um velho cavaleiro, um historiador de moral duvidosa, um assassino de aluguel e um aprendiz de feiticeiro. Com essa variedade de aliados, eles vão partir numa missão para encontrar uma princesa rebelde, desvendar a cultura de uma civilização desaparecida e buscar uma cidade lendária que é a única chance de voltarem para casa.
Para tornar este projeto realidade, Cagno reuniu 15 artistas – do Brasil, México, Escócia, EUA, Austrália e outros – para ilustrar sua história, que inicialmente era um roteiro de cinema. Apesar de se prender muito a tropes e estereótipos adolescentes batidos, os personagens vão ficando mais carismáticos conforme são aprofundados. Ironicamente, os adultos foram os que mais me agradaram.
Os cenários fantásticos que eles desbravam são muito legais, e a mitologia de Samarkand e dos Deors também é interessante. Mas acho que o maior atrativo é a carga nostálgica que vem com essa mistura de temas. Os Goonies, Caverna do Dragão, As Crônicas de Nárnia, todas essas aventuras têm grande influência no clima desta história.
No entanto, existem problemas que têm de ser citados. Por exemplo: o fato de cada uma das oito partes ter um artista diferente, que eu achava que seria um grande diferencial, acabou sendo um ponto negativo. Isso porque, apesar de serem, em maioria, competentes, eles têm estilos extremamente distintos. Alguns parecem bem influenciados pelos mangás, outros já têm estilos mais realistas, e outros são extremamente cartunescos. Quando você está começando a se acostumar com o traço de um, vem outro que não tem nada a ver com o anterior. Alguns personagens – especialmente o Peter, o Colt e o Nightmare – ficaram completamente diferentes de uma edição para outra, e isso causa algumas confusões que atrapalham.
O que também poderia ter sido melhor são os diálogos. Como eu já comentei, Lost Kids nasceu como um roteiro de cinema, e provavelmente foi concebida em inglês. Ler em português deu a mesma sensação de ver um filme dublado: fica nítido que funcionaria melhor em inglês. O que é frustrante, sendo que o autor é brasileiro e poderia ter dado uma adaptada mais cuidadosa.
Mas esses defeitos não foram surpreendentes para mim, que vivo vasculhando o trabalho de artistas independentes e acompanhando webcomics internet afora. São problemas que se resolvem com a experiência. O potencial existe e transparece mesmo assim. Com esse jeitão de filme aventuresco de Sessão da Tarde, eu o consideraria mais um bom candidato para iniciar minha irmã e meus primos mais novos aos quadrinhos, por exemplo.
O que realmente me incomodou ao ler Lost Kids foi ter de fazê-lo em PDF, já que a HQ não pôde ser impressa ainda. Mas isso você mesmo pode ajudar a mudar, colaborando com o fundraising que o autor está fazendo no Catarse. Corre lá que a campanha termina hoje, mas ainda dá tempo de ajudar.