ATENÇÃO: O texto abaixo discutirá em detalhes a história da série God of War. Se você ainda não jogou e não quer estragar surpresas, não leia.
Há muito tempo quero escrever este texto. Mais precisamente, desde que a empolgação inicial com o esperadíssimo God of War III passou. Agora, que finalmente tive a oportunidade de colocar minhas mãos nos jogos de PSP, graças à Origins Collection, me empolguei para escrever, pois posso dizer que conheço toda a história lançada até o momento.
A SÉRIE GOD OF WAR
Se você está lendo este texto, com certeza já jogou pelo menos um dos cinco jogos, e meu foco aqui vai ser nos principais, ou seja, God of War, God of War II e God of War III.
Estes três jogos mudaram a cara dos jogos de porrada. Se na época do lançamento do primeiro, o gênero tinha como pilares Devil May Cry e Ninja Gaiden, hoje todo mundo tenta superar ou igualar God of War, e nem é preciso muito esforço para citar exemplos (Castlevania: Lords of Shadow, Dante’s Inferno e até o menos conhecido, mas também divertido, Conan são alguns deles). Aliás, não só os jogos de luta, mas hoje quando vemos coisas como cenários abertos e enormes, imediatamente lembramos de God of War.
A franquia também é, em minha opinião, a que tem o melhor sistema de combate. Séries como Ninja Gaiden têm 700 combos extremamente complexos para cada arma, o que acaba gerando button mashing, já que poucas pessoas conseguem decorar tudo. A gente acaba apertando qualquer botão e torcendo pelo melhor. Kratos tem alguns poucos combos de fácil memorização (nada de “quadrado, triângulo, triângulo, quadrado, quadrado, triângulo”, mas coisas como “quadrado X5, triângulo”) e bastante eficientes, dando ao jogador controle total sobre o efeito de cada combinação.
Mas todos conhecemos as qualidades e predicados desta que é uma das séries de maior sucesso da história dos games. Porém, poucos veem os problemas, especialmente porque dificilmente voltamos a um jogo meses depois, com a cabeça mais fria e mais imparcial. Jogando hoje os dois primeiros jogos, eles ainda se sustentam como grandes games. O terceiro, nem tanto.
RELEMBRANDO OS PROBLEMAS
Nas resenhas que escrevi para os primeiros jogos, eu reclamei muito dos puzzles de empurração de caixas. Isso porque, na época, parecia que os jogos só estavam fazendo isso. Parecia um checklist que os criadores tinham durante o desenvolvimento. Hoje esses puzzles diminuíram e, com eles, meu trauma. Portanto, não é a isso que vou me referir quanto aos problemas dos jogos, mas a coisas mais universais mesmo, mais voltadas ao gamedesign propriamente dito.
Todos sabemos também que cada um dos games teve um diretor diferente. O famoso David Jaffe dirigiu o primeiro. Cory Barlog, o segundo. Stig Asmussen encerrou a trilogia.
Se você me perguntar hoje se eu conseguiria fazer um trabalho melhor do que David Jaffe ou Cory Barlog, eu diria que não, de forma alguma. Isso não significa que os jogos não têm problemas graves de gamedesign, como uma grande quantidade de desafios que são simplesmente pentelhos e que dependem apenas de sorte, não de habilidade. Todos lembramos do trauma de momentos como empurrar a jaula ladeira acima com inimigos infinitos te atacando ou a versão piorada para o mesmo desafio, presente no segundo jogo, aquele com a Fênix soltando fogo. Além desses, tem vários outros momentos bem chatos e menos famosos. Exemplo: petrificar os minotauros em cima do botão que abre a porta ou qualquer outro momento em que você tem que solucionar puzzles com inimigos te atacando.
Esses momentos chatíssimos chegam a me desanimar quando eu penso em jogá-los novamente nas dificuldades mais altas, pois não é uma dificuldade justa, como um chefe desafiador.
O terceiro não tem nenhum desses problemas. Todos os puzzles e lutas são justos e, como resultado, eu adoro jogá-lo nas dificuldades altas. Além disso, ele melhorou muito várias coisas que serão abordadas mais tarde. Mas se você me perguntar se eu conseguira fazer um trabalho melhor do que Stig Asmussen, caso assumisse a série no mesmo ponto que ele assumiu, eu diria “sim, acredito que sim”. E não me refiro a fazer um jogo como EU gostaria que ele fosse (sem puzzles, por exemplo), mas simplesmente em aproveitar adequadamente todas as oportunidades levantadas pelos diretores anteriores. O objetivo deste texto é justamente elaborar esta proposta.
GOD OF WAR III
Dentre as coisas melhoradas supracitadas, não me refiro aos óbvios gráficos (que estão sensacionais), mas a coisas da própria jogabilidade. O novo ataque forte da arma padrão, por exemplo, é mais rápido e divertido do que o anterior e o combat grapple traz novas e excitantes possibilidades. O combate enquanto você escala uma parede, então, ganhou combos e novas possibilidades de movimento, tornando-o muito mais ágil e empolgante.
Até coisas banais, como a empurração de caixas, melhoraram. Agora Kratos consegue dar uma corridinha ou virar as caixas em 90 graus. Isso faz uma tremenda diferença para mim, pois a lentidão quando se empurrava uma caixa é um dos motivos pelos quais eu ficava com tanta raiva disso no passado. Eu sentia que freava o jogo. E a possibilidade de virar as caixas tornaria aquele puzzle do quebra-cabeça presente no primeiro muito mais tolerável e dinâmico quando você o está jogando pela segunda, terceira ou décima vez e já sabe a solução, pois não perderia 10 minutos simplesmente virando as peças na máquina até elas estarem na posição certa.
E aí vem o primeiro problema considerável. Todas essas melhorias foram feitas e, com exceção do novo ataque forte e do combat grapple, sequer foram utilizadas. Você lembra de algum momento com combate durante uma escalação de parede, por exemplo? A única vez que você usa esses golpes é durante a perseguição a Hermes, e o faz com o objetivo de se movimentar mais rápido, não para lutar. A mesma coisa vale para a empurração “rápida” de caixas. Quantos puzzles tem envolvendo isso no jogo? Três? Talvez menos.
God of War III melhorou MUITO o núcleo do jogo, ou seja, o controle do personagem. Game designers costumam dizer que um bom jogo é aquele que você se diverte simplesmente controlando o protagonista. A equipe de God of War III pegou o Kratos dos dois primeiros jogos e melhorou absolutamente TUDO. Mas infelizmente, se esqueceram de construir um jogo que utilizasse essas melhoras, e aí está meu principal problema com ele.
OPORTUNIDADES PERDIDAS
Os dois primeiros jogos eram tecnicamente impressionantes na época de seus lançamentos. Hoje, como foram lançados em um console de geração passada, obviamente os gráficos já ficaram tecnicamente datados. Mas eles eram também artisticamente impressionantes. Portanto, momentos como quando você corre em cima da espada da estátua da Atena ou quando aquela estátua gigante de Zeus estende as mãos para te colocar nas Cliffs of Madness ainda são extremamente marcantes.
Vai dizer que você não lembra com carinho daquele momento, no Templo de Pandora, em que você está na montanha e, embaixo, vê Cronos, colossal, carregando o templo nas costas. Aliás, lembra quando você viu Cronos pela primeira vez, e constatou que Kratos era menor do que o olho do cara? Isso é inesquecível, mesmo sendo jogado hoje pela primeira vez, e mesmo com os gráficos de PS2.
Os gráficos de God of War III são lindos. Possivelmente os melhores gráficos da história. Mas, assim como a jogabilidade melhorada e não aproveitada, eles são desperdiçados em cenários e lugares totalmente genéricos. Sim, existem momentos marcantes e artisticamente lindos, mas é fato: mais da metade do jogo acontece em cavernas escuras e naquelas caixas sem graça ao redor do “labirinto”. Mesmo com o excelente trabalho de câmera e os zoom outs constantes, faltam cenários abertos, momentos que mostrem toda a grandiosidade que os anteriores sabiam passar tão bem. Não me entenda mal, esses momentos existem, mas em um grau muito menor do que os anteriores e, especialmente, muito menor do que as onipresentes cavernas (não deve ter mais de 30 minutos seguidos sem você passar por uma caverna).
Até o combate melhorado fica sem grandes chances para aproveitarmos. Temos um monte de inimigos novos legais, como as quimeras ou os novos centauros e as novas górgons. Mas as quimeras só aparecem duas vezes e os centauros três. É muito pouco!
E ainda tem a possibilidade de montar nos ciclopes e nos cérberos. Mas quantas vezes podemos fazer isso? Duas em cada um. Foi o suficiente para você?
E OS CHEFES?
God of War II termina com a Atena nos seus braços dizendo “god after god will deny you”, se referindo a como todos os deuses do Olimpo vão proteger Zeus e o Olimpo com suas vidas. Existem 14 deuses normalmente citados entre os olímpicos na mitologia grega: Zeus, Hades, Poseidon, Hera, Deméter, Héstia, Afrodite, Apolo, Ares, Ártemis, Atena, Dionísio, Hefesto e Hermes. A frase de Atena dá a entender que cada um desses 14 deuses (ou pelo menos 12 deles, já que este costuma ser o número mais comum de olímpicos) seria um chefe na próxima aventura.
Ares morreu no primeiro God of War. Atena no segundo. No terceiro, temos a presença de Zeus, Hades, Poseidon, Hera, Afrodite, Hermes, Hefesto e Helios. Aliás, o Helios do jogo provavelmente entra no lugar de Apolo. Ok, é comum eles serem considerados o mesmo ser. Mas quando são considerados seres diferentes, Helios é um titã e Apolo é um olímpico. O Helios do jogo é claramente um olímpico, e o Apolo aparentemente existe na realidade apresentada, pois você pega um tal de “Bow of Apollo” em Hades. Liberdade criativa? Ok, mas então onde está o Apolo que não aparece para defender Zeus?
E ainda sobraram cinco deuses que sequer são citados: Deméter, Héstia, Apolo, Ártemis e Dionísio. Talvez eles não existam na realidade do jogo. Isso seria decepcionante, mas beleza. Só que a Ártemis não só aparece no primeiro game, como também te dá uma arma, a Blade of Artemis. E daí ela simplesmente some da história. Ela, que é a deusa da caça. Não faria todo o sentido se ela ficasse te caçando ao longo do jogo? Será que ela não se importa com a morte de Zeus?
Mas falemos sobre os que aparecem então. Dos oito deuses presentes no jogo, a Afrodite não está nem aí para a morte de Zeus, assim como seu marido Hefesto que, por se sentir traído, até deseja a morte do pai dos deuses. Hera morre em uma cutscene, sem nenhuma interação com o jogador. Hermes e Helios morrem em quicktime events, sem luta. Sobram apenas três chefes propriamente ditos, os três grandes, Poseidon, Hades e Zeus. E convenhamos, se esses três não fossem chefes, seria inaceitável.
Ou seja, dos tais “god after god” que a Atena prometeu, tivemos apenas cinco, sendo que só três representaram algum tipo de perigo a Kratos. O Helios não só não reage, como ainda implora para ser salvo. Poxa, o deus do sol e da peste poderia render uma boa luta, não?
Resumindo, dos 14 chefes em potencial, tivemos três. E, como o jogo estava meio light em chefes, resolveram colocar ali um escorpião genérico sem nenhuma razão para existir e que, pior ainda, responde pelo momento mais chato do jogo. Não dá para entender a decisão de matar Helios e Hermes em QTEs e ignorar deuses como a da caça (Ártemis) e das estações do ano (Deméter, que poderia controlar o clima, tipo a Tempestade dos X-Men) para colocar um maldito escorpião genérico!
E outra, por acaso eles esqueceram que os deuses eram gigantes, como foi tão bem estabelecido na franquia anteriormente? Ok, os jogos deixaram claros que os olímpicos poderiam diminuir de tamanho se desejassem, mas o Kratos passou o primeiro jogo inteiro em busca de uma mágica que o faria crescer para enfrentar Ares. Daí quando os deuses precisam defender Olimpo de um serial killer psicopata, TODOS eles decidem encará-lo no tamanho de um ser humano? O único maior é Hades, que mesmo assim é bem mais baixo do que Ares era no primeiro jogo. Tem também o Hefesto, o único que faria sentido se tivesse diminuído de tamanho, já que está preso em um lugar pequeno. Mas ele fica gigante e encolhido o tempo todo. Vai entender…
Mas e os outros personagens da mitologia? Claro, além dos deuses, temos o Hércules, possivelmente o herói mais famoso de todas as mitologias (depois, claro, de Jesus), e a luta com ele é muito legal, melhor inclusive que as de Hades e Zeus. Tirando os chefes, temos Dédalo, o pai do Ícaro; e Peirithous, que é tão desconhecido que nem tem uma página na Wikipédia brasileira.
No segundo tínhamos um monte de heróis e vilões da mitologia grega: Perseu, Teseu, Euryale, as irmãs do destino, Ícaro, o Kraken, entre outros. E não é o caso de não ter sobrado personagens famosos para o terceiro, mas parece que faltou o conhecimento mitológico que os primeiros pareciam ter. O que nos leva ao pior de tudo.
OS TITÃS
Essa é minha grande picuinha com God of War III. Inclusive, fez com que eu me sentisse enganado. O final do segundo dá a entender que o terceiro será uma guerra entre titãs e deuses do começo ao fim, uma nova titanomaquia. E a Sony prometeu exatamente isso em toda a campanha do jogo.
Pense na divulgação de God of War III. Absolutamente TUDO que saía do jogo tinha um titã. Ou você estava nas costas de Gaia…
… Ou então você vê exatamente o que todo mundo achava que o jogo seria: titãs e deuses em uma luta até a morte. Não é à toa que é justamente essa parte que foi liberada no demo:
Daí, quando você pega a obra final, começa nas costas de Gaia, mas cinco minutos depois já não está mais lá. Você até vê os deuses e titãs brigando, mas os titãs apanham feito menininhas doentes e, em menos de 10 minutos do início do jogo, todos morreram, com exceção da Gaia e daquele que aparece depois lutando contra o Helios. E todos eles morrem com um único golpe, em segundos. Você há de concordar que, por mais que tenha curtido o início do game, matar quatro ou cinco titãs em segundo plano nos primeiros 10 minutos não é uma boa forma de fazer God of War III corresponder às expectativas criadas nos jogadores pela própria divulgação do jogo.
Todo mundo esperava que o jogo inteiro fosse “Kratos e os Titãs contra os deuses”, e não dá para entender porque não é assim. Particularmente, eu teria realmente aproveitado os Titãs, fazendo Kratos interagir com todos eles e, por que não, pular das costas de um titã para o outro conforme seus “serviços” fossem requisitados para que os gigantes continuassem escalando a montanha. Eu até mataria alguns titãs no decorrer do jogo para efeito dramático, mas não da forma que foi feito. Eles precisavam interagir com o Kratos, ter nomes e personalidades, assim como a Gaia. Senão, são apenas pedaços do cenário que desmoronam nos primeiros minutos.
Depois da abertura, você vai para Hades (cavernas, lembra?), onde fica por MUITO tempo. Daí quando consegue sair, dá aquela empolgação de “agora sim vou participar da briga”, querendo acreditar que os titãs que viu caindo nos primeiros minutos não estavam mortos. E daí você chega à parte do demo, e vê Helios e o titã não identificado brigando. Nessa hora, eu estava crente que todo o resto do jogo seria assim. Mas dez minutos depois, a cabeça do Helios estava no meu inventário (e sem briga) e, em seguida, você encara o tal titã. Se liga no vídeo abaixo, a partir dos nove minutos:
Esse corte estratégico foi vital para a campanha e esteve presente em vários trailers na divulgação do game. Convenhamos, é um momento extremamente “holy fuck!”, que promete um chefe pintudíssimo. Sabe o que vem depois disso? O Kratos enfia a arma no olho do titã, sai voando para outro lugar e o grandão não aparece nunca mais. Kratos matou o último titã que faltava com um golpe. E, a partir daí, a tal titanomaquia que nos foi prometida já não existia mais. Todas as promessas foram queimadas em duas cenas que somam menos de 30 minutos de jogo.
Aí já não é mais o caso de “poderiam ter aproveitado mais”, já é o caso de “divulgação enganadora”. Todas as peças de divulgação e o final do segundo prometiam que o jogo inteiro seria isso. Eu até chamava God of War III de God of War: Titanomaquia antes de ele sair. O que diabos aconteceu?
Verdade seja dita. Depois disso mais um titã aparece: Cronos.
E esse, meu amigo, ESSE foi o único momento de todo o game que eu não fiquei com a sensação de “oportunidade perdida”. Era isso que esperava de God of War III, simplesmente porque foi isso que me foi vendido. Mas é o único momento em que God of War III realmente alcança as alturas e a tremendice épica dos seus antecessores, e é uma pena que um jogo tão esperado consiga fazer isso em apenas uma cena.
Depois da luta contra Cronos, o jogo entra no seu último ato que, tradicionalmente, sempre foi fraco na franquia, e aqui não é exceção. Daí na luta contra Zeus, Gaia aparece, com sangue nos olhos, querendo matar você e Zeus. “Agora vai ser lindo! Todo mundo contra todo mundo!”, pensei. Mas aí o jogador simplesmente é jogado para dentro da Gaia, onde termina a luta contra Zeus sem nenhuma reação da principal titã. Se ela não vai acrescentar nada, nem na história nem na jogabilidade, por que dar uma de Marvel Comics e trazê-la de volta dos mortos então?
HISTÓRIA
Para encerrar, este foi o último ponto que me incomodou bastante. Vou ignorar as contradições, como Kratos se surpreendendo no primeiro jogo com um titã estar vivo quando ele mesmo encontrou vários titãs pouco antes em God of War: Chains of Olympus. E para piorar, a Atena fala que Cronos era o último titã vivo. =P
No primeiro jogo, Kratos era o que pode ser chamado de anti-herói. Durante o segundo, e especialmente no terceiro, ele vira um vilão com uma motivação imbecil (vingança e apenas vingança, custe o que custar, mesmo que destrua o mundo no processo). Se no primeiro eu me envolvi com ele, no terceiro eu frequentemente queria a opção de escolher outros caminhos. Eu não quis matar Gaia. Eu não quis matar Poseidon. Eu não quis matar Hércules. Mas tive que fazê-lo para continuar, então o fiz a contragosto. É bem mais legal jogar quando você está torcendo pelo personagem jogável, não contra ele.
Eu até entendo o ponto a que eles queriam chegar: como a existência daquele personagem afetaria a mitologia grega e como, a partir dali, chegaríamos ao mundo que temos hoje. E acho essa ideia muito, MUITO legal! A mitologia era a forma de os seres humanos explicarem o mundo, mas deixava muitos buracos, e alguns deles seriam – e até foram – tampados pela existência do Kratos.
Porém, embora o objetivo final seja legal, o roteiro do terceiro jogo é péssimo. A Atena de uma hora para outra fica com a personalidade de Satã, sedenta por poder e sem se importar com os humanos, mas isso não é desenvolvido, ou seja, para todos os efeitos, ela não era Satã. E a deusa da sabedoria agir daquela forma realmente não parece digno do que havia sido desenvolvido até então. A história do Hefesto e da Pandora também não faz sentido nenhum, especialmente quando ele fala que Zeus descobriu a farsa dele, e o condenou a ficar preso em Hades. Mas que farsa, delfonauta? Fazia muito mais sentido guardar a caixa de Pandora em um templo cheio de armadilhas em cima de um titã do que dentro de um fogo que uma criança inocente conseguia apagar. Para todos os efeitos, a dica dele ajudou Zeus, então seu castigo é totalmente injustificado. God of War III simplesmente não encaixa nos jogos anteriores. Tem mais retcons do que os novos episódios do Star Wars e faz um desserviço bem pior à franquia do que Greedo atirando antes.
Além do problema com a narrativa, os redesigns que os personagens sofreram ao longo dos três jogos também prejudica bastante. Quem vê Hades no primeiro jogo e depois no segundo não percebe que é o mesmo personagem, por exemplo. Eu, pelo menos, não percebi.
Ok, a história do terceiro jogo é fraca, mas será que dava para fazer algo melhor? Sim! E o diretor Stig Asmussen teve acesso a DUAS histórias melhores, mas optou por fazer a sua, mesmo que ficasse cheia de contradições e buracos em relação ao que foi construído nos jogos anteriores. Inclusive, o diretor do primeiro game, David Jaffe, diz que chegou a implorar para que Stig seguisse pelo caminho originalmente planejado.
Você pode vê-lo contando isso no vídeo abaixo, por volta dos 55 minutos. Inclusive, no vídeo abaixo você pode ouvir a ideia original do David Jaffe (sensacional!) e o caminho pelo qual o segundo diretor, Cory Barlog, queria seguir (e que também era legal). O final do segundo jogo deixa ambas as possibilidades abertas. Stig poderia seguir por qualquer uma delas, mas optou por uma terceira, bastante inferior, e que não se encaixou direito na história.
Não me entenda mal. God of War III é um jogo fantástico, que merece ser comprado por qualquer um que tenha PS3. Se tivesse qualquer outro nome, provavelmente ele estaria entre meus preferidos, e eu não teria reclamações. Mas ele é um God of War, e este texto visava demonstrar como ele poderia, ou melhor, deveria ser superior ao que é. Mesmo com as melhoras e a superioridade técnica, God of War III é muito menos marcante que seus antecessores e isso é uma pena.
Assim, por melhor que seja, não consigo deixar de lamentar a saída de David Jaffe e de Cory Barlog da cadeira de diretor. Ou melhor, dizendo, a escolha de Stig Asmussen para dirigi-lo, uma vez que praticamente qualquer pessoa conseguiria fazer um golaço com as bolas que os dois primeiros diretores levantaram. Era só seguir em frente, mas Estegão resolveu voltar e fazer tudo do seu jeito. E deu no que deu. Um sucesso de vendas, mas em minha opinião, a maior decepção da geração atual de games.
E quer ver como você concorda? Quando você terminou o primeiro jogo, aposto que exclamou algo como “Caraca, eu sou um Deus!”. No segundo, ao ver os titãs escalando o Monte Olimpo, deve ter gritado: “Caraca, isso vai ser animal! Tomara que o três saia logo!”. E ao terminar o terceiro, sentiu a mesma satisfação e empolgação quando o Kratos simplesmente se mata? Aposto a vida dos cupins do meu armário que não!