Antes de começar qualquer resenha, sempre gosto de abordar um pequeno histórico sobre o assunto e, neste caso do Exodus, a situação não poderia ser mais apropriada para situar o delfonauta.
Para quem ainda não conhece o trabalho dos caras, basta dizer que eles foram grandes pioneiros do Thrash Metal (começaram exatamente na mesma época do Metallica e do Slayer) e um dos responsáveis por todo o surgimento da cena Bay Area de São Francisco.
A banda foi fundada em 1981 pelos guitarristas Kirk Hammett (sim, esse mesmo) e Gary Holt e pelo vocalista Paul Baloff. Logo se destacou pelo peso das composições, mérito dos ótimos riffs na velocidade da luz, uma inovação para a época e um dos fatores que ajudou a consolidar o Thrash nos anos 80.
Por um acaso do destino, Kirk pulou fora para se unir ao Metallica em abril de 1983, mas a banda não desanimou com a saída de um de seus fundadores e fez história quando lançou o ótimo e cultuado Bonded By Blood em 1985. Daí para frente, a carreira do Exodus foi uma alternância entre altos e baixos, especialmente pelo fantasma das trocas de formações que sempre assustaram os fãs.
Primeiro, o vocalista Paul Baloff foi chutado pouco tempo depois do lançamento do Bonded. O seu substituto era o carismático Steve Zetro Souza (um cara que tinha a mesma voz do Pato Donald) que veio do Testament (quando este ainda chamava Legacy), mas a banda nunca mais se recuperou dessa troca e os trabalhos que vieram a seguir, especialmente nos anos 90, eram extremamente instáveis, mesmo que nunca tenham deixado de carregar com orgulho a bandeira do Thrash, ao contrário dos seus contemporâneos do Metallica, que seguiram caminhos alternativos. Apenas por curiosidade, em uma entrevista há alguns anos, o guitarrista do Slayer, Kerry King, disse que quando o Metallica “roubou” Kirk do Exodus, eles levaram o cara errado, deveriam ter ficado com Gary Holt.
Com a seqüência de álbuns medianos, o Exodus acabou na metade dos anos 90 e só reconquistou certo espaço na mídia quando resgataram Paul Baloff por volta de 1996. No ano seguinte, a banda lançou o bom ao vivo, Another Lesson in Violence, e inclusive fizeram alguns shows bem legais no Brasil em 98.
Quando tudo parecia caminhar para a volta definitiva, a eterna rixa entre Baloff e Holt impediu que a banda lançasse alguma coisa nova e esse vai-e-vem perpetuou até janeiro de 2001 quando o vocalista morreu de ataque cardíaco. Mas temos alguém aqui no DELFOS que teve o prazer de conhecer Baloff pessoalmente em 98. Se quiser saber mais sobre o cara, mande um e-mail para o Corrales.
Um ano depois, Steve “Pato Donald” Souza reassumia o posto de vocalista e somente em 2004 a banda lançou um novo trabalho de estúdio, Tempo of The Damned, considerado por alguns como o melhor CD do Exodus desde 1985.
Novamente, quando tudo parecia bem, Steve Souza caiu fora de novo por diferenças criativas e a banda quase cancelou as apresentações que faria no Brasil. Na pressa, pegaram o vocalista do Skinlab, Steev Squivel, e fizeram shows, digamos, precários no festival Bonded By Blood Thrash Fest que rolou em 2004. A confusão não acaba por aí, pois logo em seguida, o baterista Tom Hunting e o guitarrista Rick Hunolt (ambos remanescentes da formação original do Bonded By Blood) também anunciaram suas saídas do Exodus, só restando Gary Holt dos velhos tempos. Sem desanimar, o guitarrista recrutou um novo line-up e já com a nova formação gravaram um CD, que é o motivo dessa resenha. Ufa, entenderam a confusão?
Bom, agora você concorda comigo que por todos estes motivos, é difícil não encarar Shovel Headed Kill Machine, o nome da nova criança, apenas como um trabalho solo do guitarrista Gary Holt após a debandada geral no Exodus, por mais competentes que os novos integrantes sejam. Sente só o novo “time”: Paul Bostaph (ex-Slayer, Forbidden, Testament e Systematic) na bateria, Lee Altus (ex-Angel Witch e Heathen) na guitarra, além do novato Rob Dukes nos vocais. Completando o elenco temos o competente baixista Jack Gibson, na banda desde 1997.
Apostar em novas caras para uma banda experiente como o Exodus (especialmente no caso do novo vocalista que era um roadie e foi descoberto por acaso) foi arriscado, mas após ouvir o novo álbum, posso afirmar com segurança que valeu a pena e os novos integrantes (tanto o novato como os veteranos) são muito competentes e o novo trabalho é acima de qualquer expectativa.
De cara o que temos é o bom e velho Thrash Metal com uma ou outra influência mais moderna, assim como no Tempo of The Damned e lembrando bastante também a nova fase de outro veterano do Thrash, o Kreator.
A influência dos alemães (e do Thrash europeu, no geral), se faz presente especialmente pelo estilo de voz de Dukes que tende mais para o esganiçado do que propriamente o gutural ou o gritado com influências Hardcore dos norte-americanos.
Os riffs de Holt continuam matadores e todas as músicas são bem pesadas, sem espaço para baladas. O único porém vai para os solos de guitarra que não estão tão inspirados quanto nos trabalhos anteriores. O guitarrista já mostrou no Tempo que sabe construir boas melodias, mas ficou devendo aqui.
A bateria de Paul Bostaph é simplesmente soberba e o cara ressuscita um pouco o passado no Slayer na dobradinha final, 44 Magnum Opus e a faixa-título. Nessa última, Dukes também arrisca uma linha de vocal bem parecida com a de Tom Araya e o resultado é muito bom.
Outros destaques vão para I Am Abomination, a faixa de abertura Raze (com um riff matador) e a inspirada Deathamphetamine, mas o disco inteiro é bem legal e o ritmo não cai. Arrisco até a dizer que é o trabalho mais “estável” do Exodus desde o Bonded By Blood.
Ou seja, como deu pra perceber, esse é um CD obrigatório para os fãs do bom e velho Thrash Metal, é porrada com qualidade. Só espero que essa nova formação da banda se estabilize definitivamente e possamos ouvir os futuros trabalhos do Exodus sem aquela sensação incômoda do “último que sair apague a luz”.