Deathbound é um soulslike brasileiro. Se tem uma forma de garantir que ninguém se importe com seu jogo de ação em 2024, é lançando um soulslike. E quanto mais ele puxar do evangelho da From, menos especial será. Chegamos ao ponto que até mesmo o título “Soulslike Brasileiro” ou semelhante já foi usado um número plural de vezes aqui no DELFOS.
A primeira impressão de Deathbound já é bem ruim. Por ser um jogo brasileiro, eu escolhi o idioma português, e dei de cara com isso.
Além do erro acima, as vozes do jogo estão apenas em inglês. Faz sentido, dublar um jogo é caro, e se vai ter apenas um idioma, é melhor ser o inglês. Daí acabei jogando o resto em inglês, para que as legendas mostrassem o que os personagens falam, sem tradução ou adaptação.
DEATHBOUND É UM SOULSLIKE 3D
Quando o gameplay iniciou, me surpreendi com o jogo ser em 3D. Mas duas decepções enormes vieram de cara: primeira, o jogo não tem pausa. Não tem nenhuma funcionalidade online, ele só não quer que você faça xixi, atenda o telefone ou abrace sua filha mesmo. É pura babaquice. A outra é que ele é muito feio. Enquanto a maioria dos jogos começa num cenário impressionante, para marcar de cara, Deathbound começa no esgoto, um cenário totalmente verde e comum. Quando você finalmente sai do esgoto, vai para uma cidade destruída que parece saída de um Darksiders sem talento estético (o que imagino que seria o Remnant). Simplesmente não tem nada para se olhar e admirar aqui.
A temática também parece totalmente sem criatividade. Não joguei até o fim (mais sobre isso em breve), mas tudo indica que o jogo se passa num pós-apocalipse, em que uma nova cultura surgiu, e eles acham que os “que vieram antes” tinham alta tecnologia. Bem Horizon mesmo, e talvez a temática mais comum dos videogames modernos (sinto falta dos space marines carecas!).
Finalmente, ele começa a mostrar um pouco de criatividade, com algumas mecânicas que o diferenciam do resto do gênero. Uma delas é que sua stamina é limitada pela quantidade de vida que você tem. Um personagem perto de morrer fica cansado rapidamente, e se torna quase inútil. Daí entra o mais bacana.
DEATHBOUND: SOULSLIKE EM PARTY
Conforme você joga, vai absorvendo novos personagens, que formarão sua party. Eles não serão NPCs, como em Code Vein, mas personagens jogáveis, que dublam de classe. Você começa com um guerreiro, daí destrava uma rogue, depois um feiticeiro, e assim por diante. O sistema de mágicas combina a stamina com aquecimento. Cada feitiço aumenta a barra de aquecimento e, quando ela enche, rola uma explosão que machuca o herói e inimigos próximos. Isso torna magia uma forma de ataque bastante limitada, pelo menos sem upgrades. Quatro personagens podem ser equipados nas fogueiras e, sim, há mais do que quatro heróis. Você troca a qualquer momento entre os equipados com o direcional digital.
O jogo fica muito mais interessante quando apresenta as mecânicas de sincronização. Caso você troque de personagem durante um ataque, vai rolar um especial. Você pode escolher para quem mudar com o direcional digital ou, mais fácil, apertar o Y para mudar para quem tiver mais stamina. Isso me pareceu meio aleatório, já que às vezes estou com heróis cheios e ele me manda para um com pouca vida/stamina. Mas usar o direcional digital durante uma batalha com vários inimigos que te matam rapidamente é praticamente impossível.
É IMPORTANTE USAR TODA A PARTY
Uma coisa bacana é que os personagens que não estão lutando recuperam vida a cada ataque que você dá. A coisa é bem lenta, e dificilmente vai te manter vivo, mas em um soulslike, cada colher de chá é valiosa. Seria bacana que os personagens não utilizados se recuperassem independente de ataques, já que há bastante exploração sem combate aqui.
Para cura mais rápida, você pode usar o equivalente a estus, mas o “tempero especial” que a turma da Trialforge colocou aqui é que usar o estus cura o personagem que está sendo usado, mas machuca fortemente todos os inativos. Isso torna o estus praticamente inútil, já que é muito importante ter toda sua party viva o tempo todo. E sim, morrer com um deles te retorna para a fogueira, mesmo que os outros estejam completos.
Esta mecânica do estus seria o típico tempero especial do chef José Marques. Porém, Deathbound nunca se torna um prato realmente saboroso, a ponto de poder ser estragado por uma pipizada épica como esta. Ele é, se tanto, um arroz com feijão bem genérico, daqueles que você come em um PF barato quando não quer gastar muito. Só que vem com xixi mesmo assim.
O ORGULHO NA INACESSIBILIDADE
Como quase todos os soulslikes que copiam a From Software sem saber o que torna sua inspiração especial, Deathbound aprendeu todas as lições erradas, e nenhuma das certas. O jogo é absurdamente difícil e punitivo, com fogueiras bastante limitadas. Não tem pausa. Não tem absolutamente nenhuma opção para diminuir a dificuldade ou customizar a experiência para quem não quer ou não pode fazer de Deathbound sua nova vida. Mesmo com tudo isso, o jogo é extremamente feio, com fases confusas e um péssimo level design.
Como é comum em jogos que são babacas pela babaquice, os chefes não têm checkpoint do lado de fora da sua sala. Ao invés disso, você precisa encontrar atalhos que, depois de uma senhora caminhada, te colocam relativamente perto da batalha (com algumas dezenas de inimigos no meio do caminho). O problema é que o level design, ao contrário do da From, não é claro.
Você não sabe imediatamente onde apareceu depois de abrir um atalho. Muitas vezes nem percebe que é um atalho. Na batalha com o primeiro chefe, eu não encontrei o atalho e morri, perdendo mais de 30 minutos de progresso. Só por saber do funcionamento do gênero que, na próxima vida, quando sabia onde o chefe aparecia, me esforcei para encontrar o atalho – e encontrei. Mas não foi uma experiência legal fazer todo o caminho longo de novo.
COMBATE CLAUSTROFÓBICO
Os inimigos em Deathbound são extremamente agressivos e os corredores são bastante estreitos. Isso torna difícil passar correndo por eles. E mesmo quando você resolve lutar, suas armas constantemente estão batendo nas paredes, o que impede seus ataques de acertarem. Isso, claro, não acontece com os inimigos, que normalmente conseguem te matar enquanto você está martelando a parede como se fosse um pedreiro.
Eu joguei Deathbound por três horas. Segundo a assessoria de imprensa, o jogo dura de 20 a 30. Por isso, não considero que joguei o suficiente para chamar este texto de review. Mas o fim da minha aventura acabou sendo o que normalmente acontece neste gênero.
UM CHEFE ME IMPEDIU DE CONTINUAR
Eu fui até o chefe da segunda fase, o monstrão ali em cima. Passei uns trinta minutos repetindo a luta e nunca tirei mais do que metade da sua vida. Poderia ter perdido mais duas, três horas lá e duvido que faria progresso. Eu sou simplesmente velho demais pra este tipo de atividade mecânica repetitiva. Pela minha saúde mental, resolvi desistir.
Isso foi relativamente fácil pelo fato de que, embora eu até teria jogado mais se conseguisse, Deathbound não me empolgou em nenhum momento. É um jogo que eu jogaria apenas se não tivesse absolutamente nada melhor para jogar. Isso acontecia de vez em quando na minha adolescência, mas na idade adulta acredito que todos temos backlogs consideráveis. Deathbound é mais um. Mais um soulslike com atitudes babacas elitistas (como não ter pausa ou acessibilidade). Mais um soulslike brasileiro. Você precisa de mais um? Eu não preciso. E gostaria muito de ver mais jogos de ação que não se limitassem a seguir o evangelho da From.