Bayonetta 2 é o game de 2014 que você sente um pouco de orgulho quando começa a jogar, e muito orgulho quando termina. Vamos considerar que a vida é um acúmulo de experiências, grande parte delas desnecessárias e fúteis, que nós só continuamos a fazer para ocupar o tempo. É comer sem degustar. E vamos admitir: quem gosta de videogame peca ainda mais nisso. Quantas vezes nós não usamos os joguinhos para ter experiências que de nada acrescentam?
É fato que as habilidades que desenvolvemos nos jogos dificilmente servirão para alguma coisa útil na vida real e é fato também que os videogames ainda não estão consolidados como mídia, forma de entretenimento ou arte que agrega experiência cultural. Pelo menos não para muita gente aqui no Brasil. Bayonetta 2 é um daqueles jogos que faz a gente querer levantar do sofá e ir convencer o país do contrário, por mais exagerado que isso seja.
O delfonauta já sabe que este, para mim, é o melhor jogo de 2014. E Bayonetta 2 me faz refletir um pouco sobre esta mídia da qual tanto gosto.
WITCH HUNTS, BITCH
A franquia Bayonetta não é exatamente um negócio fácil de entender para quem está de fora. Por onde começo? A protagonista é uma bruxa que faz poses sensuais enquanto mata anjos e, neste segundo capítulo, ela mata demônios também (embora use alguns para seus próprios fins). É muito rocambolesco e exagerado, controverso por vários pontos de vista. Assim, cheguei para jogar Bayonetta e Bayonetta 2 sem levar absolutamente nada disso a sério. Ao final dos dois, admito, eu queria ser uma mulher – uma qualquer não, eu queria ser a Bayonetta.
História em videogame deve servir para dar um contexto para as ações mais absurdas que você irá realizar como personagem e ela ajuda a criar uma sensação de progresso conforme se chega perto do objetivo final a ser cumprido (em jogos de ação, ele costuma ser o de matar o big final boss!). Bayonetta 2, apesar de não ser uma obra-prima em termos de narrativa e roteiro, sofrendo inclusive do mal do escritor do qual o Cyrino já reclamou e do qual também não gosto (aquilo de tudo na história ter de estar conectado e todas as pontas precisarem ser amarradas), cumpre o propósito de criar e desenvolver personagens com os quais você se importa, ao mesmo tempo que não se esquece de que é um jogo, não um filme.
Alguns exemplos: não há nas cutscenes nenhum tipo de quick time events chatos como no original, mas você ainda pode apertar o botão de esquivar para começar a próxima batalha com o efeito witch time. Ainda há um achievement que pede para você tocar no corpo de Bayonetta com o gamepad (sério!). Ou seja, há interatividade e gameplay mesmo quando a história é para ser vista, não “vivida” no jogo.
Assim, a experiência trazida por explorar o mundo de Bayonetta 2 é muito bem desenvolvida no gameplay, que é o melhor que podemos encontrar no gênero de ação em terceira pessoa.
MISS ME, BABY?
A franquia Bayonetta é de Hideki Kamiya, o mesmo criador de Devil May Cry, e possui várias semelhanças com o jogo do Dante. Em Bayonetta 2, você joga em fases que devem ser exploradas para obter itens variados e segredos, mas que ao mesmo tempo são muito lineares. É sempre muito claro para onde se deve ir, mas quem quiser explorar o mundo encontrará muitos desafios novos e itens. O foco do gameplay é nas lutas, no entanto, que tem suas origens nos clássicos beat’em’up dos 8-bit.
A personagem pode equipar armas nas mãos (usadas com o botão X) e nos pés (com o botão A). Os combos são realizados basicamente pela combinação desses botões, embora ele vá se tornando mais complexo e com mais opções conforme você aprende nuances do combate e adquire novas habilidades. É impressionante como este sistema é profundo e bem trabalhado. Por exemplo, nunca tive problemas com a câmera, mesmo com dois, três ou mais inimigos na tela (vários deles gigantescos). Com o botão ZR, Bayonetta desvia dos ataques e, se isso for feito no momento certo, ativa o witch time, que permite que você se movimente e ataque enquanto os inimigos parecem estar em slow-motion. É muito mais simples utilizar esta habilidade do que no jogo original, tanto que só isto tornou a experiência muito mais gratificante.
Outra novidade é o Umbran Climax, que libera ataques gigantescos nos inimigos por um tempo limitado (chamados de wicked weaves). É difícil de explicar porque isso é tão divertido, então confira o vídeo para ter uma ideia de como funciona:
UM JOGO MAIS JUSTO
No especial de melhores games de 2014, disse que uma das melhores coisas é que Bayonetta 2 é muito mais justo com os critérios de classificação do que o primeiro jogo. Usar itens não mais tira pontos do seu resultado final, por exemplo, e na verdade você é recompensado com mais halos (a moeda do jogo) se não usá-los. É possível perder uma vida e ainda assim conseguir um rank de prata ou ouro, coisa inimaginável em Bayonetta ou em vários jogos da Platinum. Perder em desafios de Muspelheim (encontrados nas fases) não marca como um continue, então você pode tentá-los quantas vezes quiser sem sofrer consequências negativas.
Além do gameplay renovado e melhorado, com certeza a desenvolvedora acertou em cheio em fazer mudanças no sistema de classificação. É super frustrante jogar, se esforçar para avançar no desafio e, ao conseguir, ler que você não foi bem e não deveria ser recompensado. Ao contrário do original, o sistema de classificação auxilia o jogador a continuar progredindo.
Bayonetta 2 também tem o tempo de duração ideal. É possível terminar a campanha principal numa boa em até umas 12 horas, pegando todos os colecionáveis (o jogo felizmente avisa no final em quais fases você deixou de coletar alguma coisa) e com uma performance razoável. São menos horas do que se encontra em um jogo AAA, mas eu prefiro assim, porque sempre há diversão e novidades para fazer, sem encheção de linguiça.
Quem gostar bastante da experiência pode tentar a sorte em dificuldades mais altas, tentar ranks melhores nas fases e descobrir os diversos segredos do jogo, habilitando roupinhas novas, que inclusive afetam o gameplay (no caso das baseadas em franquias da Nintendo – Bayonetta se veste de Link, Peach, Samus, Fox e Daisy).
TAG CLIMAX
O outro incentivo para continuar jogando (e talvez o principal) é o tag climax, o modo multiplayer online. Nele, você e um amigo enfrentam desafios bem complicados, baseados em lutas da campanha ou totalmente novos. É competitivo na medida em que quem fizer melhor pontuação nos combos ganha, porém é necessário ser cooperativo também, pois se um personagem morre no meio da batalha, o outro deve resgatá-lo, pressionando o botão Y nele durante alguns segundos.
Como Bayonetta 2 é um daqueles jogos que faz você se sentir o cara mais pintudo do pedaço a garota mais forte e sexy do mundo, é mais do que comum um jogador se exibir com combos arriscados para logo depois precisar de ajuda do outro e vice-versa. Isso é particularmente engraçado porque é possível apostar halos em desafios mais difíceis, o que sempre resulta em jogadores desesperados, cheios de tensão, se esforçando muito para manterem suas personagens vivas. É a experiência multiplayer online mais divertida que tive com desconhecidos desde Monster Hunter 3 Ultimate.
CONCLUSÃO
Bayonetta 2 mudou minha vida pelo menos em uma coisa: entendo as mulheres melhor agora. Consigo ver o valor de um vestido bonito, com acessórios bem escolhidos. Definitivamente é divertido sair bem apessoado nas ruas, com salto alto, enquanto anjos tentam me destruir, sem sucesso, e prédios explodem ao fundo. A melhor experiência em videogames de 2014 e, possivelmente, desta nova geração até agora.
LEIA MAIS SOBRE BAYONETTA E OUTROS JOGOS DA PLATINUM:
– A resenha do primeiro Bayonetta. Ela já fazia selfies durante as lutas nesta época!
– A análise do último jogo do Dante, DMC. Dizem que ele é emo agora.
– E o texto sobre Vanquish, um dos jogos favoritos do nosso chefão aqui do DELFOS.