Hoje vamos falar de um dos games mais estranhos que já joguei. Minha opinião era constantemente mudada e desafiada enquanto jogava e novos conceitos e mecânicas eram apresentados. Desta forma, vou apresentar meus pensamentos em ordem cronológica, como uma historinha. Esta é nossa análise Wanted Dead.
ANÁLISE WANTED DEAD: ANSIEDADE PRÉ-JOGO
Wanted Dead faz parte de uma trinca de games de ação meio intercambiáveis para mim. Todos pareciam bacanas, mas eu tinha dificuldade em saber qual é qual. Os outros eram Gungrave Gore e Evil West. Quando eu sentava para me lembrar de cada um, no entanto, Wanted Dead era o que mais me chamava atenção.
Desenvolvido por veteranos de jogos de ação, que trabalharam em clássicos como Ninja Gaiden e Dead or Alive, Wanted Dead parecia ser muito minha cara. Um jogo de ação sem enrolação, sem crafting, sem mundo aberto. Cujo combate combina hack and slash e third-person shooter. E com o pedigree de uma galera que manja muito de porradaria.
O jogo final é mais do que isso. Mas também é menos. Tipo ele apresenta bem mais do que seus trailers mostravam, mas a soma de seus fatores acaba formando uma estranha subtração. Isso porque ele tenta muita coisa, mas não se dá especialmente bem na maioria delas.
ANÁLISE WANTED DEAD: UM GEARS OF WAR DENTRO DA MODINHA SOULSLIKE
Sério mesmo, esta foi minha primeira impressão com o jogo. Ele já começa com um monte de inimigos na sua frente, vestidos em roupas e armaduras militares que parecem saídos de Rainbow Six. A heroína carrega uma espada, mas não parece apropriado levar uma katana para uma briga de metralhadoras. Então lá fui eu, assumir coberturas e tentar atirar nos inimigos sempre que eles mostrassem a cabecinha.
As mecânicas de cobertura são bacanas, naquele estilo Tomb Raider, em que basta se aproximar de uma parede ou mesa que a heroína abaixa automaticamente. Gosto desse esquema, mas Wanted Dead é bem mais móvel que Tomb Raider ou Gears of War. Se alguém chega perto de surpresa, você morre rapidinho, então não dá para se esconder e morgar, como em outros jogos de tiro com cobertura.
Além disso, os inimigos precisam de muitos tiros para morrer, mesmo headshots. E você pode carregar pouquíssimas balas. Logo na primeira tela, fiquei sem munição e fui obrigado a me arriscar correndo pelo cenário para tentar pegar armas derrubadas pelos inimigos. Dada a fragilidade da protagonista, não foi legal.
Mas não estou comparando com soulslike apenas pela dificuldade. A pegada é que você tem uma quantidade limitada de itens de cura, que são automaticamente recuperados no checkpoint. E os checkpoints, que aqui são drones, funcionam exatamente como as fogueiras, permitindo não apenas recuperar recursos, mas melhorar suas armas. Eles também são bastante espaçados.
MUDANDO DE OPINIÃO
E foi assim que fui jogando Wanted Dead. Sim, sabia que ele tinha um sistema de combate corpo a corpo mais elaborado do que games de tiro semelhantes, mas não me parecia prudente ir correndo na direção dos metralhas. Até que travei em um checkpoint longo e trabalhoso. Fiquei de saco cheio de me esconder, exterminar um ou dois caboclos, caçar munição e repetir por 15 minutos, apenas para alguém me matar e eu precisar repetir tudo.
Prestes a desistir, simplesmente saí correndo na direção dos tiros e passei a cortar todo mundo com a espada. Para minha surpresa, isso deixou bem mais fácil e menos demorado vencer os inimigos. Eles morriam mais rápido com a espada, e a heroína parecia ficar menos vulnerável a tiros correndo na direção deles do que escondida em uma mesa derrubada. A coisa clicou. Foi só aí que comecei a sentir o DNA de talento que esteve em Ninja Gaiden.
UMA HISTÓRIA NINJA
Na verdade, o combate rápido e estiloso lembra muito o de Ninja Gaiden 2, especificamente. A coisa é cheia de desmembramentos e violência exagerada. E depois de alguns upgrades, é possível exterminar qualquer inimigo previamente desmembrado. Assim como em Ninja Gaiden 2, isso faz você lutar não para acabar com a vida dos meliantes, mas para desmembrá-los e exterminá-los em seguida.
O bloodlust desse tipo de combate é assustador, mas é divertido. Especialmente quando você transforma um soldado em um cotoco e, como o Cavaleiro Negro de Monty Python Em Busca do Cálice Sagrado, ele continua te atacando.
ALGUMA DIVERSÃO
Isso fez com que o gameplay clicasse comigo, e eu finalmente passei a me divertir. Mas o jogo continuava estranho. O visual é muito feio (quem não tem orçamento bombado não devia tentar fazer gráficos realistas). O game continuava muito difícil e punitivo.
As fases totalmente lineares e a obrigação de matar todos os inimigos antes de progredir deixam os checkpoints distantes ainda mais frustrantes do que em um soulslike mais aberto tradicional. No final das contas, você está fazendo o mesmo caminho e matando a mesma quantidade de inimigos várias vezes seguidas. E, sem exagero algum, entre cada checkpoint você deve precisar matar mais de 100 caboclos.
O PRIMEIRO CHEFE
E daí cheguei ao primeiro chefe, onde novamente quase fui obrigado a desistir. Era um tanque, e eu o atacava até que ele ficava parado e brilhando. Meu colega falava “agora é a hora de se aproximar”. Eu ia até lá e o enchia de espadadas, em vão. Procurava me alinhar com algum ponto específico e apertar R3 (o botão de interagir). Nada. Depois de alguns segundos, ele recuperava a vida e voltava a me atacar. O que fazer?
Só depois de tentar de tudo, descobri que precisava me aproximar e apertar Y+B. Só que o jogo não te conta isso em nenhum momento. Ele simplesmente fala para você se aproximar. Um simples prompt teria resolvido isso e me poupado muito tempo.
Mas vá lá, passei. Esta foi minha aventura pela primeira fase do game. Mas daí é que ele realmente ficou estranho.
ANÁLISE WANTED DEAD: MAIS ESTRANHO QUE A FICÇÃO
Depois de um monte de cutscenes extremamente longas, voltei a ter controle na delegacia. Era um hub, onde podia explorar e conversar com NPCs. O lugar é simplesmente enorme, com cinco andares cheios de salas e portas. E um monte de colecionáveis espalhados. Mas os colecionáveis são específicos para aquele ponto da história. Sempre que rola uma cutscene, os anteriores não coletados somem, e uma nova coleção aparece. Considerando o tamanho do lugar, é um saco ficar andando pelos seus cinco andares e dúzias de salas procurando coisinhas para pegar várias vezes entre cada missão.
Mas não é o hub que é estranho, e sim o que acontece entre missões. Do nada, uma cutscene em desenho animado começou a tocar.
Por que ela é em desenho animado? A princípio pensei que era por retratar um flashback. Mas pouco depois, uma missão começou com uma introdução nessa estética. Especialmente bizarro porque a maioria das cenas não interativas são com os gráficos do jogo, naquele estilo cinemáticas de videogame mesmo.
QUEM CANTA, A FOME ESPANTA
Depois de mais algumas cutscenes, exploração pelo hub e conversa, eu me vi em um minigame que envolvia comer ramen.
Em outros pontos da história, eu era obrigado a jogar fliperama (o game Space Runaway, criado para o jogo e que você pode baixar de graça no Steam). Em outro, ainda, estava em um minigame de karaokê cantando 99 Luftballoons. Da fãc?
Essa estranheza toda me lembrou Yakuza. Mas Yakuza é mundo aberto. Wanted Dead é um game de ação linear. E aqui estes minigames não são opcionais. Eles fazem parte da campanha. Você precisa jogá-los para avançar.
Se não estou esquecendo alguma, Wanted Dead tem apenas seis (longas e difíceis) fases de ação. Mas entre cada uma delas você fica mais de uma hora andando pela delegacia, assistindo a cutscenes e jogando minigames. É muito estranho, e não necessariamente para melhor, como acontece com o Yakuza.
PERFORMANCE
Acho que neste ponto já apresentei uma imagem realista de como Wanted Dead é, criativamente. Infelizmente, não posso deixar de falar da sua performance. Eu joguei o game no Xbox Series X e não posso mentir. Eu nunca vi um game de console rodar tão mal. Nem mesmo Crysis no modo ray tracing no Xbox One X. A coisa mais próxima que vi foi quando tentei rodar Doom 3 quando ele era novo em um computador abaixo das configurações mínimas.
Em Crysis ainda há alguns modos gráficos, e ele se torna jogável no modo performance. Doom 3, no meu computador da época, rodava como um slideshow. Wanted Dead não é tão ruim. Pelo menos não o tempo todo. Mas ele não tem opções de performance, e é comum que vire, sim, um slideshow. Por vários segundos seguidos. Eventualmente, ele volta a rodar, aos trancos e barrancos, alternando momentos de performance aceitáveis com totais slideshows.
E daí entramos naquela… ok, eu estava jogando antes do lançamento. Mas normalmente as editoras avisam quando há algum problema que eles estão trabalhando para resolver. Wanted Dead não veio com nenhum aviso além de um “espero que goste”. É difícil imaginar que alguém viu este game rodando em um Xbox Series X e considerou aceitável lançar assim. Fico até curioso para saber como a versão de Xbox One roda, porque se a de Series X roda assim… virge. E convenhamos, os gráficos são bem feinhos e crus para rodar desse jeito.
ANÁLISE WANTED DEAD E A RECOMENDAÇÃO
Isso tudo me coloca numa posição um tanto desconfortável. Há alguma diversão a ser extraída de Wanted Dead. Porém, com este nível de performance, ele necessita de muito mais paciência do que qualquer outro jogo de console. A vantagem de um console é que os games simplesmente rodam. E, bem, Wanted Dead não roda.
Talvez a performance seja melhorada com updates. Mas mesmo assim eu teria algumas objeções. O combate é legal, mas o jogo na dificuldade padrão (há dificuldades mais altas, mas não mais baixas) é mal tunado e frustrante. Difícil demais, com muita repetição contra os mesmos inimigos e corredores.
Para ser de fato recomendável, Wanted Dead precisava de pelo menos uma ou duas dificuldades mais baixas do que a padrão e resolver sua performance. Daí seu combate sanguinolento poderia ser divertido o suficiente para que ele fosse apenas “estranho”, não estranho e ruim. O que infelizmente é o que temos hoje.