Um tempo atrás, os leitores do DELFOS tinham a sensação que eu odiava Black Sabbath, apenas porque eu insistia que eles não foram os criadores do heavy metal. Isso nunca foi verdade. Eu sempre curti a banda do Tony Iommi, e por isso mesmo tinha repertório suficiente para ver as enormes diferenças entre eles e grupos como Accept e Judas Priest, que eram bem mais próximos de um Rainbow, por exemplo. Por que estou falando isso? Ora pois, bem-vindo à minha análise Thymesia.
UM FÃ CHATO DE SOUSLIKES
Eu devo ser um dos fãs mais chatos do gênero soulsborne, soulslike, ou como quiser chamar. E daí alguns delfonautas já levantam a orelha: “Fã? Como assim?”. Pois é, coleguinha. Ok, não há muitas opções entre jogos de ação modernos que saem dessa linha, mas eu gosto do gênero. Ora, é por isso que eu continuo jogando tudo que a From Software lança e várias de suas cópias. É justamente por eu jogar e gostar desses games que eu percebo quão estagnados eles estão, e quanto medo têm de sair de qualquer característica originalmente criada nos Dark Souls. Isso me incomoda, daí acabo escrevendo sobre. É um ódio que parte de um lugar de amor, digamos assim.
E finalmente isso me traz a falar de Thymesia. Trata-se de um soulslike indie, que traz muito do evangelho da From, inclusive puxando bastante de Bloodborne e Sekiro. Mas também não se limita, e aceita ficar diferente em algumas características específicas.
ANÁLISE THYMESIA
Para começar, Thymesia é em 3D, o que já o diferencia da enorme maioria das cópias que, por falta de orçamento, acaba seguindo a linha de um metroidvania 2D. Sua falta de orçamento fica clara em coisas como a total ausência de vozes. Alguns chefes, por exemplo, “falam” durante a batalha, mas rola apenas uma legenda do que eles estariam falando. Estranho, verdade.
Felizmente, ele conseguiu investir nos lugares certos. Os gráficos são muito legais, com criaturas, chefes e cenários com designs que estão perto da qualidade da From.
O gameplay também é excelente e, embora puxe claramente dos três “estilos” da From (Dark Souls, Bloodborne e Sekiro), acaba dando uma sensação diferente por remixar as mecânicas de formas inteligentes.
ANÁLISE THYMESIA E AS DUAS BARRAS DE VIDA
Tá vendo na imagem do chefe acima? Parte da barra de vida está branca, parte verde e parte preta. Isso é vital para o funcionamento de Thymesia. Atacar com a espada, apertando o R1, diminui a barra branca. Em outras palavras, ela é pintada de verde. Se você ficar algum tempo sem acertar golpes, a barra branca vai se recuperar, basicamente curando o inimigo.
E aí vem a sacada: para tirar a barra verde, você precisa atacar com a garra, apertando o R2. Só assim você pinta a barra de preto, e deixa o meliante realmente machucado. Para vencer qualquer luta, seja chefe ou minion, você precisa esvaziar as duas barras. Isso vai imobilizá-lo, e então basta apertar R1 para finalizá-lo (e ativar alguns buffs, como cura).
Outra forma de eliminar a barra branca é através de parries, estilo Sekiro mesmo. Porém, aqui não basta ficar parriando feito um doido, sem atacar, pois isso deixa a barra de vida verde. Não tem jeito, para vencer, é necessário usar a garra. Em Thymesia ou você tem parry ou tem defesa, e o curioso é que o jogo fica bem mais difícil se você escolher a defesa.
Parece complicado, e é mesmo. Porém, o controle é ótimo e os ataques de espada e de garra são combinados em combos espertos, que permitem que você machuque as duas vidas, desde que esteja alternando os golpes. E daí tem o terceiro ataque, feito com armas arrancadas dos inimigos.
BELA ARMA, SERIA UMA PENA SE ALGO ACONTECESSE A ELA
Quando um vilão está imobilizado, você pode segurar R2 para pegar sua arma. Isso te dá a possibilidade de usar este ataque “de graça”, apertando o triângulo. De graça naquelas, pois só dá para usar uma vez por arma capturada. Porém, ao longo do game você vai pegando pontos de arma, que permitem desbloquear essas armas especiais e carregar até duas delas permanentemente.
Estas armas permanentes é onde entra a stamina/mana/whatever, a sua própria barra verde. Usar um desses super golpes, que muitas vezes machucam as duas barras inimigas ao mesmo tempo, ou fazem muito dano em apenas uma das duas, consome esta stamina. E ela se recupera com ataques, poções e outras ações.
Então é assim o combate de Thymesia. Você alterna entre dois ataques que fazem danos diferentes nos inimigos e aumentam sua stamina. E quando tem stamina suficiente, pode usar um super golpe estratégico e devastador.
Vou dizer, quando comecei a jogar, achei que seria complicado demais para mim. Os primeiros minutos do jogo envolvem pop-up atrás de pop-up com textos explicando todas essas mecânicas e os diferentes tipos de dano. E tentar racionalizar isso é a pior parte. Porém, quando Thymesia “te solta”, e te deixa controlar o combate e interpretar os sinais que ele passa, a coisa funciona muito bem.
ANÁLISE THYMESIA E AS OUTRAS DIFERENÇAS
Muita coisa aqui funciona como você imagina. Fogueiras, experiência, level up… Tudo tirado direto do manual da From. Mas além dessa amálgama de combate, Thymesia faz outras coisas que me agradaram muito. Em especial o fato de que este é um jogo de ação em fases.
Quase todos os soulslikes envolvem mundos contínuos, o que é legal. Mas fases, com começo, meio e fim, também são bacanas. E até onde sei, o único jogo do gênero que fez isso foi Nioh. Até agora, claro. Afinal, Thymesia também é dividido em fases. E, ao contrário do próprio Nioh, estas fases têm layouts mais simples, mais típicos de um jogo de ação tradicional.
Não diria que são 100% lineares, mas em geral você começa no ponto A e tem que chegar no B, onde está o chefe. São mais simples de navegar do que os labirintos tradicionais do gênero. Caminhos opcionais costumam levar a itens e atalhos. Estes últimos são daquele tipo tradicional que permite voltar à fogueira mais rápido. Mas alguns inimigos mais fortes dropam chaves, e estas podem abrir atalhos que literalmente permitem pular boa parte das fases. Em uma delas, eu peguei a chave, abri a porta e, depois de uma boa caminhada sem inimigos, estava em frente à fogueira final, pré-chefe.
Outra coisa legal, e diferente de Nioh, é que mesmo que você saia da fase e entre em outra, quando você volta, ela não se reseta. Atalhos permanecem abertos, facilitando uma segunda ou terceira exploração se quiser voltar depois.
ANÁLISE THYMESIA E AS SIDEMISSIONS ESQUEMA NIOH
Thymesia é ambicioso, por ser um game next-gen com ótimos gráficos e jogabilidade. Seu orçamento fica claro no tamanho do jogo. Mas isso para mim também foi positivo. Em geral, os soulslikes são longos demais. São games que você fica jogando por semanas, às vezes meses, até terminar. Se conseguir terminar. E isso, somado à tradicional dificuldade extrema, enche o saco. Thymesia, em contrapartida, pode ser terminado em uma tarde.
São apenas três fases completas, mais um tutorial e um chefe final. As fases são longas, sim, mas são só três. Para compensar isso, Thymesia pega uma página do guia do Nioh, e coloca algumas sidemissions depois que você termina cada fase. Iniciar uma delas te coloca no mesmo cenário, mas os pontos de início e fim são diferentes, com alguns caminhos agora abertos, e outros fechados.
É uma forma de remixar a mesma fase e estender a duração do jogo. Também permite que você suba de nível fazendo coisas ligeiramente diferentes, embora mesmo nisso, Thymesia seja ligeiro. O nível máximo é o 25, e simplesmente fazendo as três fases normalmente, eu já passei do 20.
ANÁLISE THYMESIA E OS CHEFES TERRÍVEIS
Estou sendo gentil demais, certo? Pois é, eu gostei de Thymesia. É a primeira vez que um soulsborne me parece levemente diferente, ainda que haja tanto de familiar nele (como a dificuldade extrema e sem opções). E isso fez com que eu realmente gostasse do jogo. Porém, devo dizer que ele peca em uma reclamação velha minha: os chefes.
Com exceção de um, todos os chefes principais de Thymesia precisam ser vencidos duas vezes. É aquele esquema, você acaba com a vida, ele se levanta, a vida enche de novo e a luta continua. E o grande pecado mesmo você já sabe: morrer na segunda fase exige vencer a primeira novamente. E o único chefe de história que não tem isso se cura sempre que quiser. Então literalmente não tem um que se salve aqui.
Como é praxe, eu acabei ficando travado na segunda fase do último chefe. Após vencer a primeira fase algumas dúzias de vezes, mas sem ter recursos suficientes para vencer a segunda, desisti. Talvez algum dia volte a Thymesia para fazer as sidemissions, subir de nível e tentar de novo mais forte, mas por enquanto vou parar de jogar. Até porque a total falta de história me faz pensar que, embora tenha troféus para cinco ou seis finais diferentes, todos devem ser bem simples. A única “cutscene” presente no jogo inteiro é a intro, e envolve um desenho estático e um texto, então os finais devem ser mais ou menos isso também.
Enche o saco o quanto isso acontece hoje em dia. De eu ir até o chefe final, vencê-lo, ele levantar e me matar. Mas é assim que os games de ação modernos terminam hoje em dia. E isso significa que está cada vez comum eu não conseguir terminá-los. Ainda assim, Thymesia é um jogo legal, com mecânicas criativas e avançadas, e uma campanha mais lite, que não vai dominar a sua vida. E digo isso da forma mais positiva possível.