Criar esta análise The Legend of Zelda Tears of the Kingdom foi uma experiência única para mim. Por um lado, a responsabilidade é enorme, já que este é provavelmente o maior jogo de 2023. Por outro, eu realmente não estava a fim de jogar. Gosto mais da fórmula Zeldinha tradicional do que do mundo aberto de Breath of the Wild. Breath of the Wild tinha muitas mecânicas que, para mim, arrastam o jogo para baixo (como as armas de vidro ou a chuva que escorrega). Além disso, sua proposta “taí um mundão, vai lá e faz sua própria diversão” não me apetece tanto quanto uma experiência mais dirigida.
Eu tinha algum interesse e curiosidade em Tears of the Kingdom, mas ter que reservar algumas semanas para jogá-lo com pressa para ter esta análise pronta o mais rápido possível não me animava. Bastante tempo depois, com a campanha atrás de mim, eu tenho muito a dizer. Tive aqui algumas experiências muito chatas, mas quando era bom, por Odin, era muito bom. Assim, hoje sinceramente não sei se gostaria de jogar Tears of the Kingdom de novo, mas certamente fico feliz de ter tido a oportunidade de jogar uma vez.
ANÁLISE THE LEGEND OF ZELDA TEARS OF THE KINGDOM
The Legend of Zelda Tears of the Kingdom tem, assim como Breath of the Wild, uma quantidade de mecânicas absurdas que parecem existir apenas para arrastar o jogo para baixo. Além das supracitadas, você precisa usar roupas apropriadas para o clima e se preparar com refeições sabendo de antemão o que você vai encontrar no caminho.
Curiosamente, boa parte do jogo se resume a eliminar essas mecânicas inconvenientes. Cumprir as missões de jornalismo, por exemplo, dão uma roupa que te permite escalar melhor quando chove (embora não elimine as escorregadas totalmente). Completar os altares, dos quais existem mais de 150, aumentam seus corações de vida e bolas de stamina, sem os quais é praticamente impossível de jogar.
Para uma pessoa como eu conseguir curtir Tears of the Kingdom, foi necessário investir dias inteiros de jogo, coisa de seis horas por dia, simplesmente para poder começar minha aventura. Eu não paguei para jogar Tears of the Kingdom, já que recebi um código de review da Nintendo. Mas certamente paguei com meu tempo e esforço durante vários dias até chegar no jogo propriamente dito.
PAGANDO COM TEMPO E ESFORÇO
Você começa Tears of the Kingdom muito limitado. Sem armadura e com poucos corações, quase qualquer inimigo te mata com um golpe. Sua stamina não permite correr por mais do que alguns segundos e muito menos escalar de forma apropriada. Além disso, as armas quebram com uma dúzia de ataques, e você pode carregar pouquíssimas ao mesmo tempo.
Assim, depois do tutorial, quando o mundo se abre e você recebe as quatro quests principais, você não deve ir atrás delas. Deve, literalmente, sair explorando. Vai resolver altares e pegar colecionáveis. Conseguir a Master Sword, aqui, é muito mais trabalhoso do que em Breath of the Wild e talvez ainda mais vital.
Há uma missão de história que vem lá no final da campanha que te leva a ela, mas sinceramente, conseguir jogar até lá sem essa arma me parece impossível. Até dá para fazer essa missão antes se você souber onde ir, mas ela tem muito combate muito difícil. Assim, a maioria de nós precisa pegar a Master Sword da forma mais trabalhosa, mas menos difícil.
PEGANDO A MASTER SWORD
Para começar, você precisa de duas bolas de stamina. Você pode escolher ganhar 1/5 de bola a cada quatro altares que soluciona. Em outras palavras, caso você não queira nenhum coração, precisa resolver pelo menos 20 altares. Os altares são sequências de puzzles que acontecem sempre nos mesmos cenários. A diferença para Breath of the Wild é que eles usam a mecânica de construção que é novidade aqui e da qual falarei mais em breve.
Uma vez que você tiver as duas bolas necessárias, precisa encontrar todos os sinais alienígenas. Cada um encontrado mostra uma linda cutscene em desenho animado que mostra o que aconteceu com a Zelda, então muita gente pode querer ir atrás disso especialmente para ver a história. Encontrar todos faz o dragão voar mais baixo, a ponto de você conseguir voar até ele e pegar a espada. Todo esse processo, sem exagero, me tomou uns quatro a cinco dias, jogando pelo menos cinco horas por dia, normalmente mais do que isso.
Só aí eu pude de fato começar o jogo. Antes disso, sem a Master Sword, eu estava praticamente indefeso, com armas que faziam pouco dano e quebravam no meio das batalhas. Mas com a Master Sword, a coisa muda. A arma é forte e pode ficar ainda mais forte combinando-a com outros itens. Mais importante, quando ela quebra, você fica 10 minutos sem poder usá-la. Durante este tempo limitado, é viável usar algumas das armas quebráveis que você coleta normalmente. Mas usar apenas elas é inviável. Isso porque, enquanto a Master Sword dura, você naturalmente encontra armas suficientes para cobrir esses 10 minutos.
OUTRAS LIMITAÇÕES
Outras limitações, como espaço de inventário ou ausência de pontos de fast travel foram naturalmente diminuindo enquanto fazia minha quest pentelha pela Master Sword. Pegar sementes de korok aumentavam o inventário. Altares, e torres liberavam o mapa e possibilitavam fast travel. Assim, quando terminei este processo, de fato fiquei pronto para jogar. Pronto para combate e com o mapa liberado.
Eu sinceramente queria que o jogo permitisse salvar este estado, com mapa aberto e Master Sword no bolso, para poder começar daí no futuro. Ele não permite. Tem apenas um save, como é padrão Nintendo. E justamente por isso eu sinceramente não sei se terei estômago para jogar uma nova campanha de Tears of the Kingdom um dia.
Eu precisei jogar quase uma semana para poder de fato começar o jogo. Então diria que o que vai determinar se você acha Tears of the Kingdom a segunda vinda de Cristo à Terra ou simplesmente um jogo excelente é o quanto você se diverte com essas atividades secundárias que simplesmente não são opcionais. Sinceramente, eu até gostei delas no início, mas tive que fazer tantas, por tanto tempo, simplesmente para colocar meu jogo num ponto avançável, que gostaria de uma versão de PC onde pudesse destravar tudo com mods logo de cara.
E DAÍ TEARS OF THE KINGDOM COMEÇA
A questão é que quando ele começa, você passa a ser capaz de ser defender, e não apenas de fugir. Você pode explorar o mapa sem cair morto de frio ou de calor. Pode se teleportar para próximo das missões. E neste ponto, Tears of the Kingdom começa a ser muito, muito, MUITO bom!
Eu gostei do jogo no início, mas logo fiquei de saco cheio de tantos altares e colecionáveis necessários. Mas depois que estava com um personagem pronto para jogar, tudo ficou muito bom. Os quests principais são absolutamente sensacionais. Gosto do combate e os chefes são ótimos. Os puzzles são inteligentes. Há muito mais conteúdo projetado aqui do que em Breath of the Wild. Assim, Tears of the Kingdom tem muito de “vá fazer sua própria diversão”, mas também tem muita coisa mais dirigida. E é tudo de altíssima qualidade.
CHORINHO DO REINO X 4
Os quatro quests principais, que você libera após o tutorial, podem ser feitos em qualquer ordem, como as Divine Beasts de Breath of the Wild. E parece pouco por serem apenas quatro. Eu certamente senti que Breath of the Wild tinha pouca campanha propriamente dita. Mas aqui, cada um desses quatro quests é uma grande aventura. Sinceramente cada um deles poderia ser um jogo separado. Todos têm uma história mais ou menos independente, mecânicas únicas, um ótimo dungeon específico e terminam em uma sensacional batalha com um chefe e um novo poder.
O curioso é que, como você pode fazê-los em qualquer ordem, as cutscenes no final deles contam meio que a mesma coisa. Além disso, o objetivo principal do jogo, encontrar a Zelda, é algo que você faz ao pegar a Master Sword. Se você for atrás da espada antes da história, vai saber onde a Zelda está, mas vai continuar procurando por ela em outros lugares.
CARAMBA, COMO ISSO É BOM!
A primeira dessas missões que fiz, por recomendação do próprio jogo, foi a dos passarinhos da Rito Village. E logo que iniciei a missão em si, comecei a pensar “caramba, como isso é bom”. Essa sensação já começou enquanto escalava a montanha em busca do meu novo amigo, mas foi ficando cada vez melhor. Tem uma parte em que você vai voando entre as ilhas do céus para chegar à fonte da nevasca que, sinceramente, é uma das coisas mais legais que fiz em um game este ano.
E sabe o que é mais incrível? O jogo fica ainda melhor. Eu terminava cada uma dessas quatro aventuras principais empolgado e certo de que o resto do jogo não seria mais tão bom. Mas era. Depois de terminar a campanha, eu sinceramente não consigo escolher qual foi minha aventura preferida. Nem todo segundo dessas missões de história é bom (tem uma com as Gerudo que é basicamente uma missão de proteção de NPC, por exemplo). Mas o conjunto delas é muito legal.
Infelizmente, depois das quatro, ainda tem bastante jogo, e nada mais é tão legal. Há um excesso de profundezas, área escura e feia. E o jogo termina com um chefe de quatro fases sem save entre elas. Três dessas fases são péssimas, mas pelo menos a última é muito legal e deixa um gostinho gostoso ao terminar o jogo. Ao terminar o jogo, meu último save foi de mais de uma hora atrás. Se tivesse morrido no último chefe alguma vez, sinceramente não acho que teria tentado de novo.
INTERLÚDIO: CONSTRUÇÃO
Eu queria falar sobre alguns chefes, mas percebi que não falei ainda das mecânicas de construção que são tão importantes para Tears of the Kingdom. Então é hora de interlúdio. O principal novo poder do Link é pegar e colar várias coisas para construir máquinas. Você pode desde colar troncos de árvores para fazer jangadas e até usar coisas que têm uma função pré-definida, como foguetes e rodas.
A criatividade é o limite, e boa parte dos quebra-cabeças (e praticamente todos os altares) depende de você saber o que montar para chegar do outro lado ou improvisar algo que os desenvolvedores não planejaram. Eu sou uma pessoa criativa, mas não tenho muita vontade de criar em videogames. Quando o jogo para mim era uma sequência de altares onde precisava ficar montando máquinas ininterruptamente, ficou bem chato. Mas quando comecei a fazer a história em si, e as coisas começavam a vir com um timing melhor, alternando combate, exploração e puzzles, a coisa mudou de figura.
AINDA CONSTRUINDO UM INTERLÚDIO PARA TEARS OF THE KINGDOM
Eu ficava frustrado com coisas como rodas que não colavam exatamente onde queria, ou jangadas que não iam na direção que desejava. Porém, se você fizer uma busca por vídeos de Tears of the Kingdom, vai encontrar uma quantidade enorme de máquinas impressionantes feitas por pessoas com grande talento e paciência para isso. E claro, pintos. Sempre que dá para criar algo em um jogo, uma galera vai criar pintos.
Há um poder que você pode pegar que permite tirar o trabalho manual da montagem. Desde que você já tenha construído antes, e tenha os elementos – ou esteja disposto a pagar por eles – a montagem é feita automaticamente. Isso ajuda bastante quando você está explorando o mundo, mas dentro dos altares, onde mais vai precisar montar coisas, o poder é desabilitado.
VOLTANDO AOS CHEFES
E daí tem chefes que são quase quebra-cabeças. Você precisa construir uma máquina para conseguir chegar perto deles. É muito empolgante quando dá certo. Há também fases como a escalada da Death Mountain, em que você faz carrinhos de mina e vai subindo pelos trilhos enquanto ordena um dos seus camaradinhas para ir destruindo os obstáculos do caminho.
Todo esse conteúdo é muito, muito bom. Surpreendentemente bom. Eu gosto da fórmula Zelda, mas não gosto de todos os Zeldas ou Zelda-likes. Twilight Sword, por exemplo, achei um saco. Mas Link’s Awakening achei muito legal. Eu adoraria ver um novo Zelda com a qualidade do reino choroso, mas com a fórmula tradicional, em que o jogo inteiro fosse projetado, como era antes de Breath of the Wild. Isso não deve voltar a acontecer no futuro, considerando o sucesso da nova fórmula, mas fico muito feliz que Tears of the Kingdom realmente tenha uma aventura digna de um game chamado Zelda, não apenas um sandbox de sobrevivência. Especialmente pela qualidade absurda desse conteúdo.
AUDIOVISUAL FANTÁSTICO
Quando joguei Breath of the Wild, senti que ele era um dos games mais bonitos que já tinha visto. Vi muitas críticas ao visual de Tears of the Kingdom, devidos ao fato de que o Switch não aguenta nada tão pesado. E de fato, percebo que há aqui menos texturas e detalhes do que na maioria dos videogames. Em muitas cenas, fiquei com aquela sensação de que as texturas ainda não carregaram, mas o jogo é assim mesmo.
A questão é que, mesmo com essa simplicidade técnica, acho Tears of the Kingdom artisticamente lindo demais. Amo os desenhos, o visual dos personagens e, especialmente, o uso de cores. O mesmo posso dizer do som. As músicas são demais, assim como os sons de upgrades ou de quebra-cabeças solucionados. Até mesmo o sonzinho que toca quando inimigos te avistam é legal. Isso é o segredo em Tears of the Kingdom. O audiovisual do mundo é tão magistral que torna existir nele um enorme prazer. Mesmo que você só esteja solucionando altares ou tentando escalar superfícies molhadas.
TEARS OF THE KINGDOM É TRABALHOSO, MAS SENSACIONAL
Tears of the Kingdom nunca deixa de ser trabalhoso. Como um game cheio de mecânicas de sobrevivência, é comum você precisar de itens específicos em momentos específicos. Você pode precisar encontrar um item que, quando cozido, aumenta sua resistência a frio. Ou então frutas que, quando colocadas em uma flecha, iluminam o cenário. Ou então itens que fazem as flechas pegarem fogo. Para a “fase final”, você precisa ter uma quantidade absurda de comidas que te curam do Gloom (uma maldição que quebra seus corações e diminui a vida total), o que é bem chato.
Nada disso é opcional, mas você pega uma quantidade tão absurda de itens que deixa muito mais difícil do que deveria ser encontrar o que deseja. Muitas vezes você pode passar vários minutos olhando seu inventário e desistindo de encontrar um item que você sabe que tem.
Os controles também têm problemas. Os cavalos são tão inúteis aqui quanto eram em Breath of the Wild (se eles estiverem longe de você, só dá para recuperá-los em um estábulo). E mesmo assim tem um botão dedicado para assobiar e chamar os cavalos – o que não parece funcionar nem quando você está do lado do equino.
O PODER DA AMIZADE E O CHORINHO DO REINO
Ao mesmo tempo, ao longo da aventura você conquista sidekicks com poderes bem bacanas. Mas ao invés de usar o botão do assobio para selecionar suas habilidades em uma rodinha, precisa encontrar o personagem e falar com ele para poder ativar. Isso é muito mais complicado do que deveria ser em uma batalha contra chefes ou contra vários inimigos, que é quando você mais precisa encontrá-los. A última fase, em que você está com cinco sidekicks e precisa usar todos, por exemplo, é um desastre mecânico.
Além de precisar de muitas e muitas horas para colocar o jogo no ponto em que ele deveria começar, esta complicação de mecânicas e a forma como elas foram mal resolvidas no gameplay estão entre meus principais problemas com este novo Zeldinha. Também não me agrada o excesso de sidequests e a geral baixa qualidade delas, mas isso foi mais fácil de ignorar depois que tinha o necessário para fazer a história. Eu simplesmente parei de conversar com NPCs para não encher meu quest log de coisas que não queria fazer.
A questão que eu não me canso de martelar aqui é que, quando Tears of the Kingdom é bom, por Satã, sai de baixo, porque ele é realmente um dos melhores que já joguei. O problema é o quanto ele exige do jogador para você chegar nessa parte de fato sensacional. E daí existem dois tipos de pessoas: os que já se divertem com a preparação, e os que querem começar logo o jogo propriamente dito. Neste momento, eu diria que todo mundo pode amar Tears of the Kingdom. Mas quão cedo você se apaixona por ele vai depender de em qual desses grupos você se encaixa. E isso é algo que nenhuma análise pode te contar. E aí? Qual é?