Killer Instinct

0

Durante a geração anterior, a Microsoft não soube se aproveitar dos principais jogos da Rare, que possuíam o potencial de se tornarem marcas fortes e bem-sucedidas. Com o Xbox One, quem diria, a Microsoft conseguiu ressuscitar uma franquia de luta há muitos anos irrelevante, o que de fato pegou todo mundo de surpresa. Este Killer Instinct, um reboot da série, foi desenvolvido pelo estúdio Double Helix e todas as atualizações, melhorias gráficas e as Seasons 2 e 3 foram continuadas pelo Iron Galaxy Studios.

Quando foi lançado em 2013, confesso que fiquei com uma ponta de inveja dos donos de Xbox One, afinal, cresci com a Nintendo e com os jogos da Rare. Killer Instinct era, ao lado de Super Smash Bros., o meu jogo de luta favorito (sim, eu gostava mais até deles do que de Street Fighter e Mortal Kombat, o que é verdade até hoje).

A decisão da Microsoft de passar a responsabilidade para outro estúdio foi acertada. Surpreendentemente, o melhor deste Killer Instinct é que ele “entende” o original, qualidade que a Rare perdeu com seus próprios jogos. Por isso, acho que uma comparação é bem válida.

KILLER INSTINCT DOS ANOS 90

O Killer Instinct da Rare, lançado para arcades e depois para o Super Nintendo e Nintendo 64, é interessante porque tem um conceito de gameplay original, mas com a maior parte das suas características emprestadas de outros jogos mais famosos da época.

O torneio de luta, organizado por uma super corporação chamada Ultratech, num futuro caótico como aqueles imaginados nos anos 80, é claramente inspirado por Mortal Kombat, bem como outras características do jogo. A violência, a presença de fatalities (nem de longe tão violentos como o clássico da Midway Games) e até os brutalities, em forma de ultra combos, estavam presentes em Killer Instinct. De Street Fighter, vieram os golpes especiais.

Os personagens de Killer Instinct são outra curiosidade. Para mim, que joguei todos os jogos da franquia, eles são icônicos, mas não estaria errado quem disser que eles são as representações do que havia de mais genérico em videogames daquela época. Uma caveira, um robô feito para matar com cara do Predador, um dinossauro que é na verdade um híbrido réptil e humano, um ninja que solta hadoukens e uma espiã secreta com seios fartos. Os lutadores de Killer Instinct são apropriações do que a molecada achava legal naquela época.

O conceito original, fator determinante para o sucesso de Killer Instinct, foi o seu sistema de combos, que tinha uma metodologia restrita que exigia bastante treino para entender. Ao invés de você executar diversos movimentos manuais para combinar os golpes, como qualquer jogo de luta, Killer Instinct possuía golpes iniciadores de combos que, uma vez fossem utilizados no oponente, o deixariam preso para receber outros golpes. Era um sistema de combos automático, que tinha movimentos de começo, meio e fim.

Certos golpes finalizariam os combos, ataques normais poderiam resultar em dois ataques em sequência com apenas o aperto de um botão (os duplos automáticos), e por aí vai. Os combos poderiam ir de três, quatro hits, até mais de 20, se o jogador fosse habilidoso. Quem estivesse apanhando, para sair dessa situação de saco de pancadas, tinha apenas a opção de utilizar um combo breaker, que era extremamente difícil de executar.

Para jogar, era obrigatório conhecer os movimentos especiais, a estrutura dos combos e todos os personagens e seus ataques. Se você quisesse ter uma chance de executar um combo breaker, teria de decorar os combos de cada personagem do jogo. E aí podemos pular para o tema desta resenha, este reboot de Killer Instinct.

KILLER INSTINCT 2013

Duas coisas, em especial, tornam este Killer Instinct memorável. A primeira é simples e fácil de perceber por qualquer pessoa que nunca tenha jogado os anteriores: Killer Instinct tem uma identidade fácil de lembrar. Absolutamente bonito, e cada vez mais a cada nova atualização, a reimaginação dos personagens originais causa uma agradável estranheza a quem já conhecia, pois os designs deles no reboot são melhores do que no jogo original. Os personagens novos fazem parte do elenco como se já estivessem há muito tempo na série, dados os golpes originais e o fato de que cada um deles parece ser mais perigoso do que o outro, algo importante para o jogo.

A outra característica tem a ver com aquilo que mencionei sobre os desenvolvedores entenderem bem a proposta do original. O gameplay de Killer Instinct perdeu todas as gorduras e conceitos emprestados de outras franquias que não caíam bem na proposta do jogo. Esqueça-se dos fatalities, por exemplo. O reboot é o jogo de puro sistema de combos que os jogadores se lembram.

Desta forma, o Killer Instinct expande o conceito original, do combo passo a passo, ou “receita de bolo”. As regras são as mesmas: para começar um combo, é preciso fazer um ataque aéreo ou um ataque específico no chão. Depois, aperte um botão de ataque para dar continuidade, seguindo por um ataque especial com soco ou chute médio/fraco. Repita os procedimentos dois e três até o máximo que conseguir (há um limite para dano e o oponente sempre pode tentar quebrar o combo). Finalize com um ataque especial de chute ou soco forte para terminar o combo com uma animação bacana e ainda aumentar o dano causado.

Outras coisas que voltam: ultra combos, que ainda são usados para garantir a vitória e humilhar o oponente, combo breaker, que agora funciona ao pressionar soco e chute em força correspondente ao ataque recebido (soco e chute médio para um ataque médio, por exemplo), shadow moves mais fáceis de executar (é só fazer um movimento especial e apertar dois tipos de chute ou soco). Ah, e os manuais são um pé no saco para executar, exigindo timing perfeito.

O que muda, principalmente: há barras de energia para executar os shadow moves, uma barra de instinto que concede uma habilidade diferente e especial a cada personagem, tornando-os mais poderosos e, por fim, cada personagem tem uma característica exclusiva que garante que você não consiga jogar com ele a não ser que o estude antes, lendo seus movimentos especiais, suas características de combate, etc. Logicamente, sendo um jogo de primeiro escalão desta geração, Killer Instinct tem gráficos, performance (a 1080p e 60 frames por segundo no Xbox One, podendo chegar a mais no PC) e controles excelentes.

E SEUS DEDOS, COMO ESTÃO?

Porém, apesar de todas as melhorias, e do esforço de levar a essência do original a um maior número de pessoas, Killer Instinct é bastante inacessível. “Fácil de jogar, difícil de dominar”, não é uma frase aplicável ao jogo, o que o torna bastante diferente de Super Smash Bros., aquele outro favorito.

Basicamente, quem joga há mais tempo e conhece as mecânicas sempre vencerá. Embora a técnica de button mashing funcione mais até em Killer Instinct do que em outros jogos do gênero, é praticamente impossível vencer um oponente que conhece todos os movimentos, combos e habilidades de cada personagem, sem falar que jogar Killer Instinct sem entendê-lo deve ser bem chato, uma vez que todos os meus amigos próximos reclamam disso. E não é como se eu jogasse isso muito bem, aliás. Apesar de conhecer a franquia desde os meus 10 anos de idade e ter jogado por várias horas este reboot, Killer Instinct é simplesmente difícil demais, e os jogadores online são muito mais habilidosos do que eu.

Não dá para reclamar, no entanto, que o jogo não se esforça para que você aprenda cada uma das suas mecânicas complicadas. O modo de dojo, exclusivamente para o personagem Jago, ensina os movimentos básicos e avançados. Você precisará de um bom tempo aqui para desenvolver as habilidades necessárias para jogar online ou contra o computador do nível mediano para cima, porém, é de fato um trabalho caprichado.

FREE TO PAY

É lógico que o modelo not so muchfree to play” de Killer Instinct influenciou algumas decisões de design do jogo, de maneira negativa, em minha opinião. O incentivo para continuar jogando é liberar cores e roupinhas novas para os personagens, ou comprar outras. Cada personagem e o seu perfil geral de jogador recebem experiência e têm level up. Subir de nível em um jogo de luta é, devo dizer, a coisa mais imbecil desde o pacote de fatalites fácil de Mortal Kombat X.

Por conta deste modelo free to play, o modo single player foi pensado depois e, mesmo com finais diferentes para cada personagem, e uma introdução de história bacana para os personagens da Season 2, o conteúdo é muito fraco para quem quer jogar offline. E para quem joga a versão gratuita, com um único personagem liberado por vez, ou decide comprar aos poucos?

Bem, para esses, enfrentar cada personagem novo é um desafio desproporcional. A cada nova expansão, a Microsoft garante que os jogadores medianos fiquem automaticamente desatualizados a não ser que comprem o pacote ou treinem duro contra os novos personagens (é possível jogar contra eles mesmo sem pagar pelas expansões). Se você é um desses jogadores casuais sem orgulho próprio, a Microsoft tem a solução: um modo de facilitador de combos que não exige habilidade, pensamento, técnica, só dedos (aperte o mesmo botão repetidamente e algum combo, de algum jeito, sairá de alguma forma).

Porém, nenhum conteúdo novo e microtransações garante a sobrevida de um jogo de luta. O que garante é a adesão de novos jogadores – é como um esporte, só que um e-sport. E essa percepção importante provavelmente não estava na cabeça da Microsoft em 2013, mas o lançamento do jogo para PC com a Season 3 e o fato de que, se você comprar o jogo no Xbox One, terá ele também no PC, dão indícios de que é necessário trazer mais gente para cá. Covenhamos: a Microsoft trazer personagens de Battletoads, Gears of War e Halo para o jogo é marketing pesado para quem ainda não jogou!

Killer Instinct é um excelente jogo de luta, mas se você tem intenções de não passar vergonha, ou simplesmente aproveitar o que tem a oferecer, terá de desembolsar uma boa grana e, além disso, jogar muito, muito mesmo. Dominar certas coisas básicas no jogo, como ultra combos, combo breakers e auto-doubles é complicado. Aplicar manuals, counter-breakers, conhecer os movimentos e skills de cada personagem, então, é uma prova da matéria que você achava mais difícil na escola. O problema é que para resolver certos exercícios dela, você ainda terá de gastar umas dilmas (ou temers).

Para finalizar, falemos um pouco do conteúdo de cada uma das três temporadas disponíveis até o momento.

SEASON 1

Com a maioria dos personagens principais do original, a Season 1 é obrigatória para entender os golpes e combos básicos, pois esses são os lutadores mais fáceis de usar (especialmente Jago e Sabrewulf). O modo single player tem três finais para cada personagem, mas você precisa fazer algo específico em alguma luta para habilitá-lo. Fulgore e Spinal continuam sendo aqueles monstros de sempre.

Traz oito personagens, mais as fases de cada um. Disponível em versão digital e em disco, com o personagem TJ Combo (o lutador de boxe) como bônus na versão física.

SEASON 2

Outros favoritos retornam (Cinder, Riptor, Maya, Combo), mas a maioria é nova. Os lutadores desta temporada são extramente difíceis de jogar. A Kan-han usa dano em área, a Arya tem uma barra de vida que funciona diferentemente dos outros, a Hisako começa combos com contra-ataques, e por aí vai.

Nove personagens, mais fases correspondentes, roupinhas retrôs e acessórios cosméticos.

E, como ainda não joguei a Season 3, o Corrales vai dar uma força com as informações e a opinião dele sobre essa atualização. Vai lá, chefe!

SEASON 3

A terceira temporada de Killer Instinct dá uma boa repaginada no jogo, não apenas trazendo oito novos personagens, mas também reimaginando a iluminação dos cenários e fazendo sutis modificações em todos os personagens.

A Season 3 está sendo liberada aos poucos. Não traz ainda um “modo história”, e saiu originalmente com apenas com quatro personagens dos oito prometidos, sendo que uma quinta saiu pouco antes de fecharmos este texto. Falemos um pouco de cada um deles.

Rash: o personagem de Battletoads era o que mais me deixava curioso para experimentar, e ele é muito legal. Traz várias características e golpes do jogo que o apresentou ao mundo, como a cabeçada com chifres, a botinada e até mesmo a possibilidade de virar um sino. Jogar com ele é muito divertido.

Arbiter: conhecido por fãs da Microsoft como um dos personagens principais da série Halo, o Arbiter se junta ao elenco de Killer Instinct tendo sido muito bem adaptado. Ele usa a Energy Sword, aquela espada laser tradicional dos Elites e tem também a possibilidade de usar o Energy Rifle com o botão de chute. A munição é limitada, mas faz um belo de um estrago.

Kim Wu: a chinesinha de Killer Instinct 2 (1996) está de volta com seus nunchakus e seu dragãozinho de estimação. É uma das menores personagens do elenco, mas é também uma das que têm mais facilidade para fazer combos enormes.

Tusk: também originário de Killer Instinct 2, Tusk é um guerreiro medieval que não causaria estranhamento em uma capa do Manowar. Sua roupa retrô inclusive é apenas uma cuequinha peluda. Carrega uma espada enorme e a princípio não gostei dele. Porém, quando me acostumei com seus golpes especiais mais lentos, consegui bater o meu recorde no modo survival usando o sujeito. É um personagem mais difícil de usar do que a Kim, mas seus golpes são fortes e chamativos, tornando-o bem divertido.

Mira: Mira foi disponibilizada no final de abril e é uma personagem nova. Trata-se de uma vampira, e é uma das que exigem mais estratégia para ser dominada. Isso porque cada vez que usa seus poderosos golpes especiais, ela perde energia. Use demais e você será derrotado. Um de seus golpes especiais, no entanto, é uma mordida que recupera essa energia drenada (que fica marcada na barra com a cor branca) e é algo que você vai querer usar com frequência para se manter fortinho e bem alimentado. Felizmente, é um golpe que se encaixa naturalmente no final dos combos. Só torça para não ter que engolir um combo breaker antes disso.

E mais: Ainda em maio, Gargos, também de Killer Instinct 2, será disponibilizado para quem comprou a terceira temporada. Em junho e julho veremos os dois personagens finais, sendo que um deles será o General Raam, último chefe do primeiro Gears of War.

Também temos prometido para mais tarde neste ano o modo história chamado Shadow Lords, onde você vai escolher um personagem como principal e vai montar um time para vencer Gargos. Este modo terá elementos que serão carregados de uma partida para outra. Por fim, haverá um novo modo multiplayer que vai se ligar de alguma forma a Shadow Lords.

INSTINTO ASSASSINO

Killer Instinct é um jogo muito divertido e bastante diferente dos outros concorrentes do gênero luta, graças ao seu foco em combos enormes. Ele também tem um visual bem chamativo, cheio de coisas brilhantes, explosões e um narrador que não para de gritar, lembrando bastante os jogos de arcade dos anos 90 onde a série se originou.

É incrível também ver o quanto ele cresceu desde seu lançamento. É óbvio que sua estratégia de lançamento influenciou a Capcom em Street Fighter V. O tempo dirá se a nova iteração do clássico de luta será expandido de forma tão consistente e caprichada quanto Killer Instinct.

Galeria

REVER GERAL
Nota
Artigo anteriorDelfos na BRMA-RJ
Próximo artigoAngry Birds – O Filme
Daniel Villela
Daniel adora heavy metal, rock progressivo e Frank Zappa, jogos de FPS, aventura, plataforma e RPG, é fanático pelo MCU, curte séries de TV como Mad Men, Breaking Bad, Demolidor, 24 Horas, Friends e The IT Crowd. No lado profissional, é formado em Jornalismo, pós-graduado em Comunicação Empresarial e trabalha na área de Marketing.
killer-instinctAno: 2013 (com atualizações em 2015 e 2016)<br> Gênero: Luta<br> Plataforma: Xbox One, PC<br> Fabricante: Double Helix (atualizações por Iron Galaxy)<br> Versao: Xbox One<br> Distribuidor: Microsoft<br>