Introdução e entrevista formulada, conduzida, traduzida e digitada por Carlos Eduardo Corrales.
Quando conversei com o Bruno após entrevistarmos o Sepultura, ele disse que durante o tempo em que ele passou conversando com o Andreas Kisser, parecia possuído, não se sentia como ele mesmo (leia a empolgação dele), já que estava completamente concentrado na entrevista. Sinceramente, achei que ele estava exagerando um pouco, já que nunca tinha sentido isso nas entrevistas que fiz anteriormente. Mas não é que as coisas mudam completamente quando você está entrevistando alguém que você admira (caso do Bruno ao conversar com o Andreas)?
Pois foi exatamente assim que me senti ao trocar idéia por telefone com o Blackie Lawless, líder do W.A.S.P., banda que está sem dúvida, no meu Top Ten de bandas mais legais da história. Claro, se você ficar pensando: “Meu Deus, eu estou conversando com o Blackie Lawless!”, não vai conseguir fazer a entrevista direito, então essa sensação de “possuído” que sentimos acaba sendo até mesmo necessária para um bom trabalho. E nesse caso, principalmente, pois não só foi a primeira entrevista em inglês que fizemos (chegamos a entrar em contato com as bandas Lordi e Savatage que toparam a entrevista, elaboramos as perguntas e enviamos por e-mail, mas até agora não obtivemos resposta) como também foi a primeira por telefone, o que me deixou ainda mais preocupado. Imagina se o gravador não grava direitinho… 🙂
Infelizmente, tínhamos apenas 15 minutos disponíveis (que, por mais incrível que seja, parecem ter durado muito mais que isso – e eu fiquei olhando para um cronômetro o tempo todo para garantir que não ia estourar o tempo), o que fez com que fizéssemos uma entrevista bem menos detalhada do que faríamos. Mas isso não impediu que Blackie fizesse um apanhado geral da carreira do W.A.S.P.. Nas próximas linhas, você vai saber o que significa a sigla do nome da banda e como vão ser os shows no Brasil (que Lawless fala com tanta empolgação que parece até o Joey DeMaio do Manowar falando). Blackie também explicou as idas e vindas do guitarrista Chris Holmes, a origem da música Chainsaw Charlie, os problemas com o Motörhead e falou até sobre religião. É imperdível.
Como o DELFOS se diferencia dos outros veículos por sua forma informal de apresentar o conteúdo e como eu sempre achei muito chata aquelas entrevistas cheias de palavras formais (que são colocadas na tradução) e conteúdo alterado que vemos em outros lugares, decidi transcrever a entrevista palavra por palavra (chega a ser engraçada a quantidade de “Well” e de “You know” que o Blackie fala). Isso vai permitir que o delfonauta realmente imagine como foi a conversa. Obviamente, se a idéia era essa, não poderíamos censurar os palavrões que rolaram na conversa, então se você está acostumado com os “textos família” do DELFOS pode ficar um tanto assustado. 😉
Enfim, sem mais delongas, confira abaixo o bate papo com o líder do W.A.S.P., na íntegra.
Olá, sou do DELFOS e estou ligando para a entrevista com Blackie Lawless.
Oi, é o Blackie aqui.
Oi, Blackie. Meu nome é Carlos.
Oi, Carlos.
Eu quero começar por algo que todo mundo quer saber. O que significa W.A.S.P.?
Bom, no começo nós estávamos procurando por um nome polêmico e por isso colocamos os pontos depois de cada letra: para gerar polêmica. Nós fomos a primeira banda a fazer isso. Ninguém fez isso antes. Muitas bandas fizeram depois, mas nós fomos os primeiros. E isso continuou gerando polêmica. Mas quanto ao significado individual de cada letra, essa é a beleza disso. Cada um cria seu próprio significado. Para mim, é apenas para polêmicas, não tem um significado específico, tem muitos significados.
Então aqueles rumores sobre significar White Anglo Saxon Protestants (Protestantes Brancos Anglo Saxões – uma organização estadunidense de extrema direita) ou We Are Sexual Perverts (Nós Somos Pervertidos) são apenas isso: rumores?
Bom, é o que qualquer um quiser que seja. Tudo isso pode ser verdade.
Nos primeiros álbuns, o W.A.S.P. era uma banda divertida de Hard Rock. Então, no (álbum) Headless Children, o som ficou mais pesado, mais próximo do Metal Tradicional de um Priest ou Maiden. Então, alguns discos mais sombrios, como Crimson Idol, Still Not Black Enough e Kill Fuck Die. Então parece que um novo ciclo foi iniciado. A diversão volta em Helldorado, o pesado em Unholy Terror e os sombrios Dying for the World e os Neon Gods. Essas mudanças são intencionais? O W.A.S.P. funciona em ciclos?
Não penso em ciclos, mas olhando para trás pode parecer que seguiu essa direção. Mas não era essa a intenção porque eu faço discos que refletem o que estou sentindo no momento e acho que essa é a forma mais verdadeira que um artista pode fazer discos, sabe? Que tentem refletir o que ele pensa no momento. E depois de trabalhar nos Neon Gods por tanto tempo e de ficar em turnê quase o ano passado inteiro, para ser honesto com você, o meu sentimento e o da banda é que no próximo álbum de estúdio nós vamos voltar ao início. É isso que sentimos, é nessa direção que achamos que devemos ir. Eu não gosto de ficar em uma situação onde sentimos que ficamos previsíveis e a forma mais fácil de não ser previsível é fazer o que seu coração mandar.
Então o próximo álbum vai ser novamente um disco divertido?
Bom, vai ser mais semelhante ao que fazíamos no começo sim.
Isso é bom. Você e o (guitarrista) Chris Holmes eram os membros principais da banda até o Headless. Por que ele saiu da banda depois desse álbum?
Bom, eu acho que… Ele casou com a Lita Ford e acho que isso teve muito a ver com isso. Eu acho que ela queria alguém que ficasse… em casa. Ela queria que ele fosse a esposa, para ser honesto com você. Porque foi exatamente isso que aconteceu.
Eu ouvi muito sobre (a música) Chainsaw Charlie ser sobre o presidente da (gravadora) Capitol Records e, por causa dessa música, o W.A.S.P. foi despedido da Capitol. Quanto disso é verdade?
Tudo.
Ah, é? Foi exatamente isso?
Tudo é verdade.
Você pode nos dizer algo mais sobre isso?
Bom, sabe? O cara mentiu para mim em várias ocasiões e isso realmente me deixou bravo. Então eu disse: “Ok, eu vou deixar você famoso. Vou escrever uma música sobre você”. (rindo) E ele ficou bem chateado.
Ele não ouviu a música até ela ser lançada?
Não, ele não ouviu… Ele ouviu por volta de 6 semanas antes do disco ser lançado. E ele ficou louco. (rindo) Ele não viu o humor na situação. E eu ri, eu fiz piadas sobre isso depois. Eu nunca entendi qual parte que mais incomodou ele. (rindo muito) Será que foi a parte do “I’m a lying motherfucker (Eu sou um filho da puta mentiroso)” ou a parte do “I’m a cocksucking asshole (Eu sou um babaca boqueteiro)”, sabe? Eu nunca entendi qual dessas duas deixou ele mais bravo.
Acho que as duas.
(gargalha) Provavelmente.
Bom, o Chris voltou para o (álbum) Kill Fuck Die. Por que você decidiu chamá-lo de volta ou por que ele decidiu voltar?
Porque ele se divorciou da Lita. E aí nós voltamos a nos falar depois que ele se separou dela e deu certo.
E então ele saiu de novo depois do (álbum) Unholy Terror. Ele se casou de novo?
Não. Eu só acho que ele estava infeliz com a vida dele. Estava procurando por outra coisa. Ele não está mais tocando. Quer dizer, ele toca um pouco, mas não sei o que procura na vida.
Bom, nas duas partes do (álbum) Neon God, eu notei algumas semelhanças com bandas como Queen e Savatage. Você é influenciado por essas bandas ou gosta delas?
Bom… (pausa) Não conheço muito do Savatage, para ser honesto com você. (pensativo) Mas quanto ao Queen… Eu diria que minha influência veio dos Beatles, sabe? Mais do que das outras bandas, então se for para dar crédito a alguém, acho que devemos ir ao início de tudo, sabe? Os Beatles foram a influência de todas essas bandas.
Ok. Então vocês finalmente vêm ao Brasil depois de muitos boatos todo ano que diziam que vocês viriam para cá. Alguém tentou trazer vocês nesse período ou essa é a primeira vez?
Bom, tiveram conversas, mas o problema é que nenhum produtor realmente estava confiante. Eles nunca acreditaram que nós tivéssemos fãs suficientes, sabe? A força dos fãs que possibilitasse que nós fôssemos. E nós dissemos para eles por anos: “Nós temos a força dos fãs para tocar aí.”, e ninguém nunca acreditou. Sabe, eu acho que o que realmente aconteceu foi que eles viram o que aconteceu na Grécia no ano passado e também na Rússia. Porque nunca tínhamos ido também a esses lugares porque os produtores não acreditavam na nossa força. E daí nós fomos lá e destruímos tudo, lotamos todos os shows que tocamos e isso fez uma grande, grande diferença. E acho que isso fez com que os produtores da América do Sul finalmente acreditassem, sabe? Que tínhamos a base de fãs para nos apoiar, sabe? Para ser honesto com você, isso nos deixou muito, muito bravos, sabe? Porque eu estou puto, a banda está puta, os fãs estão putos porque eles nos fizeram esperar tanto tempo, sabe? E por causa disso, a gente vai descarregar essa raiva no público quando a gente chegar aí, sabe? Nós vamos chegar aí e fazer um show muito semelhante ao que fazíamos em 1983, 1984, porque o Brasil nunca teve chance de ver como o W.A.S.P. era no começo. Então nós vamos aí e vamos levar todo o sangue, as tripas, as penas, as serras… Nós vamos chegar aí e destruir o público. Vamos mostrar aos produtores que eles deveriam ter levado a gente muito tempo atrás.
Isso é bom. Seria minha próxima pergunta… Se vocês trariam todo o show, mas você já respondeu isso, então…
(interrompendo) Bom, como eu disse, nós estamos muito bravos com isso. Porque eles nos fizeram esperar. Nos fizeram esperar tempo demais, sabe? Como eu disse, nós estamos putos, os fãs estão putos, sabe? E nós vamos aí e vamos… vai acontecer a mesma coisa que acabou de acontecer na Grécia e na Rússia. Nós vamos conseguir voltar todo ano depois disso. Porque os produtores fi-nal-men-te vão acreditar depois de verem a reação dos fãs quando chegarmos aí.
E você pode nos dizer algo sobre o setlist para o Brasil?
Então, a gente não vai se concentrar muito no disco novo. Vamos tocar só umas duas ou três músicas. Porque, como eu disse, nunca fomos tocar aí, então achamos isso importante… Se já tivéssemos ido muitas vezes e as pessoas já tivessem nos visto muitas vezes seria diferente, mas como elas nunca nos viram, é importante que o show seja W.A.S.P. clássico. Vamos tocar: Fuck Like a Beast, I Wanna Be Somebody, L.O.V.E. Machine, Blind In Texas, Wildchild, Headless Children, todo o W.A.S.P. clássico. Porque elas nunca viram a gente e é importante que vejam a história do W.A.S.P..
Alguma chance de tocar Mean Man ou Scream Until You Like It (Nota: duas das minhas músicas preferidas da banda)?
(pensativo) Ahn… Não sei. Duvido. Porque estamos olhando para o setlist agora e nenhuma dessas músicas está lá. Mas eu não acho que essas músicas são grandes o suficiente, de qualquer modo… Para se comparar com o material clássico do W.A.S.P..
Voltando um pouco, o que você pode nos dizer daquela situação com o P.M.R.C. nos anos 80 (Nota: o Parents Music Resource Centre era um grupo de esposas de políticos estadunidenses que declararam guerra contra várias bandas de Rock que consideravam obscenas, satanistas, etc). Duas das mais afetadas foram o próprio W.A.S.P. e o também tremendão Twisted Sister. O efeito mais famoso de sua guerra foi aquele famoso selo de “Parental Advisory: Explicit Lyrics” que todos nós já vimos)?
Foi uma loucura. Sabe? Tem um cara que tenta ser presidente dos Estados Unidos (Nota: Blackie se refere a Al Gore, cuja esposa, Tipper Gore, era a líder do movimento) e ele escolhe as bandas de Rock ‘n’Roll para gerar polêmica e chamar a atenção para ele mesmo. E funcionou muito bem, preciso dar crédito a ele por isso.
E vocês usaram isso como divulgação…
Com certeza. Bom, você sabe, como eu sempre disse, se você quer conseguir atenção, existe maneira melhor do que grudar em alguém que já está conseguindo atenção? Porque então os holofotes também iluminam você.
Na época do Helldorado, houve muitos rumores sobre problemas entre o W.A.S.P. e o Motörhead. O que realmente aconteceu?
Hum… Nada. Eu acho que a imprensa exagerou isso. Quero dizer, Lemmy e eu somos muito bons amigos. Éramos amigos antes e somos amigos agora.
Neon God e Unholy Terror são álbuns que criticam religiões organizadas. Você segue alguma religião?
(silêncio seguido de uma respiração profunda) Não uma religião organizada. Eu tenho crenças muito específicas, sabe? Eu acredito em Deus, sabe? E tenho minhas próprias idéias sobre o que isso significa. Mas eu não sou um seguidor de religiões organizadas.
Tanto o Crimson Idol quanto o Neon God têm personagens cujo nome começa com J. Isso tem algum significado especial?
(pensativo) Acho que não. Acho que é só coincidência.
Você consegue relacionar os conceitos dos dois álbums? Ou eles não têm nada a ver um com o outro?
Bem, o Crimson Idol é uma história bem simples, sabe? Sobre um garoto que tenta conseguir amor dos seus pais. Já o Neon God é uma história muito mais complicada porque… É… Sobre… Sabe, quando eu comecei a escrever, pensei: “Qual é a coisa que nós, humanos, pensamos mais?”, sabe? E senti, sabe, que eram essas perguntas que fazemos para nós mesmos. Sabe, quando estamos sozinhos e pensando sozinhos e dizemos: “Quem sou eu? O que significa a minha vida?”, sabe? “Existe um Deus? Não existe um Deus?”, eu comecei a pensar em todas essas perguntas. Então eu pus elas em uma letra e essa letra dizia: “Oh tell me my Lord / Why am I here? (Me diga, Senhor/ Por que estou aqui?)”. Sabe, então quando eu pensei nessa letra, pensei que isso é provavelmente aquilo no que mais pensamos, sabe? Então o Neon God (Deus de Néon) é todos nós. O Crimson Idol era uma história bem mais simples, mas o Neon God é muito mais complicado, porque ele lida com todo mundo, sabe? É sobre a jornada através da vida pela qual todos nós passamos, tentando descobrir o que tudo isso significa.
Você acha que vai voltar a fazer um álbum conceitual no futuro?
(pensativo) Duvido. Porque esse último foi muito, muito difícil de fazer. E no momento eu não tenho nenhum desejo de passar por isso de novo. Passaram-se muitos anos entre os dois discos conceituais (Nota: o Crimson Idol e o Neon God) e se eu fizesse outro, também ia demorar tanto tempo novamente. Mas para ser honesto com você, depois de fazer o Neon God por alguns anos e depois de ficar em turnê quase o ano passado inteiro, meus sentimentos, e os sentimentos da banda também, são de que o próximo disco de estúdio que faremos, que está agendado para outubro, vai provavelmente ser muito similar ao que era no início, sabe? É onde meu coração está agora e é para onde eu quero ir.
Ok, voltando novamente, você escreveu Mean Man sobre o Chris, certo?
Certo.
Por que você decidiu escrever uma música sobre ele?
Porque ele me pediu para fazer isso.
(rindo) Ele pediu?
Sim.
Ok. Bom essas eram todas as perguntas que tínhamos, quero agradecer você pela entrevista…
E eu agradeço a vocês pelo interesse. Fico muito agradecido.
Gostaria que você deixasse uma mensagem para o seleto público do DELFOS.
Bom, é como eu disse antes: o W.A.S.P. está muito puto e sabemos que os fãs também estão putos. E nós vamos para o Brasil e vamos machucar alguém quando chegarmos aí, porque estamos loucos pelos produtores terem nos feito esperar tanto. Nós vamos para o Brasil e nós vamos destruir esse lugar. (Pegue um MP3 dessa mensagem aí embaixo).
Ok, muito obrigado, Blackie.
Obrigado.
Leia mais matérias delfianas sobre o W.A.S.P.:
Neon God: Part 1 – The Rise
Neon God: Part 2 – The Demise