No início dos anos 80, um programador inglês de uma pequena empresa de softwares chamado Richard Garriot, mudou para sempre a cara dos RPGs para computadores ao lançar um simples, porém ousado, jogo chamado simplesmente de Ultima.
Ultima não tinha bons gráficos (era quase um jogo de Atari mais colorido), tinha barulhos irritantes no lugar do som (lembra do PC Speaker?) e uma estória bem maluca, que misturava vários contos infantis como João e o Pé de Feijão, Chapeuzinho Vermelho e os Três Porquinhos. Mas o que mais chamava a atenção era o fato do jogo dar uma total liberdade de exploração e interatividade com os cenários, além de dar a oportunidade do jogador usar e abusar da criatividade para resolver as mais absurdas situações que iam aparecendo conforme a trama ia se desenrolando.
O jogo fez muito sucesso e, obviamente, uma continuação foi lançada no mercado um ano depois. Os demais Ultimas deixaram o lado engraçadinho e bonitinho de lado e passaram a investir no fator enredo para que o jogador realmente criasse um laço afetivo com a série e seus personagens. Portanto, em quase todos os episódios, você encontrará personagens como o Lord British (na verdade um alter-ego do próprio criador Richard), o Avatar (Nota do Carlos: Para quem gosta de Heavy Metal, uma curiosidade: Avatar foi o primeiro nome do Savatage e na época eles faziam um Hard Rock festeiro, na linha do Kiss) e o demônio Guardian. Os primeiros três episódios contavam como um cidadão comum pode se transformar, através de uma seqüência de bons atos, no Avatar (algo como um messias). Nos capítulos V, VI e VII temos a luta entre este Avatar e os demônios que assolam o reino da Britannia, entre eles o perigoso Guardian.
Os primeiros sete episódios fizeram tanto sucesso que quebraram a barreira do computador e também foram lançados para videogame: os três primeiros saíram para o Nintendo-8 Bits, o quarto saiu para Master System, e o 6 e 7 para Super Nintendo.
O Ultima VII, ainda hoje, é considerado um dos melhores, senão o melhor, jogo de computador de todos os tempos. Sua estória era tão grande (tanto no mapa quanto na quantidade de coisas possíveis de se fazer) para os padrões da época, que foi dividido e lançado em dois episódios diferentes. Sendo que no segundo episódio, nosso Avatar é considerado um traidor e banido da Britannia para sempre pelo famigerado Guardian.
Lançado em 1994, o Ultima VIII: Pagan começa exatamente neste ponto, com Avatar banido para um reino obscuro e perdido chamado de Pagan (daí o nome do jogo), dominado pela impiedosa rainha Tempest.
Você começa totalmente perdido no jogo, uma característica da série que faz com que você vá descobrindo a trama aos poucos, conforme vai explorando os lugares. A não-linearidade da série Ultima também se faz presente neste oitavo episódio. O seu objetivo final é, claro, sair de Pagan e voltar para a Britannia, mas como você vai fazer isso são outros quinhentos, pois você tem total liberdade para decidir a ordem de suas ações.
Obviamente, algumas tarefas são obrigatórias para que se atinja o objetivo final, mas você tem tantas missões secundárias possíveis, lugares secretos para explorar e pessoas para ajudar (ou simplesmente eliminar do seu caminho) que o jogo tem uma longevidade deveras alta. Especialmente quando nos lembramos que Ultima VIII já tem seus 10 aninhos de idade.
Para se ter uma idéia dessa liberdade total, basta dizer que logo quando você começa, já é possível ir atrás da arma mais poderosa do jogo, a maça mágica Slayer, desde que você saiba onde ela se encontra obviamente (Dica: em um dungeon à direita da cidade principal). Cabe ao próprio jogador decidir quando e onde você pode ir, se está apto para enfrentar um inimigo mais forte, tudo depende do equipamento disponível naquele momento.
A interação com os NPCs pode ocorrer de várias formas diferentes, você pode simplesmente conquistar as pessoas pelo seu carisma, ou ser agressivo e fazer com que os outros tenham medo, ou, em último caso, pode simplesmente sair na porrada e mesmo matar quem você quiser. Mas lembre-se: o caminho do Avatar deve ser sempre baseado na bondade e nas virtudes para que não se tenha surpresas desagradáveis no final.
Os gráficos são fantásticos, mesmo para os padrões de hoje. Você tem uma visão isométrica do cenário (como as séries Diablo e Baldur´s Gate copiariam anos depois) e o reino de Pagan é bem detalhado, com um mapa bem variado de localizações e terrenos. Não é o absurdo que foi Ultima VII, mas acredite, você vai passar um bom tempo explorando todos os lugares possíveis. Falando nesses lugares, todas as localizações presentes em um bom RPG estão aqui também: o amedrontador cemitério, a vila medieval, a subida na montanha, a cidade destruída, a vila dos magos, kilômetros de florestas e pântanos para serem explorados, dungeons, labirintos, enfim, tudo o que os amantes do gênero gostam.
Outro grande ponto que precisa ser destacado é a parte sonora de Ultima VIII. As vozes são incríveis, mas infelizmente não estão presentes durante todo o andamento da estória, apenas em momentos chave. Mas o trabalho de dublagem é fenomenal e as vozes do Guardian e dos elementais ecoam na minha cabeça até os dias de hoje. Um momento belíssimo é a invocação do elemental do fogo, Pyros, que rende um dos momentos mais clássicos que já presenciei em todos os RPGs. As músicas também são bem sinistras e combinam com o clima de mistério que envolve o reino de Pagan (não vou contar mais para não estragar as surpresas).
Apesar de todas essas qualidades, Ultima VIII é um dos exemplares menos populares de toda a série, especialmente porque muitos dos fãs acham o jogo difícil demais (e realmente é), e outros porque acham que descaracterizou um pouco o fato de sua estória não se passar no reino da Britannia. Polêmicas à parte, ele pode não ter sido o melhor jogo de computador que eu já joguei (esse título eu dou para Diablo II com a expansão), mas foi, com certeza, um dos que joguei por mais tempo.