Tudo Pode Dar Certo

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Horace Walpole disse que “A vida é uma comédia para os que pensam e uma tragédia para os que sentem”. Eu discordo dessa frase frontal e agressivamente, e ainda mostro minha ferramenta lusitana. Acontece que, quanto mais eu penso na vida, mais ela parece cruel e sem sentido. Uma simples jaula cheia de tristezas e sofrimentos que um dia, sem mais nem menos, termina. E, sinceramente, não consigo entender como alguém que pense na vida consiga chegar a uma conclusão mais animadora. Isso não seria racional. ^^

Finalmente, aparece um personagem no cinema que parece encarar a vida da mesma forma que eu. Boris (Larry David) é um sujeito amargo e arrogante, cheio de pensamentos sobre a vida, o universo e tudo mais que ele constantemente manifesta, sem se preocupar com as reações dos demais. E ele com certeza sabe argumentar racionalmente o porquê da vida parecer tão terrível e sem motivos. Eu não me identificava tanto com alguém desde que li a letra de I Was Wrong, do Social Distortion.

Um dia, ele conhece uma moça do interior que, além de ser uma das mulheres mais bonitas do mundo, é burrinha, pateta e inocente. E Boris fica extremamente irritado com a burrice alheia, assim como eu. Mas essa garota consegue ser burrinha de uma forma apaixonante.

A qualidade do texto e dos diálogos está entre as maiores já concebidas por uma mente humana. Cada diálogo, cada argumento, cada frase presente nesse roteiro é simplesmente genial. Normalmente, eu costumo escolher uma frase legal para ilustrar a chamada da matéria, mas aqui tinha tantas que eu decidi não usar nenhuma. E deixar para você o prazer de descobrir cada uma delas, por conta própria.

O negócio é tão bem escrito que meu objetivo de vida, a partir de hoje, é conseguir escrever algo que se aproxime da genialidade vista aqui. Como o Woody Allen já faz filmes há décadas e eu escrevo matérias há menos de dez anos, acho que ainda tenho bastante tempo para melhorar. Mas, considerando que, até algumas horas atrás, o maior objetivo da minha vida era abraçar um panda, você pode perceber como esse filme me mudou. Agora abraçar um panda é só a segunda coisa que eu mais gostaria de fazer antes de morrer.

Sabe o que é pior? Além de toda a negatividade presente nos diálogos e nos argumentos do Boris, o filme é MUITO engraçado. Eu gargalhei como se não houvesse o perigo de fazer pipi nas calças. Gargalhei como não gargalhava desde que um grupo de amigos me cercou e ficou me fazendo cócegas no meu aniversário de oito anos. E não é só isso, porque quando não estava rindo, estava no mínimo balançando a cabeça em concordância, não acreditando como vários dos meus próprios argumentos e pensamentos sobre a vida foram finalmente levados à tela grande. E por alguém que não sou eu. Pelo menos não que eu saiba, claro.

O delfonauta dedicado (e o não dedicado pode descobrir clicando no “Isso me lembra Woody Allen” após essa resenha) sabe que meu envolvimento com Woody Allen começou apenas quando tive que assistir aos seus filmes profissionalmente. E, se os anteriores já haviam me agradado, depois desse eu posso, sem a menor dúvida, me considerar fã do sujeito. E vou reservar uma passagem para a Argentina agora mesmo para ver seus longas mais antigos.

A única coisa que deixa a dever um pouco é a história, especialmente depois que o triângulo amoroso começa a dar sinais de existência. Fosse apenas um filme de diálogos, estaria destinado ao primeiro lugar no Top 5 de filmes de 2010 (quiçá de toda a história). Como não é apenas isso, é bem provável que ainda tenha um lugar no Top 5 desse ano, mas não garanto nada. Nada, a não ser que você vai se divertir muito assistindo no cinema. Compre seu ingresso ainda hoje.

Curiosidades:

– Larry David criou a série Seinfeld junto com Jerry Seinfeld. Ele é a pessoa real que inspirou o tremendão George Constanza.

– Quem não conhece e ficou curioso para ler a letra/ouvir a música I Was Wrong, do Social Distortion, regozije-se. Abaixo você confere o videoclipe e a letra que, assim como o filme resenhado aqui, parece ter sido escrita por mim. Divirta-se.

Well, when I was young
I was so full of fear
I hid behind anger, held back the tears
It was me against the world
I was sure that I’d win
But the world fought back, punished me for my sins

I felt so alone
So insecure
I blamed you instead, made sure I was heard
And they tried to warn me
Of my evil ways
But I wouldn’t hear what they had to say

I was wrong
Self destruction’s got me again
I was wrong
I realize now that I was wrong

And I think about my loves
Well, I’ve had a few
Well, I’m sorry that I hurt them
Did I hurt you too?
I took what I wanted
Put my heart on the shelf
But how can you love when you don’t love yourself?

It was me against the world
I was sure that I’d win
The world fought back, punished me for my sins
And they tried to warn me
Of my evil ways
But I couldn’t hear what they had to say

I was wrong
Self destruction’s got me again
I was wrong
I realize now that I was wrong
I was wrong, yeah
I was wrong

I grew up fast
And I grew up hard
Something was wrong from the very start
I was fighting everybody
I was fighting everything
But the only one that I hurt was me
I got society’s blood running down my face
Somebody help me get outta this place
How could someone’s bad luck last so long?
Until I realized that I was wrong

I was wrong
Self destruction’s got me again
I was wrong
I realize now that I was wrong
I was wrong
Self destruction’s got me again
I was wrong
The only one that I hurt was me
I was wrong

REVER GERAL
Nota
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
tudo-pode-dar-certoPaís: EUA<br> Ano: 2009<br> Gênero: Comédia<br> Duração: 92 minutos<br> Roteiro: Woody Allen<br> Elenco: Larry David, Evan Rachel Wood e Patricia Clarkson.<br> Diretor: Woody Allen<br> Distribuidor: Califórnia<br>