Alguns jogos não precisam de uma história ou contextualização muito elaborada para justificar as ações do jogador. Se você é um avião de guerra e outras naves o querem morto, é intuitivo querer revidar. Ninguém precisa explicar quem é o seu personagem ou que os objetivos do jogo são: 1) manter-se vivo; e 2) derrubar o máximo possível de navinhas inimigas. Sine Mora Ex, então, é um jogo atípico. Versão remasterizada de Sine Mora, jogo indie húngaro de 2012, o jogo possui a marcante característica de ter uma história bastante complexa para explicar uma troca casual de risquinhos azuis e laranjas entre aeronaves.
Veja só: no planeta Seol, há duas sociedades que estão em guerra: o Império e os Enkies. Algumas missões do jogo são focadas na vingança de um desertor do Império. Ele é o pai de um piloto que fora assassinado por ter sido o único a não detonar uma bomba nuclear nos Enkies. As outras fases contam os esforços dos Enkies de lutarem contra o Império séculos após terem sido praticamente erradicados do planeta. Para completar, é lógico que esse pessoal tem poderes de manipular e viajar no tempo.
É só um pouquinho demasiadamente complicado para o gênero de tirinhos 2.5D, mas Sine Mora Ex tem muito mais que isso. Me acompanha?
Onde aperto pra dar tiro?
A jogabilidade de Sine Mora Ex segue o estilo clássico dos jogos antigos de shoot ‘em up, como R-type e Gradius. Movimente sua aeronave pelo cenário, enfrente os inimigos e, o mais importante, desvie das centenas de tiros, raios, minas aéreas e mísseis. Para isso, é necessário ter uma excelente noção espacial e de posicionamento, além de reflexos rápidos. Para revidar, há o tiro comum, que aumenta de dano e quantidade quando a nave coleta power-ups, e o especial, que consome munição (varia de mísseis teleguiados a um raio de energia que se parece com o kamehameha do Goku).
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Há outras características de jogabilidade que diferem Sine Mora Ex da maioria dos jogos do gênero. A habilidade principal, que pode ser usada a qualquer momento desde que haja energia disponível, é a de “desacelerar” o tempo e fazer com que os tiros e as naves viajem vagarosamente. Outro aspecto é mais determinante às suas ações: cada trecho da fase possui um tempo pré-definido para ser concluído (normalmente de 20 segundos). Esse tempo aumenta quando um inimigo é abatido e diminui quando sua aeronave leva dano. Não há vidas de uma maneira tradicional em Sine Mora Ex: sua nave explode quando o tempo acaba.
É complexo, a princípio, mas a proposta é também intuitiva e rápida de entender. Na prática, este formato deixa o jogo menos punitivo, já que você tem muito mais chances de completar uma fase se errar, ao mesmo tempo em que mantém a dificuldade lá no alto.
Uma situação que aconteceu muitas vezes comigo é quando estava com a arma principal totalmente carregada e levava um tiro. Todos os power-ups se espalham nessa hora, o tempo para completar o trecho diminui e, então, você precisa decidir entre se arriscar para recuperar seu poder de fogo e continuar do jeito que está. Nenhuma opção é fácil e segura de ser seguida. Sem poder de fogo, os próximos inimigos levarão mais tempo para serem abatidos, porém, recuperá-lo pode fazer com que você leve mais tiros. Ambas as opções diminuem seu tempo e trazem o risco de sua aeronave explodir.
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Nessas horas, a sua melhor saída é usar a habilidade de “desacelerar” e recuperar os power-ups, que também dão um pouco de tempo extra. No entanto, nem sempre ela está disponível. Por isso, é preciso pensar numa estratégia e não gastar toda aquela barra azul do canto superior direito da tela, que é gasta para usar esse especial.
O que é falado antes de explodir coisas
Os trechos de cada fase de Sine Mora Ex têm tempo para serem concluídos e normalmente são intercalados com diálogos entre os pilotos que o jogador controla e/ou irá controlar, ou breves animações. Há também narrações dos personagens principais entre as fases, várias bastante longas.
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Estas interrupções no ritmo do jogo, sem falar no grande foco na história, são decididamente divisivas. Alguns jogadores podem se interessar pela narrativa e apreciar a quebra da ação frenética que exige tanto dos dedos; outros podem ficar um pouco decepcionados pelo jogo não ser mais objetivo, ou por não gostarem da história. Ainda pode ter aquele pessoal do meio termo, que é o meu caso: até gosto da apresentação e da proposta, mas não acho que a história é tão interessante e bem executada quanto poderia.
Sine Mora Ex lida com traição, vingança, estupro e genocídio. Pode ser demais para muitas pessoas que querem simplesmente se divertir com um estilo de jogo clássico. Sempre há o modo arcade para isso, mas é um pouco estranho jogá-lo sem a história, pois são as mesmas fases sem a narrativa e os diálogos, tão presentes na campanha.
Exclusividades Ex
É claro que esta é uma versão remasterizada e possui diversas melhorias e conteúdo novo em relação ao original, de 2012. Uma coisa que não é preciso se preocupar é com os quesitos técnicos e de apresentação. O jogo roda a 60 fps com 1080p sem qualquer problema. É um 2.5D muito bonito, cheio de cenários bem trabalhados e com uma trilha sonora que combina bastante com a ambientação e história.
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De conteúdo novo, sem dúvida o mais importante é o modo cooperativo de sofá para dois jogadores encararem a campanha (não há modo online). Porém, a história tem uma má influência aqui: apenas o primeiro jogador controla o personagem com as habilidades principais, pois, do contrário, a jogabilidade e a história não iriam se encaixar. O segundo jogador controla um drone que pode criar um escudo ou atirar em qualquer direção (igual a um twin-stick shooter). A sacada é que o drone não morre, mas toda vez que leva dano, diminui a barra de energia para a habilidade de “desacelerar” do primeiro jogador. É, cuidado para não gritar com o amigão do lado.
Neste jogo, às vezes é contraprodutivo ter jogabilidade assimétrica. É difícil se comunicar e agir, pois tudo é muito rápido. Em shoot ‘em ups, você ajuda mais o seu amigo não o ajudando. Ao se preocupar com destruir mais navinhas e manter-se vivo, só é preciso combinar com o parceiro quando usar especiais. Poderia ser mais legal se o segundo jogador também controlasse um personagem próprio. De qualquer forma, o co-op é divertido e, apesar de não ter terminado o jogo em dupla, quero fazer isso um dia.
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Há ainda os modos de treino de chefe, desafio (dificílimo) e o de um contra um (basicamente, seu amigo contra você como num jogo de luta, só que de naves). A cada fase terminada na campanha, você desbloqueia fases e personagens para o modo arcade. Tem muito conteúdo aqui e a maioria é opcional, pois a campanha pode ser finalizada tranquilamente em três horas, a não ser que mesmo a dificuldade normal derrube você (e, vai por mim, há essa chance se você não estiver acostumado com shoot ‘em ups).
Caos na tela
Pensando como remaster, Sine Mora Ex é um dos mais benfeitos que já joguei. Como experiência, é um jogo divertido, mas que possui uma abordagem diferente a um gênero que nunca teve muito disso e, de repente era uma fórmula que não precisava ser mexida.